0# CAPA 26.11.14 VEJA www.veja.com Editora ABRIL edição 2401 – ano 47 – nº 48 26 de novembro de 2014 [descrição da imagem: capa com fundo azul. Na metade inferior, do lado esquerdo, aparece imagem da Refinaria Abreu e Lima, e em frente, no lado direito, o Palácio do Planalto. Na metade superior, partes de dois e-mails, um endereçado para Senhora Ministra Dilma Vana Rousseff e a outra, De: lucosta@petrobras.com.br Para: pedro.dalcero@planalto.gov.br] EXCLUSIVO De: PAULO ROBERTO Para: DILMA ROUSSEFF Uma mensagem eletrônica de Paulo Roberto Costa para Dilma Rousseff em 2009 indica que ela e Lula ignoraram alertas sobre irregularidades em obras da Petrobras usadas pelos corruptos do caso Lava-Jato. [outras notícias no extremo superior da capa] ESTAMOS TODOS INSENSÍVEIS? Os radicais islâmicos degolam dezenas de pessoas em rituais coreografados, exibidos no YouTube, e poucos se comovem. ESPIÃO SUBMARINO Depois das cidades e até da Lua, o Google vai mapear os oceanos. ______________________________ 1# SEÇÕES 2# PANORAMA 3# BRASIL 4# ECONOMIA 5# INTERNACIONAL 6# GERAL 7# ARTES E ESPETÁCULOS _________________________________ 1# SEÇÕES 26.11.14 1#1 VEJA.COM 1#2 CARTA AO LEITOR – O PAPEL DAS INSTITUIÇÕES 1#3 ENTREVISTA – JEFF IMMELT – ELE ESTÁ PAGANDO PARA VER 1#4 MAÍLSON DA NÓBREGA – BOLSA FAMÍLIA: VOTO RACIONAL, E NÃO DE CABRESTO 1#5 LEITOR 1#6 BLOGOSFERA 1#1 VEJA.COM PARTO PREMATURO: DESAFIO Nº 1 Pela primeira vez na história, o parto prematuro — aquele que ocorre antes da 37ª semana de gestação — é a principal causa de mortalidade infantil no mundo. De acordo com o mais amplo estudo sobre o tema, publicado no periódico The Lancet, em 2013 morreu 1,1 milhão de crianças em decorrência do parto precoce, enquanto 935.000 morreram de pneumonia e 578.000, de diarreia, duas das doenças que mais matavam na infância. "No Brasil nascem quarenta bebês prematuros por hora. Quando a criança sobrevive, pode sofrer consequências gravíssimas como surdez ou cegueira", diz o obstetra Renato Passini Júnior, professor da Faculdade de Ciências Mà©dicas da Unicamp. Reportagem do site de VEJA investiga o que está por trás desses dados assustadores e especialistas em saúde infantil explicam o que pode ser feito para prevenir o problema e tentar impedir as mortes. TÉO PEREIRA BRILHA Passado o centésimo capítulo de Império, Paulo Betti pode comemorar. O ator vai entrar para a história como o impagável Tà©o Pereira, o blogueiro que adora fazer biquinho antes de disparar seu veneno contra o mundo. "Cu-ru-zes", diz ele, em um dos bordões que caracterizam o personagem. Téo Pereira, um gay exageradíssimo, é um ilustre representante da galeria de tipos criados por Aguinaldo Silva, o autor da novela das 9 da Globo, que já pôs no ar figuras inesquecíveis como Perpétua, de Tieta (1989), e Jorge Tadeu, de Pedra sobre Pedra (1992). A TRANSFORMAÇÃO DE DEBORAH SECCO Deborah Secco decidiu repaginar a carreira e mostrar que seu talento nà£o se resume a interpretar periguetes de novela. No filme Boa Sorte, de Carolina Jabor, a atriz vive uma soropositiva que se envolve com um adolescente desiludido com a vida, em uma instituição psiquiátrica. "Vou me arriscar a fazer coisas diferentes", diz ao site de VEJA, que traz um perfil da atriz e exemplos de atores que tomaram a carreira nas mãos e mudaram de rumo. TEMPORADA DE BOLSAS DE ESTUDO Estudar fora do país acrescenta bastante à carreira. Nesta época do ano, as principais universidades da Europa e dos Estados Unidos abrem inscrições para os processos seletivos de bolsas de estudo, que podem cobrir desde as despesas universitárias até os gastos pessoais e realizar o sonho de muitos brasileiros de estudar nas melhores universidades do planeta. O site de VEJA traz uma seleção de trinta cursos de mestrado, doutorado e MBA, com bolsas integrais ou parciais, nas áreas de negócios, saúde, educação, direito e ciências humanas. 1#2 CARTA AO LEITOR – O PAPEL DAS INSTITUIÇÕES Uma reportagem desta edição de VEJA, escrita pelo editor especial André Petry, detém-se sobre o documento de 51 páginas em que o juiz Sérgio Moro justifica a concessão dos pedidos de prisão de corruptos e corruptores da Operação Lava-Jato. à‰ uma peça que enriqueceria a cultura jurídica de qualquer país. No Brasil, o texto tem a característica adicional de ser o testemunho vivo da saúde das instituições. Só em um paà­s onde a democracia se implantou em sua plenitude a Justiça tem poder e independência para começar apurando um crime de lavagem de dinheiro restrito a uma única cidade, envolvendo um doleiro e alguns corruptos, e terminar com figurões do empresariado e da administração pública na cadeia, com suspeitas lançadas sobre os mais poderosos políticos da nação. A Operação Lava-Jato é um marco da maturidade institucional no Brasil. De uma investigação iniciada em Londrina, no Paraná, em 2008, tocada por meia dúzia de policiais, a Lava-Jato atingiu, em seis anos, as dimensões de um escândalo bilionário armado em torno da maior empresa brasileira, a estatal Petrobras, que vem sendo dissecado por centenas de agentes federais, procuradores e peritos da Justiça. Nesses seis anos, nenhum dos investigados lançou mão do poder financeiro e do compadrio político para armar, como era de costume, um ataque potente o bastante para fazer descarrilar as investigaà§ões. Os inquéritos estão evoluindo para processos, e estes, dentro de alguns poucos meses, vão resultar em sentenças. Os eventuais acusados com direito a foro privilegiado, membros do Congresso Nacional e ocupantes de cargo de ministro, serão julgados pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Enquanto isso, a oposição, com a exacerbação que o momento requer, faz o que se espera dela ao explorar as fraquezas do governo no episódio. E a imprensa? Está cumprindo seu papel de apontar os deslizes dos homens públicos, missão que VEJA abraçou desde sua fundação, em 1968. Não vivemos no Brasil a utopia do melhor dos mundos possível — aliás, estamos muitíssimo longe disso —, mas, até que os fatos nos desmintam, a investigação que atingiu em cheio as elites empresariais e políticas do Brasil está seguindo seu rumo sem provocar crises. Trata-se uma exceção em nossa história. Precisa ser a norma. 1#3 ENTREVISTA – JEFF IMMELT – ELE ESTÁ PAGANDO PARA VER O CEO da GE diz que a falta de clareza do governo brasileiro emperra a produtividade, dificultando os negócios, mas acha que vale a pena ficar e esperar por tempos melhores. MALU GASPAR Foram interessantes, no conceito chinês, ou seja, duros, os treze anos do americano Jeffrey Robert Immelt, 58 anos, à frente da sétima maior companhia do planeta, a General Electric (GE). Fazia apenas quatro dias que ele estava no cargo quando terroristas da Al Qaeda derrubaram as torres gêmeas do World Trade Center, em Nova York, em 11 de setembro de 2001. A crise financeira e econômica de 2008 quase custou o braço financeiro do grupo, salvo por Washington e por uma volumosa injeçà£o de recursos da própria GE. O Brasil, sua aposta mais recente, emperrou sob as contradições do dilmismo na economia. Mas ele tem fé em que as coisas melhorem por aqui. Fundada em 1878 pelo inventor da lâmpada, Thomas Edison, a GE é hoje uma empresa que fatura 150 bilhões de dólares por ano fabricando desde geladeiras e fornos de micro-ondas até turbinas de jatos comerciais, locomotivas e usinas nucleares. Em visita ao Brasil, o terceiro maior mercado da GE depois dos Estados Unidos e da China, Immelt falou a VEJA. Quando o senhor visitou o Brasil pela primeira vez, em 2011, previam-se alto crescimento econômico e um afluxo de investimentos, que não se confirmaram. O Brasil frustrou suas expectativas? Estou nesse negócio há tanto tempo que raramente me surpreendo ou me frustro com momentos de volatilidade. O Brasil certamente enfrenta muitos desafios, mas continua sendo uma boa oportunidade. É um país que precisa de tudo: eletricidade, aviação, locomotivas, petrà³leo, infraestrutura. Para nós, vale a pena esperar esse ciclo de baixa passar e permanecer aqui, mesmo crescendo menos do que esperávamos. E, se alguém desistir, tomamos o seu lugar. Sabe por quê? Porque é justamente nas dificuldades que os bons negócios se forjam. O senhor gosta de atuar nas crises? Não é bem isso. Na verdade, gostaria que as coisas fossem mais simples, que eu fosse o rei do mundo e fizesse tudo acontecer do meu jeito. Seria ótimo se pudesse dizer a cada primeiro-ministro ou presidente como agir e eles me respondessem: "Oh, Jeff, essa é uma grande ideia, vamos fazer exatamente como você sugere!". Só que não é assim que funciona. Acho, por exemplo, que a economia brasileira deveria e poderia estar crescendo pelo menos 5% ao ano, mas não está. Que medidas o senhor tomaria para chegar a esse crescimento? Daria mais clareza ao cenário econômico. Se as políticas governamentais fossem mais transparentes e previsíveis, haveria no Brasil muito mais investimentos de longo prazo, em infraestrutura, o que traria ao país mais produtividade e crescimento. O Brasil não é nem de longe tão produtivo quanto poderia ser. Ajudaria muito se os acordos entre governo e empresários fossem mais simples. Veja o setor de energia. É preciso ter coerência na política de subsídios para que empresas e consumidores saibam quanto pagarão pela eletricidade. O senhor discutiu isso com a presidente Dilma? Estive com ela há seis meses, e, claro, discutimos isso. O que ela disse? C oncordamos sobre o diagnóstico. Agora falta fazer. A Petrobras, seu principal cliente no Brasil, exige 65% de conteúdo nacional de seus fornecedores. O senhor considera essa exigência um grande problema? Se eu estivesse no comando da Petrobras, não abriria mão do conteúdo nacional. O que o Brasil pede não é inédito, e existem regras semelhantes em diversos países. A princípio, não há nada de errado nisso, desde que o restante da economia seja produtivo e compense a elevação dos custos adicionais de atender à exigência de conteúdo nacional. Aí é que está o problema do Brasil, pois os custos de eletricidade aqui são altos e os portos, de difícil acesso. Se tudo funcionasse bem, o conteúdo nacional não seria um peso excessivo. O senhor adquiriu traquejo para lidar com a classe política? Em 2011, fiz parte de um conselho criado pelo presidente Barack Obama para discutir a competitividade da economia, e ali ficou muito claro para mim quanto a política é diferente dos negócios. Foi interessante enxergar as coisas sob essa outra perspectiva, de dentro. Vejo duas atitudes típicas dos homens de negócios diante dos políticos. A primeira é mais impositiva, na linha: "Eis o que você deve fazer". A outra é mais construtiva: "Olhe o que eu faria se fosse você". A maioria dos empresários prefere a primeira opção. Eu fico com a segunda. A GE vem priorizando as vendas de produtos para infraestrutura e energia em detrimento do mercado doméstico e de crédito. Foi a crise de 2008 que precipitou essa virada? Sempre achei que esse fosse o melhor caminho. Óleo e gás, eletricidade, aviação e locomotivas são negócios com grande potencial de crescimento, em que estão as melhores oportunidades. Mas é verdade, sim, que a crise nos forçou a acelerar essa transià§ão. Ela fez minguar a importância do braço financeiro na GE. E, francamente, acredito que esse baque foi a melhor coisa que nos aconteceu. A crise o pegou de surpresa? Todos ficamos espantados com sua rapidez e severidade. Era até possà­vel ver uma recessão chegando, mas, quando os mercados encolheram fortemente, o choque foi generalizado. Felizmente, tínhamos ativos sà³lidos na parte industrial e conseguimos injetar cerca de 40 bilhões de dólares e salvar a GE Capital, o braço financeiro do grupo. Do ponto de vista pessoal, como foi aquele momento? Tenho muitos amigos brasileiros que hoje são CEOs. Eles contam que se tornaram executivos melhores nos anos 90, depois de sobreviver à hiperinflação e suas consequências. As crises ensinam a perceber melhor os riscos. No caso da GE, a crise também nos ajudou a tomar grandes decisões, como a compra da Alstom (multinacional francesa de energia e transporte) e o aumento de investimentos em pesquisa e desenvolvimento. A crise nos fez mais ousados. A GE comprou a Alstom quando a empresa já estava sendo investigada por corrupção. Não via isso como um problema? Não. Já compramos outras companhias que foram alvo de investigação parecida. Ficamos à vontade para fazer esse tipo de aquisição porque sabemos conduzir as coisas direito. Assim como naqueles casos, o que quer que tenha acontecido na Alstom será apurado e solucionado. O risco de investir em países emergentes é muito maior mesmo do que em mercados mais estáveis? Não considero maior, só diferente. Lembre-se de que a crise financeira começou em Wall Street, não no Rio de Janeiro. Daí termos ficado mais dispostos a investir em países como o Brasil. É nos emergentes que estão as maiores oportunidades. Então, por que ficar seguro e confortável em Connecticut (sede da GE), se não há negócios a fazer por lá? A complexidade e o desafio dos mercados emergentes nos dão vantagens competitivas relevantes em relaà§ão às empresas menores. Temos fôlego para atravessar os altos e baixos dessas economias. A GE está expandindo seu braço de óleo e gás em um momento em que os preços estão em queda. Como essa nova realidade afetará os negócios? A indústria de óleo e gás é interessante. Qualquer projeto leva de cinco a sete anos para concretizar-se. Ainda assim, olhamos para o preço do petróleo todo dia, imaginando qual será no dia seguinte. Nestes últimos tempos, com a economia europeia estagnada, os estoques superam o consumo e a Opep, organização dos maiores produtores, atravessa um momento crítico. Tudo isso abala o mercado. Mas acredito que, quando mais de 1 bilhão de pessoas ao redor do mundo entrarem na classe média e começarem a dirigir seu carro, a demanda por petróleo e derivados voltará a crescer, e o preço vai subir. Se o barril continuar na faixa de 80 ou 90 dólares, a grande maioria dos projetos ainda será economicamente viável. O senhor acredita que o fenômeno americano do óleo e do gás de xisto seja sustentável? Sem dúvida. Na verdade, se juntarmos Estados Unidos, Canadá e México, veremos que eles podem, em breve, formar uma região energeticamente autossuficiente. Isso muda de forma radical o jogo global, que é hoje muito diferente de quando eu estava começando. Se me dissessem naquele tempo que, mesmo com turbulências simultâneas na Rússia, na Venezuela e no Oriente Médio, os preços estariam em queda, eu não acreditaria. Foi o crescimento da produção americana que causou a reviravolta e derrubou os preços. A GE investe muito e há bastante tempo em energias renováveis, mas elas não estão avançando tão rapidamente como se esperava. Quando acha que terão um espaço significativo? Fontes de energia como a eólica e a solar continuam crescendo, mas ainda são extremamente dependentes de subsídios governamentais. Aos poucos, os preços vão caindo a patamares mais competitivos. Desde que entramos no ramo de energia eólica, há uma década, o custo do quilowatt-hora passou de 31 centavos de dólar para 4 centavos. O que falta mesmo são formas eficientes e baratas de armazenar a energia. Ninguém será realmente grande nesse negócio sem resolver tal questão. Quanto tempo o senhor acha que levará até isso acontecer? Vai depender do ritmo de desenvolvimento dos carros elétricos. Se a Tesla e outras fabricantes avançarem rapidamente, o custo das baterias deverá diminuir. Quando as soluções digitais que mudaram radicalmente para melhor diversos setores industriais começarão a fazer diferença na vida das pessoas? Isso já está ocorrendo. Está se valendo dessa revolução quem pega um avião que utiliza um software para poupar alguns minutos de viagem ou faz um exame radiológico em um laboratório que armazena as imagens na nuvem. Todo avanço só faz sentido quando beneficia o consumidor. Nossa meta agora é criar redes sociais que unam diversas indústrias e nas quais elas possam trocar informações e aumentar a eficiência. Tudo isso terá impacto sobre o consumidor final. A GE enfrenta competição forte nessa área? Nosso diferencial vem do fato de que conhecemos melhor os equipamentos do que os outros. O mercado de software pode estar dominado, mas são poucos os que, como nós, sabem aplicá-lo aos equipamentos. Há mais tecnologia em uma máquina do que em um software. E nós entendemos mais de máquinas do que os concorrentes. O senhor previu que a mão de obra terá peso cada vez menor no custo dos produtos. Isso foi entendido como uma previsão de que empresas americanas na China voltariam a fabricar seus produtos nos Estados Unidos. Faz sentido? Faz todo o sentido. Quando há um alto grau de tecnologia e inovação envolvido, é possível, sim, ser competitivo fora da China. Hoje, produzimos muito nos Estados Unidos — e funciona. Um dos segredos para achar um bom lugar para investir é despir-se de preconceitos geográficos e encontrar maneiras de baixar os custos de produção. O Brasil pode muito bem um dia entrar na rota da competitividade. Sua ideia de limitar o mandato do próximo CEO da GE a quinze anos levou à especulação de que, há treze anos no cargo, o senhor estaria vislumbrando a aposentadoria. É verdade? Faz parte da cultura da GE os CEOs se manterem no posto por um longo perà­odo, para que sejam capazes de realizar mudanças significativas. Embora não tenha data para sair, estou o tempo todo preparando a minha sucessão. Sei bem que, se não tiver um bom desempenho, poderei ser demitido. Essa ideia funciona como um motor para mim e os outros. Todo mundo tem de provar sua competência todos os dias — e sou eu quem mais precisa mostrar serviço. A GE investiu 300 milhões de dólares em Eike Batista, a quem o senhor já considerou um dos maiores empreendedores do mundo. Foi um erro? Só posso desejar ao Eike toda a sorte do mundo. 1#4 MAÍLSON DA NÓBREGA – BOLSA FAMÍLIA: VOTO RACIONAL, E NÃO DE CABRESTO Entre as barbaridades ditas na última eleição, duas tiveram a ver com o Bolsa Família. O PT reivindicou a paternidade do programa. Eleitores da oposição atribuíram a vitória de Dilma aos seus beneficiários, tidos como de cabresto. Nada disso é verdade. O PT não pariu o Bolsa Família. Unificou programas herdados do governo anterior e criou o título. A ideia tampouco nasceu com FHC, cujo mérito foi adotá-la no governo federal depois de Campinas e Brasília. O PT cuidou de ampliar o programa, o que seria natural dada a natureza gradual de sua implementação. Diz-se que o Bolsa Família é assistencialista, mas, em àºltima análise, trata-se de um investimento em educação. A ideia surgiu de avanços da neurociência e de estudos de pesquisadores como o professor José Márcio Camargo, da PUC-Rio, autor de artigo que estimulou Lula a apoiar a proposta e a abandonar o mal concebido Fome Zero. O Banco Mundial, entusiasta do projeto, ajudou a disseminá-lo via publicações e operações de empréstimo. Nações ricas e emergentes o adotaram. A neurociência evidenciou o período crítico para a aquisição das habilidades de linguagem e aprendizado de uma pessoa, que vai até os 12 anos de idade. Nesse tempo, ocorrem sinapses dos neurônios que permitem ao indivíduo aprender e se preparar para continuar aprendendo. Se ele não for à escola nesse período, dificilmente conseguirá qualificar-se para disputar postos de trabalho. Como mostrou José Márcio, famílias pobres costumam depender do trabalho dos filhos para melhorar sua renda. As crianças nà£o estudam e, assim chefiarão famílias pobres no futuro. A alternativa seria "pagar" aos pais para retirar as crianças do trabalho, desde que as colocassem na escola. O benefício é, portanto, uma aposta na segunda geração dessas famílias, criando estímulos para que as crianças estudem. Trata-se, como falei, de um investimento em educação. O principal desafio é controlar a frequàªncia à escola e, também, à vacinação. Dois outros são prover educação de qualidade e adotar mecanismos contra fraudes. A saída do programa não são os empregos, como se diz, pois os pais dificilmente podem ocupá-los. O Bolsa Família não é voto de cabresto. Esse tempo passou, felizmente. Lá atrás, os coronéis abusavam de seu poder econômico e do controle do poder político para aliciar ou comprar votos. Eles eram intermediários entre o Estado e os eleitores pobres. O programa os aposentou dessa função. O eleitor mira seus interesses quando vota. Estudos indicam que o pobre não se influencia necessariamente pelos poderosos. Ele é o "ignorante racional", termo criado pelo economista americano Anthony Downs, conforme muito bem explicado pelo cientista político Marcus André Melo em entrevista às Páginas Amarelas de VEJA (15/10/2014). Por meio do voto, esse eleitor "tenta antes de mais nada maximizar seu bem-estar. Seu voto é coerente e racional", assinalou Melo. Nasci e vivi em uma cidade pobre da Paraíba, cuja populaçà£o em grande parte hoje se beneficia do Bolsa Família. Terminado o período em que a cana-de-açúcar oferecia emprego, muitas famílias passavam a enfrentar a angústia da insegurança alimentar. Elas não sabiam se poderiam comer no dia seguinte. O programa lhes deu a certeza do amanhã. Mas, como não têm educaçà£o para avaliar riscos, imaginam que um novo governo pode cancelar o programa. Por isso, votam racionalmente no candidato oficial, quem quer que seja. Essas famílias votaram antes em FHC. Espertamente, Lula convenceu que ele e o PT, e não a sociedade e o Estado, são a origem do benefício. O passo seguinte foi a vergonhosa propaganda do medo, afirmando que a oposição, se vencesse, acabaria com o programa. Foi caso pensado para aterrorizar pobres indefesos e explorar seu imaginário. O Bolsa Família não teve papel decisivo na reeleiçà£o de Dilma. Os votos do programa são estimados em torno de 27 milhões, ou cerca da metade dos que sufragaram o nome dela nas urnas. Mesmo que fossem votos de cabresto, o PT precisaria dobrar o programa para vencer só com eles. Impossível. Em suma, o PT não é dono do Bolsa Família, nem os beneficiários do programa têm votos para eleger presidente da Repàºblica. MAÍLSON DA NOBREÇA é economista 1#5 LEITOR A PRISÃO DOS BILIONÁRIOS Que satisfação abrir VEJA no tablet, no sábado (15) pela manhã, logo cedo, e constatar que as novidades sobre a Operação Lava-Jato — assunto que dominou o noticiário na sexta-feira (14) — já estavam disponíveis para os seus leitores na edição 2400 ("O golpe no clube do bilhão", 19 de novembro). E com uma capa alternativa: "A prisão dos bilionários". Quanta eficiência! Parabéns a toda a equipe de VEJA! ROBERTO ADOLPHO DA SILVA FILHO Salvador (BA), via tablet Petro-lama-bras! Com certeza, não foi surpresa para o cidadão à©tico e moral a divulgação na revista VEJA do envolvimento de oito das maiores empreiteiras do Brasil no escândalo da Petrobras. Somente os "cumpanheiros" é que "não sabem de nada". ADONIRO PRIETO MATHIAS Londrina, PR No início da Petrobras, o slogan era "O petróleo é nosso". Agora, com a sujeira exposta, tal qual o petróleo nas mãos de Lula e Dilma Rousseff, o slogan poderia mudar para: "A Petrobras é nossa!". E as mãos limpas, cobradas de todos os envolvidos: diretores da estatal e executivos presos e partidos políticos. ANTÔNIO RIBEIRO Curitiba, PR Uma vez condenados, os empresários podem ser classificados como corruptos e submetidos às penas da lei, mas corruptores são os mandantes, funcionários e laranjas que os chantageiam em troca de milhões em propinas. PAULO HENRIQUE WEDDERHOFF Curitiba, PR Que país é este? Que nação é esta onde não se vê limite para a falta de moral de homens públicos, catapultada pela postura igualmente imoral de empresários, ambos os lados em sua ânsia de abusar do patrimônio público em benefício próprio? Como explicar o que está acontecendo com o Brasil à minha filha de 11 anos e, ainda pior, que país a aguarda no futuro? VIRGÍNIA PINTO Caxias do Sul, RS Os brasileiros se sentiram enlameados com o mais fétido e purulento petróleo bruto extraído aos borbotões dos poços da corrupção pelas sondas das delações premiadas. Na prática, nos próximos trinta anos nada será resolvido, porque o monstro processual terá tantos recursos e travas políticas que a modorrenta Justiça vai sufocar as esperanças da sociedade brasileira. LAUDÍ VEDANA Pato Branco, PR No dia em que os corruptos e corruptores, quando pilhados comprovadamente em suas negociatas de assalto aos cofres públicos, alegarem que sabiam e/ou participaram dos eventos denunciados, e assumirem sua culpa, o papa vai beatificar Ali Babá, seus ladrões e Judas. Afinal, não se escrevem as palavras "corruptos" e "corruptores" sem as letras "pt" juntas. Como dizia um ex-presidente brasileiro, "nunca antes na história deste país...". ALMIR JOSÉ POUTO Salvador, BA DUAS CAPAS, UMA REVISTA Na semana passada, a edição 2400 de VEJA (19 de novembro) circulou com capas diferentes e conteúdo interno absolutamente idêntico nas duas versões, a de assinantes e a de bancas. Alguns leitores escreveram para a revista pedindo mais detalhes em torno da engenharia gráfica. A explicação é simples. A capa "A Rosetta e o mistà©rio da água" já estava impressa, na sexta-feira (14) pela manhã, quando a Polícia Federal começou a prender altos executivos de empreiteiras e o homem forte do PT na Petrobras, dentro da Operaà§ão Lava-Jato. Como os dois temas são relevantes, cada um a seu modo, e "A prisão dos bilionários" teve repercussão histà³rica, VEJA decidiu oferecer aos leitores os dois caminhos — ambos com um único objetivo, dar ao leitor notícia nova, confiável e de relevância. JOÃO DIONISIO AMOEDO Senti uma lufada de ar fresco ao ler a entrevista com o engenheiro e administrador carioca João Dionisio Amoedo, fundador e presidente do Partido Novo ("Ao povo o que é do povo", 19 de novembro). Como pequeno empreendedor (mas podem me chamar de "mico-empresário" ou de "próprio otário"), não estou suportando mais o peso deste Estado corrupto, assistencialista e populista. ALBERTO SEMER São Paulo, SP O surgimento do Partido Novo é um alento, uma luz no fim do túnel para os brasileiros que ainda têm esperança de ver os recursos públicos aplicados com decência e eficiência. EDUARDO LEDOUX GAVA Joinville, SC Excelente a entrevista com João Dionisio sobre o Partido Novo. De longe a melhor oportunidade para reunirmos pessoas que ainda sonham com um Brasil mais justo. Surgirão incautos, companheiros e militantes para desvirtuar o movimento. Ainda assim, esse time deve ganhar proporções relevantes, pois no Brasil, embora pareça o contrário, temos muita gente honesta e empreendedora. Por qual motivo nos omitirmos numa real oportunidade de tornarmos este um país admirado? ELISON BERNARDES DO AMARAL Goiânia, GO Vamos aderir à utopia e transformá-la em realidade. Com Estado menor, educação maior, redução da impunidade, junto à  nossa ótima criatividade, com certeza teremos de verdade um duradouro crescimento sustentável. Sou administrador e pretendo me filiar. Parabéns pela iniciativa e coragem. ADEMAR GONÇALVES Brasília (DF), via tablet O Partido Novo já conta com minha simpatia e engajamento para tal. Seu presidente nos dá uma ideia simples de como deve agir realmente um estadista que se propõe a dirigir uma nação. Há pouco tempo, durante os debates presidenciais, eu me perguntava: como pode um governo se vangloriar tanto de ter aumentado o número de beneficiados pelo Bolsa Família? Afinal, em doze anos de administração do PT, será que tudo aquilo que ele propagava não serviu para "amenizar" o porcentual de "bolsistas"? E como torci para que qualquer candidato fizesse essa pergunta durante os debates. O senhor João Dionisio Amoedo, tenho certeza, contabilizará em sua proposta inúmeros seguidores, que já não suportam mais ver o Brasil sendo dilapidado por sucessivos erros de administrações que se especializaram em deter o "poder pelo poder". GABRIEL SELE MANCILHA RANGEL Caxambu, MG Brasil: um país viciado em corrupção. RICARDO C. SIQUEIRA Niterói, RJ CARTA AO LEITOR A manobra do governo federal de querer alterar a Lei de Diretrizes Orçamentarias (LDO) para maquiar os resultados das contas de 2014 é desastrosa para a confiança nas instituições ("Os limites do malabarismo", Carta ao Leitor, 19 de novembro). É uma simbologia de mau exemplo que pode desencadear o perigo de ser adotado pelos entes federativos, estados e municípios, e, ainda, pelas empresas, com riscos danosos para o conceito das instituições, nas quais tudo é possível no país que banaliza a legalidade e institucionaliza a ilegalidade. O povo deve acompanhar pari passu o movimento dos congressistas que apoiam essa falcatrua e riscar o nome deles do rol dos que querem construir um Brasil focado na legalidade, na ética e no respeito aos princípios institucionais. CLÉBER MAFRA Salvador (BA), via tablet LYA LUFT Concordo com a abordagem da escritora Lya Luft sobre o livro As Crianças Mais Inteligentes do Mundo ("A nau avariada", 19 de novembro), em que se mostra que os países com maior nota no sistema mundial de avaliaà§ão da educação são aqueles onde o professor tem uma formação extremamente cobradora, e com isso adquire o respeito da população e a possibilidade de educar com rigor seus alunos. Não com abusos, mas com o rigor necessário a qualquer sistema de educação. Não se educa bem sendo sempre bonzinho e condescendente. O que mais nos falta no Brasil é educação, seja domà©stica, seja formal, justamente devido à nossa cultura de permissividade. Nosso governo é o primeiro a desrespeitar professores, aviltando salários e desautorizando a cobrança rigorosa por resultados. CYNTHIA SIMON CALADO Recife (PE), via tablel J.R. GUZZO E VEJA Além de "tarada", "desviada", "golpista" etc. etc. etc., sou alucinada quando VEJA não chega logo aos sábados à minha casa. Uma página da revista lida com seriedade pode levar à reflexão e mudar o mundo. Parabéns pela belíssima crônica "Caros leitores" (19 de novembro), de J.R. Guzzo. BIA FARNEZI Por e-mail Nunca me senti tão orgulhoso de ser leitor e assinante de VEJA como ao ler o brilhante artigo de J.R. Guzzo que destaca a importância dos leitores para a construção, o crescimento e a sobrevivência de um órgão de imprensa livre. Aquela gritante capa vermelha da edição 1 de VEJA (11/9/1968), com a estampa de uma foice e um martelo, chamou a imediata atenção de minha mente juvenil, que mal despertava para a realidade do que se passava com a nação onde nasci e me criei. Ler VEJA tem sido um verdadeiro raro prazer. De modo especial, é motivo de enorme satisfação ser leitor e assinante de VEJA nestes tempos preocupantes de nefasta hegemonia do PT na política nacional. VEJA é o grande baluarte da defesa da democracia e da liberdade neste país. O sucesso e a influência de VEJA, que atrai a fidelidade de seus leitores, estão diretamente ligados à sua excelente linha editorial e à magnífica equipe de jornalistas, que, muito além de cumprir sua função profissional, têm representado um papel essencial na defesa dos valores fundamentais de uma sociedade democrática, em total afinidade com seus leitores, o que faz com que esperemos ansiosamente por um novo exemplar, cuja leitura nos faz sentir que não estamos sós nessa árdua luta pela preservação da identidade democrática da sociedade brasileira, que deseja ser livre e, mais do que nunca, banir para sempre a ameaça representada por aquele estranho símbolo estampado, como um alerta profético, na capa do primeiro número da revista. Agradeço a todos vocês pela coragem e determinação com que vêm defendendo os mais altos interesses da nação contra uma grave ameaça: a perda da liberdade, pela qual deram a vida Tiradentes e tantos outros legítimos heróis nacionais. RUBENS MÁRIO MAZZINI RODRIGUES Porto Alegre, RS Qualquer agressão à revista VEJA atenta contra a lucidez que resta neste nosso Brasil. Quando um assunto desperta muita polêmica, a próxima edição de VEJA traz a transparência, a consistàªncia e a isenção que me poupam de ouvir pessoas que simplesmente opinam, inconsequentemente, apenas por ser consultadas e claramente desconhecem os fatos. Parabéns pelo artigo e pela revista VEJA. GASTÃO LUIZ OPPERMANN João Pessoa (PB), via tablet Se criticam a revista VEJA e seus leitores é porque são leitores. Não podem criticar sem conhecer, a cada semana, os assuntos abordados. Conclusão: o PT, a presidente Dilma, Lula e seus apaniguados lêem VEJA, somando-se a seu grande público leitor. CELSO POLETTO Gurupi, TO ESPECIAL TERRA A gigantesca reportagem "Um grande passo para a humanidade" (Especial Terra, 19 de novembro) é para ser arquivada para netos e bisnetos. VEJA se supera periodicamente com espetaculares notícias de grande interesse para os leitores. Eu, particularmente, li o especial vagarosamente, assimilando cada trecho em detalhes. Colocar o robô Philae em cima do cometa Chury, a mais de 500 milhões de quilômetros de distância do planeta Terra, e enviar fotos e mensagens na velocidade da luz para os terráqueos parece ficção científica. O homem cada vez mais supera suas limitações caminhando para comportamentos fora da imaginação. JOAQUIM P. MARTINS João Pessoa, PB Concisa, completa, didática e esclarecedora a reportagem especial sobre a missão Rosetta e o mistério da água na Terra. E com um alerta altamente preocupante sobre o futuro que estamos preparando para nossos filhos e netos. JOSÉ ANTONIO SOLER Itu, SP LIGIA KOGOS Na entrevista com a dermatologista Ligia Kogos ("Eterna enquanto dure", 12 de novembro) houve, por diversas vezes, a citação do produto Botox, um medicamento biológico cujo princípio ativo é a toxina botulínica, comercializado exclusivamente sob prescrição médica. Em nenhum trecho da entrevista foi transmitida a informação de que existem outras toxinas botulínicas no mercado, comercializadas por diferentes laboratórios e com outras marcas/nomes comerciais. Um leitor que seja desconhecedor do assunto tratado pode, de forma equivocada, interpretar que o produto referido na entrevista é o único no mercado a ser aplicado para conseguir determinado resultado. JOSÉ ROBERTO CORRÊA TEIXEIRA FERRAZ E JOCHEN NORBERT BOHNER Galderma Brasil Ltda. São Paulo, SP PARA SE CORRESPONDER COM A REDAÇÃO DE VEJA: as cartas para VEJA devem trazer a assinatura, o endereço, o número da cédula de identidade e o telefone do autor. Enviar para: Diretor de Redação, VEJA - Caixa Postal 11079 - CEP 05422-970 - São Paulo - SP: Fax: (11) 3037-5638; e-mail: veja@abril.com.br. Por motivos de espaço ou clareza, as cartas poderão ser publicadas resumidamente. Só poderà£o ser publicadas na edição imediatamente seguinte as cartas que chegarem à redação até 3 quarta-feira de cada semana. 1#6 BLOGOSFERA EDITADO POR KÁTIA PERIN kperin@abril.com.br DE NOVA YORK CAIO BLINDER JUDAÍSMO Atacar um templo é assaltar o endereço de uma religião, sua identidade. Como a mesquita no caso dos muçulmanos, a sinagoga é o coração de qualquer comunidade judaica. Assim, o atentado terrorista de terça-feira em uma sinagoga de Jerusalém, no qual morreram cinco pessoas, entre elas quatro rabinos, é um atentado contra o judaísmo. www.veja.com/denovayork VEJA MERCADOS GERALDO SAMOR PETROBRAS No fim de sua vida, o jornalista Paulo Francis foi atormentado por um processo judicial. Francis havia dito no programa Manhattan Connection que "os diretores da Petrobras todos têm conta na Suíça". O então presidente da Petrobras, Joel Rennó, processou-o. De lá para cá, a corrupção na Petrobras passou de endêmica a epidêmica, mas a empresa continua vivendo das boas graças do contribuinte brasileiro enquanto é usada para servir a interesses políticos e particulares. www.veja.com/vejamercados NOVA TEMPORADA FERNANDA FURQUIM SÉRIE DE TV Sessão de Terapia, do GNT, não será renovada para sua quarta temporada. Segundo o canal, o diretor Selton Mello está se dedicando a outros projetos e ficou sem agenda para as gravações da série. www.veja.com.br/temporada CIDADES SEM FRONTEIRAS CUSTO DE VIDA O que é mais caro, morar em Dubai ou em Londres? E entre Rio de Janeiro e Miami, onde se gasta mais? E qual é a metrópole mais dispendiosa do mundo? Com cada vez mais pessoas estudando e trabalhando no exterior, faltava uma ferramenta que as informasse sobre o custo de vida que as aguardava no local de destino. Assim, em 2009, o engenheiro de software Gerardo Robledillo criou o Expatistan, uma plataforma colaborativa que coleta preços variados ao redor do globo. A partir de uma cesta de produtos que serve como base e de índices de preços ao consumidor, o site calcula uma média de gastos de acordo com a cidade referida. As faixas de valor são refinadas pelos próprios usuários do site, convidados a relatar o custo de produtos e serviços no lugar onde moram. Há seis grupos de despesa: alimentação, moradia, vestuário, transporte, saúde e entretenimento. Quanto mais informaçàµes houver sobre os preços de uma mesma cidade, mais acurados serà£o os dados sobre ela. www.veja.com/cidadessemfronteiras SOBRE PALABRAS BONITO E BONZINHO A palavra bonito veio do termo latino bonus, ou seja, bom. Desembarcou no português no século XVI, provavelmente depois de ir buscar o sufixo diminutivo ito no espanhol. O bonito é, na origem, bonzinho. A ligação entre bondade e beleza não é um sentido contrabandeado por séculos de história: desde o início, no latim, uma das acepções de bonus era — além das de "bom, virtuoso, útil, legítimo, corajoso e nobre" — a de "belo, formoso, gentil, elegante". E a própria palavra bellus, que deu em nosso belo, é uma contração de benulus, diminutivo de bonus. Mais uma vez, bonzinho. A chamada ditadura estética pode ser realmente odiosa, mas quem estiver disposto a derrubá-la deverá apontar suas armas para muito além dos estereótipos veiculados pela cultura de massa. A sinestesia bonito/bom — que no verso, claro, é a sinestesia feio/mau — tem raízes culturais profundas. SOBRE IMAGENS ELIOT ELISOFON O americano Eliot Elisofon (1911-1973) trabalhou como fotojornalista da Life entre 1942 e 1964, mas sua história na fotografia é bem maior. Em 1936, ele foi um dos fundadores da Photo League, cooperativa de fotà³grafos em Nova York que contou com nomes como Beaumont Newhall, Richard Avedon e Robert Frank. Nos anos 50 e 60, Elisofon prestou consultoria para filmes de Hollywood e ensinou em várias instituições, como o MoMA e a Universidade Yale. Além disso, a relação de Elisofon com a África resultou num acervo com mais de 80.000 fotografias que fazem parte do Eliot Elisofon Photographic Archives no Museu Nacional de Arte Africana, em Washington. www.com/sobreimens • Esta página é editada a partir dos textos publicados por blogueiros e colunistas de VEJA.com ____________________________________ 2# PANORAMA 26.11.14 2#1 IMAGEM DA SEMANA – A MALDIÇÃO DO TEMPLO 2#2 DATAS 2#3 CONVERSA COM LUCIANA TAMBURINI – A MULHER QUE NÃO PERDEU O JUÍZO 2#4 NÚMEROS 2#5 SOBEDESCE 2#6 RADAR 2#7 VEJA ESSA 2#1 IMAGEM DA SEMANA – A MALDIÇÃO DO TEMPLO Em clima de incitação religiosa, a morte de quatro rabinos estremece a cidade santa. Filactérios, a palavra de origem grega para tefilins, são as tiras de couro que judeus religiosos usam enroladas nos braços e na cabeça para segurar caixinhas que contêm trechos do Antigo Testamento em que o exigente Deus de Israel demanda obediência. "E estas palavras que hoje te ordeno estarão no teu coração", diz o trecho do Deuteronômio. “Também as atarás por sinal na tua mão e te serão por frontais entre os olhos." Ver os filactérios ensanguentados de um dos quatro rabinos assassinados numa sinagoga de Jerusalém foi uma das mais chocantes imagens do atentado da semana passada, pelo simbolismo que carrega. Os religiosos ultraortodoxos foram atacados a facadas, machadadas e tiros por dois primos palestinos — também foi morto um policial de trânsito druso, uma minoria árabe que tem status especial em Israel, que correu para socorrer as vítimas. Numa ironia do tipo que é tão frequente na região, o primeiro-ministro de Israel, o líder da Autoridade Palestina e o rei da Jordânia haviam acabado de fazer um acordo para acalmar os ânimos exaltados pelos incidentes na Esplanada das Mesquitas, uma veia pulsante de tensão no topo da terra santa de Jerusalém, onde muçulmanos vão rezar e eventualmente apedrejar os policiais israelenses que controlam tudo. Num desses confrontos, policiais chegaram ao umbral da magnà­fica mesquita de Al-Aqsa, num ato propagado como profanação insuportável e com potencial para desencadear uma terceira rebelião palestina. Uma minoria de judeus religiosos também exige fazer preces no mesmo lugar, onde no passado existiram os dois templos judaicos — chegam a fingir que falam no celular para disfarçar. A maioria dos rabinos é contra, por motivos ritualísticos: sem querer, os judeus podem pisar onde outrora ficava o Santo dos Santos, o recinto recôndito do templo onde só o sumo sacerdote podia entrar, uma vez por ano. Ai de ti. Jerusalém. VILMA GRYZINSKI 2#2 DATAS • MORRERAM Samuel Klein, empresário polonês naturalizado brasileiro, fundador das Casas Bahia. Nascido em Lublin, numa família judia de poucas posses — o que o levou a cursar apenas até a 4ª série —, foi mandado aos 19 anos, com o pai, para o campo de concentraà§ão de Maidanek, de onde escapou em 1944. Vendendo bebidas e cigarros às tropas aliadas, conseguiu juntar algum dinheiro e, em 1951, viajou com a mulher, Ana, e o filho Michael para a América do Sul. Desembarcou no Rio, tentou a vida na Bolívia e por fim se estabeleceu em Sà£o Paulo. Comprou uma charrete e começou a vender toalhas e cobertores de porta em porta, em São Caetano do Sul. Em 1957, adquiriu a primeira loja e a batizou de Casa Bahia, em homenagem a seus clientes nordestinos, apelidados de "baianos", que migravam para o ABC em busca de emprego na indústria automotiva. Especializado no comércio varejista popular, o negócio apostou no crediário e se expandiu a ponto de se tornar um dos líderes de seu segmento. Dia 20, aos 91 anos, de insuficiàªncia respiratória, em São Paulo. Mike Nichols, cineasta alemão, consagrado nos EUA, onde vivia, por filmes como A Primeira Noite de um Homem (1967), estrelado por Dustin Hoffman e Anne Bancroft. Foi um dos diretores mais premiados de sua geraçà£o. Além do Oscar por A Primeira Noite..., conquistou nove Tony, quatro Emmy e um Grammy. Sua primeira experiência atrás das câmeras aconteceu em 1966, numa adaptação da peça Quem Tem Medo de Virgínia Woolf?, de Edward Albee, com Richard Burton e Elizabeth Taylor. O longa recebeu treze indicações ao Oscar (venceu em cinco). Berlinense, Mikhail Igor Peschkowsky — esse era o seu verdadeiro nome — chegou aos EUA em 1938. Dirigiu, entre outros, Morgan Freeman, Meryl Streep, Robert Redford e Julia Roberts (uma das protagonistas do intrigante Closer, de 2004). Dia 19, aos 83 anos, em Nova York. Alexander Grothendieck, matemático alemão naturalizado francàªs, um dos maiores especialistas em geometria algébrica. Áreas distintas como robótica e genética foram impactadas por seu trabalho. Nascido em Berlim e radicado na França, lecionou na USP em meados da década de 50. Ao regressar, empregou-se no Instituto de Altos Estudos Científicos (IHES), que abandonaria nos anos 1970 ao saber que a entidade era financiada pelo Ministério da Defesa. Em 1966, ele se recusara a ir até Moscou para receber a Medalha Fields, em protesto contra a prisão de autores russos. Nas últimas décadas, vivia como um eremita. Dia 13, aos 86 anos, em Ariège. María del Rosário Cayetana Fitz-James Stuart y de Silva, a duquesa de Alba, a aristocrata com mais títulos de nobreza no mundo. Madrilena, era conhecida pelo cabelo branco armado, pelas plásticas e pelo comportamento excêntrico — seu terceiro marido era quase 25 anos mais jovem. Recebeu em sua residência personalidades como Audrey Hepburn e Jackie Kennedy. Detinha cinco títulos de duquesa, um de condessa-duquesa, dezoito de marquesa, dezoito de condessa e um de viscondessa. Dia 20, aos 88 anos, de complicações decorrentes de uma pneumonia, em Sevilha. • TER|18|11|2014 Encontrados os corpos da miss Honduras, Maria José Alvarado, e de sua irmã Sofia. Ambas tinham sido vistas pela última vez na quinta 13, quando saíram para o aniversário do namorado de Sofia, o primeiro suspeito do crime. Maria se preparava para o Miss Universo, em Londres. 2#3 CONVERSA COM LUCIANA TAMBURINI – A MULHER QUE NÃO PERDEU O JUÍZO A funcionária do Detran que foi condenada a pagar 5000 reais por danos morais a um juiz parado em blitz da Lei Seca agora estuda direito e se prepara para entrar para a Polícia Federal, "Quero ser delegada". Qual a lição de ética mais importante que você recebeu na vida? Meu pai é médico militar e seus superiores pediam a ele que assinasse laudos falsos. Ele se recusava, era ameaçado, mas mantinha suas convicções. Cresci com elas. Não há muita gente que diz "olhem o que os políticos fazem", para justificar deslizes de trânsito? Acontece sempre. Quando eu era agente de trânsito, ofereciam-me dinheiro a todo momento. Achavam que a Lei Seca era igual ao esquema de pagar a um policial e ser liberado, o que acontece bastante no Rio. Acha que as pessoas pararam de dirigir depois de beber por causa dessa lei? Acredito que sim. O Rio foi o estado que teve o menor índice de mortes no trânsito depois dela. Todas as vezes em que bebeu, pediu um táxi? Eu nem bebo. Não gosto de cerveja e raramente tomo vinho. Que tipo de motorista é o que mais tenta dar carteirada? Os advogados. Já chegam mostrando a carteirinha da OAB. Já paramos a Xuxa e alguns outros artistas que não fizeram isso. Quando aconteceu o incidente, o que mais a impressionou? O medo das pessoas que estavam comigo naquela hora. Meus colegas ficaram acuados. Mesmo que tenha sido empurrada para a posição de vítima de poderosos, sente, pelas reações que recebe, que é uma vencedora? Acho que sou vítima do Judiciário, não do juiz. Tem gente que desiste no meio do caminho, eu não. Nesse sentido sou vencedora, mas o beijinho no ombro posso mandar só no fim do processo. Já ouviu a piada: "O papa é argentino, mas Deus é um juiz carioca"? O tempo todo. A piada é engraçada, mas a realidade é vergonhosa. 2#4 NÚMEROS 11 vezes aumentou o número de indivíduos que se declaram pescadores no Brasil desde 2003, ano em que o governo afrouxou os critérios para o recebimento do "seguro-defeso", uma bolsa paga a esses profissionais durante o período de reprodução dos peixes. 796.800 pessoas receberão neste ano o benefício, de um salário mínimo mensal, pago durante quatro meses, em média. 2,4 bilhões de reais é o que o governo gastara neste ano com o seguro-defeso, dada a multiplicação de pescadores. Descontada a inflação, o valor representa quinze vezes o que era despendido onze anos atrás. 2#5 SOBEDESCE SOBE * "Salgante" - A Anvisa aprovou a comercialização de um novo tipo de sal de cozinha, com 0% de sódio. Juventude - Com a queda da mortalidade infantil, um quarto da população mundial tem hoje entre 10 e 24 anos de idade, segundo as Nações Unidas, um recorde desde o começo da série histórica, em 1969. * Emprego informal - O número de pessoas que trabalham por conta prà³pria aumentou 6% em outubro em relação ao mesmo período do ano passado: 256.000 a mais DESCE * Japão - Depois que o governo aumentou impostos sobre o consumo, a economia do país encolheu 1,6% no terceiro trimestre e voltou a entrar em recessão. * Desarmamento - Pela primeira vez desde o início da campanha para a entrega voluntária de armas, em 2003, o número de registros de novos artefatos superou o de devoluções. * Emprego formal - O número de empregados com carteira assinada diminuiu 30.000 no último mês, o pior resultado para outubro desde 1999. 2#6 RADAR LAURO JARDIM ljardim@abril.com.br • LAVA-JATO ALMA PENADA Deve-se evitar dizer o nome de Fernando Baiano perto de Valdir Raupp. O senador peemedebista chega a passar mal com a simples menção ao lobista, sabe-se lá por quê. O BARQUINHO VAI A propósito, Fernando Baiano é um feliz proprietário de uma superlancha de 54 pés, com a qual ele singra o mar azul de Angra dos Reis. Baiano a comprou de Otávio Azevedo, presidente da holding Andrade Gutierrez. TEIA DE RELAÇÕES De todos os presos pela PF, Léo Pinheiro, presidente da OAS, é o mais próximo a Lula. DE ORELHA BAIXA Durante anos e anos, os empreiteiros presos na Lava-Jato tinham prioridades indiscutíveis em sua vida. Por exemplo, negociar aditivos bilionà¡rios a obras públicas, especialmente na Petrobras. Na cadeia, suas prioridades mudaram radicalmente. Por exemplo, eles têm de economizar cotonete. Na prisão de Curitiba, cada um dos 23 executivos e empresà¡rios presos recebe uma cota de dois cotonetes para cada cinco dias de cadeia. ME PROTEJA Remexendo no material apreendido no tal "escritório da lavagem de dinheiro" que Alberto Youssef mantinha em São Paulo, os agentes da Polà­cia Federal encontraram algo curioso numa pasta plástica cheia de papéis. No verso de um documento com o número de uma conta no exterior, Youssef anotou os telefones do pai de santo Zé do Oxossi. Se o doleiro buscou proteção, não deve ter dado muito certo. DUQUE VERSUS PRC Um mês antes de ser preso, Renato Duque entrou com uma ação por calúnia e difamação contra Paulo Roberto Costa na Justiça do Rio de Janeiro. Duque se ofendera com o trecho da delaçà£o premiada de PRC em que ele confirmou a Sérgio Moro a participaà§ão do ex-diretor de serviços da Petrobras no esquema de corrupção na estatal. De acordo com Costa, o setor controlado por Duque destinava 3% dos contratos da área de abastecimento da estatal ao PT. No início de novembro, dias antes de ser preso, Duque viu a juíza Simone Frota decidir em favor do ex-colega. Segundo a juíza, seria necessário provar que a declaração de PRC é falsa. Duque, até agora, não recorreu. DEVOLVA, JÁ Sérgio Machado comandou por longos onze anos a Transpetro, da qual foi obrigado a pedir licença de 31 dias, tragado que foi pela Operação Lava-Jato. Ao sair, teve provas de quanto era "querido". Já no dia seguinte à licença, a diretoria de recursos humanos solicitou a imediata devolução do laptop e dos dois celulares que ele usava. Machado questionou a decisão. Mas, assim mesmo, foi obrigado a entregar os equipamentos. • GOVERNO O DESAFIO Um dos grandes quebra-cabeças na montagem do novo ministério à© onde Dilma Rousseff vai colocar Jaques Wagner. Seu nome é cogitado para uns seis ministérios pelo menos. • PARTIDOS CAMPANHA TUCANA A partir de 15 de dezembro, Aécio Neves lança uma campanha nacional para aumentar o número de filiados do PSDB. FUTURO EM JOGO 1 O processo decisório vacilante de Marina Silva paralisou a criação da Rede. Guilherme Leal, da Natura, e até a filha Mayara sà£o contra a criação do partido já. Acham que é preciso esperar o primeiro semestre de 2015, aguardar insatisfações em outras siglas e, aí sim, montar um partido com maior representatividade. FUTURO EM JOGO 2 Já a militância da Rede quer a criação do partido no primeiro bimestre do ano que vem. Marina não decidiu, mas deixou claro que não pretende submergir como depois da disputa presidencial de 2010. Isso inclui participar mais ativamente das eleições municipais daqui a dois anos. • ECONOMIA AGORA, VAI A venda da Portugal Telecom pela Oi sai mesmo nesta semana. SEM ÂNIMO Joaquim Levy e a nova equipe econômica terão, ninguém duvida, muito trabalho pela frente para mudar o humor dos empresários. Um exemplo: de acordo com uma pesquisa feita pela seguradora Zurich e pela GfK com 3800 pequenas e médias empresas de dezenove países, os brasileiros são os mais pessimistas em relação ao crescimento dos negócios em 2015. Do total de 200 altos executivos brasileiros entrevistados, 27,5% "não esperam nenhuma oportunidade para suas empresas". A média mundial é 18%. DESISTIU DO BRASIL A sueca Ikea, uma das maiores redes mundiais de móveis e decoração, com filiais em 42 países, desistiu, ao menos por enquanto, de abrir lojas no Brasil. FANTASMA DO EDEMAR Sob intervenção há dez longos anos, o Banco Santos segue dando dor de cabeça ao BC. Empresas processadas pela massa falida do banco contra-atacaram e processaram o BC com o argumento de que o órgà£o fiscalizador não cumpriu seu papel de impedir a sangria e as fraudes do Santos, antes de decretar a intervenção. E agora querem indenização do BC. • LIVROS CONVERSAS DIFÍCEIS A Amazon está renegociando todos os contratos para a venda de e-books com as editoras brasileiras. Têm sido conversas duras. A empresa de Jeff Bezos quer ter o direito de dar descontos maiores; as editoras dizem não. Hoje, a Amazon detém 40% desse mercado no Brasil e menos de 10% dos livros físicos vendidos de forma digital — um desempenho sofrível para seus padrões. MAGO DA URNA A Record lança em janeiro a biografia de João Santana — O Mago que Faz Presidentes, como reza o título —, escrita por Luiz Maklouf Carvalho. g • TELEVISÃO PLÁGIO IMPERIAL Está nas mãos da Globo uma notificação extrajudicial que acusa Império de plágio. O roteirista Mikael Faleiros relata que o diretor da novela, Rogério Gomes, aceitou produzir seu filme A Glória e a Graça, participando de reuniões durante meses. A captação de 4,1 milhões de reais foi aprovada na Ancine, mas Gomes caiu fora do projeto para dedicar-se à emissora. Império foi ao ar em julho exibindo cenas de um núcleo com um travesti que "descaradamente imita" A Glória e a Graça, segundo acusa Faleiros. A Globo informa que a novela é uma obra original de Aguinaldo Silva. 2#7 VEJA ESSA EDITADO POR RINALDO GAMA “Há o risco de algo seriamente perigoso acontecer no prazo de cinco anos.†- ELON MUSK, bilionário sul-africano, fundador e presidente da Tesla e da SpaceX. referindo-se, em seu site, ao suposto risco de que robôs possam, em breve, matar seres humanos: pouco depois de publicar o comentário, ele o retirou do ar. “Na seleção brasileira, ninguém é dono de nada.†- DUNGA, técnico do Brasil, respondendo, sem citar nomes, a Thiago Silva, que havia dito que se sentia como se tivessem tirado algo que lhe pertencia, em alusão à perda do posto de capitão para Neymar; o zagueiro acabou postando uma foto ao lado do camisa 10 para apagar o mal-estar. “Estamos tentando sair do inferno. Voltamos ao purgatório.†- JOSÉ MARIA MARIN, presidente da CBF, falando sobre a atual fase da seleção brasileira: em março, ele dissera que todos estavam no purgatório e iriam para o inferno se o time perdesse o Mundial. “Nem eu nem meus amigos fizemos o que fizemos para ser heróis. Eu fico com vergonha quando alguém me aplaude. (...) Eu só estava fazendo o meu trabalho.†- MATT BISSONNETTE, ex-integrante da tropa de elite que matou Osama bin Laden e autor do livro Não Há Dia Fácil, em entrevista à Folha de S.Paulo. “Vocês podem todos saber que é verdade. (O casamento) vai acontecer. Eu o amo.†- AFTON "STAR" BURTON, jovem americana de 26 anos, ao confirmar, à Associated Press, que se casará com Charles Manson, 80, condenado à prisão perpétua por ter ordenado a morte de sete pessoas em 1969, incluindo a atriz Sharon Tate, então grávida do cineasta Roman Polanski. “Não saio de casa. Ninguém sabe onde moro. A única maneira de manter a intimidade é ficar o mais reservada possível.†- JENNIFER LAWRENCE, atriz americana, estrela de Jogos Vorazes, na Folha de S.Paulo. “Eu nunca amei estar na frente da câmera.†- ANGELINA JOLIE, atriz americana, admitindo à revista DuJour que pode abandonar essa carreira; o filme Invencível, dirigido por ela, chega aos cinemas em dezembro nos EUA e em janeiro no Brasil. “Sou julgado pelas minhas entrevistas (...), pela maneira como desempenho minhas funções. Enquanto isso, as mulheres são normalmente julgadas pelo que estão vestindo ou por seu cabelo.†- KARL STEFANOVIC, apresentador do programa Today, exibido pelo Channel Nine, da Austrália, ao revelar que ficou um ano trabalhando com o mesmo terno sem que ninguém reparasse; ele disse que sua intenção foi "denunciar o sexismo na TVâ€. “Quando falamos em complementaridade entre homem e mulher (...), não devemos confundir (isso) com a ideia de que as relações entre os sexos estejam confinadas a um modelo único.†- PAPA FRANCISCO, em um encontro sobre o tema, no Vaticano. EPÍGRAFE DA SEMANA A pretexto das investigações do petrolão “O homem exige a verdade e a realiza no comércio moral com os homens; é sobre isso que repousa toda a vida em comum.†- F.W. NIETZSCHE, filósofo alemão (1844-1900). _______________________________________ 3# BRASIL 26.11.14 3#1 DE: PAULO ROBERTO PARA: DILMA ROUSSEFF 3#2 OS MILIONÁRIOS DA PETROBRÁS 3#3 MARCHA EM DESCOMPASSO 3#4 O CRIME NÃO COMPENSA 3#1 DE: PAULO ROBERTO PARA: DILMA ROUSSEFF O doleiro Alberto Youssef disse à Justiça que Lula e Dilma sabiam do esquema de corrupção na Petrobras. Agora, e-mails encontrados pela Polícia Federal em computadores do Planalto mostram que eles poderiam ter interrompido o propinoduto, mas, por ação ou omissà£o, impediram a investigação sobre os desvios. ROBSON BONIN E HUGO MARQUES ----Mensagem original---- De: lucosta@petrobras.com.br [mailto:lucosta@petrobras.com.br]Em nome de pcosta@petrobras.com.br Enviada em: terça-feira, 29 de setembro de 2009 19:53 Para: pedro.dalcero@planalto.gov.br; gabinetecasacivil@planalto.gov.br Assunto: TCU. FISCOBRAS 2009 - OBRAS COM RECOMENDAÇÃO DE PARALISAÇÃO. Situação da REPAR, Refinaria Abreu e Lima e Construção de terminal de graneis líquidos no porto de Barra do Riacho/ES. Senhora Ministra Dilma Vana Rousseff, Seguem em anexo os dados do TCU (FISCOBRAS 2009) com a recomendaçà£o de paralisação de três obras do Abastecimento: 1) RNEST (Refinaria Abreu e Lima em Pernambuco); 2) REPAR (Refinaria Getúlio Vargas, no Paraná) e 3) Terminal de graneis líquidos no Espírito Santo - Obra do Plangás (GLP). Conforme consta na nota, os processos são preliminares, não representando a posição final do TCU, assim como o TCU está enviando a CMO (Comissão Mista de Orçamento) do Congresso Federal, a quem compete a paralisação ou não das obras. No ano de 2007 o TCU propôs a paralisação de quatro obras da Petrobras, não tendo tal posicionamento sido ratificado pelo Congresso Nacional. Atenciosamente, Paulo Roberto Costa Antes de se revelar o pivô do petrolão, o maior escândalo de corrupção da história contemporânea brasileira, o engenheiro Paulo Roberto Costa era conhecido por uma característica marcante. Ele era controlador e centralizador compulsivo. À frente da diretoria de Abastecimento e Refino da Petrobras. nenhum negócio prosperava sem seu aval e supervisão direta. Como diz o ditado popular, ele parecia ser o dono dos bois, tamanha a dedicação. De certa forma, era o dono — ou, mais exatamente, um dos donos —, pois já se comprometeu a devolver aos cofres públicos 23 milhões de dólares dos não se sabe quantos milhões que enfiou no próprio bolso como o operador da rede de crimes que está sendo desvendada pela Operação Lava-Jato. Foi com a atenção aguçada de quem cuida dos próprios interesses e dos seus sócios que, em 29 de setembro de 2009, Paulo Roberto Costa decidiu agir para impedir que secassem as principais fontes de dinheiro do esquema que ele comandava na Petrobras. Costa sentou-se diante de seu computador no 19º andar da sede da Petrobras, no Rio de Janeiro, abriu o programa de e-mail e pôs-se a compor uma mensagem que começava assim: "Senhora ministra Dilma Vana Rousseff...". O que se segue não teria nenhum significado mais profundo caso fosse rotina um diretor da Petrobras se reportar à ministra-chefe da Casa Civil sobre assuntos da empresa. Não é rotina. Foi uma atitude inusitada. Uma ousadia. Paulo Roberto Costa tomou a liberdade de passar por cima de toda a hierarquia da Petrobras para advertir o Palácio do Planalto que, por ter encontrado irregularidades pelo terceiro ano consecutivo, o Tribunal de Contas da União (TCU) havia recomendado ao Congresso a imediata paralisação de três grandes obras da estatal — a construção e a modernização das refinarias Abreu e Lima, em Pernambuco, e Getúlio Vargas, no Paraná, e do terminal do Porto de Barra do Riacho, no Espírito Santo. Assim, como quem não quer nada, mas querendo. Paulo Roberto Costa, na mensagem à senhora ministra Dilma Vana Rousseff, lembra que no ano de 2007 houve soluà§ão política para contornar as decisões do TCU e da Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional. Também não haveria por que levantar suspeitas se o ousado diretor da Petrobras que mandou mensagem para a então ministra Dilma Rousseff fosse um daqueles barnabés convictos, um ''caxias", como se dizia antes nas escolas e no Exército de alguém disposto a arriscar a própria pele em benefício da pátria. Em absoluto, não foi o caso. Paulo Roberto Costa, conforme ele mesmo confessou à Justiça, foi colocado na Petrobras em 2004, portanto cinco anos antes de mandar a mensagem para Dilma, com o objetivo de montar um esquema de desvio de dinheiro para políticos dos partidos de sustentação do governo do PT. Ele estava ansioso e preocupado com a possibilidade de o dinheiro sujo parar de jorrar. É crível imaginar que em 29 de setembro de 2009 Paulo Roberto Costa, em uma transformação kafkiana às avessas, acordou um servidor impecável disposto a impedir a paralisação de obras cruciais para o progresso da nação brasileira? É verdade que às vezes a vida imita a arte, mas também não estamos diante de um caso de conversão de um corrupto em um homem honesto da noite para o dia. O que se tem até aqui, então, pelo encadeamento lógico dos fatos e pelo que já foi revelado pela Operação Lava-Jato, pode ser resumido em quatro pontos principais, sem ser preciso recorrer a nenhuma ilação: 1. Um corrupto foi colocado na Petrobras para montar um esquema de desvio de dinheiro para partidos aliados do governo Lula. 2. O corrupto se mostra muito empenhado em seu ofício, que lhe permite conseguir propinas para os políticos e, ao mesmo tempo, enriquecer. 3. O corrupto se preocupa com a decisão do TCU e do Congresso de mandar cortar os repasses de recursos para as obras das quais ele, o corrupto, tirava o dinheiro para manter de pé o esquema. 4. O corrupto acha melhor alertar as altas autoridades do Palácio do Planalto sobre a iminência da interrupção do dinheiro público que alimentava o propinoduto sob sua responsabilidade direta na Petrobras. Como se viu, não é disparatado o ditado popular que diz: "Para viver fora da lei, é preciso ser honesto". Portanto, enquanto diretor comprometido com um esquema de propinas, Paulo Roberto Costa foi honesto em dar o alerta geral de que ia faltar dinheiro público na engrenagem da corrupção. VEJA relatou esses fatos e a interpretação que faz deles a assessores de Dilma no Palácio do Planalto e pediu uma resposta. Ela veio por e-mail: "Em 2009, a Casa Civil era responsável pela coordenaà§ão do PAC. Assim, os relatórios e acórdãos do TCU relativos às obras deste programa eram sistematicamente enviados pelo próprio tribunal para conhecimento da Casa Civil. Após receber do Congresso Nacional (em agosto de 2009), do TCU (em 29 de setembro de 2009) e da Petrobras (em 29 de setembro de 2009) as informações sobre eventuais problemas nas obras da Refinaria Abreu e Lima, a Casa Civil tomou as seguintes medidas: encaminhamento da matéria à CGU, em setembro de 2009, para as providências cabíveis; determinação para que o grupo de acompanhamento do PAC procedesse ao exame do relatório, em conjunto com o Ministério de Minas e Energia e a Petrobras; e a participação em reunião de trabalho entre representantes do TCU, da Comissão Mista de Orçamento, da Petrobras e do MME, após a inclusão da determinação de suspensão das obras da Refinaria Abreu e Lima no Orçamento de 2010, aprovado pelo Congresso. Houve consenso sobre a viabilidade da regularização das pendências identificadas pelo TCU nas obras da Refinaria Abreu e Lima". Dilma ignorou as perguntas de VEJA sobre o tema principal: a mensagem de Paulo Roberto Costa para ela. Não deu nenhuma explicação. Apreendida pela Polícia Federal nos computadores do Palácio do Planalto em uma operação de corrupção, a mensagem nà£o pode ser varrida para debaixo do tapete. Paulo Roberto se dirige a Dilma Rousseff, na ocasião também presidente do conselho de administração da Petrobras. Ele, o corrupto atualmente preso e depondo em regime de delação premiada, relata problemas e propõe solução política. E qual é a solução política? Qualquer uma que fizesse o dinheiro público continuar jorrando para as obras e, consequentemente, para o esquema de corrupção sem que a Petrobras tivesse de explicar ao TCU e ao Congresso a origem das irregularidades. Ou seja, qualquer uma capaz de impedir a abertura da caixa-preta dos negócios que Paulo Roberto Costa tocava. À luz de tudo o que se sabe hoje sobre a corrupção na Petrobras no governo Lula, os fatos narrados até aqui pintam um quadro de extrema gravidade. Do ponto de vista da lógica mais básica, a única saída para Lula e Dilma é a mais clássica de todas as desculpas: o desconhecimento total do esquema de Paulo Roberto Costa na Petrobras, onde ele atuou honestamente fora da lei por oito anos — com Lula ou Dilma na Presidência da República. Essa saída tem problemas. Primeiro, o doleiro Alberto Youssef, o caixa do petrolà£o, disse à Justiça que Lula e Dilma sabiam de tudo. O depoimento do doleiro foi dado no regime de delação premiada, o que coloca sobre os ombros dele o ônus da prova. Se mentir, ele se complica e não terá acesso aos benefícios previstos em lei para os acusados que colaboram com a Justiça. No caso de Youssef, a delaçà£o premiada, se homologada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), é essencial. Sem ela, só pelos crimes já capitulados, ele pode ser condenado a 300 anos de prisão. Youssef pode ter mentido mesmo assim? Pode, mas é altamente improvável que ele se tenha colocado voluntariamente em situação de tão alto risco. Segundo, Lula e Dilma teriam de ser os mais mal informados personagens da República para não saberem das atividades paralelas de Paulo Roberto Costa. Lula o chamava carinhosamente de "Paulinho". No dia em que Paulinho mandou a mensagem para a ministra Dilma, Lula estava embarcando para Copenhague, na Dinamarca, para acompanhar a escolha do Rio de Janeiro como sede olímpica de 2016. Quando voltou, o presidente encontrou ainda sem "solução política" o caso da interrupção das obras da Petrobras. Deu-se então o desfecho que, como toda essa história, é suspeito à luz do que se sabe hoje, mas inócuo antes de estourar o esquema do petrolão. Lula se encheu de coragem e, pela primeira vez em uma questão orçamentaria, usou seu poder de veto para passar por cima do TCU e do Congresso Nacional, reabrindo os cofres para as obras. Paulinho, claro, deve ter ficado felicíssimo com a solução dada pelo presidente. A Petrobras deu uma banana para os órgãos que pretendiam fiscalizá-la mais a fundo ou, pelo menos, receber uma mísera explicação sobre as irregularidades encontradas e como a empresa pretendia corrigi-las e impedir que viessem a ocorrer novamente no futuro. O veto presidencial pôs uma pedra sobre o problema e ainda deu ensejo a uma mudança na lei restringindo os poderes da Comissão de Orçamento do Congresso, que só pode agora paralisar obras suspeitas caso isso não provoque "impactos sociais, econômicos e ambientais". Os corruptos do petrolão agradeceram a iniciativa, pois, e isso é incrível, a mudança na lei feita por Lula os favoreceu diretamente. Pode ser apenas mais um caso da implacável sina dos efeitos indesejáveis e imprevistos. É ótimo que obras públicas bilionárias não mais sejam paralisadas por pequenas irregularidades flagradas pelo TCU — mas, obviamente, é totalmente inaceitável que a nova lei não embuta salvaguardas para evitar o favorecimento de corruptos. Castigo mesmo para os desonestos seria obrigá-los a fazer as obras, sem prejuízo das punições a que se sujeitem por desvio de dinheiro e outros crimes. Durante oito meses, a equipe do ministro Aroldo Cedraz, que assume a presidência da corte em dezembro, se debruçou sobre os custos de Abreu e Lima. A construção da refinaria estava ainda na fase de terraplenagem, mas os indícios de superfaturamento já chegavam aos 100 milhões de reais. A Petrobras, porém, se recusava a esclarecer as dúvidas. O ministro chegou a convocar o então presidente da companhia, Sérgio Gabrielli, para explicar o motivo do boicote. Depois de lembrado que poderia sofrer sanções se continuasse a se recusar a prestar esclarecimentos, Gabrielli entregou 10.000 folhas de planilhas ao tribunal. Para a surpresa dos técnicos, as informações não passavam de dados sem nenhuma relevância. Em uma derradeira tentativa, os técnicos do tribunal realizaram uma diligência na Petrobras. Descobriram algo ainda mais inacredità¡vel sobre os parâmetros praticados para calcular o preço das obras: na maior estatal brasileira, não havia parâmetro algum. Os valores dos serviços eram fixados aleatoriamente por um grupo restrito de pessoas que se reunia numa sala secreta, no 19º andar do edifà­cio-sede da empresa, no Rio de Janeiro. O procedimento normal seria a Petrobras realizar um levantamento prévio no mercado para ter um referencial de custos. Mas nem os servidores da área de licitação tinham acesso ao que era decidido pela diretoria. Diante desse enigma, os técnicos anotaram no relatório: "Nenhum dirigente da Petrobras ou qualquer outra pessoa que não trabalhe naquele andar tem informações sobre a estimativa secreta (...) É uma completa despreocupação com custos". Não restava ao TCU outra alternativa senà£o recomendar à Comissão Mista de Orçamento do Congresso a paralisação imediata das obras. Quem despachava na sala secreta do 19º andar era o diretor Paulo Roberto Costa. Foi de um dos computadores daquele andar que partiu a mensagem de alerta para a ministra Dilma. A conclusão a que esses fatos conduzem é de assustadora simplicidade. Por razões que precisam ser diligentemente apuradas, Lula e Dilma usaram seu poder — ou deixaram de usá-lo — de uma maneira que, ao fim e ao cabo, favoreceu o grupo que extraía propinas de obras da Petrobras. É grave se o fizeram por desinformação sobre o que se passava nas entranhas da Petrobras. É indesculpável se delegaram a outros a apuração das denúncias — e nunca cobraram os resultados. Qualquer outra hipótese pode levar a consequências impensáveis. A CORRUPÇÃO INSTITUCIONALIZADA O CRIME - Em acordo de delação com a Justiça, Paulo Roberto Costa confessa seu envolvimento e revela que assumiu cargo na Petrobras, em 2004, já com o objetivo de operar o esquema de corrupção envolvendo políticos aliados ao governo Lula. O ALERTA - Em setembro de 2009, o Tribunal de Contas da União detectou irregularidades na Refinaria Abreu e Lima, alertou sobre indícios de superfaturamento e manipulação de preços e pediu a paralisação da obra. A OMISSÃO - No mesmo dia, Paulo Roberto Costa envia uma mensagem a Dilma Rousseff, no Planalto, preocupado com a decisão do Tribunal de Contas. Recomenda, incluindo parecer jurídico, uma solução política para o problema. A única ação concreta da ministra foi pedir à CGD que investigasse as denúncias. A AÇÃO - O presidente Lula vetou a decisão do Congresso de paralisar as obras com suspeita de irregularidades e, assim, permitiu que o esquema continuasse operando e desviando dinheiro aos partidos do governo. A "INVESTIGAÇÃO" - Em 2012, três anos depois, a CGD anuncia o resultado da investigação iniciada em 2009 a pedido de Dilma: não investigou nada devido às divergências de procedimento do TCU. A REVELAÇÃO - Em acordo de delação, o doleiro Alberto Youssef confessa seus crimes e diz à Polícia Federal e ao Ministério Público que Lula e Dilma sabiam de tudo. PODER - Em 2006, Paulo Roberto Costa, já operador do petrolão, reúne-se no Palácio do Planalto com o então presidente Lula, a ministra Dilma Rousseff e Sérgio Gabrielli, presidente da Petrobras. O EPICENTRO DO ESCÂNDALO Refinaria Abreu e Lima (PE) Orçamento inicial: 2,5 bilhões de dólares Gasto estimado: 20 bilhões de dólares Estágio da obra: 90% concluída O que se descobriu: parte dos recursos foi desviada para o PT, o PMDB e o PP, e também para a campanha presidencial de Dilma em 2010. OS COMPROMETIDOS E OS INCONFIÁVEIS O advogado Claudismar Zupiroli era encarregado da defesa dos gestores da Petrobras quando o Tribunal de Contas da União começou a detectar as primeiras irregularidades na obra da Refinaria Abreu e Lima. Na mensagem apreendida nos computadores do Planalto, ele apresenta a Gilberto Carvalho, então chefe de gabinete do presidente Lula, uma extraordinária solução para os problemas do governo: indicar para o TCU pessoas "comprometidas" ideologicamente com o governo — e recomenda Erenice Guerra, então braço-direito de Dilma Rousseff na Casa Civil. Erenice Guerra seria hoje ministra de Contas se não fosse a descoberta de que ela usava o cargo no Palácio do Planalto para facilitar negócios que beneficiavam sua família. Os ministros Augusto Nardes, Aroldo Cedraz, Raimundo Carreiro e José Jorge, segundo ele, não se identificavam com as "práticas ousadas de aplicação de recursos que marcam este governo". Nomear aliados poderia evitar uma futura "inelegibilidade de companheiros(as) em face da rejeição de contas". AÇÃO - Gilberto Carvalho era o mais influente assessor do entà£o presidente Lula. Seus palpites costumavam se materializar em indicaà§ões de ministros. OMISSÃO - Em vez de esclarecer as dúvidas levantadas pelo TCU, o advogado Claudismar Zupiroli aconselhava lobby pela indicação de pessoas comprometidas com o governo. AÇAO - Sérgio Gabrielli, ex-presidente da Petrobras: segundo o Tribunal de Contas e a Comissão de Orçamento, ele dificultava o trabalho de apuração das irregularidades. OMISSÃO - O presidente do TCU afirmou ter advertido também a ex-ministra Gleisi Hoffmann sobre as irregularidades na Petrobras. Apontada pelos delatores como beneficiária do esquema, ela nega. 3#2 OS MILIONÁRIOS DA PETROBRÁS Um simples gerente, que ocupava o quarto escalão do esquema de corrupção na estatal, confessa que roubou 250 milhões de reais. Imagine os seus chefes, os chefes dos chefes e o chefão de todos eles. DANIEL PEREIRA Maior processo da história do Supremo Tribunal Federal (STF), o mensalão começou a ser desvendado com a divulgação por VEJA de um vídeo no qual Maurício Marinho aparece embolsando 3000 reais em propina. Chefe de um departamento dos Correios, ele fazia parte de um esquema clandestino de desvio de recursos públicos comandado pelo PTB na estatal. Marinho era um peixe pequeno nessa rede. Presidente do partido na época e delator do mensalão, o deputado cassado Roberto Jefferson admitiu ter recebido dos cofres mensaleiros 4 milhões de reais, 1333 vezes mais do que o seu subalterno. Com a descoberta do petrolão, essas cifras se tornaram dignas de um juizado de pequenas causas, como bem ironizou o ministro do STF, Gilmar Mendes. Basta compará-las com os valores movimentados pela quadrilha que assaltou a Petrobras. Ex-gerente executivo de engenharia da empresa. Pedro José Barusco Filho virou alvo da Operação Lava-Jato depois de a Suíça bloquear 20 milhões de dólares que ele mantinha numa conta no exterior. Descoberto por autoridades estrangeiras, Barusco tratou de se entender com as autoridades brasileiras. Ele passou a negociar um acordo de delaà§ão premiada e prometeu devolver à União 100 milhões de dólares — cerca de 250 milhões de reais. Só esse valor supera com folga toda a verba pública surrupiada para subornar o Congresso no primeiro mandato do ex-presidente Lula. Em troca de penas mais brandas, Barusco também terá de ajudar a polícia e os procuradores a saber quanto seus superiores amealharam com o esquema de corrupção. A envergadura e os compromissos políticos de seus chefes são bastante sugestivos. Barusco foi braço-direito do ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque, preso na carceragem da Polà­cia Federal sob a acusação de cobrar propina para superfaturar e executar os contratos da área comandada por ele. Duque foi indicado ao cargo pelo ex-chefe da Casa Civil José Dirceu, que ficou quase um ano preso, como corrupto condenado, na esteira do julgamento do mensalà£o. Como diretor da Petrobras, Duque se tornou amigo do tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, responsável por conseguir recursos para financiar as campanhas do partido — de deputados a presidente da Repàºblica. Por uma questão de hierarquia e de responsabilidade no organograma do poder, como ficou claro no mensalão, é de esperar que os chefes de Barusco tenham movimentado quantias bem maiores do que ele. Descobrir quanto é o desafio dos investigadores. Suspeita-se de cifras astronômicas, como tudo o que envolve a Petrobras. Carro-chefe dos investimentos públicos no Brasil, a estatal sustentou a boa vida de muitos dos protagonistas do petrolão. Na semana passada, Renato Duque disse em depoimento que, depois de deixar a empresa, recebeu 1,6 milhão de reais da UTC como pagamento de um serviço de consultoria. O caso será apurado para saber se o repasse era ou não um acerto tardio de propina. O próprio Barusco é proprietário de uma casa avaliada em 6 milhões de reais. Já Nestor Cerveró, ex-diretor da área internacional, morou até meados do ano num apartamento na Zona Sul do Rio, com preço de mercado estimado em 7,5 milhões de reais. Depois de se tornar alvo das investigações relacionadas à compra da Refinaria de Pasadena, Cerveró se mudou para um endereço mais modesto e, com medo do bloqueio de seus bens, transferiu três imà³veis para os filhos. Lobistas também fizeram fortuna em negócios com a Petrobras. Entre eles, Júlio Faerman e Fernando Soares (veja o quadro ao lado). Os dois construíram uma carreira de sucesso ao farejar oportunidades de negócio na empresa e intermediar contratos. Faerman foi apontado — em uma denúncia feita por um ex-funcionário da companhia holandesa SBM Offshore — como o intermediário do pagamento de comissões a funcionários da Petrobras. Ele trabalhava para a SBM, que gastou 139 milhões de dólares em propinas no Brasil, fechar contratos bilionários de aluguel de plataformas para à exploração de petróleo. Faerman rechaça a denúncia de corrupção. No governo Lula, os cargos de direção da Petrobras foram loteados entre PT, que assumiu os postos mais importantes, PMDB e PP. Com a descoberta das reservas do pré-sal, a disputa entre os partidos por nacos da estatal se acentuou. Era patente que não apenas o ex-presidente, mas também sua legião de aliados, considerava a empresa um bilhete premiado — ou um passaporte para o futuro. A Operação Lava-Jato revelou que executivos, lobistas e políticos foram com muita sede ao pote — e o futuro, ao contrário do que imaginavam, pode ser a cadeia. CHEFE – Indicado ao cargo pelo mensaleiro José Dirceu, o ex-diretor Renato Duque, segundo a Justiça, mantém contas milionárias na Suíça. Ela já admitiu ter recebido 1,6 milhão de reais, mas os investigadores acreditam que a fortuna dele é bem maior e inclui imóveis. SUBORDINADO - Dono de uma suntuosa mansão no Rio de Janeiro, Pedro Barusco, o ex-gerente, confessou ter recebido propina e se comprometeu a devolver 100 milhões de dólares escondidos no exterior. ÁGUAS TURVAS INTERNACIONAIS Em um dos depoimentos prestados à Polícia Federal em busca do benefício da delação premiada, o executivo Júlio Camargo, da Toyo Setal, fez uma revelação que amplia o raio de aà§ão do esquema de propinas instalado na Petrobras. Camargo disse à  Justiça que o propinoduto atingiu o braço naval da coreana Samsung, dona do segundo maior estaleiro do mundo, que fatura anualmente 13,3 bilhões de dólares construindo navios, sondas e plataformas de petróleo. O executivo da Toyo Setal deu detalhes da transferência pela Samsung de 40 milhões de dólares, em 2005, para a conta da Piemonte, empresa de consultoria dele próprio. Os sul-coreanos, segundo o depoimento de Júlio Camargo, estavam pagando "comissões" cobradas por Nestor Cerveró, ex-diretor da área internacional da Petrobras. Cerveró cobrou a propina para aprovar a contratação de duas sondas da Samsung que seriam usadas em prospecções da Petrobras na África e no Golfo do México. Camargo disse à Justiça que a Piemonte recebeu e repassou o dinheiro a Fernando Soares, o Baiano, suspeito de ser o operador do esquema em favor do PMDB. De acordo com o relato de Júlio Camargo, o contrato com os sulcoreanos começou a ser articulado na sede da Petrobras, no Rio de Janeiro, durante um encontro entre Cerveró e Harry Lee, vice-presidente mundial da Samsung. Luiz Carlos Moreira, ex-gerente executivo e homem de confiança de Cerveró, também participou da reunião. Camargo não precisou o que foi decidido no encontro, mas contou que, pouco tempo depois, ele e Baiano se encontraram com representantes da Samsung em um edifício no centro do Rio de Janeiro, quando então teriam acertado o valor e os detalhes da transferência da propina. O suborno relativo à sonda destinada à costa africana, segundo Júlio Camargo, foi de "12,5 a 15 milhões de dólares". Meses depois, Baiano apareceu com a proposta de comprar a segunda sonda, a do Golfo do México. Baiano, que não tinha cargo na Petrobras, animou-se com o fato de que o novo negócio com a Samsung renderia comissàµes de 25 milhões de dólares. Harry Lee, disse Camargo, desconhecia a destinação da propina, que pagou em parcelas, por meio de depósitos em contas bancárias no Uruguai. THIAGO PRADO E MALU GASPAR 3#3 MARCHA EM DESCOMPASSO Depois de verem recusada pela Justiça sua proposta de um "acórdão", os advogados das empreiteiras acusadas na Lava-Jato partem cada qual por um caminho. O maior temor de todos: que um executivo de uma das grandes resolva engrossar a fila da delação premiada. MARIANA BARROS E ALEXANDRE HISAYASU Até a semana passada, a estratégia dos sonhos dos advogados dos empreiteiros presos no dia 14 na Operação Lava-Jato era a seguinte: seus clientes — executivos das maiores construtoras do paà­s acusados de pagar propina para obter contratos com a Petrobras — se juntariam para fazer com a Justiça um acordo coletivo. Eles topariam pagar vultosíssimas multas (na casa do bilhão e tendo o céu como limite) e contar o que sabem sobre o esquema de corrupção que vigorou na estatal. Em contrapartida, não admitiriam a prática de corrupção e, caso fossem condenados por crimes menores, como lavagem de dinheiro, cumpririam a pena em regime aberto. A ideia chegou a ser levada por um grupo de advogados ao Ministério Público, que a considerou "inaceitável", mas sinalizou que acordos individuais seriam bem recebidos. "Quem trouxer fatos relevantes à investigação será beneficiado", confirmou a VEJA o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, um dos que atuam no caso. A resposta do MP provocou entre a quase meia centena de advogados contratados pelos empreiteiros um clima de salve-se quem puder — e também o temor de que alguém pisque primeiro. No raciocínio de advogados, caso alguma empreiteira entre as grandes aceite a proposta de delação do MP, isso poderá prejudicar todas as outras. Primeiro, porque elas poderão ser incriminadas na delação, depois porque podem perder a chance de fazer o mesmo. "A Justiça não vai estender o benefício a todas as empresas", disse um advogado a servià§o de uma empreiteira de médio porte. "Se, por exemplo, uma empresa como a Camargo Corrêa aceitar falar tudo, o resto não terá nada a acrescentar." Diante desse quadro, os advogados hesitam em deixar clara a estratà©gia que pretendem adotar. Um dos poucos a fazê-lo até agora foi José Luís de Oliveira Lima, que defende representantes da Galvão Engenharia. Na segunda- feira, seu cliente Erton Medeiros Fonseca, diretor-presidente da empresa, afirmou à PF ter sido extorquido pelo ex-diretor de abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa e pelo doleiro Alberto Youssef. No dia seguinte, o mesmo discurso foi repetido pelo vice-presidente da Mendes Júnior, Sérgio Cunha Mendes, defendido por Marcelo Leonardo. Ele afirmou à PF ter pago uma propina de 8 milhões de reais a Youssef. Os dois alegaram que, se não concordassem em pagar a propina, os autores da extorsão ameaçavam descumprir o valor orçado para a obra e cobrar deles multas contratuais milionárias. A alegação, se aceita pela Justiça, transformaria os acusados em vítimas. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, no entanto, já adiantou o que pensa sobre a tese da extorsão: "Vamos combinar que nessa situação não existem néscios nem papalvos. É muito difícil acreditar. Ninguém é obrigado a ganhar dinheiro e a lucrar com uma atividade ilícita". Ainda que o MP tenha descartado o acórdão pretendido pela defesa, um grupo de advogados mantém um objetivo comum. Defensores contratados pela Engevix, OAS e Camargo Corrêa se encontram quase todos os dias na sede da PF em Curitiba e têm aproveitado o almoço para discutir formas de anular a Lava-Jato ou, ao menos, tirar o caso das mãos do juiz federal Sérgio Moro, que consideram muito rigoroso. O exemplo sempre citado nas conversas é a Operação Castelo de Areia, de 2009, que pegou toda a cúpula da Camargo Corrêa e acabou anulada pelo Superior Tribunal de Justiça por um motivo técnico — a polícia fez escutas telefônicas autorizadas pela Justiça a partir de uma denúncia anônima, sem que tivessem sido feitas diligências anteriores. Até agora, no entanto, os advogados admitem que o juiz Moro não ofereceu motivos para um pedido de anulação. Para livrar seus clientes do rigor de Moro, o advogado Fábio Tofic Simantob, que defende funcionários da construtora Engevix, pediu que o caso seja transferido para o STF, alegando a presença de acusados com foro privilegiado. Já Mário de Oliveira Filho, defensor do lobista Fernando Soares e de executivos da construtora lesa, afirmou que vai requerer que as investigações sobre seus clientes sejam conduzidas pela Justiça e Polícia federais do Rio de Janeiro. "Os crimes de que eles são acusados teriam sido cometidos no Rio. Não faz sentido os trabalhos ocorrerem em Curitiba." Até sexta-feira passada, doze dos 23 empreiteiros presos no dia 14 continuavam na cadeia (veja o quadro na pág. 77). Investigadores consideram que há provas suficientes para condená-los. Mas têm dúvidas se a punição às pessoas físicas será estendida às empreiteiras. Uma operação em curso indica que, se depender do governo, as grandes construtoras serão poupadas. Se se seguir a lei, as empreiteiras acusadas de participação no petrolão deverão ser declaradas inidôneas e proibidas de prestar serviços ao governo federal. Foi o que ocorreu com a Delta depois de revelado o segredo de sua ascensão meteórica: em troca do superfaturamento de contratos firmados com o poder público, a empresa do notório Fernando Cavendish pagava propina a servidores públicos e, por meio de empresas de fachada, repassava dinheiro sujo a partidos políticos. A engrenagem, pelo que mostram as investigações até agora, é a mesma empregada na Petrobras, mas o discurso dos agentes públicos, nesse caso, está diferente. Há um coro em defesa de uma negociação política com as empreiteiras. Esgrime-se a tese de que a declaração de inidoneidade coletiva pararia as principais obras de infraestrutura e interditaria o país. Entre os porta-vozes dessa teoria estão o vice-presidente Michel Terner, o comandante do Tribunal de Contas da União (TCU), Augusto Nardes, e o próprio ministro Jorge Hage, que já era chefe da CGU quando a inidoneidade da Delta foi decretada. Hage até cogita a possibilidade de impedir que as construtoras fechem novos contratos com a União, mas rechaça a interrupção dos contratos em curso. Afinados, Hage, Temer e Nardes preferem a chamada "repactuaçà£o" dos negócios firmados, com a redução dos custos das obras e a devolução do dinheiro surrupiado dos contribuintes. Ou seja: a mera restituição da roubalheira. As empreiteiras, nesse caso, poderiam firmar novos contratos sem nenhum tipo de constrangimento. Uma decisão nesse sentido teria um óbvio efeito antipedagógico. Quase um crime sem castigo. Mas a boa vontade com a OAS, a Camargo Corràªa e a UTC, entre outras, tem uma explicação secundária. As empreiteiras figuram entre os maiores financiadores de campanhas polà­ticas. Nas últimas três eleições, as nove empresas acusadas de participar do petrolão doaram formalmente cerca de 400 milhões de reais ao PT e seus candidatos, incluindo o ex-presidente Lula, em 2006, e a presidente Dilma, em 2010 e 2014. Espera-se que isso não seja motivo para que escapem da lei. O QUE ELES ESTÃO DIZENDO Como os empreiteiros pegos na Operação Lava-Jato responderam à s perguntas da polícia. PODERÃO COLABORAR Ricardo Pessoa — UTC O presidente da construtora admitiu ser sócio de Youssef em um hotel e ter emprestado dinheiro ao doleiro, mas negou irregularidades. Estuda acordo: conta o que sabe e não fica preso. A polícia não divulgou o depoimento de Walmir Santana, diretor financeiro SITUAÇÃO: prisão preventiva. Santana foi solto Eduardo Hermelino Leite — Camargo Corrêa O vice-presidente da empreiteira não falou nada, mas seu advogado disse que ele poderá "dar a mão à palmatória". Dois executivos devem seguir o mesmo caminho: João Auler, presidente do conselho de administração, e Dalton Avancini. presidente da empresa SITUAÇÃO: prisão preventiva. Os outros dois colegas tambà©m continuam presos FORAM “EXTORQUIDOS†Sérgio Cunha Mendes — Mendes Júnior O vice-presidente da empresa admitiu ter pago 8 milhões de reais a Youssef. Segundo sua defesa, o doleiro e Paulo Roberto Costa ameaçaram não liberar pagamentos a que ele teria direito e bloquear sua participação em novas licitações se não aceitasse dar a propina. SITUAÇÃO: prisão preventiva Erton Medeiros Fonseca — Galvão Engenharia O diretor-presidente da divisão de engenharia industrial da companhia admitiu que pagou propina. Assim como no caso da Mendes Júnior, disse que o fez para não ser prejudicado pela dupla Costa-Youssef SITUAÇÃO: prisão preventiva “NADA A DECLARAR†José Adelmário Pinheiro Filho — OAS O presidente da construtora ficou calado, com o argumento de que não teve acesso às delações. Mateus Coutinho de Sá Oliveira, vice-presidente do conselho de administração, Agenor Franklin Magalhães Medeiros, diretor-presidente da área internacional de petróleo e gás, e José Ricardo Nogueira Breghirolli, funcionà¡rio, seguiram a mesma tática SITUAÇÃO: todos em prisão preventiva. Valdir Lima Carreiro — Iesa Nem a polícia nem a defesa divulgaram o teor dos depoimentos do diretor-presidente da Iesa e do diretor de operações da empresa, Otto Garrido Sparenberg SITUAÇÃO: foi solto na terça-feira, assim como seu subordinado NÃO SABEM DE NADA Carlos Eduardo Strauch Albero — Engevix O diretor técnico da empresa negou as acusações, assim como Newton Prado, diretor de contratos. Gerson Almada, vice-presidente, tinha contatos com Youssef. segundo Albero SITUAÇÃO: solto na terça, assim como Prado. Almada segue preso. Ildefonso Colares Filho — Queiroz Galvão O ex-diretor da companhia negou a existência de cartel e o pagamento de propina. Admitiu apenas que Youssef intermediou "doações legais" para o Partido Progressista (PP) SITUAÇÃO: foi solto na terça. Othon Zanoide de Moraes Filho — Vital Engenharia O diretor da empreiteira, uma das subsidiárias da Queiroz Galvão, também negou irregularidades SITUAÇÃO: foi solto na terça-feira COM REPORTAGEM DE DANIEL PEREIRA, BELA MEGALE E PIETER ZALIS PÃO E ÁGUA EVIAN Com a liberação de onze presos na última terça-feira, a carceragem da Polícia Federal em Curitiba ficou um pouco menos apertada. Mesmo assim, não há cama para todos, o que obrigou os atuais doze presos — na maioria, presidentes, vice-presidentes e diretores de algumas das maiores empreiteiras do Brasil — a decidir quem ocuparia os três beliches de alvenaria disponíveis nas três celas (6 metros quadrados cada uma) da ala 2, onde se concentram os executivos. O critério adotado foi o da idade: os mais velhos na cama, os mais novos no chão. Na segunda semana de prisão, os empreiteiros presos na Operaà§ão Lava-Jato já estabeleceram uma rotina. Tão logo acordam, empilham os colchões do lado de fora das celas e os cobrem com lençóis, de modo que sirvam de sofás. É nesse lounge improvisado que passam a maior parte do dia, já que a porta das celas sà³ é trancada à noite e até lá a circulação é permitida. Ninguém veste uniforme — a maioria passa o dia de chinelos, jeans e camisa polo. Apenas o presidente da Camargo Corràªa, Dalton dos Santos Avancini, faz questão de continuar de paletà³. Na tarde de domingo, um dos três banheiros usados pelos presos entupiu. O problema só poderia ser resolvido na manhã seguinte, quando técnicos estariam no local. Quem salvou os presos da espera e do odor na madrugada foi o diretor-presidente da Galvão Engenharia, Erton Medeiros Fonseca. Uma das poucas reivindicações que os empreiteiros fizeram até agora foi a mudança do horário do banho de sol. Queriam reagendá-lo para mais tarde, já que o pátio ainda é frio e úmido nos horários programados: das 8 às 10 horas e das 10às 12 horas. A superintendência da PF estabeleceu dois turnos de banho de sol para que o doleiro e delator Alberto Youssef, que ocupa uma cela na outra ala da carceragem, não precisasse ter contato com os empreiteiros, muitos dos quais estão lá por causa dele. A PF negou o pedido para a alteração dos horários do banho de sol. Alguns presos têm se queixado de problemas de saúde. Eduardo Leite, vice-presidente da Camargo Corrêa, disse a familiares ter enfrentado dois picos de pressão alta. Recebeu um aparelho para monitorà¡-la. O presidente da UTC, Ricardo Pessoa, fumante, vem sofrendo com a falta do cigarro — proibido inclusive no pátio. Ele é um dos quatro presos que estão fazendo uso de adesivos de nicotina para aliviar os sintomas da abstinência. Apontado como o "coordenador do clube" das empreiteiras, é o que tem demonstrado mais abatimento na prisà£o. Em alguns momentos, distante dos colegas de cárcere, dá vazão ao choro. A PF não permite a entrada de refeições vindas de fora. A exceção é para biscoitos, chocolates e outros produtos que, trazidos em pequena quantidade e embalagens fechadas, não necessitam de grande inspeção. O almoço na carceragem é às 11h30 e o jantar, às 17h30. Entre os pratos servidos na última semana, estavam nhoque e peixe ao curry, sempre acompanhados de salada e suco instantâneo. Os presos que têm restrições alimentares tiveram de se adaptar. O presidente da Iesa, Valdir Carreiro, liberado na terça-feira, por exemplo, é alérgico a lactose, e come apenas a salada e as frutas do marmitex. Complementa a dieta com bolachas trazidas por seus advogados. A única bebida com entrada autorizada é água mineral. Mais de 300 litros, parte deles da marca francesa Evian, já chegaram à carceragem trazidos por advogados e assessores dos empreiteiros. A quarta-feira passada foi o primeiro dia em que os familiares dos presos puderam vê-los. Quase todos receberam visitas, à exceção de Dalton Avancini, Ricardo Pessoa, Eduardo Leite e do ex-diretor da Petrobras Renato Duque. Fernando Baiano, por exemplo, apontado como operador do PMDB no esquema, recebeu o irmão, e Youssef, a irmã. Com um dos visitantes, veio também um bom estoque de chocolate belga, distribuído a todos os presos. Os encontros com os familiares duraram pouco mais de quinze minutos e ocorreram no mesmo parlatório em que os presos falam com seus advogados, por telefone e separados por um vidro. Os empreiteiros tiveram de enfrentar uma pequena espera para ver seus parentes: das três cabines disponíveis no parlatório, só duas estão em uso porque o doleiro Youssef quebrou o vidro de uma delas meses atrás, durante uma discussão com um visitante. Alguns dos executivos presos têm a possibilidade de ser libertados antes do Natal, caso a polícia ou o Ministério Público não peçam a prorrogação de sua prisão preventiva — a maioria vence no próximo dia 15. Até lá, o ambiente na carceragem da PF continuará tenso. No fim da semana passada, advogados tentaram entregar baralhos e fichas aos presos. A PF não autorizou. O CÁRCERE Como é o espaço na Uperintendência da PF em Curitiba onde estão presos alguns dos maiores executivos do páis. 1- Pátio onde os presos tomam sol 2- Ala 1 da carceragem. É onde ficam o doleiro delator, Alberto Youssef, e o homem apontado como o operador do PMDB, Fernando Baiano 3- Ala 2. Abriga todos os empreiteiros presos. Chegou a ter 23 pessoas e agora acomoda doze 4- O "lounge" da prisão. São sofás montados pelos empresà¡rios, com colchões empilhados e lençóis jogados por cima. Eles passam aí a maior parte do tempo 5- Parlatorio onde se dão os encontros dos presos. Um dos três teve o vidro quebrado por Youssef numa discussão 6- Sala dos agentes da PF 7- Sala administrativa BELA MEGALE 3#4 O CRIME NÃO COMPENSA Com a investigação do esquema bilionário de corrupçà£o que envolve gente cada vez mais graúda, o país vem exibindo uma estabilidade invejável. NATALIA LUZ E ANDRÉ PETRY Dispensando o barroquismo do juridiquês tão comum nos tribunais brasileiros, o juiz Sérgio Moro, que comanda a já célebre Operação Lava-Jato, escreveu 51 páginas históricas ao autorizar a prisão da nata dos empreiteiros do país. Na segunda metade do documento, Moro defendeu a correção dos acordos de delação premiada, que têm funcionado como usina de revelações, e explicou a necessidade da prisão dos executivos das empreiteiras. Sobre a delação premiada, ele disse que se trata de um instrumento "válido e eficaz", sobretudo em casos complexos como a lavagem de dinheiro, nos quais, às vezes, só mesmo a confissão de algum envolvido permite esclarecer as ramificações criminosas. Escreveu Moro: "Quem, em geral, vem criticando a colaboração premiada é, aparentemente, favorável à regra do silêncio, à omertà das organizações criminosas, isso sim reprovável". Ao discorrer sobre a necessidade das prisões, o juiz Moro tocou no ponto mais revelador do momento único que o Brasil atravessa. Primeiro, fez uma citação do sociólogo americano Edwin Sutherland (1883-1950), que cunhou a expressão "crime do colarinho-branco" na primeira metade do século XX, quando ainda era escassa a noção de que homens de paletó e gravata podiam cometer crimes. A citação é a seguinte: "Crimes de colarinho-branco violam a confianà§a e, portanto, criam desconfiança, o que diminui a moral social e produz desorganização social em larga escala. Outros crimes produzem relativamente menores efeitos nas instituições sociais ou nas organizações sociais". A partir desse raciocínio, Moro explicou que a prisão dos empreiteiros, aliada à gravidade dos crimes de que são suspeitos, era uma forma de preservar a "confiança da sociedade" e a "credibilidade das instituições públicas". Em meio à revelação de roubalheiras bilionárias cometidas por máfias bem organizadas, o aspecto alentador da Operação Lava-Jato é justamente este: a credibilidade das instituià§ões públicas. Com crescente autonomia, a Polícia Federal vem atuando com independência e profissionalismo, ainda que não tenha superado divisões internas, em que um lado tenta boicotar o outro. O Ministério Público, cuja eficácia não chega a ser uma novidade, tem trabalhado com a correção habitual, mesmo que haja forças internas que gostariam de fazer as coisas tomar outro rumo. Além da própria Justiça Federal, na qual atua o juiz Moro, outras instituições se juntaram às investigações e, neste caso, sem promover as intrigas que tanto ajudaram a atropelar investigações anteriores. Na semana passada, a Justiça autorizou que os documentos apreendidos pela Polícia Federal sejam compartilhados com a Receita Federal, a Controladoria-Geral da União, o Tribunal de Contas e o Cade, órgão que zela pelas boas práticas econà´micas. Tudo isso se materializa no contexto de uma investigação que cresce a cada nova etapa, envolvendo gente cada vez mais graúda, e que pode, na ponta final, alcançar os gabinetes mais poderosos da República. Não é pouca coisa, nem coisa para países com instituições frágeis. Até aqui, os movimentos — de investigadores e investigados — têm ocorrido dentro da moldura institucional. O juiz Moro, ao atender a pedidos do Ministério Público e da Polícia Federal para fazer prisões, escutas telefônicas ou operações de busca e apreensão, tem tomado cuidado especial quanto à correção dos procedimentos. Quer evitar que a Lava-Jato tenha o mesmo fim melancólico da Operação Castelo de Areia, por exemplo, que revelou os intestinos de transações criminosas da empreiteira Camargo Corrêa mas, em função de ações irregulares, acabou destruída no Superior Tribunal de Justiça. Os investigados, por sua vez, vêm reagindo com base em recursos legítimos. Tentaram acordo com o Ministério Público, dispostos a desembolsar até 1,2 bilhão de reais, recorreram ao Supremo Tribunal Federal para tirar a investigação das mãos do juiz Moro e defenderam- se, no caso da Mendes Júnior, dizendo que não pagaram propina — foram extorquidos. Nada tem dado certo, mas nada disso é golpe baixo. Golpes baixos, mesmo, têm aparecido aqui e ali, mas nenhum com potência nem dimensão suficientes para melar o jogo. Um advogado de empreiteiras tentou dar uma cartada terrorista, sugerindo que as investigações inviabilizariam o trabalho das maiores construtoras, o que paralisaria o país. Queria dizer que era melhor parar de investigar em nome do bom funcionamento da nação. Ninguém deu muita atenção. Outro advogado disse que, sem propina, não se coloca "um paralelepípedo no chão", hipérbole que embute uma conclusão matreira: se todos cometem o mesmo crime, é melhor que sejam todos inocentados de uma vez. A declaração, feita por Mário Oliveira Filho, defensor do lobista Fernando Soares, operador de alguns nomes graúdos do PMDB, teve repercussão nacional, mas não no sentido desejado pelo seu autor. Foi repudiada. Com tudo somado, a Operação Lava-Jato tem servido como testemunho da saúde das instituições e, de algum modo, talvez esteja contribuindo para, nas palavras do juiz Moro, "resgatar a confiança da sociedade no regular funcionamento das instituições públicas e na aplicação da lei penal". No terreno da política, o Congresso vive a ciclotimia típica de sua composição. Oscila entre a empolgação da oposição, a inércia de aliados atônitos e o pânico daqueles que sabem que, mais cedo ou mais tarde, terão de dar explicações. A oposição tucana faz seu trabalho de fustigar o governo e o PT, e os petistas tentam se defender vendendo a lorota de que o governo do PT é que mandou investigar tudo. Há dois sinais de maturidade institucional dignos de nota: nem o governo do PT tem usado poderes ocultos para barrar as investigações, tendo inclusive contribuído para a profissionalizaçà£o da Polícia Federal, nem a oposição do PSDB pronunciou a palavra impeachment, pela nobre razão de que não há motivos concretos para tanto. Por enquanto, pelo menos. As investigações que hoje assombram o país começaram com base em suspeitas menores em Londrina, no Paraná, em torno de um doleiro, em 2008. Depois se somaram a outro caso menor, que apurava a atuação de mais um doleiro, cuja casa de câmbio ficava num posto de gasolina em Brasília. Juntando as pontas, foi revelado esse imenso esquema bilionário de corrupção concentrado na maior empresa do país. Mas os desdobramentos da investigação são tão imprevisíveis hoje quanto eram no começo de tudo, seis anos atrás. O que se pode afirmar é que não faltarão desdobramentos para continuar testando a solidez das instituições. Num documento de 98 páginas endereçado ao juiz Moro, no qual pede algumas providências, o Ministério Público Federal escreve: "É possível afirmar que o esquema criminoso atuava há pelo menos quinze anos na Petrobras''. Se for verdade, a roubalheira será bem superior ao que já veio à tona. Além disso, no seu despacho de 51 páginas, o juiz Moro informa que o esquema das construtoras talvez nà£o esteja circunscrito à Petrobras. O juiz relata o seguinte trecho do depoimento de Paulo Roberto Costa, ex-diretor da estatal e homem da propina: JUIZ - Essa cartelização em obras funcionava em toda, praticamente, não era só na Refinaria Abreu e Lima, funcionava em outras à¡reas também da Petrobras? COSTA - Da Petrobras e fora da Petrobras. JUIZ - Na Repar, aqui no Paraná, houve isso também? COSTA - Houve. Como deve ter ocorrido em Angra 3, como deve ter ocorrido na construção de hidrelétricas lá no norte do país, como deve ter ocorrido nas rodovias. Que as instituições resistam. CADA VEZ MAIOR A Polícia Federal começou investigando um doleiro e, a cada etapa, foi descobrindo ramificações — até prender a càºpula das maiores empreiteiras do país. 11 DE JULHO DE 2013 O COMEÇO MODESTO Numa operação despretensiosa, a PF monitorou telefonemas do doleiro Carlos Chater, por suspeita de lavagem de dinheiro. Ele atuava em uma casa de câmbio num posto de gasolina, em Brasília JULHO/AGOSTO DE 2013 SURGE O DOLEIRO Na escuta telefônica, a PF descobriu que o doleiro Chater tinha relações com outros três doleiros. Um deles, Alberto Youssef, chamou atenção pelo volume de suas transações 21 DE OUTUBRO DE 2013 ENTRA EM CENA O EX-DIRETOR DA PETROBRAS Em telefonema interceptado, Youssef reclamou das exigências de um comparsa sobre a divisão do butim: "Ninguém sabe fazer conta nessa p....", protestou na conversa. O comparsa, disse Youssef, era Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras 20 DE MARÇO DE 2014 CAI A PLANILHA DA CORRUPÇÃO Com a suspeita de que Paulo Roberto Costa estava eliminando pistas de sua ligação com o doleiro Youssef, a Polícia Federal prendeu o ex-diretor da Petrobras no Rio de Janeiro. Na sua casa, os agentes encontraram uma planilha cujas anotações indicavam que Paulo Roberto Costa passava dinheiro para funcionários públicos e políticos 5 DE ABRIL DE 2014 APARECEM AS EMPREITEIRAS Com a quebra do sigilo bancário, a PF descobriu que a MO Consultoria, uma das empresas de fachada do doleiro Youssef, movimentara 90 milhões de reais entre 2009 e 2013. Chamavam atenção os depósitos feitos pelas empreiteiras. Só a Mendes Júnior depositara 5,5 milhões de reais para o doleiro 11 DE ABRIL DE 2014 A PETROBRAS CAI NA REDE À procura de detalhes sobre um contrato suspeito de 444 milhões de reais, a Polícia Federal fez uma operação de busca e apreensão na própria sede da Petrobras, no Rio de Janeiro. A ação policial marcou o ingresso oficial da Petrobras no escândalo que, mais tarde, seria batizado com seu nome: petróleo 22 DE AGOSTO DE 2014 A PROPINA PARA OS PARTIDOS Paulo Roberto Costa fez acordo de delação premiada, nos termos do qual ganhará uma redução de pena em troca de revelar o que sabe. Em seus depoimentos, contou que todos os contratos da Petrobras embutiam uma propina de 2% a 3% do valor do documento, que era depois dividida com os operadores do esquema e com o partido correspondente — PT, PP ou PMDB. Contou, ainda, que as grandes empreiteiras integravam um cartel, no qual dividiam entre si as obras da Petrobras, sabotando as disputas SEMANA PASSADA OS EMPREITEIROS NA CADEIA Com mais de uma dezena de detidos em delação premiada, 23 empreiteiros presos e onze soltos depois de alguns dias na cadeia, além de outros dezesseis investigados com seu sigilo bancário quebrado, a operação da PF atacou de frente os corruptores. As nove empreiteiras cujos dirigentes foram presos mantêm contratos com a Petrobras que, somados, chegam a 59 bilhões de reais. É o auge da operação policial até aqui — quando atingir o flanco político, em Brasília, especula-se que pelo menos setenta políticos cairão na rede _____________________________________ 4# ECONOMIA 2.11.14 ABUSO 3 X 1 CORRUÇÃO Para cada real roubado, a Petrobras perdeu três para o intervencionismo. MARCELO SAKATE Os bilhões de reais subtraídos da Petrobras no caso do petrolão abalaram as suas finanças e a levaram ao constrangimento de não divulgar o seu balanço financeiro. As perdas estimadas atà© aqui poderão chegar a 20 bilhões de reais. O prejuízo da maior empresa do país com o seu uso político pelo governo Dilma Rousseff, entretanto, supera, em muito, o valor desviado pela gangue capturada na Operação Lava-Jato. O principal fator de destruiçà£o de riqueza se dá na política para o preço dos combustíveis. Para evitar que a inflação estoure o teto da meta oficial, uma vez que não quis combatê-la, o governo decidiu segurar os reajustes da gasolina e do diesel. A Petrobras é obrigada a amargar um prejuízo bilionário com a venda de combustível a preà§os interiores aos pagos para importá-lo, dado que a produçà£o nacional é insuficiente. As perdas acumuladas com a operação de abastecimento da Petrobras chegavam a 60 bilhões de reais até junho passado — o triplo do que foi desviado. Trata-se da metade do que a empresa arrecadou com a venda de ações no fim de 2010, com o objetivo de se capitalizar para bancar a exploração do pré-sal. Como resultado da política de usar a estatal para os propósitos do governo, e nà£o para remunerar os seus acionistas, a companhia deixou de atrair a atenção dos investidores. O seu valor de mercado desabou 59% desde o início do governo de Dilma Rousseff, uma perda de 226 bilhões de reais (veja o quadro abaixo). Medida em dólares, a desvalorização das ações foi ainda mais acentuada, superando 70%. No mesmo período, o valor de mercado da americana Exxon cresceu 10%, e o da anglo-holandesa Shell avançou 13%. Na análise do mercado brasileiro, o desempenho da Petrobras encontra respaldo em outras estatais, também vítimas da interferência nociva do governo. A Eletrobras deve encerrar 2014 com prejuízo pelo terceiro ano seguido e corre o risco de não distribuir dividendos aos seus acionistas, algo inédito, porque a sua reserva está no fim. As dificuldades operacionais e financeiras se agravaram há dois anos. A estatal foi a mais prejudicada pela decisão federal de renegociar os contratos de energia no fim de 2012. A medida resultou em uma perda contábil de 10 bilhões de reais. Depois, impactou a sua receita em decorrência da tarifa mais baixa. Mais recentemente, a estatal tem perdido dinheiro com o baixo nível dos reservatórios de usinas hidrelétricas. Como a geração está aquém do previsto, a Eletrobras é obrigada a adquirir energia no mercado à vista, a valores elevados, para honrar os seus contratos de entrega a consumidores. Nos nove primeiros meses deste ano, essa despesa totalizou 6,8 bilhões de reais. Os bancos públicos também têm sido submetidos a interferências que afetam os seus resultados, como fica evidente quando se compara o desempenho das ações do Banco do Brasil com o dos papéis dos maiores bancos privados. "Trata-se do modelo mental do atual governo. O Estado sabe tudo, pode tudo", resume Sérgio Lazzarini, professor do Insper e autor do livro Capitalismo de Laços. "A lição é que usar as estatais para controlar preços não funciona. Você quebra a estatal e não resolve o problema porque é muito difícil remar contra forças de mercado. O melhor é criar um ambiente de regras estáveis que permita que as empresas invistam e aumentem a eficiência ao longo do tempo." A DILAPIDAÇÃO DAS ESTATAIS As intervenções feitas por Dilma e sua equipe arruinaram o valor de mercado das empresas controladas pelo governo (em bilhões de reais) EMPRESAS PRIVADAS ambev 2010 157 2014 245 Variação +62% Itaú 2010 180 2014 184 Variação +2% Bradesco 2010 123 2014 147 Variação +20% ESTATAIS Banco do Brasil 2010 90 2014 73 Variação -19% Eletrobras 2010 25 2014 8 Variação -68% Petrobras 2010 380 2014 154 Variação -59% 226 bilhões de reais foi a perda total da Petrobras A desvalorização equivale a 84 VEZES o valor das Lojas Marisa 23 VEZES o valor da Via Varejo 13 VEZES o valor da Embraer 8 VEZES o valor do Pão de Açúcar Fonte: mercado ________________________________________ 5# INTERNACIONAL 26.11.14 5#1 ELE SACOU PRIMEIRO 5#2 POR QUE NINGUÉM MAIS SE IMPORTA? 5#1 ELE SACOU PRIMEIRO No duelo com o Congresso, Barack Obama anistia por decreto 5 milhões de imigrantes ilegais e agora espera chumbo. FELIPE CARNEIRO Nos dois últimos anos de seu governo, o ex-presidente republicano George W. Bush, que foi sucedido em 2009 pelo democrata Barack Obama, atual ocupante do cargo, enfrentou um Congresso dominado pela oposição. Ele soube negociar com os parlamentares do Partido Democrata e, juntos, mudaram a estratégia na Guerra do Iraque e aprovaram os resgates ao sistema financeiro americano durante a crise de 2008. Agora, Obama se encontra na mesma situação, mas está agindo de outra forma. No início de novembro, o seu partido foi derrotado nas eleições de meio de mandato. Na mesma noite em que foi anunciado o resultado do pleito, o presidente avisou que, caso a oposição não aprovasse uma reforma nas leis de imigração até o fim do ano, ele a faria na marra. Para tornar a situação dos estrangeiros sem visto "mais humana", ele usaria as ordens executivas, similares às medidas provisórias do Brasil. Foi o que Obama acabou de fato fazendo na quinta-feira passada, ao divulgar um plano para beneficiar 5 milhões de um total de 11 milhões de imigrantes clandestinos, impedindo que eles sejam deportados. A opção pelo confronto foi proposital. Quando o conteúdo das medidas já era ventilado nos jornais, o líder republicano do Senado, Mitch McConnell, convocou a resistência, dizendo: "Caso o presidente Obama desafie o povo americano e imponha sua vontade ao país, o Congresso vai agir". Há várias táticas em estudo. A primeira é impedir que o orçamento de 2015 contemple as agências e os programas necessários para a implementação das medidas de Obama, o que pode ocorrer em dezembro. A segunda é formular, no próximo ano, uma reforma de imigração que entre em conflito com as ideias do presidente. A terceira é vetar qualquer tentativa democrata de passar uma lei. Fora das rixas partidárias, existe certo consenso de que as leis de imigração americanas caducaram e precisam ser aprimoradas. Três em cada quatro americanos apoiam a criação de um caminho para que os estrangeiros legalizem sua situação, desde que nà£o sejam uma ameaça à segurança e paguem os impostos. As medidas tomadas por Obama se encaixam na vontade popular. Ele aumentou o orçamento da vigilância na fronteira, facilitou a entrada de empreendedores e cientistas e ampliou, a imigrantes que moram há mais de cinco anos no país e não têm antecedentes criminais, o direito de pleitear um visto de residência. Pais que têm filhos americanos ou com residência permanente ficarão livres de deportaçà£o e terão autorização para trabalhar. O problema foi a maneira que Obama escolheu para fazer essas mudanças. Quase metade dos americanos (48%) é contra o uso de decreto para resolver a pendenga da imigração. Apenas 38% são a favor. Ainda que os republicanos tenham se mostrado reticentes em discutir a questão antes, Obama tampouco tem se inclinado à chamada pequena política, o processo de sedução de congressistas que costuma envolver partidas de golfe e drinques na Casa Branca. Sua opção tem sido sempre reclamar do Congresso na imprensa e ameaçar governar por decreto, o que acabou por cumprir. O que ele pretende com isso é incerto. Obama pode estar cortejando os votos dos latinos, que foram decisivos na sua reeleição. Ou então está tentando se eximir da responsabilidade pela ociosidade do seu governo. "O decreto me parece mais uma maneira de jogar a culpa pela paralisação de Washington nos dois últimos anos para cima dos republicanos", diz o cientista polà­tico americano William Stewart, da Universidade do Alabama. Sem conversa, os próximos dois anos não serão nada produtivos em Washington. 5#2 POR QUE NINGUÉM MAIS SE IMPORTA? Tratar a escravização de mulheres e as decapitações pelo Estado Islâmico como fatos distantes ou isolados é um erro. à‰ preciso indignação para combatê-los. DUDA TEIXEIRA Dezoito homens algemados e de uniforme azul são escoltados em fila por um grupo de combatentes com roupa camuflada e gorro preto, com diferentes tamanhos de barba. Enquanto conduzem os reféns pela gola da blusa, pegam uma faca em uma caixa de madeira. Os prisioneiros são colocados em uma fileira, sob a mira de várias câmeras. A imagem capta lentamente o movimento de um piscar de olhos ou de uma mão brincando com a lâmina de uma faca, como em um thriller do cineasta chinês John Woo. Em seguida, a selvageria começa. Os terroristas apoiam os joelhos sobre as costas das vítimas indefesas, cortam sua garganta e arrancam sua cabeça. Os decapitados eram soldados do governo do ditador sà­rio Bashar Assad, em sua maioria da seita alauita ou cristãos. A filmagem e a edição do vídeo são, claramente, o trabalho de um ou mais profissionais. O discurso é raso, e o propósito à© propagandístico. O filme foi feito e divulgado na internet pelo grupo terrorista Estado Islâmico, que controla regiões da Síria e do Iraque, na semana passada. O objetivo é projetar um poder militar muito além da realidade e espalhar o terror pelo resto do mundo. "Vamos fazer o mesmo nas ruas de sua cidade", diz um assassino mascarado no vídeo. Em outros tempos, cenas como essas levariam cidadãos dos países civilizados a protestar publicamente, exigindo do governo uma ação para dar fim à barbárie. Não é o que se vê. Por que ninguém mais se importa? Desde que apareceram para o mundo, em meados do ano passado, os terroristas do Estado Islâmico, inicialmente conhecidos como Isis, já sequestraram e escravizaram meninas, tentaram exterminar minorias religiosas e executaram milhares de homens. Sem nenhum medo de retaliação, eles ainda põem evidências de seus crimes na internet. Foi com relutância que algumas dezenas de países aceitaram se unir, sob a liderança dos Estados Unidos, para combater o grupo com aviões. A indiferença provocada pela profusão de imagens desse tipo é parte da resposta. O Estado Islâmico aprendeu com a Al Qaeda, grupo do qual é uma dissidência, que uma ação terrorista tem de ser espetacular para ter impacto. Desde que o jornalista americano Daniel Pearl foi decapitado no Paquistão, em 2002, porém, cenas de jihadistas cortando a cabeça de reféns tornaram-se corriqueiras, banais. Outro fator é a defesa psicológica de quem porventura assiste a essas imagens. Diante de algo absurdo e assustador, a saída é considerar aquilo que se viu como uma anomalia que só existe nos confins do Oriente Médio. A formação dessa autodefesa mental é endossada pela crença de que a humanidade evoluiu ao longo dos séculos, deixando crueldades como decapitações, torturas e escravidão para trà¡s. As provas disso estariam principalmente na ciência e na tecnologia, que permitem um padrão de vida muito maior e pacífico do que o de outros séculos. Essa fé é partilhada tanto por liberais, para os quais o capitalismo e a democracia são um sinal claro de civilização, como por ideólogos de esquerda, que acreditam caminhar rumo à justiça e à igualdade. Para desconforto geral, há os que contestam essa ideia. "A ciência e a tecnologia são cumulativas, enquanto ética e política lidam com dilemas repetitivos", escreve o inglês John Gray, em seu livro The Silence of Animais (O Silêncio dos Animais), de 2013. "A tortura e a escravidão são males universais, e não estão restritas ao passado como certas teorias supérfluas da ciência. Elas voltam com diferentes nomes", completa Gray. A tortura virou técnica aprimorada de interrogatório. A escravidão, o tráfico de pessoas. A civilização não livrou a humanidade de seu barbarismo atávico. Pousar uma sonda em um cometa não deixou a espécie humana mais humana. Se os vídeos do Estado Islâmico provocam repulsa ou indiferenà§a na maioria das pessoas, em outras despertam deleite. Entre os barbudos com roupa camuflada do vídeo, havia dois franceses e um inglês. Poderiam ser brasileiros, por que não? Negar para si mesmo essa realidade pode garantir uma boa noite de sono. A contrapartida dessa indiferenà§a é dar mais força aos piores tipos de sanguinários. ________________________________________ 6# GERAL 26.11.14 6#1 GENTE 6#2 ESPAÇO – AS PRIMEIRAS NOTÍCIAS DO COMETA 6#3 MEMÓRIA – ENTRE O CORAÇÃO E A RAZÃO 6#4 MEMÓRIA – OS SEGREDOS DE “DEUS†6#5 TECNOLOGIA – QUEM VÊ CUIDA 6#6 HISTÓRIA – PERÓN, 68 ANOS; NELLY, 14 6#7 OLIMPÍADA – LIÇÕES PARA DIRIGIR BEM 6#8 MEDICINA – A GENÉTICA DO SERTÃO 6#1 GENTE JULIANA LINHARES. Com Daniella De Caprio e Thais Botelho SE ELA DANÇA, TODO MUNDO DANÇA A atriz CAROL CASTRO virou uma especialista em Dança dos Famosos. Além de ter sido a vitoriosa do quadro no ano passado, neste, ao lado de Fausto Silva, faz apartes na apresentação dos casais concorrentes. De tão envolvida com o gingado, contratou um dos professores do programa para dar aulas particulares de dança de salão, em sua casa, para ela e o marido. "Ele leva uma bailarina, nós empurramos os mà³veis da sala e nos divertimos muito", conta Carol. Com o fim do quadro, no próximo dia 30, ela estreará em 2015 um longa-metragem, em que interpreta uma secretária de Segurança Pública do Rio. "Fiz treinamento com policiais e, pela primeira vez, peguei em armas de fogo", diz a atriz, que mostra outro tipo delas, longas, perigosas e matadoras, na revista VIP. PRINCIPEZINHOS NA BARRIGA Parecia que nunca aconteceria, mas o trono monegasco enfim vê a linha direta de sucessão garantida. Esperados para perto do Natal, os filhos gêmeos dos príncipes ALBERT e CHARLENE farão parte da nova geração de futuros coroados, ao lado dos herdeiros de Kate, na Inglaterra, e de Letizia, na Espanha. No caso de gêmeos, a coroa està¡ destinada ao que nascer alguns minutos antes, mas o sistema sucessà³rio é tradicional: um filho homem tem precedência. Mesmo preterida, uma pequena princesa terá direito às prerrogativas das mulheres da família: uma linhagem de beleza que começa com ninguà©m menos que Grace Kelly, namoros tempestuosos, filhos antes e depois do casamento — se a brava mamãe Charlene não fechar o tempo. NA BOCA DO CAIXA Até quatro anos atrás, DANIELA BRAGA, 22, era caixa de uma farmácia em São Paulo e, com o salário de 600 reais, pagava a faculdade e ajudava o pai, pedreiro, a manter a família. O corpo esbelto e interminável — 1,82 metro de altura — e os lábios, com uma saliência superior poucas vezes vista na natureza, rendiam-lhe ofertas de trabalho como modelo, ali mesmo, na boca do caixa. Um dia, ela topou. Com apenas seis meses de experiência, foi mandada para Nova York. "Até hoje, eu me viro no inglês com um aplicativo de celular e uma gramática na bolsa", diz Daniela, que vai participar do desfile-show da marca de lingerie que pode lançar modelos para outra dimensão. O que acha de dividir a passarela com Adriana Lima e Alessandra Ambrosio? "A diferença é que sou mais jovem, minha energia é de novata", responde. PAPAI SABE NADA Venerado como o pai de família sábio e divertido que interpretava na televisão, o comediante BILL COSBY chegou aos 77 anos como uma raridade: casado com a mesma mulher, CAMILLE HANKS, sem falar palavrões para se destacar como comediante e prestes a estrear mais uma série em que faria o papel de si próprio. Só que esse papel, ensombrecido por acusações de abuso sexual feitas em 2005, naufragou com uma renovada denúncia de estupro. Uma ex-atriz afirmou que foi drogada e violentada quando discutia oportunidades de carreira num jantar na casa de Cosby. Exatamente o mesmo método foi descrito por JANICE DICKINSON, aspirante a cantora e ex-modelo que depois ficou conhecida pelas intervenções estéticas exageradas. Ela atribui ao episódio seus impulsos autodestrutívos. Foi a quinta mulher a aparecer. A carreira de Cosby não será relançada. 6#2 ESPAÇO – AS PRIMEIRAS NOTÍCIAS DO COMETA Dados do robô estacionado no corpo celeste, a 516 milhões de quilômetros, indicam que a missão Rosetta pode sim, elucidar parte do enigma da existência da vida. FILIPE VILICIC E RAQUEL BEER Não foi fácil a aterrissagem do Philae no cometa 67P/Churyumov- Gerasimenko, o Chury. Na semana passada, a ESA, a agência espacial europeia, divulgou detalhes da situação em que se encontra a missão Rosetta. Os problemas começaram quando o módulo se desprendeu da nave-mãe. Eram três os mecanismos de pouso: jatos de hidrogênio para o impulso inicial; dois arpões para fixar no solo; e um sistema de parafusos que auxiliaria a prendê-lo. Apenas o último funcionou. A falha, associada à baixa gravidade (o Philae pesa um mísero grama quando apoiado no cometa), fez o módulo quicar duas vezes antes de aterrissar e parar a 1 quilômetro do local planejado, embaixo de um penhasco, com parco acesso à luz solar, sua fonte de energia. A má notícia: a bateria acabou em três dias. A boa: o que ele coletou nesse curto período justificou o investimento de 1,75 bilhão de dólares e as duas décadas de trabalho dos 2000 cientistas do projeto. A ESA anunciou os primeiros resultados com cautela. Afinal, talvez eles sejam bombásticos, com o poder de redefinir a indagação fundamental, "de onde viemos?", mas também há a chance de só confirmarem informações pouco relevantes. Foram dois os achados do Philae: moléculas orgânicas, detectadas na rala atmosfera, e à¡gua, em formato de vapor e gelo (veja abaixo). São elementos essenciais para o surgimento e a manutenção da vida na Terra. O que falta checar é o tipo de substâncias encontradas, pois há à¡gua e biomoléculas em abundância pelo universo. Das moléculas, se forem simples, a exemplo do metano, já se sabia de sua existência em cometas. Se forem complexas, como aminoácidos, o impacto será outro. Estes são conhecidos como "tijolos da vida", pelo papel na origem dos seres vivos, e indicariam que um dos elementos que levaram à nossa existência pode ter sido depositado na Terra por cometas. Os cientistas do projeto Rosetta já intuem as respostas a essas questões, e tudo indica que devemos nossa existência ao que os cometas trouxeram. À espera da publicação dos resultados em revistas especializadas, Gerhard Schwehm, físico da missão Rosetta, disse a VEJA: "Só confirmo que conseguimos informações significativas em relação a nossos maiores objetivos: pesquisar se a água e a vida terrestres vieram de cometas; e compreender melhor esses corpos celestes, que em nada mudaram desde que surgiram, há bilhàµes de anos, para assim entender o sistema solar". Mesmo se os dados nà£o corresponderem às melhores expectativas, há esperança. O Philae deve voltar a funcionar em até três meses, quando o Chury se aproximará do Sol, o que permitirá a captação de energia solar, e a ESA tentará reativar equipamentos para estudar o cometa. "Consideramos desde já que a missão foi um sucesso", afirmou Schwehm. "O feito inédito da aterrissagem é extraordinário e influenciará novas missões espaciais." OS ACHADOS DO PHILAE Em apenas três dias de trabalho, a primeira máquina a pousar em um cometa fez descobertas que podem nos ajudar a compreender a origem da vida. 1- MOLÉCULAS ORGÂNICAS: Substâncias que contêm carbono, normalmente encontradas em seres vivos, o que leva a crer que foram essenciais para o surgimento da vida. Que podem ser: AMINOÁCIDOS - Moléculas complexas, constituídas principalmente de carbono, hidrogênio, oxigênio e nitrogénio (ligadas a outros elementos). Qual a relevância do achado: Enorme MOLÉCULAS SIMPLES - Como gás metano (um dos mais comuns dos hidrocarbonetos e de cuja presença em cometas já se sabia), que tem em sua fórmula um átomo de carbono e quatro de hidrogênio. Qual a relevância do achado: Mínima A melhor notícia Se for um aminoácido. será preciso verificar se ele é de um de dois tipos possíveis: o conhecido como "canhoto", cuja estrutura química (a disposição de seus átomos) é da esquerda para a direita: ou o "destro", com a composição disposta de maneira inversa, como se fosse a imagem no espelho do primeiro. O da Terra à© o "canhoto" Isso significaria que: um aminoácido "canhoto" indicaria a possibilidade de os cometas, que colidiam com frequência com nosso planeta hà¡ 4 bilhões de anos. terem depositado na Terra (e espalhado pelo universo) um dos ingredientes essenciais para a formação da vida. 2- GELO E VAPOR: Sabe-se há muito que cometas são formados por gelo, mas é inédita a oportunidade de analisar se sua água tem a mesma composição química daquela existente na Terra. Que podem ter: ÁGUA COMO A MAIOR PARTE DA QUE HÁ NA TERRA - Formada por átomos de oxigênio com oito prótons e nêutrons no núcleo e hidrogênio com um próton e nenhum nêutron. Qual a relevância do achado: Enorme OU ÁGUA DE UM TIPO MAIS RARO NA TERRA - Composta de oxigênio com oito prótons e dez nêutrons e deutério, conhecido como hidrogénio pesado, com um próton e um nêutron. Qual a relevância do achado: Mínima A melhor notícia Seria a certificação de que a maioria das moléculas de H2O do cometa é igual à maior parte das que existem na Terra. Isso significaria que: cometas que se chocaram com o planeta há bilhões de anos podem ter abastecido de água oceanos, nos lagos. Fontes: o cientista molecular Douglas Galante, do Laboratório de Lux-Sincrotom, o químico Fábio Rodrigues, da Universidade de São Paulo, e o físico Gehard Schwehm, da missão Rosetta6. 6#3 MEMÓRIA – ENTRE O CORAÇÃO E A RAZÃO Na manhã de 22 de setembro, ao chegar ao Hospital do Coração (HCor), em São Paulo, do qual era diretor-geral, o cardiologista Adib Jatene sentiu uma forte dor no peito. Sem titubear, sentou-se na cadeira de rodas elétrica, sempre ali, à sua disposição, e foi para a unidade de terapia intensiva (UTI). "Estou passando mal", anunciou, pálido, aos intensivistas de plantão. Jatene havia sofrido um infarto — obstrução da artéria descendente anterior, ramo da coronária esquerda e uma das principais fontes de irrigação sanguínea do coração. Depois de algumas idas e vindas ao hospital, morreu em 14 de novembro, aos 85 anos. A autointernação de Jatene foi a derradeira demonstração de como enfrentava as situações de extrema tensão com tranquilidade — decorrente do domínio profundo de sua atividade, pela qual era respeitado mundialmente. Nos anos 50, Jatene criou o primeiro coração-pulmão do Hospital das Clínicas. Em 1968, realizou a primeira cirurgia de ponte de safena no Brasil. Na década de 70, inventou uma técnica de correção de artérias infantis, hoje conhecida no mundo todo como "cirurgia de Jatene". Tinha no currículo 20.000 operações de coração. Entre seus pares, era considerado um sábio. "Trinta segundos com o professor correspondiam a anos e anos de pesquisa", decretou Roberto Kalil Filho, diretor da divisão de cardiologia clínica do Incor e diretor do Centro de Cardiologia do Hospital Sírio-Libanês de São Paulo. Sem nunca abandonar as atividades médicas, Jatene, em 1992, ocupou o cargo de ministro da Saúde do governo Collor, posto que voltaria a ocupar em 1995 com Fernando Henrique Cardoso. Durante seu segundo mandato, foi o principal articulador da CPMF, o "imposto do cheque". ADRIANA DIAS LOPES 6#4 MEMÓRIA – OS SEGREDOS DE “DEUS†“Um caso tem de dar pão ou dar glória. Se der os dois, melhor." - Márcio Thomaz Bastos “Deus", ou melhor, "God". Era como se referiam a Márcio Thomaz Bastos muitos de seus colegas e seus muitos discípulos. Maior criminalista da sua geração, ele formou a elite da advocacia nacional e ajudou a dar ao Judiciário os contornos que tem hoje. Só para o Supremo Tribunal Federal — ele dizia e era verdade — "nomeou" seis ministros (dos quais apenas Cármem Lúcia e Ricardo Lewandowski estão na ativa). Mas foi como ministro da Justiça do governo Lula, o mais longevo no cargo desde a redemocratização, que "God" mais exercitou seus poderes. Graças a ele, por exemplo, a Polícia Federal é o que é hoje, atuante e independente. Mas também foi graças a ele que o PT pôde se agarrar à tese do caixa dois — que, se não serviu para livrar os mensaleiros da cadeia, cumpriu a estratégica missão de evitar, por prazo suficiente, que se colasse o carimbo de corrupto na testa do governo, ou melhor, na de Lula. Do ex-presidente da República, o advogado foi, além de ministro, conselheiro e arguto observador. "O que eu ouvi hoje vai para o diário." A frase servia para indicar que era alta a temperatura dos acontecimentos presenciados naquele dia. "O diário" foi escrito entre 2003 e 2007. Seus dezessete volumes estão guardados em um cofre e, por ordem do autor, só poderão ser publicados cinquenta anos depois de sua morte. Nascido em Cruzeiro (SP), Bastos teve uma breve carreira política como vereador pelo partido de Adhemar de Barros. Da tribuna da Câmara cruzeirense, chegou a defender o golpe de 1964. Nos anos 80, como presidente da OAB-SP, foi um dos líderes das Diretas Já. Mais tarde, ficou rico com uma clientela heterogênea, que ia do líder seringueiro Chico Mendes ao médico Roger Abdelmassih e ao bicheiro Carlos Cachoeira. Sempre que lhe perguntavam por que aceitava defender assassinos, estupradores e corruptos, ele citava a frase do advogado americano Edward Bennett Williams: "Defendo meus clientes da culpa legal. Julgamentos morais eu deixo para a majestosa vingança de Deus". Bastos morreu no dia 20, aos 79 anos, de complicações pulmonares. 6#5 TECNOLOGIA – QUEM VÊ CUIDA Ao mapear Fernando de Noronha, inclusive no fundo do mar, o Google expande para o Brasil seu ambicioso projeto de mostrar a todos tudo o que há na Terra. De quebra, ainda forma um banco de dados decisivo para a conservação do o arquipélago brasileiro. RAQUEL BEER O Brasil concentra a mais rica biodiversidade do planeta, e o arquipélago pernambucano de Fernando de Noronha é um dos maiores sà­mbolos da variedade e da beleza de nossa flora e fauna. Mas são poucos os que têm contato com essa porção do país. Noronha recebe apenas 250 visitantes por dia, sob estrito controle ambiental. Como não é permitido construir novas pousadas, os quartos que existem são caríssimos. "Limitar o acesso traz um evidente aspecto positivo para a preservação", afirma o engenheiro florestal Ricardo Araújo, chefe do Parque Nacional de Fernando de Noronha. "Mas fica difícil convencer quem não vê a rica natureza de que é necessário conservá-la." Está aí a principal motivação da parceria firmada entre o Instituto Chico Mendes de Conservaà§ão da Biodiversidade (ICMBio), responsável por administrar os parques nacionais, e o Google para criar uma versão on-line da ilha no popular serviço Street View. Por uma semana, VEJA acompanhou o trabalho da equipe do Google ao registrar cada pedacinho de Noronha e, em um feito extraordinário, também vastas regiões submarinas. As imagens em 360 graus construirão um mapa digital acessível a todos a partir do início do ano que vem. Então, qualquer um poderá ver, compreender e cuidar da bela biodiversidade de Noronha. O Google criou dois braços de seu site Street View para a digitalização de reservas e parques naturais: o Parks (que abrange à¡reas continentais) e o Oceans (de submarinas). Com Noronha e o Atol das Rocas (reserva ecológica nas proximidades do arquipélago), jà¡ são treze as regiões do tipo gravadas por suas câmeras. Na lista há, por exemplo, Galápagos, no Equador, e a ameaçadíssima Grande Barreira de Corais da Austrália (veja o quadro na pág. 98). No Brasil, a empresa pretende expandir o mapeamento para todos os parques nacionais, inclusive na Amazônia. O projeto de Noronha é pioneiro em três aspectos. Além de ser o primeiro território brasileiro da lista, nunca foi feito um mapa subaquático do arquipélago e também é a primeira vez que o Google usa bugues (a única forma de trafegar por parte do terreno). Noronha é, hoje, um ambiente bem protegido, sobretudo para os pobres padrões brasileiros de conservação — que levaram ao vergonhoso aumento do desmatamento na Amazônia entre 2012 e 2014. Só que por dois séculos sofreu com a destrutiva mão humana. Primeiro, ao abrigar uma prisão; depois, serviu de base para os Estados Unidos na II Guerra Mundial e durante a Guerra Fria. Por todo esse perà­odo, nem a pesca nem o desmatamento eram regulados. Só em 1988, depois do fim da ditadura, Noronha foi tirada do gerenciamento de militares e virou um parque nacional. De lá para cá, projetos ecológicos recuperaram, com resultados louváveis, a flora e a fauna, que inclui espécies endêmicas, como o passarinho juruviara-de-noronha, e ameaçadas, a exemplo do tubarão-limão. Nas últimas décadas, porém, os esforços conservacionistas esbarraram em uma limitação técnica. Pelos anos de descaso, ainda é falho o acompanhamento da evolução da fauna, principalmente a marinha. Órgãos ambientais não têm acervos de fotos e vídeos que mostrem a evolução do ecossistema subaquático de Noronha ao longo dos anos. Os registros mais ricos que existem vêm de imagens feitas por mergulhadores recreativos, que nem foram organizadas, e de parcos documentários gravados por emissoras de TV. Não se sabe ao certo quais espécies marinhas estão ameaçadas no arquipélago. Mesmo com a rígida proteção atual, os animais continuam em risco por questões que muitas vezes fogem do controle da fiscalização local. Um exemplo são as mudanças climáticas que inegavelmente afetam o planeta e ameaçam a sobrevivência dos quinze tipos de coral da região e, logo, a manutenção de todo o ecossistema, dependente deles. "Nossas gravações servirão como base não só para ver Noronha hoje, mas também para acompanhar como as ilhas estarão em dez, vinte, trinta anos", diz o engenheiro gaúcho Tomas Nora, responsável pelas operações do Google Maps na América Latina. "Assim, veremos se a população de espécies do arquipélago aumentou ou diminuiu, o que serve de base para direcionar medidas de preservaà§ão." Como já faz com cidades do Street View, a empresa planeja atualizar de tempos em tempos as imagens de Noronha, e de todas as reservas e parques que constituem o Google Parks e o Oceans. No início deste ano, a companhia lançou uma ferramenta on-line, a Digital Timeline (em português, Linha do Tempo Digital), pela qual usuários acompanham o progresso das fotos em 360 graus feitas em regiões urbanas. Garante Nora: "O objetivo é expandir para as rurais e para o que chamamos de off-roads, categoria em que está Noronha". Não há, porém, tempo certo de atualização das imagens. Resta confiar na promessa. E por que é quase certo que ela será cumprida? O Google não faz o mapeamento apenas por bom-mocismo, é evidente. A ideia de mapear o mundo surgiu em 2001, como proposta de Larry Page, um dos fundadores da empresa. O projeto começou pela cidade de São Francisco, nos Estados Unidos, e hoje está em 63 países, além de partes do Ártico e da Antártica. Apesar de não existir faturamento direto com a iniciativa, é fácil detectar como ela atrai mais dinheiro para os cofres da companhia. Uma em cada cinco buscas feitas no google.com são ligadas à geolocalizaà§ão. São pesquisas como "Onde é o restaurante X" ou "Como ir de carro de São Paulo ao Rio de Janeiro". Ao atrair para seu site mais pessoas que estão atrás dos mapas, a empresa consegue aumentar a visualização de anúncios, sua principal fonte de receita. Não foi fácil, porém, colocar Noronha no radar do Google. Os cartógrafos modernos encararam dois desafios. O primeiro foi passar pela típica burocracia brasileira — levaram dois anos para conseguir as aprovações necessárias para dar gás à  iniciativa nos parques nacionais. O segundo foi superar a dificuldade de acesso do arquipélago. Para fotografar as ilhas, câmeras foram acopladas a carros, bugues, barcos (que fizeram fotos da costa) e mochilas de fotógrafos a pé. No mar, um mergulhador utilizou um aparelho à prova de água e que resiste à pressão de profundidades de até 30 metros (veja o quadro na pág. 96). "Viajo o planeta inteiro mergulhando, e estive em todas as gravações submarinas do Google. Mas nunca havia visto formações rochosas e peixes como os de Noronha", afirma o francês Christophe Bailhache, o principal mergulhador do projeto. Bailhache se espantou apenas com um ponto: encontrou poucos animais marinhos de grande porte, a exemplo de tubarões. Ao analisar o histórico da ilha, tradicionalmente rica nessas espécies, ele e sua equipe deduzem que alterações no ecossistema, tanto pela poluição humana quanto por fatores como o aquecimento global, já podem ter afetado a população desses animais (mal que, pela falta de acompanhamento, nunca foi adequadamente registrado). Por uma ótica abrangente, projetos como o do Google em Fernando de Noronha são essenciais como incentivo a uma atividade que sempre esteve no cerne da humanidade: a exploração. O homem moderno surgiu na África há quase 200.000 anos e de lá se expandiu pelo mundo (e, mais recentemente, pelo cosmo). Os desafios impostos durante nossa caminhada foram vencidos com base na inventividade. Motivados pela ambià§ão de conhecer tudo o que há, criamos mapas, carroças, bússolas, barcos, carros, o GPS, ônibus espaciais e sites de geolocalização. A evolução científica e cultural està¡ intrinsecamente ligada à superação de fronteiras. Como disse o químico inglês Humphry Davy, descobridor de uma série de elementos naturais com os quais hoje somos familiarizados (como o cà¡lcio): "Nada é tão perigoso para a mente quanto assumir que nossas visões estão concluídas e que não há novos mundos para conquistar". CARTÓGRAFOS DA ERA DIGITAL O Google adotou duas táticas para digitalizar a ilha de Fernando de Noronha. Fora da água, acoplou câmeras a mochilas, bugues, carros e barcos; no fundo do mar, um mergulhador levou o equipamento a 30 metros de profundidade. As câmeras em terra... Peso do equipamento: 20 quilos Quilômetros digitalizados em Noronha: 50 * Com o GPS embutido, captam-se as coordenadas de cada clique, para formar o mapa de navegação no site do Google. * Um acelerômetro — dispositivo que ajuda a estabilizar as imagens — elimina a influência das vibrações do carro, do bugue, do barco ou de tropeçadas do cameraman * O fotógrafo controla o aparelho com um smartphone * O aparelho tem quinze câmeras, que tiram fotos em alta resolução ao ritmo de uma a cada 2 segundos e meio (o que dá a sensaà§ão de 360 graus das imagens) * Após serem armazenadas nos servidores do Google, as imagens passam por um software que elimina das fotos a presença do fotógrafo e dos veículos de transporte, além de borrar o rosto de pessoas e as placas de carro ...e embaixo da água Peso: 65 quilos Quilômetros digitalizados em Noronha: 6 * Há três câmeras acopladas ao aparelho, todas com lentes de grande ângulo de visão que tiram fotos a cada 3 segundos, em resolução superior à das clicadas em terra * O GPS da câmera registra as coordenadas, a base para formar o mar subaquático * A haste protege fios que transmitem as informações entre a cà¢mera e o tablete * A estrutura à prova de água resiste a profundidades de 30 metros * No tablete, também à prova de água, o mergulhador ajusta as câmeras e confere as imagens capturadas * Um software congrega as imagens, o que confere a sensação de visão em 360 graus. A BELEZA QUE PODE DESAPARECER A Grande Barreira de Corais, um dos maiores símbolos da Austrà¡lia e a primeira área submarina a ser mapeada pelo projeto Google Oceans (responsável por digitalizar também o Arquipélago de Fernando de Noronha), foi reconhecida pela ONU como patrimônio da humanidade, status dado a lugares e construções únicos e de valor inestimável, há 33 anos. No ano que vem, porém, ela deve garantir seu nome em outra categoria, esta em nada gloriosa: a de patrimà´nios ameaçados. Isso porque, nas últimas três décadas, os corais australianos perderam metade de sua extensão e começaram a apresentar uma coloração mais esbranquiçada, indà­cio de queda na diversidade de nutrientes. O desastre põe em risco a sobrevivência de corais de 400 tipos e das 1500 espécies de peixes, baleias, golfinhos, tartarugas e pássaros que dependem deles. Isso levou a ONU a cogitar a inclusão da Grande Barreira na lista de ameaçados. Em meados de 2015 deve vir a confirmação do novo status da área, o que, no fim, pode ser até bom para a sua conservação — afinal, quanto mais evidente for a destruiçà£o da barreira, maior será a pressão para preservá-la. Das muitas causas da devastação da Grande Barreira, duas são mais relevantes. A mais fácil de resolver: a poluição. Pesticidas e outros poluentes utilizados em fazendas próximas à  costa são carregados pela chuva e pela maré até o recife. Para piorar, o governo australiano autorizou neste ano a dragagem de 3 metros cúbicos do leito marinho que abriga parte da barreira, devido à s contínuas obras de expansão dos portos. A ampliação da região portuária ainda permitirá que mais navios ancorem na costa, atalho para um efeito dominó danoso. Esses barcos devem aumentar, ainda mais, a exportação de carvão do país. A queima desse combustível, por sua vez, intensificará a emissão de gás carbónico (CO2) e, em decorrência, o aquecimento global que impacta o planeta. Isso leva à segunda causa, cuja solução ainda é enigmática: as mudanças climáticas que podem elevar a temperatura da Terra em até 4,8 graus no fim deste sà©culo. O fenômeno, cada vez mais preocupante, aquece e acidifica os oceanos, tornando-os ambientes hostis para os corais. A consequência fatal: a ameaça de 25% de toda a vida marinha, dependente dessas estruturas. 6#6 HISTÓRIA – PERÓN, 68 ANOS; NELLY, 14 As novas revelações sobre a relação entre o ex-presidente argentino e uma estudante secundarista um ano depois da morte de Evita mostram como o populismo se vale do autoengano do povo para tornar seus là­deres políticos imunes à lei e à moral. DUDA TEIXEIRA Em política, os argentinos são mestres na arte do autoengano. "Estamos ganhando", dizia uma manchete de jornal durante a Guerra das Malvinas, em 1982. O povo acreditou, ainda que os ingleses estivessem dando uma surra nos militares em alto-mar. A embromação suprema, contudo,é aquela que diz que o general Juan Domingo Perón (presidente em três ocasiões entre 1946 e 1974) foi um redentor, que ajudou pobres e trabalhadores e combateu os exploradores estrangeiros. Essa fábula ainda hoje é repetida pelos seus seguidores, que há 25 anos dominam a política na Argentina, exceto em breves intervalos. Nada mais falso. Perón destruiu a economia do país, fechou empresas, reduziu os empregos e fomentou disputas fratricidas. Outro fato que os peronistas preferem omitir é o seu relacionamento de um ano e meio com uma menina de 14 anos, Nélida Haydeé Rivas. Essa história andava um pouco esquecida até que, no mês passado, chegou às livrarias argentinas o livro Amor y Violência, de Juan Ovidio Zavala, com documentos e depoimentos inéditos de Nelly (apelido de Nélida). Após a morte da primeira-dama Evita, em 1952, um ministro, comovido com a tristeza de Perón, sugeriu criar a União das Estudantes Secundaristas (UES), sediada na Residência Oficial de Olivos, onde hoje vive a presidente Cristina Kirchner. As melhores alunas das escolas secundárias ganhavam permissão para frequentar a entidade. Um ônibus as pegava em Buenos Aires e as levava a esse local amplo e arborizado, onde participavam de competições e andavam de lambreta. "Era uma espécie de clube esportivo", relatou Nelly em uma das conversas com Zavala. Perón, de 58 anos, aparecia de vez em quando para observar as brincadeiras. Almoçava várias vezes com as meninas, que ficavam deslumbradas e tentavam chamar sua atenção. Ele era visto por elas como um deus. "Seria uma grande falsidade não reconhecer que cada uma de nós queria ser uma segunda Evita. Com a idade que tínhamos, ele alimentava nosso romantismo e nossas agitações corporais. Posso assegurar que não havia uma de nós que não as sentisse", relata Nelly. Quando se encontrou com Perón pela primeira vez em Olivos, Nelly nem sequer conseguiu balbuciar o seu nome. Depois, mais decidida, logrou empreender o que chamou de "comunicação direta". Em uma ocasião, ao lado dele, pediu uma casa para a família, que era pobre. Seu pai trabalhava em uma fábrica de chocolates e a mãe era caseira. Quando Perón lhe perguntou se sabia andar de lambreta, ela respondeu que só faria isso se ele a ensinasse. O presidente consentiu sorrindo e as aulas começaram no dia seguinte. Os pais dela ganharam uma casa pouco tempo depois. Em dezembro de 1953, todas as jovens frequentadoras de Olivos ganharam 500 pesos de presente, o equivalente a cinco vezes o salário mensal do pai de Nelly. "Perón era a lei, e era assim que ele comprava vontades", diz o historiador argentino Juan Battaleme, da Universidade de Buenos Aires. "Ainda hoje, fazer política na Argentina implica distribuir favores, sempre." Certa vez, em 1954, Nelly se juntou a outras meninas para visitar o Palácio Unzué, onde vivia Perón, para fuçar nos vestidos que tinham pertencido a Evita. Numa dessas visitas, o mordomo fez uma ligação para os pais de Nelly para dizer que ela estava resfriada e dormiria no palácio. Nelly, que era virgem, acomodou-se no quarto que pertencera a Evita e passou a viver ali. Durante os dias vazios, brincava com dois poodles da ex-primeira-dama, Monito e Tinolita. "Na quarta noite, eu me animei a propor ao general que víssemos televisão juntos", contou Nelly. Anos mais tarde, ela não ocultaria a ninguém que Perón foi seu primeiro homem na cama. O relacionamento tornou-se público quando o presidente decidiu levá-la a um festival de filmes na cidade balnearia de Mar del Plata, perto de Buenos Aires. Em 1955, Perón sofreu um golpe e se refugiou em um navio paraguaio, ancorado no Rio da Prata. Antes de partir para o exílio na Europa, mandou duas cartas a Nelly, em que se despedia com "um grande beijo de seu papi". Nunca mais se viram. Uma busca policial na casa de Nelly em 1955 encontrou objetos valiosos, incluindo jóias de Evita. Também foi achada uma licença para dirigir motocicletas, assinada por Juan Perón. O regime que se instalou iniciou um processo contra os pais de Nelly por participação em estupro. Segundo o código penal, esse era o crime que se cometia ao manter relações sexuais com uma menina com menos de 15 anos e mais de 12. O advogado que defendeu a família foi Juan Ovídio Zavala, o autor do livro, que entrevistou Nelly e guardou os documentos judiciais. Ela morreu pobre, em 2012. Zavala escreveu o livro para tentar fazer justiça a Nelly, que foi perseguida após a queda de Perón. O que ele revela é muito mais que isso. Sua obra acaba sendo um alerta para a manipulação da verdade em nome de um bem político maior. Quando isso acontece, até presidentes pedà³filos saem impunes. 6#7 OLIMPÍADA – LIÇÕES PARA DIRIGIR BEM DANIEL HAIDAR Formado em economia, mas com uma longa carreira no serviço público, o inglês Peter Hendy, 61 anos, comanda há quase uma década a Secretaria dos Transportes de Londres. Foi ele o responsável pela monumental operação de manter a cidade locomovendo-se sem grandes transtornos durante a Olimpíada de 2012. Previa-se um caos, mas a impressão geral é que tudo funcionou a contento — tanto que, segundo o próprio Hendy, as faixas exclusivas para a passagem de atletas e autoridades, obrigatórias no protocolo olímpico, pouco foram usadas. A chave do sucesso foi uma vastíssima campanha prévia de orientação do público (além, claro, de um transporte público já bastante eficiente). Nesta entrevista concedida no Rio de Janeiro, a próxima sede olímpica, Hendy — que, sim, vai trabalhar todo dia de ônibus, "o nº 24" — relata detalhes da sua vitoriosa maratona, pela qual foi agraciado pela rainha Elizabeth com o título de sir. JANELA DE OURO - Uma Olimpíada representa a grande chance de uma cidade concretizar obras vitais de infraestrutura que, de outro modo, não sairiam do papel. Isso porque é muito mais fácil obter financiamentos e tocar projetos quando existe um prazo bem definido e um motivador poderoso como os Jogos: seu palco se torna temporariamente a vitrine do mundo, em que tudo ganha alta visibilidade, e por isso é mais interessante investir. O redimensionamento do transporte público fica como legado, talvez o mais importante de todos. Cada lugar tem os próprios desafios. No Rio, ampliar o metrô, algo imprescindível, esbarra em grandes obstáculos topográficos, que devem ser (e acredito que serão) vencidos. Na minha estada, enfrentei congestionamentos, mas não vi nada que não fosse esperado em uma cidade latino-americana em fase de crescimento. Orquestrar um bom plano de transportes exige obediência religiosa ao cronograma. Nós conseguimos concluir nossas obras — novas linhas, novos trens, mais ônibus — um ano antes da Olimpíada, e as melhorias são sentidas até hoje. "SE O METRÔ ESTIVER CHEIO, VÁ TOMAR UMA CERVEJA" - Um dos aspectos mais bem-sucedidos dos preparativos londrinos para a Olimpíada foi manter uma comunicação permanente com a população. Primeiro cruzamos os dados dos compradores de passes do metrô, de ônibus e dos pedágios com os dos compradores de ingressos para as competições. Aí enviamos milhões de e-mails, tuítes e mensagens de texto, tanto ao público em geral quanto a estabelecimentos comerciais, explicando quando e onde os sistemas de transporte ficariam congestionados e pedindo que evitassem aqueles lugares, naqueles horários. O site do departamento fornecia informações atualizadas das alternativas. Falei até uma frase que me rendeu muitas críticas: "Se o metrô estiver muito cheio, vá tomar uma cerveja e espere esvaziar". Não parece razoável? O próprio prefeito Boris Johnson gravou uma mensagem, transmitida nos alto-falantes do metrô, recomendando que os usuários planejassem a viagem para evitar transtornos. Deu muito certo: durante a Olimpíada, mais de 30% dos moradores de Londres mudaram seu trajeto. E não é porque nossa população seja especialmente disciplinada, não. Quando há informação precisa e confiável, as pessoas param para ouvir. CENTRAL DE COMANDO - criamos em Londres uma Central de Transporte Olímpico, formada por nosso pessoal, junto com representantes dos governos, da polícia e do comitê organizador — umas quarenta pessoas ao todo. Claro que tivemos de acomodar interesses diversos, mas isso não se sobrepôs ao resto. Numa organização de dimensões olímpicas, se cada um impuser sua agenda particular, a coisa desandará. E sempre tive muito claro que o tempo deve ser usado a favor: nà£o deixamos para a última hora a necessária tarefa de fazer a manutenção da frota nem a de administrar as falhas do sistema, que acontecem o tempo todo. É o que já fazemos diariamente — afinal, Londres funciona, assim como o Rio, no limite da capacidade — mas de modo muito amplificado. Aprendi também que, numa Olimpà­ada, a palavra-chave é informação. Quanto mais organizada e compartilhada, melhor. No centro de operações, tinha a visà£o completa da cidade em tempo real. O Rio já tem algo parecido. OLHAR PARA TRÁS - A experiência da Copa do Mundo no Brasil foi boa e pode servir de espelho para a Olimpíada. Já os Jogos de Atlanta, de 1996, devem funcionar como contraexemplo: ali, convocados às pressas, sem planejamento nem treino, os motoristas de ônibus não sabiam sequer circular pela cidade, atrapalhando inclusive a locomoçà£o dos atletas. Estive em Pequim em 2008, mas não posso dizer que tirei muitas lições. Era tudo bem diferente, desde as esferas de decisão até o próprio transporte, com muita ênfase nas bicicletas. As autoridades brasileiras estiveram em Londres, observando o que fizemos. É essencial revisitar o passado, para evitar os mesmos erros e reprisar os acertos. TEMPO É TRANSPORTE - Congestionamentos roubam a produtividade das pessoas. Sem boa mobilidade urbana, a criação de riqueza se atrofia. Os congestionamentos custam 8% do produto interno bruto (PIB) da região metropolitana do Rio de Janeiro, o que é muito alto. Como as grandes cidades não têm espaço para acomodar os carros da populaà§ão inteira, o transporte público se torna fundamental. Hoje em dia, todas elas precisam de uma infraestrutura melhor de transportes, até as que iniciaram antes a expansão do sistema. Londres, por exemplo, tem um metrô muito antigo, que requer manutenção constante e clama por ampliação. O do Rio demanda expansão. Acontece que, na hora de conseguir recursos, o transporte tem de brigar com outras prioridades, como moradia, saúde, educação, e frequentemente fica para trás. DE CARRO, PAGA - Uma das medidas mais controvertidas que tomamos foi implantar o pedágio urbano no centro de Londres — uma forma de, ao mesmo tempo, levantar dinheiro e diminuir a circulação de veículos em área crítica. Mas ela demanda, primeiro, a existência de transporte público eficiente, e, depois, de uma prefeitura decidida a resistir às pressões. Demorou, mas hoje ninguém em Londres discute sua eficiência. CARO, MAS BOM - Ouvi muitas vezes do prefeito Boris Johnson e dos que vieram antes dele: "Peter, você é a favor de tarifa cara". Sou mesmo, porque quero ter dinheiro para melhorar os transportes. Sei que é difícil aprovar esse tipo de coisa. É impopular, exige muita habilidade política. Por outro lado, uma cidade só tem condições de progredir se as pessoas puderem se encontrar, fazer negócios. E a tendência é elas se mudarem para mais longe, já que nà£o há lugar barato para viver no centro. Então gastamos quase 2 bilhões de libras por ano em investimentos no metrô, por exemplo. Os custos de operar um sistema público de transporte são sempre maiores que a receita. É um problema mundial. No mundo moderno, o subsídio para estudantes, idosos e deficientes é obrigatório. Tem de haver de onde tirar recursos. Que outro jeito senão aumentar as tarifas? 6#8 MEDICINA – A GENÉTICA DO SERTÃO A ocorrência de doenças genéticas raras em Monte Santo, na Bahia, pode ser explicada por uma das mais interessantes teorias neodarwinistas — a do "efeito fundador". ADRIANA DIAS LOPES, DE MONTE SANTO A roupa era a melhor do armário — camisa listrada de branco e preto e calça social cor de vinho. Nos pés, chinelos com tiras largas de couro. O roceiro José de Andrade Pereira pegou o filho Jorge nos braços e partiu do povoado em que morava com a família em direção ao posto de saúde mais próximo, a 6 quilômetros dali, na cidade de Monte Santo, no sertão baiano. Era um dia quente de 2004. Foram cinquenta minutos percorridos a pé na estrada de terra. O menino chorava muito. Jorge, então com 3 anos, tinha o tamanho de uma criança de 12 meses. Seus dedos eram curtos, os braços, gordos, e a cabeça, desproporcionalmente grande. Ao ver o menino, o médico não titubeou: "É uma doença desconhecida, volte para casa e sossegue". Pereira foi embora sem esboçar reação. Alguns dias depois, vendeu seu único bem, uma moto encostada fazia quase dez anos. Com o dinheiro, comprou passagens de ônibus para Salvador. Dessa vez, levou também o filho mais novo, Sidney, ainda bebê, mas que já dava sinais de que cresceria como o irmão. Da rodoviária, seguiu para o Hospital das Clínicas de Salvador, o único serviço de saúde na capital sobre o qual já ouvira falar. Quando viram as duas crianças, os especialistas ficaram impressionados. Estavam diante de uma doença genética raríssima, a mucopolissacaridose tipo VI. Com a incidência de um doente para 300.000 pessoas, o distúrbio afeta o desenvolvimento dos órgãos. Diante do espanto dos especialistas, Pereira quebrou o silêncio: "Tem mais menino e menina desse jeito por lá". A pedido dos médicos, ele levou outras crianças doentes como seus filhos para Salvador. Os exames genéticos confirmaram — todas eram portadoras do mesmo distàºrbio. "Tem ainda mais gente diferente", anunciou o roceiro. "Tem bastante mudinho e doente dos nervos..." Dez anos se passaram da romaria de Pereira. E a vida da população de Monte Santo nunca mais foi a mesma. "De imediato percebemos que tínhamos ali um incomparável celeiro de estudos", diz a coordenadora do serviço de genética do Hospital das Clínicas de Salvador, Angelina Acosta. Com o apoio de instituições como a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae), a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRS), Angelina e os profissionais que atenderam o roceiro formaram o Genà©tica do Sertão, um dos projetos mais interessantes e humanistas na recente história da medicina brasileira. As descobertas são surpreendentes. Com cerca de 20% dos habitantes de Monte Santo rastreados, foram documentados até agora dezoito distúrbios genéticos — com uma incidência muito superior à registrada na populaà§ão em geral. Um exemplo: a fenilcetonúria, definida pela incapacidade do organismo em metabolizar o aminoácido fenilalanina, que, sem tratamento, pode levar ao retardo mental, atinge uma pessoa em 18.000. Em Monte Santo, sua incidência é o triplo. Ou, então, a sà­ndrome de Treacher-Collins, caracterizada por deformidade no crânio e na face. No Brasil, entre 40.000 pessoas, uma é portadora do distúrbio. No sertão baiano, uma entre 8000. A prevalência de doenças genéticas raras em Monte Santoé extraordinária, mas não única. Já foi documentada cerca de uma centena de agrupamentos populacionais no mundo com altos índices de casos atípicos. Na Finlândia, por exemplo, hà¡ comunidades com cerca de dez distúrbios cada uma. Em Israel, uma única aldeia tem portadores de aproximadamente trinta afecções. A incidência de graves alterações genéticas pode ser resultado de um processo conhecido como "efeito fundador". Instituído nos anos 50 pelo biólogo alemão neodarwinista Ernst Mayr (1904-2005), pai da convergência da teoria da evolução de Darwin com as descobertas da genética, o conceito tem um axioma razoavelmente simples: "O estabelecimento de uma nova população por uns poucos fundadores originais (em um caso extremo, por apenas uma fêmea fertilizada) que contém somente uma pequena fração da variação genética total da população parental". Mayr constatou que descendentes de um grupo fundador têm, em muitos casos, variaà§ão genética reduzida. E, se nesse grupo há genes defeituosos, as mutações podem prevalecer. Ornitólogo por formaà§ão, durante anos Mayr coletou pássaros em Nova Guiné para estudos taxonômicos. Ele notou que as espécies que viviam isoladas em ilhas eram geneticamente semelhantes aos exemplares do continente. Diz o geneticista Salmo Raskin, diretor do Laboratório Genetika e integrante do Projeto Genoma Humano: "Para que genes de doenças raras resistam à seleção natural, é preciso que a comunidade possua também outras duas características — o isolamento e a consanguinidade". Em Israel, regiões com alta concentração de afecções genéticas surgiram com o isolamento, por questàµes religiosas, no século XIX, de uma família muçulmana vinda da Jordânia. Hoje, esse agrupamento conta com 9000 pessoas, em sua maioria parentes. Na Finlândia, onde os estudos sobre doenças raras em comunidades isoladas já estão mais bem estabelecidos, o efeito fundador está associado em grande parte às migrações internas, sobretudo no século XVI, quando a população fugia para o interior do país para escapar dos abusos tributários do rei Gustavo Vasa (1496-1560). Um corte para Monte Santo, que soa abrupto, mas não é, dada a perfeita adequação da cidade ao edifício neodarwinista de Mayr. Com 54.000 moradores, a cidade está no meio da caatinga. O acesso até lá é penoso. De Salvador, para percorrer os 373 quilômetros de estrada mal recapeada e cheia de curvas, demora-se, em mà©dia, seis horas de carro. Sete em cada dez habitantes do município vivem espalhados por 46 pequenos povoados da zona rural. A maioria sobrevive de plantações domésticas e da criação de cabras. Cerca de 30% dos moradores com mais de 10 anos não sabem ler nem escrever. Nas áreas isoladas, o índice de casamentos consanguíneos é altíssimo. Em Monte Santo, é de cerca de 15%. Na maior parte dos países, incluindo o Brasil, esse índice não chega a 3%. "A consanguinidade em si não causa as doenças genéticas", explica o fonoaudiólogo Danniel Dias da Silva, integrante da equipe do Genética do Sertão. A união entre parentes, ao aproximar duas pessoas da mesma família, que compartilham um DNA parecido e, consequentemente, os mesmos genes defeituosos, aumenta o risco de transmissão dessas mutações. A junção de duas cópias alteradas do mesmo gene (uma transmitida pelo pai e a outra pela mãe) desencadeia as doenças genéticas recessivas, as quais constituem 70% do total das identificadas em Monte Santo. Nesse caso, os pais não desenvolvem a doença. O filho, no entanto, tem 25% de risco de que isso ocorra, caso herde os genes defeituosos tanto da mãe quanto do pai. Quanto mais próximo for o parentesco entre o casal, mais semelhante é o genoma dos dois e, portanto, maior é a probabilidade de que possuam alterações nos mesmos genes. Entre primos em primeiro grau, essa ameaça é de 6% — o dobro da taxa entre cônjuges não aparentados. Para entender o alto índice de doenças genéticas em Monte Santo, é preciso também voltar à fundação da cidade, no século XVIII. Em 1775, frei Apolônio de Todi, italiano da Ordem dos Capuchinhos, passava pela região quando viu um morro muito parecido com o Monte Calvário, em Jerusalém. Convocou então os fiéis que o seguiam a fincar cruzes e construir capelas ao longo da subida, incluindo uma no topo. Com 2,8 quilômetros de altura, o monte atrai anualmente cerca de 100.000 pessoas de todo o país em busca de uma graça. Euclides da Cunha, em Os Sertões, o definiu como "o mais tosco e imponente templo da fé religiosa". São doentes, amparados por parentes, que sobem a pé ou de joelhos o caminho de pedras, entrecortado por 25 capelinhas, até a igreja empinada no topo do morro, o Santuário da Santa Cruz — uma construção arcaica e quente. No filme Deus e o Diabo na Terra do Sol, rodado por Glauber Rocha em 1964 em Monte Santo, o personagem Sebastião anuncia: "Esse é o caminho para levar ao céu a alma dos inocentes". As peregrinações, acreditam os especialistas, podem ter contribuído para a proliferação de doenças genéticas. "No início, quando as locomoções eram ainda mais precárias, os doentes e suas famílias acabavam ficando em Monte Santo", diz a bióloga Kiyoko Abe Sandes, coordenadora do grupo Genética do Sertão. No século XIX, Monte Santo foi quartel-general dos soldados governistas que atacaram a Canudos de Antônio Conselheiro. Entre 1896 e 1897, cerca de 5000 homens se fixaram na cidade. Não era incomum um único soldado engravidar mais de uma mulher. Com o fim da Guerra de Canudos, os soldados foram embora, mas as mulheres continuaram em Monte Santo, e seus descendentes contribuíram para a consanguinidade de mesmo pai. Hoje o grupo Genética do Sertão de Monte Santo é formado por dezoito profissionais de sete instituições. O término do trabalho está previsto para 2016 e não se limita ao mapeamento das doenças. A ideia é orientar os portadores de genes defeituosos sobre o controle dos sintomas — uma doença genética não tem cura. O bem maior a ser deixado em Monte Santo pelo projeto Genética do Sertão é a possibilidade de oferecer aos moradores conhecimento sobre sua condição — o que pode mudar o futuro de uma família e de uma população inteira. É a pequena cidade do sertão baiano ancorada, depois de meio século, na extraordinária hipótese de Ernst Mayr. MUCOPOLISSACARIDOSE TIPOIV Algumas crianças e adolescentes da família do roceiro José de Andrade Pereira, incluindo dois de seus três filhos, tem mucopolissacaridose tipo VI, doença rara que compromete o desenvolvimento dos à³rgãos. Os casamentos foram consanguíneos. Pereira foi o homem que, ao procurar ajuda médica para o primogênito, Jorge, deflagrou o projeto Genética do Sertão. O QUE É A DOENÇA: caracteriza-se pela dificuldade do organismo em degradar o mucopolissacarideo, molécula fundamental para o metabolismo celular. O acúmulo de mucopolissacarideos afeta o desenvolvimento e o funcionamento dos órgãos, sobretudo ossos, coração, baço e fígado. A doença é recessiva, ou seja, é preciso haver duas cópias do gene defeituoso (uma herdada do pai e a outra da mãe) para se manifestar. Incidência geral: 1 para 300.000 Incidência em Monte Santo: 1 para 5000 FENILCETONÚRIA Portadora de apenas uma cópia defeituosa do gene associado à doença, Roselia Lima de Almeida não sofre de fenilcetonúria. Edivan, seu filho, de 5 anos, tem o problema porque herdou a mutação tanto do lado materno como do paterno. Os pais de Edivan são primos em terceiro grau. Há pelo menos mais nove casos da doença nas duas famílias. O QUE É A DOENÇA: define-se pela incapacidade do organismo em metabolizar o aminoácido fenilalanina. O consumo do composto, presente na maioria dos alimentos proteicos, desencadeia problemas neuropsicomotores e pode levar à deficiência mental. A doença é recessiva. Ou seja, é preciso ter duas cópias do gene defeituoso (uma herdada do pai e a outra da mãe). Incidência geral: 1 para 18.000 Incidência em Monte Santo: 1 para 5500 TREACHER-COLLINS Emília Trindade transmitiu a doença para quatro de seus oito filhos. O distúrbio pode se manifestar de forma grave, como ocorreu com Daniela, ou leve, no caso de Gabriela, filhas de Emília. Como a doenà§a decorre de um gene dominante, o filho de um portador da mutaçà£o genética tem 50% de risco de ter o distúrbio. O QUE É A DOENÇA: seus portadores apresentam deformidades no crânio e na face, além de surdez. A doença está associada a centenas de mutações genéticas. O tipo de mutaçà£o encontrado em Monte Santo é raríssimo. Incidência geral: 1 para 40.000 Incidência em Monte Santo: 1 para 8000 MÚLTIPLAS DOENÇAS Os Peixinhos, sobrenome de família, simbolizam a história da cidade de Monte Santo. Dos vinte filhos de Maria e Isidoro, dez nasceram com doenças genéticas - cinco deles morreram nos primeiros meses de vida. Primos em primeiro grau, Maria e Isidoro moram com quatro filhos. Edvaldo tem deficiência mental e uma malformação no polegar; Indaci, deficiência mental; Gilberto, deformidade física; e José, deficiência mental e polidactilia (um dedo a mais). _______________________________________ 7# ARTES E ESPETÁCULOS 26.11.14 7#1 MÚSICA – O DIABO A QUATRO 7#2 ARTE – UMA LICENÇA POÉTICA 7#3 LIVROS – INFORTÚNIOS DE GUERRA E PAZ 7#4 VEJA RECOMENDA 7#5 OS LIVROS MAIS VENDIDOS 7#6 ROBERTO POMPEU DE TOLEDO – CARO GOLPISTA, 7#1 MÚSICA – O DIABO A QUATRO Destaque de um festival de música de câmara em São Paulo, o quarteto de cordas exige talento, disciplina — e traquejo nas relações entre os integrantes. SÉRGIO MARTINS Indagado por um jornalista, em 2000, sobre as razões de a Filarmônica de Berlim ter uma sonoridade única, o regente italiano Cláudio Abbado (1933-2014), então diretor artístico da orquestra, respondeu: "Nas horas de folga, eles se dedicam à música de câmara. Isso faz toda a diferença". Abbado não estava só fazendo média com seus músicos. As formações camerà­sticas permitem que os instrumentistas aprimorem o refinamento interpretativo e estreitem o companheirismo musical, na busca por um consenso criativo que, para variar, não é ditado por um maestro. Mas música de câmara não é apenas treino: algumas peças podem ser tão ou mais exigentes (e belas) que as maiores sinfonias. No universo dos pequenos grupos, entre duos, trios, quintetos, sextetos e afins, o quarteto de cordas é a joia da coroa. Enquanto certos ensembles (de percussão, por exemplo) só surgiram no modernismo do século XX, o repertório do quarteto vem sendo enriquecido pelos principais compositores desde o século XVIII. Trata-se de um formato enxuto — dois violinos, viola e violoncelo —, mas capaz de complexidades e sutilezas incomparáveis. É verdade que, em termos de popularidade, não há composição do gênero que possa competir com as missas de Bach ou as sinfonias de Beethoven. Mas os quartetos finais do mesmo Beethoven ou os seis quartetos de Bela Bartók estão, sem exagero, entre os maiores patrimônios musicais da humanidade (veja outras peças fundamentais do gênero na pág. 113). Ainda hoje, a composição e a execução de quartetos seguem em andamento molto agitato. Nesta semana, o Estado de São Paulo sedia um festival de música de câmara. Dos 44 eventos programados, dez serão recitais de quartetos de cordas. O vanguardista Kronos Quartet, o jovem Quarteto Lutoslaswki e o recém-formado Quarteto Carlos Gomes farão um panorama geral do gênero, com obras que vão do romântico Carlos Gomes e do impressionista Claude Debussy até Bryce Dessner e Amon Tobin, criadores vindos do universo do rock e do drum'n'bass. "Os quartetos de cordas são o Santo Graal da música", diz Marcin Markowicz. líder do Quarteto Lutoslawski. A invenção do quarteto de cordas é atribuída ao austríaco Joseph Haydn, que também ajudou a formatar as sinfonias. "Se Bach, nascido no século XVII, é o compositor do barroco, Haydn é o responsável pela música do século seguinte", decreta Marcelo Jaffé, violista do Quarteto de Cordas da Cidade. Consta que o austríaco chegou a esse que é talvez o gênero mais elegante da música erudita quase por acidente: encarregado, aos 18 anos, de criar música para entreter um nobre empregador, Haydn só dispunha de quatro instrumentistas — dois violinistas, um violista e um violoncelista. Discípulo de Haydn (e seu companheiro em um quarteto no qual tocava viola, enquanto o mestre assumia um dos violinos), Mozart foi um grande cultor do gênero, mais tarde revolucionado por Beethoven. O formato manteve-se vital na música moderna e de vanguarda — com algumas variações heterodoxas: o alemão Karlheinz Stockhausen compôs um absurdo Concerto para Quarteto de Cordas e Helicóptero, e o americano Steve Reich juntou o som do quarteto a manipulaçàµes eletrônicas e a gravações de anúncios em estaà§ões ferroviárias em Different Trains. O entrosamento dos quatro músicos é extenuante. "Para encontrar a sonoridade ideal, ensaia-se mais do que numa orquestra sinfônica", diz Cláudio Cruz, violinista do Carlos Gomes. A constância na formação é importante para a manutenção da sonoridade de cada grupo, mas trocas são inevitáveis. O americano Kronos Quartet mudou de violoncelista três vezes nos últimos quinze anos. "Mas, antes disso, mantivemos a formação original por 26 anos. Os Beatles duraram muito menos", diz o violinista David Harrington. Formado em 1947 por três sobreviventes de campos de concentração nazistas e um violoncelista inglês, o Quarteto Amadeus, famoso por magníficos registros integrais das peças de Beethoven e Brahms, foi constituído em torno de um pacto: encerraria as atividades assim que o primeiro músico saísse do grupo. E, de fato, o conjunto extinguiu-se em 1987, com a morte do violista Peter Schidlof. No Brasil, o Quarteto de Cordas da Cidade de São Paulo, fundado por Mário de Andrade, é um invejável exemplo de longevidade: completa oitenta anos em 2015. Obviamente, não há mais ninguém da primeira formação em atividade, mas os integrantes atuais tocam juntos já hà¡ treze anos. O aniversário será comemorado com o lançamento de um álbum ao vivo, gravado em Chicago. O quarteto de cordas é um arranjo íntimo e, como um casamento, está sujeito a turbulências afetivas. "A relação vai se deteriorando com o passar do tempo", admite Cláudio Cruz. O quarteto americano Takács — obrigatório na discoteca de todo apreciador de música erudita — tenta limitar o convívio ao palco e aos estúdios. Em excursões internacionais, os músicos fazem questão de se sentar separados no avião e de se hospedar em quartos distantes nos hotéis. Com realizações artísticas mais limitadas — e por boa razão —, o quarteto americano Audubon acabou em uma contenda judicial, em 2005, com três integrantes tendo de penhorar até os instrumentos para pagar mais de 600.000 dólares a um violinista que se sentiu lesado. Marcin Markowicz, violinista do polonês Lutoslawski, aparentemente tem a solução para evitar o desgaste: "O trabalho em grupo ocupa apenas alguns meses de nossa vida profissional. Temos outras atividades, como solistas e músicos de orquestras". Pedras fundamentais do quarteto como Haydn, Mozart e Beethoven estarão ausentes do festival paulista. Mas há cavalos de batalha de qualquer grupo de câmara que se preze: A Morte e a Donzela, de Schubert, pelo Quarteto Carlos Gomes, e as criações de Schumann e Debussy, pelo Lutoslawski. O grupo polonês interpretará também o compatriota do qual tirou o nome, Witold Lutoslawski. O Kronos vai exibir sua especialidade: música do século XX e composições inspiradas no pop ("Eu toco obras de compositores que minha neta poderá conhecer pessoalmente", orgulha-se Harrington), além de um tango de Astor Piazzolla. A divina integração de violinos, violoncelo e viola é difícil, mas flexível o bastante para abraçar a diabólica música moderna. CÂNONE DE CÂMARA Alguns dos momentos mais importantes da história dos quartetos de cordas Mozart - Quartetos Haydn Escritas em Viena entre 1782 e 1785, essas peças são dedicadas a Franz Joseph Haydn (1732-1809), considerado o criador dos quartetos de cordas. Depois de escutá-las, Haydn teria dito ao pai do jovem Wolfgang Amadeus Mozart que o menino era o compositor mais talentoso que ele já havia conhecido. Mozart (1756-1791) usou, de forma ousada, dissonâncias que não se costumavam ouvir então - e assim preparou o terreno para as revoluções de Beethoven Gravação recomendada: Mozart: the Six "Haydn" Quartets, pelo Juillliard Quartet Beethoven -Todos os quartetos Ludwigvan Beethoven (1770-1827) conferiu ao quarteto a grandiosidade que antes só se ouvia nas sinfonias. E inovou muito: o Quarteto Op. 59 N º 1, por exemplo, toma liberdades que não se conheciam, como o cruzamento de altura entre violoncelo e violino em algumas passagens, o alargamento da tessitura interna do quarteto (violino muito agudo sobre cello bastante grave), e, no movimento Scherzo, notas repetidas com efeito de percussão Gravação recomendada: The Complete String Quartets, pelo Alban Berg Quartet Bartók - Seis Quartetos São o ponto mais significativo da carreira do compositor húngaro - o que não é pouco, pois Bela Bartók (1881-1945) criou concertos que fazem parte do repertório das principais orquestras em todo o mundo. Além do elemento folclórico presente em suas obras, os quartetos trazem uma complexidade de execução que desafia os màºsicos. Alguns ouvintes podem considerá-los áridos, mas representam bem o espírito de caos do modernismo no início do século XX Gravação recomendada: The Six String Quartets, pelo Takács Quartet Shostakovich - Os Quartetos de Cordas Completos Dmitri Shostakovich (1906-1975) deixou quinze quartetos e quinze sinfonias. Mas o compositor russo demorou mais a chegar ao formato de câmara: só compôs o primeiro quarteto depois de criar sua Quinta Sinfonia. Mais melódicos que os de Bartók, seus quartetos são simples e diretos - tudo na medida certa. A atmosfera densa de alguns deles é inspirada em eventos da II Guerra e pela opressão do stalinismo Gravação recomendada: The Complete String Quartets, pelo Emerson String Quartet 7#2 ARTE – UMA LICENÇA POÉTICA Peças de colorido vibrante e movimentos suaves marcam a primeira exposição de Ferreira Gullar, revelando uma face jovial e bem-humorada em sua obra. MÁRIO MENDES â€œÉ preciso sempre estar alerta para o acaso", diz Ferreira Gullar, 84 anos. O conselho também é a melhor explicaçà£o possível para o que o poeta, escritor, ensaísta e crítico de arte, recém-eleito para a Academia Brasileira de Letras, apresenta no momento numa exposição em cartaz em duas cidades simultaneamente. A Revelação do Avesso (até 6 de dezembro na Dan Galeria, em São Paulo, e na Graphos:Brasil, no Rio de Janeiro) reúne trinta peças feitas a partir do que até então Gullar vinha produzindo apenas como passatempo: colagens em papel colorido. "Um dia eu estava cortando um pedaço de papel verde e, por acaso, vi que o lado do avesso era cinza. Resolvi manter o movimento do papel que deixava esse avesso exposto, e aquilo me mostrou a possibilidade de explorar a colagem de uma maneira diferente", conta o poeta maranhense, sem oferecer maiores interpretações sobre esse novo caminho em sua trajetória. "Achei que ficou bacana e continuei fazendo", limita-se a comentar. Amigos que frequentam seu apartamento em Copacabana, no Rio, se encantaram ao ver essas formas coloridas que sugeriam movimento, e insistiram para que ele fizesse uma exposição. "Eu protestei, claro, porque não me considero um artista plástico." Mas concordou em exibi-las ao descobrir que as curvas e dobras em papel assumem um ar de permanência quando reproduzidas em um tipo leve e delicado de metal. (A mostra, aliás, é acompanhada por um livro, em tiragem limitada, com fotos da coleção completa e também poemas do autor.) É bom lembrar que Gullar, além da atividade de crítico, não é exatamente um estranho no ninho das artes plásticas. Em 1959, ele foi um dos fundadores do neoconcretismo ao lado de artistas como Lygia Clark e Hélio Oiticica. "Criamos um movimento que não seguia mestre algum e era algo totalmente novo no cenário internacional", conta. Suas colagens também já haviam sido vistas no livro Zoologia Bizarra (2010) — formas que remetiam a animais e seres humanos. Mas as peças de A Revelação do Avesso, em seu movimento colorido, como se tivessem sido soltas ao vento ou agitadas por gestos humanos, são um passo além. Ele mesmo é o primeiro a ressaltar seu caráter inédito dentro da sua obra: "Não é um trabalho que tenha a ver com um conceito verbal. Trata-se de um fato visual intraduzível em palavras", explica. Aliás, ultimamente Gullar tem se dedicado mais a escrever ensaios e artigos de jornal — ele é colunista da Folha de S.Paulo — do que à sua vocação primeira, a poesia, na qual se estabeleceu indisputavelmente como um dos maiores do país: "Há cinco anos não escrevo poesia e provavelmente não vou escrever mais, porque um poema nasce do espanto e eu não ando me espantando muito, a não ser com a corrupção no Brasil". Ele também não é nada lisonjeiro em suas considerações sobre a arte contemporânea: "A arte ultimamente tem assumido uma postura negativa, e os artistas parecem querer castigar o espectador. Na Bienal de São Paulo, por exemplo, vi uma obra que era um monte de panos sujos pendurados. Aquilo não é uma mostra de arte, é apenas algo lamentável. A arte não existe para maltratar ninguém, ela existe porque a vida não basta", pondera. Gullar também diz não ter medo de ser chamado de velho e conservador, já que durante sua carreira assumiu um sem-número de posturas rebeldes e infringiu todas as regras do que se considerava ser de bom-tom na poesia. "Minha mais recente rebeldia foi entrar para a Academia Brasileira de Letras, algo a que sempre me opus no passado", conclui. Essa falta de paciência com a vanguarda sensacionalista não é, porém, sinal de uma visão pessimista ou amarga da vida. As cores vibrantes e os movimentos suaves das colagens metálicas de Gullar sugerem exatamente o contrário — prazer. Ele diz que começou a fazer colagens para se distrair, e considera divertido o processo de escolha das cores com que vai trabalhar, as formas inesperadas que surgem enquanto recorta o papel e, sobretudo, o resultado final: "É à³timo, porque as pessoas sempre gostam", diz, com um sorriso satisfeito e maroto. E não o surpreende que digam que as peças não parecem ter sido feitas por um octogenário: "Claro, sou um estreante!". 7#3 LIVROS – INFORTÚNIOS DE GUERRA E PAZ Dois grandes livros fecham a temporada de publicações motivadas pelo centenário da I Guerra Mundial e mostram que se pode perder e ganhar sem glória. EURÍPEDES ALCÂNTARA Talvez só John Maynard Keynes, com As Consequências Econà´micas da Paz, possa ser páreo para O Tratado de Versalhes — A Paz depois da Primeira Guerra Mundial (tradução de Gleuber Vieira e Jorge Ribeiro; Globo; 260 páginas; 44,90 reais ou 31,40 reais na versão digital), de Harold Nicolson, um clássico que acaba de ser lançado no Brasil. Junto com A Primeira Guerra Mundial (tradução de Gleuber Vieira; Globo; 728 páginas; 64,90 reais), de Margaret MacMillan, a obra de Nicolson fecha a temporada de grandes lançamentos sobre a Guerra Mundial de 1914-1918. Lembrada pelos europeus simplesmente como a Grande Guerra, ela matou 10 milhões de soldados e 5 milhàµes de civis. Nicolson e Keynes eram os mais brilhantes jovens integrantes da delegação inglesa à Conferência de Paz de 1919, realizada no Palácio de Versalhes, símbolo da opulência da monarquia que, depois da Revolução Francesa e de muitas cabeças no cesto do carrasco da guilhotina, passou a ser chamado de "berço da liberdade". Derrotados em suas teses essenciais sobre as condições da rendição alemã, Nicolson e Keynes saíram igualmente amargurados de Paris. Keynes fez algumas contas simples e chegou à conclusão de que o custo da reparação de guerra imposta pelos vencedores esmagaria economicamente a Alemanha. Nenhum governo de Berlim seria capaz de alimentar 60 milhões de bocas e, ao mesmo tempo, pagar o alto custo das reparações exigidas pelos vencedores. A Alemanha entrou na guerra um país rural e saiu dela industrializado. De produtora de 90% dos alimentos consumidos pela população, caiu para 40%, importando todo o resto. Keynes anteviu que da miséria emergiria alguma força polà­tica radical e militarista nutrida pelo orgulho ferido do povo alemà£o. Ele acreditava que os "bolchevistas russos" teriam mais chances de ser os herdeiros da insatisfação popular. Mas deixou em aberto o palpite sobre que tipo de populismo totalitário chegaria ao poder com a promessa de reerguer a Alemanha: "Quem pode dizer com certeza qual é o limite da resistência e que caminhos os homens, finalmente, vão buscar para escapar de suas desgraças?". Sobreveio o nazismo, e Keynes se consagrou como oráculo de crises. Ele precisou de apenas duas semanas para redigir sua famosa condenação ao Tratado de Versalhes, qualificado por ele de "Paz Cartaginesa", referindo-se à destruição total de Cartago pelos romanos na antiguidade. Nicolson esperou catorze anos para publicar seu livro, mas juntou ao texto as melhores partes do fascinante diário que escreveu na estada em Paris — e o fez, nas palavras dele, "convencido de que, em sua jovial trivialidade, reflete melhor do que comentários da meia-idade desiludida a atmosfera que pretendo transmitir". Que ares o jovem Harold Nicolson viu preencher as salas na conferência de paz? "Uma atmosfera doentia (...) onde se trabalhou (...) em meio à neblina cada vez mais espessa." Ele não se referia à fumaça dos charutos. Tanto quanto um diplomata pode ser técnico à maneira de um economista, Nicolson percebeu o fracasso da conferência pelo mesmo mecanismo racional que levou Keynes à conclusão coincidente. "É menos uma questà£o de ética e mais de método", escreveu ele, lamentando que não tenha havido uma negociação verdadeira com os perdedores e que tampouco os vencedores tenham saído de Paris sabendo como impor suas condições. Para que o tratado funcionasse, observa Nicolson, seria preciso que a autoridade moral, o poder político e a força econômica de Woodrow Wilson, presidente dos Estados Unidos, estivessem "íntima e incessantemente" empenhados na observância do tratado. Wilson era um intelectual idealista que, antes de chegar à Casa Branca, adquirira o respeito da comunidade acadêmica como reitor da Universidade Princeton. à‰ lembrado como o autor dos famosos Catorze Pontos, as condições para que a paz fosse ao mesmo tempo a prova de que a Grande Guerra foi "lutada por questões morais" e de que a paz seria também mantida por ser moralmente superior à guerra. O idealismo de Wilson na política incluía o desarmamento, com os países mantendo forças armadas no limite mínimo da garantia da ordem interna. Na economia, deveria prevalecer o livre-comércio, em que todas as barreiras alfandegárias seriam banidas e, auge da utopia, "as nações deveriam cuidar da subsistência umas das outras". Nicolson lembra que só assim se poderia garantir a promessa de que a I Guerra tivesse sido mesmo "a guerra para acabar com as guerras". O idealismo de Wilson foi contornado pelo pragmatismo da "realpolitik" dos líderes Georges Clemenceau e David Lloyd George. O francês e o inglês, tendo perdido gerações inteiras de jovens nas trincheiras, não viam lugar para idealismo. Especialmente Clemenceau, que em uma vida tinha testemunhado duas vezes a artilharia alemã fazer chover ferro e fogo sobre Paris. A primeira foi em 1871, no lance final da Guerra Franco-Prussiana. Clemenceau tinha 30 anos. "Se Deus se contentou com dez mandamentos, qual é a razão de você insistir em catorze, meu caro Wilson?", teria dito o líder francês. Nilcolson anota, melancólico, que, para ele, ficou claro desde o início que "a colaboração americana talvez pudesse ser íntima, mas não poderia ser incessante". Não foi nem uma coisa nem outra, embora Woodrow Wilson pudesse ter voltado para casa com a aprovação da criaà§ão da Liga das Nações, o embrião da Organização das Nações Unidas (ONU). Curiosamente, Wilson achava que a possibilidade de algumas nações permanecerem neutras era um catalisador de guerras, pois elas podiam simplesmente ser observadoras do morticínio. Caso da Holanda na Grande Guerra, o que viria a ser a salvaà§ão pessoal do derrotado cáiser Guilherme II. Uma observação tão antiga quanto a diplomacia diz que conferências de paz quase sempre são apenas preparativos para a guerra seguinte. Como um fumante compulsivo que acende um cigarro na brasa do outro, a Europa foi, de guerra em guerra, a mais fiel encarnação desse paradoxo. Suas inovações tecnológicas e institucionais liberaram energias produtivas jamais vistas antes na história. Nunca foi superada a formulação europeia dos códigos de convivàªncia baseados no respeito aos direitos inatos do homem. Os europeus criaram o mundo contemporâneo, mas por muito pouco não destruíram o seu próprio. A história europeia moderna se define pelo embate constante entre a criação e a destruição, a moderação e a fúria, a tolerância e a intransigência, o sublime e a vilania, a civilização e a barbárie. Como nenhuma outra, a Conferência de Paz de Paris de 1919 encapsulou essas contradições. Ela reuniu 32 representantes de países ganhadores e perdedores da I Guerra Mundial. Liderados por Woodrow Wilson, presidente dos Estados Unidos, David Lloyd George, primeiro-ministro da Inglaterra, e seu colega francàªs, Georges Clemenceau, em seis meses os delegados redigiram o Tratado de Versalhes, que moldou a política mundial pelos vinte anos seguintes e, como é da tradição, preparou o terreno para a eclosão da II Guerra Mundial, funcionando como amplificador e fio condutor das tensões que sobreviveram ao armistício. A historiadora canadense Margaret MacMillan nasceu dez anos depois da publicação do livro de Harold Nicolson. Ela tem sobre o Tratado de Versalhes uma visão mais distanciada no tempo e totalmente oposta às de Keynes e Nicolson. Para ela, o grande erro das potências vencedoras não foi obrigar a Alemanha a pagar as pesadas reparaçàµes de guerra, mas não impor aos alemães as restrições previstas no Tratado de Versalhes que os teriam impedido de reconstruir seu poder militar. MacMillan, em A Primeira Guerra Mundial, livro que termina onde o de Nicolson começa, se concentra no estudo de documentos e na avaliação do caráter dos líderes que jogaram a Europa no caldeirão fervente da guerra de 1914-1918. Ela não chega a culpar unilateralmente a Alemanha pelo conflito, mas mostra que, se havia um grupo realmente querendo guerra, ele se concentrava a leste do Reno. MacMillan tem uma boa dose de razão. É inegável que só a Alemanha poderia ter evitado a guerra por uma decisão exclusiva sua. Todos os demais envolvidos precisariam contar com combinações favorà¡veis para interromper a marcha da insensatez. A França precisaria contar com a concordância da Inglaterra se quisesse perseguir o caminho da paz. A Rússia, ainda sob o regime dos czares, faria o que a França quisesse. Se optasse por não se enfiar na guerra no continente, a Inglaterra seria percebida como falsamente neutra pela Alemanha e, cedo ou tarde, teria de responder às provocações de Berlim. Portanto, a ideia de que a Inglaterra poderia ter unilateralmente afastado o fantasma da Grande Guerra só sobrevive na teoria. Entre todos os livros editados neste ano sobre a I Guerra, o de Margaret MacMillan é o que disseca de maneira mais cruel e com toda a justiça, diga-se, o cáiser Guilherme II, mandatário alemão absolutista, alienado e frio que "gostava de estar próximo à frente de combate para ouvir os tiros" e voltar correndo para a segurança dos jantares em que se vangloriava de "ter estado na guerra". MacMillan narra com incontido desprezo e indignação o exílio dourado de Guilherme na Holanda, onde foi acolhido por uma família de aristocratas que o alojou com alguns antigos serviçais em um pequeno palácio em Doorn. MacMillan contrasta a vida sem sobressaltos de Guilherme no exà­lio com o cotidiano de miséria e sacrifícios de seus ex-sàºditos. Margaret conta que Guilherme "passou o resto de sua vida em Doorn. Ocupava-se derrubando árvores — 20.000 no fim da década de 20". Ele preencheu seu tempo também escrevendo a mais insossa e falsa autobiografia entre as de todos os líderes que sobreviveram à Grande Guerra. Guilherme se exime de toda culpa pela guerra e se afasta da derrota como se narrasse uma lenda antiga de um país distante. Enquanto isso, os alemães penavam não apenas com a derrota militar, para muitos pouco convincente, pois no dia do armistício não havia um àºnico soldado inimigo em solo germânico. Sofriam com a humilhação trazida pela hiperinflação. Em Munique, um cafezinho aumentava de preço no espaço de tempo em que o cliente levava a xà­cara aos lábios e a depositava vazia no balcão do bar. Um dos clientes poderia ter sido Adolf Hitler, então apenas um insignificante cabo austríaco condecorado por bravura, ainda se recuperando de ferimentos recebidos no campo de batalha. Os últimos dos muitos prazeres de Guilherme no exílio holandês eram as notícias que lhe chegavam do avanço sem resistência perceptível dos tanques e da infantaria de Hitler pelo território francês. Guilherme morreu em 1941, sem saber por que a Alemanha perdeu a Primeira Grande Guerra e achando que ganhara a Segunda. 7#4 VEJA RECOMENDA BLU-RAY HARAKIRI (SEPPUKU, JAPÃO, 1962. VERSÁTIL) • Hanshiro (o magistral Tatsuya Nakadai), um samurai sem mestre, pede ao clã Iyi o obséquio de que o deixem cometer o haraquiri, o suicídio ritual, em seu pátio: ele não mais suporta a pobreza e a vergonha de não pertencer a um senhor, diz. Não é a primeira vez que o clã ouve um pedido como esse; está-se no início do Período Edo, no século XVII, quando a centralizaçà£o do shogunato pôs fim a casas tradicionais e deixou muitos guerreiros ao deus-dará. Temeroso de que o velho samurai esteja usando o pretexto do haraquiri para obter dinheiro ou um emprego, o conselheiro do cl࣠decide contar a ele o que se passou ali alguns meses antes, quando um jovem samurai apareceu com essa mesma história — um episódio que terminou de forma brutal. Existem, porém, ligações entre o velho e o jovem, as quais o diretor Masaki Kobayashi vai desenhando com estupendas tensão narrativa e composição visual — e também com fortíssima verve contra o bushidô, o código de honra samurai, que ele expõe neste filme magnífico em toda a sua tirania e hipocrisia. O disco traz também a refilmagem de 2011 do diretor Takashi Miike, lindíssima mas bem menos potente. CINEMA UMA PROMESSA (A PROMISE, FRANÇA/BÉLGICA, 2013. JÁ EM CARTAZ NO PAÍS) • O diretor Patrice Leconte é um exímio artífice do chamado "filme de época": sabe infundir com uma psicologia contemporânea e perspicaz suas narrativas passadas em lugares e tempos muito específicos (a corte de Luís XVII em Caindo no Ridículo, de 1996, ou uma colônia francesa perto da Terra Nova em 1849, em A Viúva de St. Pierre, de 2000). Essa habilidade sobressai nesta sua adaptaà§ão da novela Viagem ao Passado, do austríaco Stefan Zweig, sobre um jovem e paupérrimo contador que, com sua dedicação e iniciativa, conquista a confiança do dono de uma fundição na Alemanha dos primeiros anos do século XX. Já com certa idade e mal de saúde, o industrial Hoffmeister (Alan Rickman) parece, porém, ter mais em mente do que apenas o futuro de sua fortuna quando toma Friedrich (Richard Madden, o Robb Stark de Game of Thrones) sob sua proteção: também a preocupação com sua mulher, Lotte (Rebecca Hall), bem mais nova e radiante, parece estar em jogo. Apesar das diferenças estilísticas, note-se a similaridade com os temas de O Grande Hotel Budapeste, também inspirado na obra de Zweig: a relaçà£o entre um rapaz e seu mentor, e a desfiguração de um mundo ideal por força da guerra. LIVROS A BALADA DE ADAM HENRY, DE IAN McEWAN (TRADUÇÃO DE JORIO DAUSTER; COMPANHIA DAS LETRAS; 200 PàGINAS; 37,90 REAIS, ou 26,90 NA VERSÃO ELETRÔNICA) • Adam Henry depende de uma transfusão de sangue. Se essa providência não for tomada, dizem os médicos, é bem provà¡vel que ele morra. Mas há dois complicadores no caso: Adam tem 17 anos — ou seja, é menor de idade, sem autonomia para tomar decisões finais sobre a própria saúde. E ele é, como seus pais, uma testemunha de Jeová, membro, portanto, de uma religião que proíbe transfusões. O dilema entre medicina e religião será, afinal, decidido pelo Judiciário britânico, na pessoa de Fiona Maye, juíza do Tribunal Superior. Ian McEwan, um dos melhores escritores ingleses da atualidade, investiga aqui os dilemas profundos da racionalidade legal — como já havia antes inquirido sobre as questões filosóficas da neurociência em Sábado. Mas ele é, antes de tudo, um romancista: em primeiro plano estão os dramas individuais dos personagens. Maye tem de decidir sobre a vida de Adam Henry em meio a uma turbulenta crise afetiva, na qual rui seu casamento de 35 anos. OBJEÇÕES DE UM ROTTWEILER AMOROSO, DE REINALDO AZEVEDO (TRÊS ESTRELAS; 168 PÁGINAS; 25 REAIS) • Quando Reinaldo Azevedo estreou como colunista da Folha de S.Paulo, em outubro de 2013, Suzana Singer, então ombudsman do jornal, escreveu que o novo contratado era um "rottweiler", atacando do PT aos defensores dos direitos animais que naquela semana haviam invadido um centro de pesquisa para "libertar" beagles usados em testes médicos. Assim como Nelson Rodrigues, que abraçou ironicamente o epíteto que lhe atribuíram no título de uma coletânea de crônicas, O Reacionário, Azevedo admite — "com um quê de galhofa", como diz na introdução — certa semelhança com a feroz raà§a canina. "Não tenho olhar pidão, não espero que passem a mão na minha cabeça, não me esforço para ganhar o afeto de estranhos e, sempre que acho relevante, parto para a briga", afirma. Nessa reunião de textos da Folha, Reinaldo Azevedo revisita temas que lhe são caros, e que serão familiares também ao leitor de seu blog em VEJA on-line. O PT, o progressismo, a ditadura pretensamente moral da correção política — a mordida crítica deste que é o mais conhecido colunista político do Brasil não poupa ninguém. DISCO NÃO PARE PRA PENSAR, DE PATO Fu (SONY MUSIC) • No Pato Fu, nada é o que se espera: uma balada pode se transformar numa canção agitada, ou uma música romântica pode ser sabotada pelo excesso de eletronices. O grupo mineiro distingue-se da geração de roqueiros surgida na década de 90 pela criatividade. Nos últimos anos, a banda tocou um projeto de covers para o pàºblico infantil, o Música de Brinquedo. Primeiro disco de composià§ões próprias desde Daqui pro Futuro, de 2007, Não Pare pra Pensar marca a entrada do baterista Glauco Mendes, que substitui o elà©trico Xande Tamietti. Há uma predominância do guitarrista John Ulhoa, seja nas composições (sozinho ou em parceria, ele assina dez faixas), seja nos solos. Ritchie, ressurgido dos anos 80, faz uma participação em Pra Qualquer Bicho, e há uma ótima cover de Mesmo que Seja Eu, de Roberto e Erasmo Carlos. Talvez a melhor prova de que nada é o que parece no Pato Fu seja Cego para as Cores, que comeà§a com um riff de banda de heavy metal mas é suavizada pelos vocais doces de Fernanda Takai. 7#5 OS LIVROS MAIS VENDIDOS FICÇÃO 1- Se Eu Ficar. Gayle Forman. Novo Conceito 2- A Culpa É das Estrelas. John Green. INTRÍNSECA 3- Para Onde Ela Foi. Gayle Forman. NOVO CONCEITO 4- Cidades de Papel. John Green. INTRÍNSECA 5- O Sangue do Olimpo. Rick Riordan. INTRÍNSECA 6- Somente Sua. Sylvia Day. PARALELA 7- O Teorema Katherine. John Green. INTRÍNSECA 8- O Pequeno Príncipe. Antoine de Saint-Exupéry. AGIR 9- O Irmão Alemão. Chico Buarque. COMPANHIA DAS LETRAS 10- Quatro. Veronica Roth. ROCCO NÃO FICÇÃO 1- Nada a Perder 3. Edir Macedo. PLANETA 2- O Capital no Século XXI. Thomas Piketty. INTRÍNSECA 3- Aparecida. Rodrigo Alvarez. GLOBO 4- Bela Cozinha: as Receitas. Bela Gil. GLOBO 5- Guga — Um Brasileiro. Gustavo Kuerken. SEXTANTE 6- Carlos Wizard – Sonhos Não Têm Limites. Ignácio de Loyola Brandão. GENTE 7- Manual do Mundo. Alfredo Luis Mateus e Iberê Thenório. SEXTANTE 8- Eu Sou Malala. Malala Yousafzai. COMPANHIA DAS LETRAS 9- O Diário de Anne Frank. Anne Frank. RECORD 10- Sonho Grande. Cristiane Corrêa. PRIMEIRA PESSOA Getúlio 1945-1954. Lira Neto. COMPANHIA DAS LETRAS AUTOAJUDA E ESOTERISMO 1- Ansiedade. Augusto Cury. SARAIVA 2- Não Se Apega, Não. Isabela Freitas. INTRÍNSECA 3- Geração de Valor. Flávio Augusto da Silva. SEXTANTE 4- De Volta ao Mosteiro. James Hunter. SEXTANTE 5- As Regras de Ouro dos Casais Saudáveis. Augusto Cury. ACADEMIA DE INTELIGÊNCIA 6- O Monge e o Executivo. James Hunter. SEXTANTE 7- Resolva! Marcus Vinicius Freire. GENTE 8- Quem Me Roubou de Mim?. Padre Fábio de Melo. PLANETA 9- Pais Inteligentes Formam Sucessores, Não Herdeiros. Augusto Cury. SARAIVA 10- Eu Não Consigo Emagrecer. Pierre Dukan. BEST SELLER 7#6 ROBERTO POMPEU DE TOLEDO – CARO GOLPISTA, Você que foi à manifestação da Avenida Paulista e pediu intervenção militar, vamos lá, raciocinemos juntos. Intervenção militar precisa de militar, certo? Veja o que disseram os comandantes militares à coluna de Mônica Bergamo, na Folha de S.Paulo. O comandante da Marinha, almirante Júlio Soares de Moura Neto: "Os militares estão totalmente inseridos na democracia e não vão voltar. Isso eu garanto". O comandante da Aeronáutica, Juniti Saito: "São coisas de extremistas. (...) não há a menor chance de essas ideias evoluírem". O comandante do Exército, Enzo Peri: "Nós vivemos há muitos anos em um ambiente de absoluta normalidade". O.k., mas imaginemos que em algum momento esses comandantes mudem de ideia, ou que outros venham a sobrepujá-los e aceitem aderir à sua proposta. Um golpe precisa de uma justificativa, não é verdade? O que temos à frente do país é um governo legitimamente reeleito, ainda que por pequena margem. Sim, é um governo incompetente, que levou a economia ao fundo do poço, teve medíocre desempenho na educação e na saúde, só fez trapalhadas na infraestrutura e, para culminar, se vê enredado num escândalo de corrupà§ão gigante. Mas as instituições funcionam, em primeiro lugar as encarregadas de apurar as roubalheiras, e não há sinal de motins dentro das Forças Armadas, como em 1964. O.k., se você insiste, continuemos — mesmo assim o golpe é desfechado e instala-se a ditadura. O quê? Será que ouvi bem? Você diz que a intervenção é "só" para afastar o atual governo, não para implantar a ditadura? Em 1964 havia também esse argumento. Mas vamos lá: depois de afastar o governo, o que se faz? Ahn? Ah, entendi: convocam-se novas eleições, você diz. Nesse caso, abrem-se duas alternativas: ou se restauram completamente as liberdades democráticas, e nesse caso o partido deposto pode participar da nova eleição, ou se restauram pela metade, e ele é proibido de participar. Se lhe é permitido participar, é grande a chance de ganhar, e desta vez ganhar com ampla vantagem, fortalecido pela aura de vítima. Lembre-se do que ocorreu na Venezuela, com o ridículo golpe desfechado contra Chávez em 2002. Foi a partir daí que ele cresceu, ganhou crescente confiança, arrebatou multidões e acabou por projetar sua sombra por cima das instituições do país. Pela segunda alternativa, propàµe-se uma eleição viciada. É imperativo que as forças democráticas, inclusive da oposição, se recusem a participar de tal farsa. Inviabiliza-se a saída eleitoral. Os militares anunciam que governarão eles mesmos. Fecham o Congresso, censuram a imprensa, prendem opositores. No dia seguinte... Não, nem será preciso esperar o dia seguinte. No mesmo momento, pela internet e pela televisão, a imagem de um general de óculos escuros sintetiza os acontecimentos no Brasil. Uma risada universal explode em resposta. Você se lembra do Bananas, de Woody Allen? Mas isso não é o pior. Seguem-se os pedidos de boicote ao Brasil pela quebra da ordem democrática. O governo dos Estados Unidos anuncia a reavaliação das relações. Países europeus chamam seus embaixadores para consultas. Dezenas de países decidem não participar da Olimpíada do Rio de Janeiro. O movimento cresce, e os Jogos sà£o cancelados. Cineastas recusam-se a ceder seus filmes para a mostra de São Paulo e escritores recusam-se a vir para a Flip. Enquanto isso ocorre no plano externo, no interno os novos donos do poder enfrentam dificuldades. Por mais que prendam, torturem e silenciem, não conseguem conter os desafios. Goste-se dele ou não, o partido alijado do poder tem raízes profundas na sociedade. Sucedem-se as greves, que, quanto mais reprimidas, mais se multiplicam. Manifestações de rua afrontam as proibições e são engrossadas mesmo pelas forças democráticas que se opunham ao governo deposto. Mais grave é o que acontece no campo. Movimentos sociais se transmudam em forças de guerrilha. Quem temia o fantasma da Venezuela tem agora pela frente o fantasma da Colômbia. A situação se agrava, e a unidade militar, que nunca fora tão unida assim, se rompe. Nesse ponto ou eclode uma guerra civil, o país se incendeia e as ruas se juncam de cadáveres... ...ou o amigo golpista acorda, recolhe sua faixa e toma juízo. Deixe de ser besta, cara. Se você quer fazer oposição ao governo, está marcando gol contra. -- Você está participando do grupo "DV-Escola", dos grupos do Google. Sua inscrição é de sua inteira responsabilidade. Atenção! Para descadastrar-se deste grupo, envie um e-mail totalmente em branco, sem nada no corpo e/ou no assunto para o seguinte endereço: dv-escola+unsubscribe@googlegroups.com Favor observar um sinal de hífen (-) entre a palavra DV e a palavra escola. Se for o caso, copie e cole em seu cliente de e-mail o endereço acima para que não haja dúvidas de seu conteúdo. Ezequiel Silva - Angela Lima - Luís Campos --- Você está recebendo esta mensagem porque se inscreveu no grupo "DV-Escola" dos Grupos do Google. Para cancelar inscrição nesse grupo e parar de receber e-mails dele, envie um e-mail para dv-escola+unsubscribe@googlegroups.com. 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