Pré-história - Música A música nasceu com a natureza, ao considerarmos que seus elementos formais, o som e ritmo, fazem parte do universo e, particularmente da estrutura humana. O homem pré-histórico descobriu os sons que o cercavam no ambiente e aprendeu a distinguir os timbres característicos da canção das ondas se quebrando na praia, da tempestade se aproximando e das vozes dos vários animais selvagens. E encantou-se com se próprio instrumento musical - a voz. Mas a música pré-histórica não se configurou como arte: teria sido uma expansão impulsiva e instintiva do movimento sonoro ou apenas um expressivo meio de comunicação, sempre ligada às palavras, aos ritos e a dança. Antigas civilizações O mistério continuou a envolver a música da antigüidade, pela ausência do próprio elemento sonoro, que se desfez no tempo e, ainda, pela inexistência de uma notação musical clara e documentação suficiente. No entanto, sabemos que nas antigas civilizações já havia o cultivo da música como arte em si mesma, embora ligada à religião e à política. Fazendo estudos nos instrumentos encontrados dessa época notou-se o aperfeiçoamento na construção dos instrumentos, com valorização do timbre. Mesopotâmia Desde início do terceiro milênio antes de Cristo, no Império Agrícola da Mesopotâmia, situado na região entre os rios Tigre e Eufrates, viviam respectivamente sumérios, assírios e babilônios. Nas ruínas das cidades desses povos, foram descobertos harpas de 3 a 20 cordas dos sumérios e cítaras de origem assíria. Na Assíria e na Babilônia, a música tinha importante significação social e expressiva atuação no culto religioso. Fortaleceu-se tal conclusão, quando C. Saches decifrou um documento musical de Assur, escrito por volta de 800 a.C., em símbolos cuneiformes: era um acompanhamento de harpa, onde se revela uma forma de escrita a duas e três vozes, com base num sistema pentatônico. O legado da cultura mesopotâmica passou aos Persas. Segundo o testemunho de Heródoto, o célebre historiador grego, eles chegaram a abolir a música do culto, sem deixarem de apreciar, no entanto, os conjuntos vocais e instrumentais, como é possível constatar nos documentos iconográficos. Egito A arte egípcia, com características muito próprias, revela inspiração e finalidade religiosa. A música no Egito era praticada em todos os momentos da vida social. O povo tinha seus cantos tradicionais, religiosos - principalmente através de transes místicos para a cura de doenças do corpo físico, do mental, do emocional e do espiritual -, profanos, guerreiros e de trabalho. Os instrumentos de corda, harpa e cítara eram artisticamente elaborados. Os egípcios tinham flautas simples e duplas e instrumento típicos de percussão, como crótalo e sistros e principalmente os tambores. No século II a.C., na Alexandria, Ctesíbio inventou o órgão hidráulico, que funcionava, em parte, mergulhado na água. A escala egípcia era diatônica, com tons e semitons, conforme se pode deduzir pelas flautas encontradas. A harpa, como instrumento nacional, foi elaborada nas mais luxuosas e elegantes formas. A arte egípcia, através de seus instrumento musicais e papiros com diversas anotações, atingiu outras civilizações antigas, como a Cretense, a Grega e a Romana. Grécia Encontramos a gênese da arte grega na civilização- cretense, cujos vestígios se revelaram em ruínas de cidades como Tirinto, Micenas e Cnossos. Ela é a glorificação da natureza e da vida, expressando um anseio constante pela perfeição, ritmos e harmonia, o apreço pelos valores espirituais e o culto da beleza ideal. A música, a poesia e a dança, unidas por um elemento comum- o ritmo- , eram praticados de modo integrado. Os poemas eram recitados ao som de acompanhamento musical. A música grega se baseava em oito escalas diatônicas descendentes- os modos gregos -, cada um com um significado ético e psicológico. Os instrumentos nacionais eram a cítara e a lira. O instrumento de sopro mais usado era o aulos, de sonoridade sensual, muito usada nas festas dedicadas ao Deus Dionísio, mais tarde chamado de Baco, pelos romanos. A teoria musical grega se fundamentava na ética e na matemática. Pitágoras estabeleceu proporções numéricas para cada intervalo musical. A notação musical era alfabética, mas insuficiente: usavam letras em diversas posições para representar os sons. Os gregos relacionavam intimamente música, psicologia, moral e educação. No âmbito da ética musical, dentre as posturas mais interessantes, destacam-se: - a de Pratinas, rígida e conservadora, extremamente reacionária, condenava o instrumentalismo. - a de Pídaro, mais positiva, expressa uma sincera crença no poder da influência musical no decorrer do processo educativo. - A de Platão, representante máximo da filosofia musical grega, apoiava-se na afirmação da essência psicológica da música. Segundo esse filósofo, a música poderia exercer sobre o homem poder maléfico ou benéfico, por imitar a harmonia das esferas celestes, da alma e das ações. Daí, a necessidade de se colocar a música sob a administração e a vigilância do Estado, sempre a serviço da edificação espiritual humana, voltada para o bem da polis, almejada como cidade justa. - A de Aristóteles, que destaca o papel da poesia, da música e do teatro na purgação das paixões (cartase). Finalizando, para ressaltar a importância da música na Grécia, basta citar um trecho da A República de Platão, que comenta estes versos de Homero, na Odisséia: ''os homens apreciam mais os cânticos mais novos''. O referido trecho, traduzido, é o seguinte: ''... pois é de temer que a adoção de um novo gênero musical ponha tudo em perigo. Nunca, com efeito, se a assesta um golpe contra as formas da música, sem abalar as maiores leis da cidade, como afirma Damon, e eu creio de bom grado.'' (PLATÃO. A República, 424b-2, p.203.) Encontramos a gênese da arte grega na civilização- cretense, cujos vestígios se revelaram em ruínas de cidades como Tirinto, Micenas e Cnossos. Ela é a glorificação da natureza e da vida, expressando um anseio constante pela perfeição, ritmos e harmonia, o apreço pelos valores espirituais e o culto da beleza ideal. A música, a poesia e a dança, unidas por um elemento comum- o ritmo- , eram praticados de modo integrado. Os poemas eram recitados ao som de acompanhamento musical. A música grega se baseava em oito escalas diatônicas descendentes- os modos gregos -, cada um com um significado ético e psicológico. Os instrumentos nacionais eram a cítara e a lira. O instrumento de sopro mais usado era o aulos, de sonoridade sensual, muito usada nas festas dedicadas ao Deus Dionísio, mais tarde chamado de Baco, pelos romanos. A teoria musical grega se fundamentava na ética e na matemática. Pitágoras estabeleceu proporções numéricas para cada intervalo musical. A notação musical era alfabética, mas insuficiente: usavam letras em diversas posições para representar os sons. Os gregos relacionavam intimamente música, psicologia, moral e educação. No âmbito da ética musical, dentre as posturas mais interessantes, destacam-se: - a de Pratinas, rígida e conservadora, extremamente reacionária, condenava o instrumentalismo. - a de Pídaro, mais positiva, expressa uma sincera crença no poder da influência musical no decorrer do processo educativo. - A de Platão, representante máximo da filosofia musical grega, apoiava-se na afirmação da essência psicológica da música. Segundo esse filósofo, a música poderia exercer sobre o homem poder maléfico ou benéfico, por imitar a harmonia das esferas celestes, da alma e das ações. Daí, a necessidade de se colocar a música sob a administração e a vigilância do Estado, sempre a serviço da edificação espiritual humana, voltada para o bem da polis, almejada como cidade justa. - A de Aristóteles, que destaca o papel da poesia, da música e do teatro na purgação das paixões (cartase). Finalizando, para ressaltar a importância da música na Grécia, basta citar um trecho da A República de Platão, que comenta estes versos de Homero, na Odisséia: ''os homens apreciam mais os cânticos mais novos''. O referido trecho, traduzido, é o seguinte: ''... pois é de temer que a adoção de um novo gênero musical ponha tudo em perigo. Nunca, com efeito, se a assusta um golpe contra as formas da música, sem abalar as maiores leis da cidade, como afirma Damon, e eu creio de bom grado.'' (PLATÃO. A República, 424b-2, p.203.) Roma No período helenístico, a música grega desviara-se para a busca e o culto da virtuosidade, o que representou uma decadência do espírito nacional que a orientara na época áurea. Eram interessantes os diversos instrumentos de sopro utilizados nos exércitos, com variadas finalidades. A mais curiosa figura conhecida na arte musical romana, antes da era cristã, foi o Imperador Nero, compositor e poeta, que se acompanhava à lira, tendo até instituído a ''claque'', cujos aplausos interesseiros estimulavam sua inspiração e acalentavam sua vaidade. Arte Cristã Fase Catacumbária Ocorreu em Roma, no século primeiro de nossa era, a existência simultânea de duas culturas de filosofias opostas: a civilização cristã, que nascia, e a antiga civilização romana, cujo crepúsculo já era anunciado pela sua grande decadência espiritual. Os cristãos, empolgados com a doutrina de Jesus Cristo, que pregava o amor, o respeito, a igualdade e a fraternidade entre os homens, foram considerados subversivos pelos poderosos que nada disto sentiam ou praticavam . E uma perseguição cruel se iniciou, culminando em espetáculos sangrentos nas arenas dos teatros romanos, onde os cristãos eram sacrificados, lançados às feras, crucificados ou incendiados vivos, sempre com uma palavra de amor e perdão aos seus perseguidores. Os cristãos sepultavam seus mortos nas catacumbas, túmulos subterrâneos, verdadeiros labirintos ladeados por galerias em diferentes níveis. Ali oravam e exprimiam seus sentimentos de fé, esperança e amor, através da arte. Entoavam um tipo de oração cantada, a uma voz, em ritmo prosódico do texto em latim, sem acompanhamento musical. Era a salmodia, de origem hebraica, que São Pedro ha-via trazido da Antioquia, no ano 54. A música cristã, depois denominada cantochão ou cantus planus, pelo seu sentido horizontal, com suaves ondulações melódicas, era simbólica e de maravilhoso efeito místico. Idade média (séc. X ao XV) Arte Paleocristã Também a música litúrgica é organizada em cada região de forma diferente e própria: S. Efrém, em Bizâncio, organizou os cantos litúrgicos e criou novos hinos estróficos; Santo Ambrósio fez o mesmo em Milão, dando nova organização musical às festas do ano litúrgico e sistematizando os quatro primeiros modos - escalas musicais - eclesiásticos; S. Hilário e S. Isidoro, em Poitiers e Sevilha, respectivamente, também organizaram à sua maneira os cantos religiosos. Quando Gregório Magno se tornou Papa, de 590 a 604, teve uma importante preocupação: unificar a música cristã que estava muito diversificada nos diferentes locais. Selecionou os melhores cantos, acrescentou novos hinos, sistematizou-os de acordo com as festas do ano litúrgico e codificou tudo isso em dois livros que prendeu, simbolicamente, em correntes num altar na Igreja de S. Pedro, em Roma. Estes livros eram o Antiphonarium e o Cantatorium . Gregório Magno reformou ainda a Schola Cantorum, onde os padres e missionários aprendiam a música religiosa católica - símbolo uniforme da fé cristã -, que deveria ser levada a todos os lugares do mundo, expressando a palavra de Deus. O cantochão passou a denominar-se Canto Gregoriano em homenagem ao Papa Gregório Magno a quem é atribuída sua organização. Até o ano 1000, a arte expressava, de modo predominante, sentimentos religiosos. Época Medieval (séc. VIII ao XIII) A música, como também a arte figurativa, representava a pura expressão do Teocentrismo reinante na Idade Média. Até o ano 1000, predominara religiosa e monódica (isto é, a uma voz) dentro da atmosfera dos "modos" eclesiásticos, herdados indiretamente da música grega. Os modos eram escalas ascendentes, em que se baseava a música litúrgica, cada qual com uma seqüência própria de tons e semitons, partindo de una determinada nota denominada finalis ou final. Cada modo apresentava duas formas: a autentica e a plagal. Os modos autênticos eram: o dórico (protus), de ré a ré; o frígio (deuterus), de mi a mi; o lídio (tritus), de fá a fá, e o mixolídio (tetrardus), de sol á sol. Cada modo plagal se iniciava uma quarta abaixo da finalis do respectivo modo autêntico e tinha o mesmo nome, acrescentado do prefixo hipo, isto é: hipodórico (lá a lá), hipofrígio (si a si), hipolídio (dó a dó), e hipomixolídio (ré a ré). A notação musical, por volta do ano 1000, permanecia alfabética e neumática . Os neumas eram sinais escritos, com freqüência, no sentido de uma linha horizontal, acima do texto religioso e indicavam, de forma muito vaga, o movimento ascen-dente ou descendente das melodias do cantochão. Os músicos, por vezes, usavam "pauta" de uma linhas coloridas, cujas alturas eram indicadas por letras, logo no seu início, que constituíram ente a origem das claves. A escrita da música tomou novo impulso a partir do momento em que o Monge Guido d'Arezzo (995 - 1050) aumentou para quatro as linhas da pauta; deu nome aos sons musicais, usando a primeira sílaba de cada verso do Hino a São João Batista (tu, ré, mi, fá, sol, lá) e passou a representar cada som, na pauta, por um neuma quadrado, tornando a leitura mais clara. Fase Gótica A música transcendente e severa de Leonim e Perotin fora criada para soar na majestosa catedral gótica de Notre-Dame de Paris, cuja construção se iniciou em 1163. A parti do século XII, o mensuralismo musical se desenvolveu, sob a influência da música trovadoresca, infiltrando-se inclusive nos organa a duas, três e quatro vozes de Leonin e Perotin. Assim abalou o primado do canto gregoriano, sempre plano e com ritmo amétrico. Outra forma importante de canção erudita, polifônica e latina, dos séculos XII e XIII, foi o conductus - palavra ligada ao sentido de "conduzir" no contexto de procissão. O conductus apresenta texto único para todas as vozes; é geralmente estrófico e, de preferência, silábico (uma sílaba para cada nota), embora haja também melismas. A forma musical espelha a estrutura poética. Assim, a música pretende seguir a métrica dos versos: para cada estrofe permanece a mesma música e, por isto, o conductus se divide em partes ou seções de divisão idêntica para todas as vozes . A partir do século XIV, afirmaram-se os valores menores (semínima, crome e fuza), completando os maiores já usados no século anterior (longas, breves, semibreves e mínima). Na música, multiplicaram-se então as descobertas e conquistas técnicas. O enfraquecimento do espírito teocêntrico da Idade Média se revelou na música e, de modo especial, no chamado Moteto Gótico de século XIII. No Moteto Gótico, o cantus firmus apresentava-se no tenor, com texto religioso a ser cantado em latim ou executado instrumentalmente, e as outras vozes eram construídas acima dele, geralmente em francês, com letra profana e específica para cada uma. Ocorria, portanto, a síntese do religioso com o profano e a politextualidade em idiomas diversos. Ars Nova Musicae No âmbito musical, o século XIV foi marcado pelo tratado Ars Nova Musicae, de Filipe de Vitry, Bispo de Meaux, cujo aparecimento é inserido entre 1320 e 1325. A obra deu nome a uma época em que o estilo polifônico adquiriu, por sua vez, grande desenvoltura e em que se delinearam amplas perspectivas de progresso estético nos campos rítmico, melódico e formal. A Ars Nova afirmou-se na França, influenciou outros centros culturais e estendeu-se por todo o século XIV até, aproximadamente, meados do século XV. Correspondeu ao início da Pré-Renascença na arte em geral, quando ocorreu a transição do espírito teocêntrico da Idade Média para o humanista do Renascimento, revelada na linguagem artística, através das transformações estilísticas. A Ars Nova italiana foi, sem dúvida, menos sofisticada e erudita, mais lírica, espontânea e simples. O amor era o tema central. No final do século XIV, sofreu influência da arte francesa. Renascença Na música renascentista, como continuidade histórico e artístico que vinha se elaborando principalmente nos três últimos séculos da Idade Média, atingiu seu apogeu o estilo coral polifônico a capella - isto é, o canto de várias vozes, interpretado por solistas, ou por um ou mais coros, sem acompanhamento instrumental. Essa música se corporou, mediante As técnicas de contraponto, aperfeiçoadas pelas escolas dos Países Baixos e através da influência franco-flamenga difundida por toda a Europa. Na primeira fase da Renascença musical, destacou-se, de modo especial, Josquin des Près (1440-1521), aluno de Ockeguem, chamado "o Príncipe dos Compositores" e "luz da escola flamenga", considerado pelos estudiosos "a encarnação da música renascentista". Segundo uma observação de Lutero sobre Josquin, citada por Kiefer, em sua obra História e Significado das Formas Musicais, "as notas tinham de sujeitar-se à sua vontade", pois ele não era como outros mestres do canto que tinham de se submeter à determinação das notas. Tal comentário se faz pertinente, pelo fato de que muitos compositores permitiram que os artifícios técnicos do contraponto escravizassem a expressão musical. Havia em Josquin uma preocupação muito clara em traduzir musicalmente o sentido das palavras do texto e ele o fazia, de modo profundamente expressivo, tendo usado a imitação canônica com autêntica maestria. Após a morte de Josquin, considerado fundador da escola franco-flamenga, seus discípulos se espalharam pela Europa, difundindo as avançadas conquistas da técnica contrapontística concretizada pelos mestres dos Países Baixos. Assim, de acordo com o estilo musical da época, os compositores, com liberdade determinada e precisão científica, teciam teias de diversas melodias, que soavam independentes, num sentido horizontal, embora entrelaçadas simultaneamente, explorando, numa trama musical, todos os recursos da imitação vocal. Esta é a chamada textura polifônica, que contrasta com a monofônica, dotada de uma única linha melódica, própria, por exemplo, do cantochão medieval. Difere-se também da homofônica ou acordal que utiliza, com freqüência, para todas as vozes, o mesmo ritmo, geralmente predominando uma linha vocal mais aguda sobre as outras que, como blocos verticais, têm a função de acompanhamento. Nas principais formas musicais da Renascença afirmou-se a cerrada textura polifônica, em que são concebidas as vozes horizontalmente. A escrita em acordes foi mais utilizada em canções profanas que se ligavam, de modo especial, ao ritmo bem marcado da dança ou da poesia. Tudo isto ocorria ainda dentro da linguagem modal. No entanto, através da chamada musica ficta ou falsa, haviam sido muito ampliadas, desde o século XIV, as perspectivas de invenção melódica. A musica ficta consistia na possibilidade de emprego alternativo de notas "estranhas" aos modos ou escalas básicos, mediante "acidentes" indicados no texto musical. Surgiu também, no Renascimento, uma tendência no sentido de valorizar o uso de mais dois outros modos ou escalas: o jonico (de dó a dó), que, posteriormente, seria chamado maior e o eólio (lá a lá), hoje denominado "menor natural". Durante a Renascença, o compositor trabalhava a imitação de forma diferente do compositor medieval. Na Idade Média, as vozes eram linhas melódicas, distintas e independentes entre si, uma "contra a outra". Na música renascentista, as imitações de cada "antecedente" - trecho melódico a ser repetido, de forma regular ou irregular, pelas demais vozes - fluíam, com continuidade muito natural, em todo o tecido musical, geralmente sem cisões, na passagem de uma seção à outra, mesmo quando, após a imitação de um fragmento melódico por todas as vozes, era introduzido novo antecedente que seria tratado da mesma forma.O interesse pela música profana era intenso. A canção polifônica francesa apresentava-se freqüentemente naturalista, empregando, por vezes, com o intuito de descrição, efeitos onomatopaicos e eventualmente, a métrica greco-latina, em que a poesia condicionava o ritmo da música. Os escritores e músicos do grupo La Pléiade, chefiados pelo poeta Ronsard sonharam em realizar uma música á maneira greco-romana, submetida á antiga métrica rítmica. Dentre as mais grandiosas e expressivas obras da Renascença, ressaltam-se aquelas compostas para a Igreja Católica, sobe as formas de moteto e missa. · MÚSICA INSTRUMENTAL Ao lado da música vocal, desenvolveu-se, gradativamente, a música instrumental. Começou-se por reduzir para órgão ou transpor para instrumentos de corda as melodias vocais das canções polifônicas. Depois surgiram formas típicas como: prelúdios de livre invenção, diálogos instrumentais, tocatas, ricercari, suites, variações, fantasias e sonatas (par suonare). Dentre as formas de música instrumental má elaboradas, especialmente ressaltaram-se: - suites ou coleções de danças, como pavanas e galhardas, dentre outras; - fantasias, utilizando com criatividade os recursos contrapontísticos; - variações, em que uma melodia principal -geralmente apreciada - era várias vezes repetida, sucessivamente, de modo sempre variado; - baixo ostinato (em que uma melodia insistia continuamente no baixo, enquanto ocorriam variações nas vozes superiores); - tocatas ("para tocar" em teclados, geralmente de órgão e cravo); - canzonas da sonar ou para soar (destinada a grupos de instrumentos); - ricercari (que significava "procurar" e u "imitação" no instrumento, à maneira contrapontística vocal). Barroco Podemos afirmar que duas correntes principais se afirmaram no Barroco Musical: uma, o melodrama - elemento novo e revolucionário no momento histórico; outra, a música instrumental, que teve um notável desenvolvimento, emancipando-se definitivamente, como arte autônoma, ao se libertar das cadeias literárias. De 1600 a 1750, aproximadamente, quando localizamos o período barroco musical, a evolução no âmbito da música gira em torno destas duas vertentes. Na música instrumental pura, a linguagem é imprecisa, não descreve e não tem um conteúdo claramente definido como nas demais artes. Representa, na síntese de suas estruturas em movimento, uma arquitetura sonora, abstrata e dinâmica. Possui, no entanto, uma maleabilidade expressiva que a amolda ao cosmo interior de cada ser humano, que nela se projeta e a interpreta, conforme sua própria identidade. Assim, a música pura torna-se profunda e abrangente, guardando aquele mistério que evoca o infinito. A música instrumental alçou no Barroco um transcendente vôo que, no decorrer dos séculos, não mais seria tolhido. Só poderemos avaliar adequadamente a evolução da música no século XVII, se a compararmos com a produção medieval e a renascentista. A visão da música barroca dentro das perspectivas dos séculos posteriores, sem se levar em consideração a sua linha evolutiva anterior ao século XVII, alterará por completo a percepção do significado e das proporções formais e expressivas que ela assume no seiscento. Como já foi dito, na música do século XV, prevalecera o canto polifônico a capella. Os instrumentos eram por vezes introduzidos para substituir uma ou outra linha melódica vocal. Usava-se também a transcrição da música vocal para alaúde, cravo (ou similar) e órgão, instrumentos que se prestam à execução de polifonia. Em fins do século XVI, já constatamos que a música instrumental se libertara paulatinamente de sua anterior função, de caráter secundário, desabrochando em sonatas - para "sonar" em vários instrumentos - e em tocatas - para "tocar" em instrumentos de teclado -, em contraposição às cantatas - obras "para cantar". Pré-clássica e Arcadismo Na primeira metade do século XVIII, no contexto do espírito galante da música da corte, a dança que ganhava a preferência nos salões era o minueto, com passos miúdos, grande leveza e evoluções graciosas. No espírito da música refletia-se a vida aristocrática, marcada pelas normas de etiqueta, elegância exterior, mesuras, frivolidade e luxo. As peças para alaúde, para teclado - cravo, clavicórdio, espineta e para conjuntos, revelavam-se especialmente em ordres (suites de danças ou de peças - miniaturas caracterizadas) de extrema delicadeza, com cadências femininas freqüentes, melodias muito ornamentadas, num estilo nobre e galante, em linguagem tonal, de densidade leve. O maior cravista francês da época foi François Couperin (1668-1733) denominado Le Grand, e na Itália, destacou-se o notável Domenico Scarlatti (1685-1757). A opéra-ballet, criada no século XVII por Lully ( 1632-1687) e seus contemporâneos, síntese do "bailado" francês com elementos operísticos italianos, continuava a abrilhantar, na primeira metade do século XVIII, a vida artística dos palácios. Rameau, no reinado de Luís XV, era o novo compositor de óperas, nem sempre devidamente apreciadas por seus contemporâneos adeptos do estilo napolitano, por estarem impregnadas de uma certa austeridade, ao lado da simetria, elegância e clareza. Rameau, excelente clavecinista, foi também autor do Tratado de Harmonia Reduzida aos seus Princípios Naturais, de 1722, em que sistematizava as conquistas da linguagem musical do século XVII e lançava as bases da música tonal dos séculos posteriores. No âmbito da corte, a ópera nacional francesa disputou acirradamente, num contexto de ânimos alterados, o prestígio e a preferência do público, com a ópera bufa italiana, representada pela encantadora Serva Padrona (Criada-Patroa) de Pergolesi (1710-1736) culminando na célebre Querela dos Bufões ( 1752) e que dividiu a opinião do rei e da rainha, dos aristocratas e intelectuais, tendo um papel controvertido, nesta questão, o célebre filósofo Jean-Jacques Rousseau. Célebre se tornara, no século XVII, a orquestra francesa dos 24 violinos, introduzida por Lully, durante o reinado de Luís XIV e depois imitada na Inglaterra, na corte de Carlos II. Foi progressivamente enriquecida com delicadas sonoridades de instrumentos de sopro, como a flauta e o oboé, ampliando-se os recursos de linguagem. Assim, enriqueceu-se paulatinamente a composição orquestral, com a nobreza de seus primeiros passos, mediante o desenvolvimento das estruturas das formas musicais e das técnicas de instrumentação. O desenvolvimento da música para orquestra de câmara ocorria, na segunda metade do século XVIII, gradativa e simultaneamente em vários países de modos diversos, com contribuições próprias definidas, com base no aproveitamento da herança anterior: na França, com Rameau ( 1683-1743); na Itália, com Vivaldi (1678-1743), Alessandro Scarlatti (1660-1725), Sammartini (1700?-1775) e outros; na Inglaterra, com o alemão G. F. Haendel (1685-1759); na Alemanha, com J. S. Bach (1685 -1750) e Telemann (1681-1767); na Áustria com, Johann Stamitz (1717-1757) e outros compositores da Escola de Mannheim. Surgiu também, ainda na primeira metade do século XVIII, o concerto para um solista e orquestra, gênero que substituiria, na segunda metade do século XVIII, o concerto grosso. Algumas das citadas contribuições, na diversidade essencial e complementar de seus aspectos, em fins da primeira metade do século XVIII, confluíram para o esboço claro dos traços de um Pré-Classicismo Musical, ainda contido no espírito galante, mas que caminhava, dentro da harmonia tonal, para uma meta definida: a busca de uma técnica composicional perfeita e de uma forma ideal. Ocorreu, portanto, multifacetado, na história das artes, um momento de transição, na primeira metade do século XVIII: expirava o barroco musical como o "canto do cisne" na sua mais elevada e nobre expressão; o rococó se engalanava em gentilezas, delicadeza e leveza, na alienação de uma classe condenada à morte e, paralelamente, germinavam, discretamente, mas com a solidez das sementes eternas, os sinais do Pré-Classicismo Musical, com tendência a um fortalecimento progressivo. Classicismo O termo clássico sempre há de significar essencialmente harmonia, equilíbrio e perfeição formal valores universais perenes. Na primeira metade do século XVIII, no auge do Barroco, a obra de Johann Sebastian Bach se destaca como um marco importante na evolução da estética musical. Constitui a síntese perfeita das conquistas musicais anteriores - representadas especialmente no apogeu das formas polifônicas -, com as transformações da linguagem musical que ocorreram no curso do século XVII, unificadas no processo harmônico cujos princípios básicos Rameau formalizara no seu Tratado da Harmonia, de 1722. Sob o ponto de vista do equilíbrio e perfeição formal, a obra de Johann Sebastian Bach já corporifica os ideais clássicos, embora o seu estilo e linguagem representem um universo musical muito próprio, distanciando-se daquele que se vai revelar como característico da segunda metade do século XVIII, com Franz Joseph Haydn ( 1732-1809), Wolfgang Amadeus Mozart ( 1756-1791 ) e Ludwing Van Beethoven (1770-1827). Podemos ainda observar que a forma fuga, de textura contrapontística tonal, que Bach elevou à sua mais perfeita expressão, foi anunciadora do formalismo com base na dialética de tonalidades que se tornaria preocupação estética dominante dos compositores do período clássico. O período clássico musical se caracterizou pelo formalismo na busca da beleza universal, do equilíbrio e da perfeição estrutural da obra. Estes ideais se concretizam na forma sonata (bitemática e ternária), característica do primeiro movimento do gênero sonata para instrumentos ou grupos de câmara, da sinfonia orquestral clássica e do concerto para solista e orquestra. A natureza dos instrumentos musicais Por um longo período da história, a tecnologia dos instrumentos musicais fechou-se em densas camadas de segredos, os quais somente seriam revelados de pai para filho, à maneira dos vinhos, dos perfumes e de outras preciosidades do gosto humano. Mesmo assim havia instrumentos considerados improdutíveis, como os violinos Stradivarius construídos há quase 300 anos pelo luthier (fabricante de instrumentos musicais) Antonio Stradivari, em Cremona, na Itália. Acredita-se que a genialidade desse luthier, na aproximação da qualidade sônica do instrumento com os valores estéticos da música daquela época, foi, paradoxalmente, o que o impossibilitou de transmitir a parte mais nuclear da sua técnica a quem quer que fosse. Consta que nenhum de seus sete filhos obteve sucesso em inúmeras tentativas de reprodução. Hoje em dia, ainda se constróem violinos em Cremona com o mesmo procedimento artesanal de Stradivari, mas sem a alma de Stradivari. Os compositores dessa época escreviam partituras dentro do chamado sistema tonal, que é um sistema musical construído sobre uma certa hierarquia de intervalos. A organização básica do sistema tonal considera uma nota de referência (a tônica) ocupando o centro dos acontecimentos, enquanto um número finito de outras notas - ou graus - gravitam em torno dela. Numa visão simplista, uma seqüência melódica seria como uma viagem interplanetária, na qual se permaneceria o suficiente em cada planeta e sempre com o olhar voltado para o Sol. As sensações causadas pela produção do sistema tonal são tais que uma frase melódica em Dó Maior estará clamando pela nota dó cada vez mais à medida que os graus de consonância vão se tornando críticos e o equilíbrio do sistema se compromete. É o chamado sentimento da tônica a que se referem os teóricos. O mecanismo mais poderoso do sistema tonal é denominado modulação, e consta de se transferir o centro tonal para um outro grau abaixo na hierarquia. Novas notas associadas a um subconjunto da configuração anterior, incluindo aquela que teria definido o tom original, passam a gravitar em torno do novo centro. Isto demonstra que a idéia subjacente de sistema gravitacional na música dos séculos XVII e XVIII não se prendia apenas à organização do nosso sistema solar, mas talvez a um modelo para o universo. Nesse período, em que viveram Galileu Galilei e Isaac Newton, as idéias a respeito do movimento dos corpos ganhavam formalizações sólidas ao mesmo tempo em que surgia uma primeira tecnologia - óptica - que dava suporte experimental às formalizações matemáticas. Com um sistema musical que inclui na sua essência as informações cinemáticas do sistema solar e similares, a mudança de referência passa a ter uma confluência lógica na percepção humana, criando a sensação de um horizonte possível e natural. Se a idéia de que "a música é a concretização da inteligência contida nos sons" - como escreveu o matemático tcheco H. Wronski 2 no século XIX - for levada ao extremo, pode-se levantar a hipótese de que o segredo de Stradivari residia na sua intuição sobre os sistemas gravitacionais, pois se a cada música cabe um instrumento, ao sistema tonal, por força de sua analogia com os sistemas planetários, cabem os instrumentos cuja organização espectral de seus timbres reflitam a dinâmica gravitacional. Contudo, ainda que nada parecesse abalar o equilíbrio das peças tonais, a evolução da música faria com que muitos compositores fizessem uso do sistema tonal até a exaustão. O domínio absoluto da técnica de modulação possibilitou o deslocamento do centro para intervalos distantes ou pouco ligados à tônica. E essa simplificação do caminho no tecido tonal diminuiu a importância dos critérios de consonância postulados pela modulação convencional. Abandonou-se a noção de hierarquia de alturas, que era a essência da tonalidade, em favor da estruturação de outros parâmetros musicais, como a intensidade. Era a dissolução do sistema tonal. Simultaneamente a essas transformações dos sistemas de composição, acontecia nas ciências exatas o desdobramento das investigações sobre o interior da matéria, que se seguiu à descoberta do átomo. Essas pesquisas trouxeram uma nova realidade conceitual a respeito do movimento dos corpos e impôs um novo rumo à compreensão do universo. A energia no interior do átomo revela-se quântica, comprometendo a noção de contínuo. A geometria euclidiana passa a dividir o seu lugar com outras, que manipulam o invisível e o inimaginável. Matéria e antimatéria passam a conviver lado a lado para dar significado à solução das novas equações. Enfim, essa nova ordem da natureza revelada no século XX - incomparavelmente mais complexa que a de Copérnico - foi uma dose excessiva para o já combalido sistema tonal. E é nesse contexto que a música enfrenta problemas em conseguir uma química espontânea entre o instrumento e a partitura, pois, conforme a hipótese de Wronski enunciada acima, os instrumentos preparados para o sistema tonal produzem uma inteligência que a rigor satisfaz exclusivamente ao sistema tonal, de modo que um sistema musical que pretenda espelhar uma outra circunstância física terá que manufaturar instrumentos que acomodem as estruturas de informações dessa nova circunstância. Se a virada do século XIX para o século XX for tomado como o início do conflito entre as idéias e os instrumentos, vê-se que foram necessários ainda quase sessenta anos para que os primeiros instrumentos algorítmicos viessem a ser implementados em máquina. Mas, felizmente, a moderna teoria espectral e as técnicas de processamento digital de sinais que se desenvolveram nos últimos quarenta anos resolveram seguramente todo o problema da produção de sons, uma vez que qualquer som devidamente especificado pode ser produzido por meios computacionais.