SUPERINTERESSANTE www.superinteressante.com.br EDIÇÃO VERDE Edição 327 – dezembro / 2013 [descrição da imagem: no centro da página, em posição vertical, a figura de um carro, traseira e dianteira parece dos primeiros “Fuca”. Nesta imagem ele está alongado, sendo que onde corresponde aos bandos dianteiros tem uma separação onde está escrito, em letras grandes, a palavra O FIM, e onde estaria o banco traseiro, outra separação, com a palavra CARRO (COMO VOCÊ CONHECE). Depois o final do carro, sua traseira. Aparece ainda, ao redor, destacados do carro, uma direção, vidros, pedaços de vidro, palheta limpa-vidros] O FIM DO CARRO (COMO VOCÊ CONHECE) Por 100 anos o carro foi basicamente o mesmo. Agora vem aí algo completamente novo. P. 41 O carro que se dirige sozinho Jogue videogame enquanto dirige Velocidade mais alta, sem trânsito Ele será capaz de conversar com outros carros. Outros títulos na capa COMENDO VENENO? O brasil usa agrotóxicos que são proibidos no mundo todo. Por quê? INDÚSTRIA SE INSPIRA NA NATUREZA VIVENDO EM UM MUNDO SEM ABELHAS GANHE $$$ PRODUZINDO ENERGIA BOM SENSO: A LIBERTAÇÃO DO FUTEBOL. ____________________________ 1# PARTE INICIAL 2# SEÇÕES 3# REPORTAGENS 4# GUIA _____________________________ 1# PARTE INICIAL dezembro 2013 ed. 327 1#1 AO LEITOR – O FIM DE UMA ERA – E O COMEÇO DE OUTRA 1#2 MUNDO SUPER 1#1 AO LEITOR – O FIM DE UMA ERA – E O COMEÇO DE OUTRA Um século atrás, em dezembro de 1913, a Ford Motor Company inaugurou a primeira linha de montagem — um trilho no qual carcaças de automóveis iam sendo progressivamente montadas. O carro ficava pronto em apenas uma hora e meia. Nascia ali o nosso atual modelo de mobilidade — carros cada vez mais baratos, produzidos em massa, despejados nas ruas nos quatro cantos do mundo para mover a humanidade. Começava o Século do Carro. Cem anos depois, bilhões de quilômetros de vias de asfalto preto cortam todas as cidades de todos os países de todos os continentes, dando passagem para 1 bilhão de carros. Como uma vez escreveu o astrônomo Carl Sagan, se um visitante do espaço se aproximasse da atmosfera da Terra, concluiria que os carros são a espécie dominante do planeta. E as coisas não vão bem. No mundo inteiro, congestionamentos monstruosos deixam evidente a impossibilidade de seguir pelo mesmo caminho — no ano passado, perto de Pequim, um engarrafamento durou 11 dias numa rodovia de 18 pistas. Movemo-nos cada vez mais devagar — a velocidade média de um carro em São Paulo equivale à de uma galinha. E as temperaturas globais estão cada vez mais altas. Bom, tudo isso você já sabe. O que talvez não saiba é que já existe tecnologia para reinventar o carro. O próximo século será uma nova era de mobilidade. O carro como você conhecia vai deixar de existir. E o que vai surgir no seu lugar é muito mais interessante, como você pode conferir na reportagem que começa na página 41. Seis anos atrás, em dezembro de 2007, a SUPER chegou às bancas pela primeira vez sem a tradicional moldura vermelha, que já era sua marca registrada fazia 20 anos. Era nossa primeira Edição Verde, uma SUPER inteira cheia de temas ambientais. Foi uma novidade: uma grande publicação brasileira dedicando uma edição toda e 100% de seus recursos editoriais para investigar o tema. Nos últimos seis anos, a tradição se consolidou e não passou um sem que houvesse uma SUPER verde nas bancas, antecipando assuntos que depois cairiam na boca do povo. Quando resolvemos fazer esta sétima Edição Verde, nos demos conta de que já não fazia mais sentido pintar a moldura de verde. Afinal, a edição tem tanta diversidade de temas — e de cores — quanto qualquer outra. Falamos aqui de história, de tecnologia, de política, de economia, de ciência, como sempre fazemos — e não só de florestas. O verde que incluímos na escala de cores em 2007 hoje está irreversivelmente misturado ao nosso vermelho de sempre. DENIS RUSSO BURGIERMAN, Diretor de Redação super.abril.com.br/blogs/mundo-novo 1#2 MUNDO SUPER DARK WRITER TAMBÉM LÊ A SUPER A matéria O Escritor sem Rosto, sobre o autor brasileiro que publicava textos no Orkut e foi apadrinhado pelo editor de Harry Potter, foi uma das mais comentadas da edição de dezembro na nossa página no Facebook. Nahamut, a ilustradora oficial do Dark Writer Project, fez até uma ilustração especial em homenagem à reportagem. “Escrever é doar ao mundo aquilo que existe dentro do seu mundo” DÁ ZERO PRA GENTE Galera da SUPER, fiz um teste esses dias e a revista estava presente. Porém estavam apontando um errinho tão minúsculo que nem sequer notei e, bem... errei a questão. Dêem uma olhada. O professor gostou pelo menos (mas não o suficiente para me dar o ponto). - #chateado RENAN NOVAES Renan, para nós, você tirou 10. 3 LEITORES REAGEM AO DESCOBRIR QUE QUEM TOMA CAFÉ TODO DIA TEM ESPERMATOZOIDES MAIS ATIVOS Vixi! Os meus estão disputando Fórmula 1 então! - VÍTOR LEANDRO DE SOUZA Agora eu descobri por que estou fazendo um filho atrás do outro. Eliminando o café aqui, em casa, em 3,2,1... - CLEBER JÚNIOR Tomo de 3 a 5 xícaras de café por dia. Então, para quem quiser ser mãe, vendo os meus! - PANCHoVlOLLIDAY Entenda a razão de tanta atividade em ABR.Al/1lOUGCG 3 LEITORES EXPLICAM (MAL) O QUE FAZ UM ALIMENTO SER INTEGRAL Ele ser ruim. Brincadeira. Algumas coisas são boas. Algumas. - GISELLE FRANÇA Não ser derivado (piada exclusiva para engenheiros e matemáticos). - SILAS FIGUEIREDO "Mãe, tem arroz integral?" Não, filho, só parcial hoje. Seu pai foi demitido. - DAN QUEIROZ DEL LAMA, PIADISTA DO MÊS, PARABÉNS. Se você quiser saber a resposta certa, acesse ABR.AI/HTMl1N SUPERBANCA Conhece-te a ti mesmo comprando os dois especiais que preparamos neste mês COMO AS PESSOAS FUNCIONAM - Entenda melhor esse indivíduo que aparece no espelho todas as manhãs (R$ 29,90) O GUIA DA FILOSOFIA - A obra, a vida e as inquietações dos 60 maiores filósofos da história (R$ 13). O MELHOR DO ANO: 2013 Fim de ano: época de organizar o amigo-secreto, reclamar da trilha sonora natalina do shopping e conferir as listas especiais da SUPER. Em dezembro, entra no ar a retrospectiva mais interessante da internet, com o que rolou de melhor na ciência, na tecnologia, na internet e na cultura. Confira rankings feitos pela redação e por convidados e dê pitacos no Facebook: abr.ai/supermelhores-2013. O PULO DO GATO Aqui, em casa, todo mundo curte a SUPER, até o nosso gatinho. Aguardando com muita ansiedade a próxima edição! MARIANA DUARTE CORREIO ELEGANTE Os comentários mais carinhosos que recebemos nas últimas semanas. Que matéria ridícula, tão ridícula quanto o "rei do camarote"! JOSÉ, SOBRE O POST COMO ELE AGREGA VALOR À ECONOMIA, DO BLOG CRASH. Não acredito que perdi meu tempo lendo essa m***a. BASILIO, SOBRE O MESMO POST. Achei esse censo uma m***a! Ah, vá pro c****o!!! LUIZ, SOBRE O 1º CENSO BRASILEIRO DE TATUAGEM FOI MAL Supermercados desperdiçam US$ 900 milhões em comida vencida, e não R$ 900 milhões. (Prazo de Validade, dezembro) A série Harry Potter vendeu cerca de meio bilhão de livros, e não 1 bilhão. (O Escritor sem Rosto, dezembro) A "finada" Telebras na verdade foi reativada em 2010. (Oráculo, outubro) FALE COM A GENTE REDAÇÃO - Envie sugestões, comentários, críticas e dúvidas para Adriana Meneghello pelo e-mail superleitor@abril.com.br, para o endereço av. das Nações Unidas, 7221, 14º andar, CEP 05425-902, São Paulo, SP; ou ainda pelo fax 11 3037-5891. PARA ANUNCIAR - Escreva para fernando.sabadin@abril.com.br ou entre no site publiabrif.com.br. Telefones: SP 11 3037-5189, RJ 21 2546-8100. Outras praças: 11 3037-5759. Vendas Diretas: 11 3037-5000. SERVIÇO DE ATENDIMENTO AO CLIENTE (SAC) - Para consultar dados da sua assinatura, comunicar alteração de endereço, tirar dúvidas sobre pagamento ou entrega, renovação e outros serviços: Internet: abrilsac.com Ligue grátis: 0800- 7752112 Grande São Paulo: 11 5087-2112 De segunda a sexta, das 8 às 22h. VENDAS DE ASSINATURAS - Internet: assineabril.com Ligue grátis: 0800-7752828 Grande São Paulo: 11 3347-2121. De segunda a sexta, das 8 às 22h. Sábado, das 9 às 16h. RECURSOS HUMANOS - Você pensa em trabalhar, estagiar ou participar de algum dos programas de treinamento da Editora Abril? O lugar certo para obter informações e enviar seu currículo é o link abril.com.br/trabalheconosco. Boa sorte! EDIÇÕES ANTERIORES - Solicite exemplares antigos a seu jornaleiro. O preço será o da última edição em banca mais a despesa de remessa. 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O hidrato de metano foi descoberto nos anos 70, mas só agora estamos vendo os primeiros avanços para retirá-lo dos oceanos. Quem lidera o resgate é o Japão, que investiu mais de R$ 1,2 bilhão no Chikyu, uma espécie de iate gigante com uma torre de 30 andares de armazenamento e que faz perfuração em águas profundas. O Chikyu conseguiu retirar o gás a 400 metros de profundidade sem romper o gelo — ou seja, sem liberar descontroladamente para a atmosfera o metano, um dos gases do efeito estufa. Novas extrações devem ser feitas até 2019. Só no Japão, as reservas do gelo inflamável são suficientes para abastecer o país no próximo século — nada mal para uma economia que compra 95% da energia que consome. Em todo mundo, há 3 trilhões de toneladas de hidrato de metano nos mares, mais do que o triplo das reservas de 930 bilhões de toneladas de carvão, petróleo e gás natural somadas, de acordo com o relatório Energy Outlook, de 2007. No Brasil, estudos feitos pela PUC-RS com a Petrobras mostram que há depósitos do combustível na bacia sedimentar de Pelotas, na Região Sul, e na foz do rio Amazonas, no Norte — mas ainda falta estimar o volume das reservas. O hidrato leva vantagem em relação a hidrocarbonetos tradicionais porque produz mais energia gerando menos dióxido de carbono. Encapsulado nos cristais de gelo, o gás fica estável. Mas, à temperatura ambiente, é liberado e provoca chamas insólitas em mares gelados. FAUNA ALIEN CUSTA US$15 BI Quando a China decidiu expandir os laços econômicos com o mundo, poucos esperavam que a fauna do país cresceria junto do comércio internacional. Mas um levantamento revelou que o país tem 544 espécies "invasoras", quatro vezes mais do que havia sido registrado no ano de 1900. Entre os invasores, há peixes, besouros e até mamíferos. O vai e vem de espécies está causando prejuízos de US$ 15 bilhões por ano. Um dos piores casos é o de um inseto voador que reduziu a produtividade em até 80% em lavouras como a de algodão em 2009. CAMPEÕES DA VAQUINHA OS TRÊS PROJETOS DE CROWDFUNDING QUE MAIS ARRECADARAM EM 2013 (EM US$): $ 26,5 milhões 1. STAR CITIZEN - Game gratuito de aventura épica espacial. Já tem fundos suficientes para tirar o projeto do papel, mas continua aberto para doações. $ 12,8 milhões 2.UBUNTU EDGE - Primeiro smartphone com o sistema operacional de código aberto Ubuntu. Ainda não atingiu o mínimo, que é de $32 milhões. $5,7 milhões 3. VERONICA MARS - Adaptação para o cinema da série norte-americana Veronica Mars. NOSSOS VENCEDORES 1- CABEÇA INFLÁVEL GIGANTE DE LIONEL RICHIE - Somou $ 13 mil, quase o dobro do solicitado, e debutou em um festival de música realizado na ilha de Wight. 2- ROB FORD CRACKSTARTER - Vaquinha conseguiu os $ 200 mil para comprar e divulgar o vídeo do prefeito de Toronto, Rob Ford, fumando crack. 3- BAAAHS - Ônibus transformado em escultura de ovelha gigante que funcionaria como boate gay. Levantou os $10 mil solicitados. FRACASSOU, MAS ADORAMOS! DINNER WITH A PORNSTAR: programa de culinária estrelado por grandes nomes do pornô mundial (vestidas). Arrecadou só $75 da meta de $2 mil. MEDUSA, A REVELAÇÃO DA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA Ela não para de nadar nem quando está descansando. Pesquisadores descobriram que a medusa pode ser o animal mais eficiente do mundo. As medusas têm um anel de músculos ao redor das extremidades de suas nadadeiras em formato de guarda-chuva. Para nadar, elas utilizam um sistema de dupla propulsão, que promove um redemoinho na água. Quando o animal aperta os músculos, as nadadeiras em formato de guarda-chuva se contraem e expelem a água que estava armazenada dentro delas. Depois, os músculos ao redor das nadadeiras relaxam e se abrem, permitindo que a água entre outra vez. A entrada da água lhe dá um segundo empurrão, que corresponde a 30% da distância que percorre a cada movimento, mesmo que a medusa não empregue nenhuma força para provocá-lo. COMIDA DE FARAÓS TAMBÉM ERA MUMIFICADA Quando morriam, faraós eram sepultados ao lado de itens de luxo e de comida. Pesquisadores britânicos descobriram que o ritual para embalsamar o último jantar dos reis também era sofisticado, envolvendo cera de abelha, gordura aplicada nos tecidos que envolviam as carnes e uma resina especial. ROBÔ NO ENEM JAPONÊS DE 2021 A Fujitsu, gigante japonesa do mercado de tecnologia, anunciou que está desenvolvendo um robô que terá a missão de passar no teste da Universidade de Tóquio até 2021. A prova está entre as mais difíceis de toda a Ásia — ou seja, ele terá que pensar de verdade, não adianta chutar na grade. PRÉ-PAGO DE ENERGIA SOLAR Um novo sistema está substituindo o querosene na África subsaariana, que, além de caro, induz o câncer de pulmão. Habitantes de zonas rurais estão usando placas solares pré-pagas, cujo energia custa menos da metade do querosene. “Vamos escrever OS LIVROS DE HISTÓRIA MAIS TARDE", disse o norueguês Magnus Carlsen, novo campeão mundial de xadrez, de 22 anos, tentando reduzir as expectativas sobre sua promissora carreira. Ele venceu o indiano Viswanathan Anand e levou um prémio de £ 1,4 milhão. 2 MILHÕES DE DÓLARES foi o adiantamento recebido pelo crítico literário norte-americano Garth Risk Hallberg para publicar seu primeiro romance, um valor inédito no mercado editorial para novatos. O livro, City on Fire ("Cidade em chamas"), sairá pela editora Knopf e terá 900 páginas. Ainda não há previsão de lançamento. 2#2 SUPER NOVAS – ÁGUAS DE NINGUÉM A ONU está em busca de zeladores para cuidar de dois terços dos oceanos. — TEXTO / Rossana Silva Setenta por cento dos 510 milhões de km2 da Terra são ocupados pelos mares. E dois terços dessa infinidade de água não têm dono. Ou seja: não há nenhum tipo de legislação sobre a pesca ou pesquisas que utilizem os recursos do fundo do mar em toda essa área. Esse vazio jurídico ocorre porque apenas as 200 milhas náuticas de cada país, contadas a partir do litoral, estão sujeitas às leis nacionais. Fora desse limite, não existe tribunal para julgar um navio que lava seus tanques com produtos químicos em alto-mar, por exemplo. "Isso é preocupante porque estamos vendo uma crise grave da biodiversidade marinha, com zonas sem oxigênio", explica o brasileiro André Abreu de Almeida, que coordenou a Campanha Oceanos da ONU com vistas à realização da Rio+20 e trabalha na ONG Tara Expeditions, da França. Em 2008, um relatório da União Internacional pela Conservação da Natureza (IUCN) concluiu que menos de 1% dos oceanos têm áreas protegidas. Essa situação pode começar a ser solucionada com a criação de um novo órgão dentro da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (Unclos). A expectativa é que a nova instituição seja aprovada na 69a Assembleia-Geral da ONU, em setembro de 2014. Ambientalistas e a comunidade científica torcem para que a nova agência seja criada nos moldes da International Seabed Authority, responsável por legislar apenas o fundo do mar — e não a coluna d'água. 2#3 CIÊNCIA MALUCA TEXTO / Carol Castro INVERNO FAZ HOMEM QUERER MAIS SEXO Essa foi a conclusão de um estudo feito com 114 homens, que avaliaram fotos de mulheres quatro vezes ao longo do ano. As notas dadas aos rostos femininos se mantiveram sempre as mesmas. Mas os corpos ganharam notas mais altas no inverno. Segundo os autores da pesquisa, isso acontece porque nessa estação as mulheres ficam mais cobertas — e, nas raras vezes em que os homens veem um corpo seminu, ficam loucos por ele. SUPERSTIÇÕES ACALMAM A CABEÇA Num teste, psicólogos pediram a voluntários que falassem em voz alta: "Eu nunca vou sofrer um acidente de carro". Isso fez as pessoas ficarem com medo. Em seguida, metade delas foi estimulada a dar batidinhas na madeira da mesa — e se acalmou. É que rituais devolvem a sensação de autocontrole e tranquilizam a mente. MAIS PSIQUIATRAS, MAIS SUICÍDIO Pesquisadores compararam o número de psiquiatras, os leitos para doentes mentais e a taxa de suicídio em 191 países. E perceberam que, quanto melhor o sistema de saúde, maior o índice de suicídio. A possível explicação é que, onde há mais psiquiatras, o governo registra dados mais precisos sobre a causa da morte das pessoas (como suicídio). Fonte: Men's attraction to women's bodies changes seasonally. Boguslaw Pawlowski e outros. Universidade de Wroctaw. Reversing one's fortune by pushing away bad luck. Jane L. Risen e outros. Universidade de Chicago. National suicide rates and mental health system indicators: An ecological study of 191 countries. Anto Rajkumar e outros. Universidade Aarhus (Dinamarca). 2#4 SUPER NOVAS – COLABORAÇÃO EXTREMA Programadores não estão mais sozinhos no GitHub. A rede social está sendo usada por noivas, governos e até para paquerar. TEXTO / Melissa Schröder No dia 7 de julho de 2013, os usuários da rede social GitHub foram surpreendidos por uma postagem. A Secretaria Nacional de Articulação Social compartilhou um arquivo em seu perfil com propostas para a Política Nacional de Participação Social e incentivou as pessoas a melhorá-lo. Seria apenas curioso usar um site popular entre hackers e programadores para aprimorar um texto jurídico, mas casos parecidos estão ficando comuns no GitHub. Projetos de lei já são escritos, revisados e melhorados pelos usuários da rede, que estão levando o espírito da colaboração a patamares nunca antes desbravados. Criado por Tom Preston-Werner em 2008, nos Estados Unidos, o GitHub é uma espécie de Facebook para nerds. O usuário posta o projeto, e os outros comentam, corrigem e modificam o arquivo. A grande vantagem é a possibilidade de acesso a todas as versões. Se o projeto não foi pelo caminho que os autores imaginavam, por exemplo, é possível voltar ao ponto que desejarem. Faz pouco tempo, a rede era usada apenas para aprimorar softwares e códigos —, basicamente só se encontrava linguagem de programação por lá. Até que alguns usuários deram uma nova utilidade ao GitHub. Aproveitaram a ferramenta para resolver problemas de todos os tipos coletivamente. No início do ano, o engenheiro de sistemas Bubby Rayber convidou amigos e familiares para o casamento através do GitHub. Depois da postagem, um amigo corrigiu um erro de digitação no convite e outro adicionou uma nota para quem quisesse desejar felicidades ao casal. O número de colaborações impressiona. Há cerca de dois anos, um artigo publicado no GitHub pela equipe da revista Wired ganhou 12 versões novas menos de seis horas após as postagem. As alterações incluíam correções de erros de digitação e gramática e uma tradução para o espanhol. Teve até quem tentou encontrar a metade da laranja por lá. Moradora de Tóquio, Noriko Hagashi postou seus interesses e objetivos na esperança de que o príncipe encantado aparecesse pela rede social. A realidade, porém, foi dura. A moça acabou recebendo algumas críticas e um usuário chegou a revelar inconsistências em seus critérios. 2#5 ESSENCIAL – O GIGANTE (DO FUTEBOL) ACORDOU Os protestos de junho geraram um filhote inesperado: a união dos jogadores de futebol pelos seus direitos. Saiba por que esse é um fato histórico. TEXTO Fábio Soares No último 13 de novembro, o Cruzeiro conquistou os pontos que faltavam para confirmar o título do Brasileirão. Mas aquela 34ª rodada do campeonato ficaria marcada por uma disputa bem mais abrangente. Pela primeira vez na história, jogadores de futebol cruzaram os braços. Em quase todas as partidas daquela quarta-feira, equipes inteiras ficaram imóveis ou trocaram passes insossos durante o primeiro minuto dos jogos. O levante foi arquitetado pelo Bom Senso F.C., grupo recém-criado por atletas que reivindicam melhores condições de trabalho. Parar de jogar duas vezes por semana é o principal ponto da pauta. Assim como as manifestações populares que tomaram as ruas em junho, o ultimato dos jogadores surpreendeu, considerando a histórica passividade da categoria diante de seguidos calendários ilógicos, que minam suas articulações e abreviam suas carreiras. Os atos do meio do ano, na esteira da Copa das Confederações, tiraram os boieiros da inércia. "Serviram de inspiração", dizem os cabeças do movimento. E no lugar dos "graças a Deus", "o time tá unido", "vamos atrás dos três pontos" e outros jargões surrados no meio, entrou o discurso sobre direitos trabalhistas e fisiologia. Liderados por Paulo André (Corinthians), Alex (Coritiba), Rogério Ceni (São Paulo), Dida (Grêmio) e D'Alessandro (Inter), o movimento já tem praticamente todos os jogadores dos principais clubes do país engajados. E elenca algumas prioridades: menos jogos no calendário, férias de 30 dias, punição a clubes que atrasem salários e representatividade dos jogadores na CBF e nas federações. Nada disso apareceu no calendário anunciado para 2015. Veio então o gesto coletivo do dia 13. O calendário atual reserva 21 datas para esses torneios, espremidos entre Libertadores e Copa do Brasil. Dessa forma, os jogos ficam concentrados nos cinco primeiros meses do ano e encurtam férias e pré-temporadas. É unânime entre o Bom Senso que para corrigir isso é preciso encurtar os campeonatos estaduais. Tal mudança, no entanto, esbarra nas federações estaduais e na Rede Globo, que financia os clubes em troca dos direitos de transmissão. As federações querem esses certames longos. Como são os votos de seus mandatários, que elegem o presidente da CBF, querer é poder. Convencer a Globo a reprogramar sua grade, com partidas às quartas e aos domingos, tampouco é simples. O Bom Senso argumenta que, nesse debate, menos é mais. Com um calendário enxuto, os jogadores ganharão tempo de preparação, o número de contusões diminuirá, a qualidade dos jogos vai melhorar e o produto pelo qual a emissora paga R$ 1,6 bi por ano atrairia mais gente. A premissa é amparada por números. Entre 2012 e 2013, a média de público da Série A caiu da 13ª para a 18ª do mundo, atrás da Austrália, país com tradição zero no futebol. No ranking de ocupação dos estádios, o pentacampeão Brasil despencou de 18º para 31º do mundo. Uma comparação entre o tempo de descanso entre times de ponta no Brasil e na Europa ajuda a explicar. Um exemplo: o Bayer de Munique, que chegou à final de todos os torneios que disputou na última temporada europeia, fez 54 jogos. Enquanto isso, alguns times brasileiros jogaram quase 80 partidas. E um que tivesse alcançando as finais da Libertadores e da Sul Americana, por exemplo, chegaria a 87. Aí não tem joelho que aguente. Até o fechamento desta edição, uma comissão do Bom Senso tinha se reunido duas vezes com a CBF e uma com a Globo. O grupo se comprometeu a apresentar alternativas ao calendário atual, no qual 101 clubes jogam o ano todo, enquanto outros 500 jogam apenas quatro meses. Seja como for, o que mais chama a atenção nessa história é um contraste. O contraste entre o discurso tranquilo e articulado de Paulo André, o principal porta-voz do movimento, com a verborragia obtusa dos cartolas que mandam no futebol. E a inteligência está mostrando resultado. Tanto que, segundo os líderes do Bom Senso, a conversa com a Globo rendeu. Mas, para variar, a reação da CBF, ou a falta dela, foi decepcionante. Veio então outro protesto na rodada dos dias 23 e 24 de novembro. Jogadores de Vasco e Cruzeiro sentaram no gramado por 30 segundos depois do apito inicial, sob aplausos dos torcedores no Maracanã. O passo em discussão pelo Bom Senso agora é prolongar esses segundos de paralisação para uma greve geral no início de 2014. É algo sem precedentes no Brasil. E que funciona. Na Argentina, por exemplo, greves de jogadores levaram a conquistas relevantes. Na primeira, em 1931, após oito paradas, conseguiram profissionalizar o futebol por lá. A partir dos anos 1970, houve pelo menos uma greve por década, a última em 2001. O que está acontecendo aqui, porém, é algo maior. Nesses tempos de comunicação onipresente e instantânea, o conjunto dos nossos jogadores formou uma espécie de inteligência coletiva, capaz de negociar diretamente com quem paga pelo show — a TV e a própria torcida, que apoia o movimento. Tudo isso faz pensar: será que o Brasil ainda precisa de gente como José Maria Marin, o presidente da CBF? Imaginamos que não. Pelo jeito, nossos jogadores estão a caminho de tornar a CBF desnecessária. Tão obsoleta quanto a figura de seu presidente. 2#6 BANCO DE DADOS – ABELHAS Elas estão desaparecendo no Hemisfério Norte, o que pode ter consequências na nossa alimentação. E não, não estamos falando só de mel. INFOGRÁFICO / Felipe van Deursen, Rafael Quick e Aurélio Amaral SUMINDO DO MAPA: População (EUA) 1947 – 6 milhões 1990 – 3 milhões 2013 – 2,5 milhões TAXA ANUAL DE MORTALIDADE 13% Aceitável EUA 30% Europa 7 a 22% 61% dos apicultores americanos tiveram perdas superiores a 30% em 2011 O MOTIVO Pesquisas apontam como possíveis causas: Vírus Bactérias Ácaro parasita Pesticidas Estresse no transporte das colmeias E se elas sumirem do mundo? Leia na p. 88 (reportagens) INSETO PODEROSO 73% das espécies vegetais cultivadas no mundo são polinizadas por abelhas. São essenciais na polinização de 71 das 100 maiores culturas de alimento (que são 90% da comida do mundo). Os 71 alimentos têm valor de mercado de US$ 121,5 bilhões AMEAÇA ÀS AMÊNDOAS... 3/5 das abelhas dos EUA são polinizadoras de amendoeiras. Os EUA produzem 80% das amêndoas do mundo .. E A MUITOS OUTROS Um mercado dos EUA quis chamar a atenção para o problema ao deixar de vender alimentos cuja produção depende das abelhas: 237 dos 453 produtos saíram das prateleiras. BAQUE NO MEL A produção caiu em alguns dos maiores produtores mundiais Produção em toneladas 1- CHINA 2010 431 mil 2011 402 mil 2- TURQUIA 2010 94 mil 2011 82 mil 4- EUA 2010 67 mil 2011 66 mil 5- RUSSIA 2010 60 mil 2011 53 mil 11- BRASIL 2010 41 mil 2011 38 mil VOA, VOA As operárias viajam até 6,5 KM em busca do néctar das flores. 10 MILHÕES de viagens são necessárias para fabricar um pote de mel (450 gramas) RELAÇÃO ANTIGA Os egípcios foram os primeiros a domesticar as abelhas RELAÇÃO COM HUMANOS (EM ANOS) Cães 32.000 Gatos 10.500 Galinha 8000 Boi 9000 ABELHA 5000 Pato 4500 SOCIEDADE ORGANIZADA As abelhas se organizam em minicidades do tamanho de uma jaca UMA COLÔNIA MÉDIA TEM: 1 RAINHA a única fêmea fértil 300 ZANGÕES (os machos) 50 MIL OPERÁRIAS, fêmeas inférteis, das quais: 25 MIL OPERÁRIAS MAIS VELHAS, encarregadas de voar para buscar alimento 25 MIL OPERÁRIAS JOVENS, responsáveis por: Alimentar 9 MIL LARVAS Cuidas de 6 MIL OVOS E 20 MIL PUPAS (nesses estágios de desenvolvimento, elas não precisam mais ser alimentadas) Fontes: Departamento de Agricultura dos EUA. Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). Whole Foods Market. Museu de Arqueologia da Filadélfia/Universidade da Pensilvânia (EUA). Associação Internacional de Pesquisas sobre Abelhas “A queda não é necessariamente ligada à redução da população de abelhas. 2#7 PAPO – CLIQUES E HECTARES Um dos fotógrafos mais famosos do mundo, Sebastião Salgado agora é visto por outro ângulo: ambientalista. Além de retratar a natureza em seu último projeto, Gênesis, já ajudou a plantar 2 milhões de árvores. E ainda quer salvar uma bacia hidrográfica. TEXTO / Ester Jacopetti Você já retratou trabalhadores, refugiados, guerras. Agora, buscou comunidades isoladas. Por quê? Para aprender. Descobri que somos velhos de 50 mil anos. O que é essencial hoje já era essencial no passado. Nós só sistematizamos. Essas comunidades já tinham antibióticos, anti-inflamatórios. Até conceito de balística, os índios já tinham: o caçador leva um punhado de flechas e não pode perdê-las, se não morre de fome. Por isso, lança a flecha de um ângulo em que, mesmo perdendo o alvo, consegue recuperá-la. Como foi fotografar animais pela primeira vez? Tive que me preparar, estudar, não foi brincadeira. Trinta e duas reportagens visuais ao longo de oito anos me ensinaram uma coisa: existe racionalidade profunda nas outras espécies, nos pássaros, nos leões. Até nas rochas. Nós temos que aprender a respeitar isso. E viver de forma muito mais doce e menos agressiva. A natureza chegou às suas fotos agora, mas já havia uma ligação anterior. A fazenda da minha família, no interior de Minas, era um verdadeiro paraíso. Eu convivi com jacarés naqueles córregos maravilhosos, com as onças... Tive uma vida de sonho! Nos anos 90, voltei do exterior para essa fazenda e havia só 0,5% de cobertura florestal. Foi quando a Lélia, minha esposa, teve a fabulosa ideia de recuperar a mata atlântica da região. Mobilizamos parceiros e fundamos em 1998 o Instituto Terra, uma organização ambiental dedicada ao desenvolvimento sustentável do Vale do Rio Doce. Quais os resultados até agora? No dia em que entregaram o projeto, tomamos um susto: para recuperar toda a área, era necessário plantar 2,5 milhões de árvores. Mas aceitamos o desafio. Já plantamos 2 milhões. Um dos grandes parceiros do instituto é a mineradora Vale do Rio Doce. Há contradição? Não vejo nenhuma contradição em trabalhar com uma mineradora ou até mesmo bancos. Nosso conselho diretor é composto de membros da Vale, ex-diretores de bancos, membros da sociedade civil. Nós não temos dinheiro. Nós temos a capacidade de organização. E conseguimos o que queremos: recuperar a Mata Atlântica. Já sabe seu próximo projeto fotográfico? Vou continuar a fotografar. Mas Gênesis foi o último trabalho grandioso. Em fevereiro, faço 70 anos e fisicamente já não tenho a potência que tinha. E o próximo projeto ambiental? Estamos iniciando o projeto Olhos d’Água. O objetivo é recuperar a bacia do rio Doce — mais ou menos do tamanho de Portugal. O ministério do meio ambiente quer que sirva de protótipo para a recuperação dos outros rios brasileiros. Já há uma mudança: fazendeiros que foram contra o reflorestamento hoje fazem fila para que a gente recupere suas fontes de água. 2#8 MATRIZ – VERSÕES PARA O CINEMA 2013 foi o ano das adaptações cinematográficas, com graus variados de fidelidade e Sucesso. INFOGRÁFICO Emiliano Urbim e Inara Negrão GIOVANNI IMPROTTA - Bicheiro de Senhora do Destino deu mico na cabeça. (baseado em novela) CRÔ-O FILME - Nem celebridades salvam o mordomo de fina Estampa. (baseado em novela) CARRIE, A ESTRANHA - Estranho foi fazer a nova versão. (baseado em livro de ficção) FLORES RARAS - Quem buscou romance viu aula de história-bilíngue. (baseado em livro de não-ficção) O JOGO DO EXTERMINADOR - "Best-seller jovem? Faz o filme!" (baseado em livro de ficção) MINHA MÃE É UMA PEÇA - Dá pra rir um pouco. Mas pouco. (baseado em peça) A VIDA SECRETA DE WALTER MITTY - Ben Stiller sério, recepção morna. (baseado em livro de ficção) O HOBBIT: A DESOLAÇÃO DE SMAUG - Meio de trilogia sempre promete. (baseado em livro de ficção) ANNA KARENINA - Filmada num teatro, adaptação esperta e fiel da obra de Tolstói. (baseado em livro de ficção) O GRANDE GATSBY – Prejudicado pela direção carnavalesca. (baseado em livro de ficção) TEMPO E O VENTO - Clássica versão para um clássico. (baseado em livro de ficção) O LADO BOM DA VIDA - Bom filme, apesar das partes ruins (apostas, bipolaridade, dança) criadas só para o cinema. (baseado em livro de ficção) OS INSTRUMENTOS MORTAIS: CIDADE DOS OSSOS - "Best-seller jovem? Já disse: faz o filme!" (baseado em livro de ficção) O CAVALEIRO SOLITÁRIO - Houve muito espectador solitário. (baseado em rádio) PERCY JACKSON: MAR DE MONSTROS - "Filme do best-seller jovem foi fiasco? Faz a sequência!" (baseado em livro de ficção) JACK, O CAÇADOR DE GIGANTES - Ou: João e o pé-frio-de-feijão. (baseado em livro de ficção) JOBS - Gênio, líder, santo... A biografia autorizada é bem mais honesta. (baseado em livro de não-ficção) FAROESTE CABOCLO - Não tenha medo do João de Santo Cristo. (baseado em canção) JOGOS VORAZES: EM CHAMAS - Meio de trilogia não compromete. (baseado em livro de ficção) CAPITÃO PHILLIPS – Mudanças tornaram o enredo melhor. (baseado em livro de não-ficção) JOÃO E MARIA: CAÇADORES DE BRUXAS - Tão, tão absurdo que é divertido. (baseado em livro de ficção) HOMEM DE AÇO - Mito atualizado magoou fãs. Azar deles. (baseado em quadrinho) GUERRA MUNDIAL Z - De história oral falsa a bom blockbuster. (baseado em livro de ficção) 2#9 COORDENADAS UM SANTUÁRIO DE ANIMAIS NO LITORAL COLOMBIANO Bahia Solano, Choco, Colômbia. Paisagens intocadas são refúgio de baleias, tartarugas e 12% de todas as espécies de aves do mundo. TEXTO / Carol Castro A Colômbia é o único país sul-americano banhado por dois oceanos. Se no mar do Caribe estão as praias mais famosas, no Pacífico há mais paisagens preservadas, como na Bahia Solano. Mas chegar aqui não é fácil: chove tanto que não há rodovias na região, e, para complicar, os Andes a separam do resto do país. A natureza agradece o isolamento. Graças a ele (e à chuva), as cidades de Bahia Solano e Nuquí, com menos de 9 mil habitantes, recebem poucos turistas. Os principais visitantes são outros: aves, baleias-jubarte e tartarugas. Esses, sim, são uma multidão. A Colômbia é um dos países com mais espécies de aves do mundo. E metade delas (mais de 900) está em Solano. Isso equivale a quase 12% de todas as espécies de pássaros do planeta. Cerca de 200 delas (entre águias, falcões e aves praieiras) só aparecem de outubro a abril para fugir do inverno da América do Norte. O restante (tucanos, tangarás, patos etc.) passa a vida toda aqui – e mais de 200 desses pássaros são endêmicos, ou seja, só existem na região. A explicação para tamanha diversidade é que não faltam opções de comida. "São mais selvas, mais recursos que no Caribe, onde é mais seco. Há uma variedade grande de ambientes distintos", diz Felipe Estela, zoólogo e ornitólogo colombiano. Na praia, as aves brilham. Quando o mar baixa, elas abocanham peixinhos que a água abandona na areia. O banquete vira um imã de pássaros. Qualquer leigo, como eu, se impressiona com tantos bichos coloridos que passeiam por aqui. Um espetáculo. VÁ: O voo mais comum é via Medellín. De barco, é uma viagem de um dia a partir do porto de Buenaventura, próximo a Cali. Não há estradas. QUANDO: Entre setembro e dezembro, há baleias-jubarte, tartarugas-marinhas e ainda mais espécies de aves migratórias. ESTE MÊS, NESTE PLANETA KIRIMATI 01,91° N 157, 39° O Primeiro lugar habitado a receber o Ano-Novo, a ilha pertence à República de Kiribati, arquipélago que até 1995 era cortado ao meio pela Linha Internacional da Data. SADO 38,01° N 138, 36° L Já viu a moda de gente com máscara de cavalo? Não? Pois nessa ilha, no Japão, isso é costume de Réveillon: as pessoas dançam mascaradas em volta das casas. UM MOMENTO 26/12, 11H30 Centenas de nadadores, muitos fantasiados, encaram o frio de até 5 °C e se jogam no mar em Tenby, País de Gales, em uma famosa e tradicional competição beneficente. 100.000 pessoas num estádio em Melbourne verão a seleção de críquete da Austrália receber a Inglaterra dia 26. É mais que em jogo da Copa. QUE LUGAR É ESSE? 1- Tem cerca de 40.100 km2 2- É uma ilha fluvio-marinha, ou seja, é banhada por rio e mar. 3- Famosa por ter um bovino pouco comum no resto desse país. Resposta Ilha de Marajó (PA). É a maior ilha fluviomarinha do mundo. Os búfalos chegaram no século 19, e hoje a ilha tem quase 30% de todo o rebanho do Brasil. 2#10 ORÁCULO DESSALINIZAÇÃO DO CHORUME A verdade sobre Papa-Léguas, Projeto Kony, focas, noz-moscada e outras coisas sem a menor ligação. ÁGUA QUE PINGUIM NÃO BEBE Se os mamíferos bebem água doce, o que bebem focas, leões-marinhos e pinguins? Carregam cantil ou compram garrafa de água mineral? - Everaldo de Araújo, Sapucaia do Sul. RS Engraçadão. Mamíferos marinhos bebem água doce, mas não como os mamíferos terrestres. Esses animais retiram a água da própria comida para beber, explica Ana Paula Costa, bióloga e pesquisadora do Laboratório de Mamíferos Aquáticos da UFSC. Eles fazem um processo bioquímico que retira a água dos alimentos durante a digestão. Aves como o pinguim fazem essa filtragem em uma glândula específica, e mamíferos, no rim. DILEMAS DE LARINGE Como engrossar a minha voz? Já tenho 22 anos e não a acho muito grossa. - Felipe Fernando da Silva. Santo André. SP O problema pode ser anatômico, como laringe infantil, alterações hormonais ou pregas vocais pequenas. Para resolver, você pode fazer terapia fonoaudiológica, com exercícios para reposicionamento da frequência da voz, ou tratar com medicamentos ou cirurgia, explica a fonoaudióloga Mara Behlau, diretora do Centro de Estudos da Voz. Ou então você pode se assumir e tentar virar tenor, vocalista de banda de metal farofa ou lutador de MMA. DESERTO VERDE Que árvore consome mais CO2? - Guilherme da Silva, Jaraguá do Sul, SC A turma especializada não tem consenso, mas há um forte candidato. "Se pensarmos somente em uma espécie que aproveita bem a energia solar e capta eficientemente o CO2, o mais provável é o eucalipto", diz Fernanda Reinert, especialista em fisiologia vegetal e professora da UFRJ. Mas eucaliptos estão longe de serem mocinhos ecológicos. Apesar de sugarem muito gás carbônico, matam a diversidade da flora ao redor devido à pequena incorporação de matéria orgânica no solo, fundamental para nutrir as plantas. Por isso as florestas de eucaliptos têm tão poucas plantas – não enche nem uma mísera sauna. OPORTUNIDADE O necrochorume poderia ser canalizado e utilizado para geração de energia? - Amlerson Idianin, João Pessoa, PB. Jamais, mr. Anderson. Não há tecnologia, interesse econômico nem permissão para fazer isso. O necrochorume, líquido que sai de cadáveres em decomposição – veja só que agradável –, tem menos componentes energéticos que o chorume do lixo, que é usado para o mesmo fim, explica Leziro Marques-Silva, especialista em, tocharam, necrochorume. Para piorar, dilemas morais, legislação funerária e desafios sanitários são um impeditivo a mais para sua bizarra usina de cadáveres sair do papel. MEME POLÍTICO O que se deu com o projeto Kony 2012? Tanto burburinho, tanta manifestação e aí não se tem mais notícia dos resultados. - Aline Maezuto, São Paulo, SP Para quem não lembra, em março de 2012 um vídeo de alto impacto emotivo atingiu a marca de 100 milhões de visualizações em seis dias e foi o assunto do momento em vários cantos do mundo. Ele apresentava Joseph Kony, chefe do Exército de Resistência do Senhor, procurado pela Corte Penal Internacional por crimes de guerra em Uganda e em países vizinhos. O objetivo do projeto era tornar conhecido Kony, o que funcionou, embora o burburinho tenha durado pouco. A Invisible Children, responsável pela campanha, diz que os ataques cometidos pelo grupo caíram na primeira metade de 2013. Mas Kony não foi pego. É preciso outro meme? QUER QUE DESENHE? Qual a altura máxima que uma pessoa pode saltar na água sem sofrer danos graves? - Rodrigo Fávaro, São José do Rio Preto, SP Mergulhadores profissionais evitam alturas superiores a 40 metros. O resto dos mortais não deve passar do trampolim do clube. Quanto menos contato no impacto, melhor. Pés e braços devem estar esticados, formando uma flecha humana. Mesmo profissionais se arrebentam: lesões nos joelhos e tornozelos não são raras. Muitos não conseguem voltar à superfície sozinhos. Fontes: Vicenzo Giordano, presidente da Sociedade Brasileira de Ortopodia e Traumatologia do Rio de Janeiro. UMA DE DESENHO ANIMADO Será que o Coiote poderia vencer o PapaLéguas na vida real? - Gabriela Della Méa. Porto Alegre, RS Certamente. Até porque o Papa-Léguas original é um pássaro relativamente pequeno e atrapalhado, o roadrunner (Geococcyx californianus). Ele tem só cerca de 50 cm de comprimento, ou seja, não é aquele cruzamento de avestruz com Usain Bolt do desenho. Eduardo Eizirik, professor da PUCRS, diz que a ave, que habita o México e os Estados Unidos, atinge 30 km/h. Pouco para o coiote, um dos animais mais velozes do mundo, que chega a 69 km/h. A única chance do roadrunner, então, é voar. Mesmo assim ele pode ser pego, já que seu voo é desengonçado e pouco funcional – como um artefato ACME. MAMÍFEROS MAIS RÁPIDOS DO MUNDO GUEPARDO 115 Km/h ANTILOCAPRA 98 Km/h GAZELA 80 Km/h LEOA 80 Km/h GNU 80 Km/h PÁ PUM Meu falecido pai adorava ralar noz-moscada. Li na SUPER que ela tem substâncias alucinógenas. É possível dizer que ele era viciado? - Raísa Bitencourt, Porto Seguro, BA Talvez, já que alguns gramas dão alucinações e um barato como o de anfetaminas. NÚMERO INCRÍVEL 54% Redução dos ataques de Kony em Uganda. OUTRO DADO RELEVANTE SEM NENHUMA LIGAÇÃO 54% dos palestinos apoiam a existência dos Estados de Israel e Palestina. Fontes Arab World for Research & Development; The Encyclopedia of Addictive Drugs PERGUNTE AO ORÁCULO! Escreva para superleitor@abril.com.br com o assunto "Oráculo" e mencione sua cidade e Estado. 2#11 CONEXÕES – DE DODÔ A BARDOT TEXTO Giselle Hirata DODÔ - Pássaro das ilhas Maurício, extinto no século 17 com a exploração de europeus no arquipélago. Marinheiros e animais domésticos, como cães e gatos, trazidos nas embarcações, caçaram a ave até ela desaparecer da Terra. Hoje, o dodô é um ícone do país, que tem muitos animais que só existem ali, assim como... MADAGÁSCAR - Graças ao isolamento geográfico, essa grande ilha do Índico tem várias espécies endêmicas, como o lêmure. O excêntrico primata já foi personagem de desenhos animados e videogames, mas ficou famoso para valer ao cantar "I like to move it, move it" nos filmes da série de animação Madagáscar, da... DREAMWORKS - O estúdio é conhecido por filmes estrelados por animais, como A Fuga das Galinhas e O Espanta Tubarões. Outro longa famoso é Kung Fu Panda, que se passa na China, terra dos pandas. O animal é símbolo da preservação de espécies ameaçadas e mascote de uma das maiores ONGs do tipo, o... WWF - O World Wide Fund for Nature se propõe a recuperar áreas ambientais e conservar a diversidade biológica mundial. Com sede na Suíça, foi criado por cientistas preocupados com a devastação da natureza, causa que há décadas atrai artistas engajados, como... BRIGITTE BARDOT - Atriz francesa símbolo sexual nas décadas de 1950 e 60, famosa por filmes como E Deus Criou a Mulher e Um Ato de Amor. Em 1973, anunciou sua aposentadoria e virou ativista ao criar a Fundação Brigitte Bardot, que defende os direitos dos animais e luta para que eles não tenham um destino cruel – como o dodô. 2#12 IDEIA VISUAL – BOA AÇÃO DO DIA Reciclar. Andar de transporte público. Economizar água. Tudo isso faz bem para o planeta. Mas uma das formas mais eficientes de ajudar o ambiente está na sua alimentação: basta deixar a carne de lado uma vez por semana. — Karin Hueck e Rafael Quick SEGUNDA SEM CARNE É FÁCIL, É DIFERENTE E É GOSTOSO. VEJA COMO É PEQUENO (E SABOROSO) O SACRIFÍCIO PARA SALVAR O PLANETA. [em um mês, trinta dias, nas segunda-feira não comer carne. Significa cinco dias sem carne. Em vinte e cinco dias pode comer carne] VAI NEGAR? Trocar o bife por uma macarronada com molho de tomate é uma baita boa ação. Duvida? No ano passado, matamos 31 milhões de bois no Brasil e cada brasileiro consumiu, em média, 23 kg de carne. Se toda a população deixasse de comer bife nas segundas-feiras, cerca de 4 milhões de bois seriam poupados, população equivalente a uma Croácia dos ruminantes (isso sem falar dos porcos, das galinhas e dos peixes que também vão para a panela). Além disso, cada quilo de carne gasta cerca de 10 mil litros de água doce para ser produzido (em uma estimativa bem baixa), o que faria a abstinência brasileira de bife durante um dia da semana economizar 10 trilhões de litros de água. Apenas. Se joga na pizza de mussarela que o planeta agradece. 3# REPORTAGENS dezembro 2013 ed. 327 3#1 CAPA – O FIM DOS CARROS COMO VOCÊ CONHECE 3#2 FAÇA VOCÊ MESMO – PRODUZA SUA PRÓPRIA ENERGIA 3#3 ZOOM – ANTES QUE ELES PARTAM 3#4 PERFIL – O COWBOY DO XINGU 3#5 MUNDO – QUEM TEM O QUÊ 3#6 ECONOMIA – A IDADE DO LITIO 3#7 SAÚDE – COMIDA QUÍMICA 3#8 INOVAÇÃO – O INCRÍVEL MANUAL DE INSPIRAÇÃO NA NATUREZA 3#1 CAPA – O FIM DOS CARROS COMO VOCÊ CONHECE Agora está em curso uma corrida para colocar nas ruas a próxima geração de carros, que vai dar fim aos maiores problemas do trânsito. Comece a se despedir de engarrafamentos, acidentes e motores barulhentos. REPORTAGEM Andreas Müller EDIÇÃO Alexandre de Santi Há 100 anos, em dezembro de 1913, o modelo T, o primeiro carro popular, começava a ser fabricado na novíssima linha de montagem da Ford. Hoje, 1 bilhão de automóveis circulam pelo mundo, ocupando 60% das ruas. Estamos no trânsito de São Paulo, ano 2030. E não é preciso apertar os cintos: nosso carro agora trafega sozinho pelas ruas, salvo de acidentes, graças a um sistema que o mantém em sincronia com os demais veículos lá fora. O volante, item de uso opcional, inclina-se de um lado para outro com se fosse manuseado por um fantasma. Mas ninguém liga pra ele - até porque o carro do futuro está cheio de novidades bem mais legais. Em vez dos tradicionais quatro assentos, o que temos agora é uma verdadeira sala de estar, com poltronas reclináveis, mesa no centro e telas de LED. As velhas carrocerias de aço foram substituídas por redomas translúcidas, com visibilidade total para o ambiente externo. Se você preferir, é possível torná-la opaca e transformar o carro em um ambiente privado, quase como um quarto ambulante. Como o sistema de navegação é autônomo, basta informar ao computador aonde você quer ir e ele faz o resto. Resta passar o tempo da forma que lhe der na telha: lendo, trabalhando, assistindo ao seu seriado preferido ou até dormindo. A viagem é agradável e silenciosa. Com suspensões inteligentes, o carro parece flutuar a 100 km/h, sem solavancos nem freadas bruscas. Os outros veículos andam pertinho, quase encostados na traseira um do outro, e não há nada de errado nisso – o sistema se encarrega de agrupá-los para economizar espaço nas ruas. O trânsito ainda é compacto, mas escorre como água, procurando qualquer brecha para fluir. Lá fora, não há mais a barulheira infernal de motores a combustão, escapamentos abertos e buzinas intermitentes. O ruído agora é outro. Os motores, movidos a baterias elétricas ou a hidrogênio, emitem apenas um zumbido discreto. O ar também está mais agradável. Não há mais aquela borra acinzentada que pairava no céu até uma década atrás, e você consegue sentir certo frescor nas narinas. Aliás, se você reparar bem, não existem mais congestionamentos nem acidentes. O último foi registrado em 2022, quando um sujeito tentou hackear o sistema de navegação do próprio carro. Felizmente, ninguém saiu ferido. Nosso passeio pela São Paulo de 2030 desemboca na avenida Paulista. E aqui temos de seguir a pé – a via foi fechada para veículos oito anos antes. Onde os carros e ônibus costumavam disputar cada palmo do asfalto, agora há um calçadão com cafés, praças, monumentos e artistas de rua. Para cruzá-lo, é preciso caminhar. Ou, se você preferir, pode embarcar num PRT, como é conhecido o Personal Rapid Transit, o único carro que tem autorização para circular no coração da maior metrópole brasileira. O passeio é barato, ecológico e bastante confortável: o robô que guia o PRT não exagera na velocidade, não xinga e não buzina para ninguém – e nem joga bituca de cigarro pela janela. No início, muita gente achou um absurdo fechar a avenida mais movimentada do Brasil, mas basta olhar pela janela para perceber que a mudança deu certo. A cidade, enfim, se movimenta. A ERA DO SMARTCAR Cenários como o descrito acima não têm nada de desvario. Vêm sendo imaginados há décadas por pesquisadores e designers de algumas das maiores empresas do mundo, da General Motors ao Google – embora seja improvável que toda a frota seja renovada até lá e que todas as cidades estejam preparadas para as novidades. A maioria das empresas trabalha com o pressuposto de que, até 2030, os carros já não precisarão mais de motoristas. A Volvo está desenvolvendo um sistema antibarbeiragem que impede manobras imprudentes – e promete, assim, eliminar mortes e ferimentos no trânsito a partir de 2020. No mesmo ano, a Nissan pretende colocar à venda seus primeiros veículos 100% autônomos. E a BMW aposta que os humanos vão se tornar inúteis ao volante a partir de 2025, ano em que tanto os carros quanto as ruas das grandes cidades estarão equipados para conversar entre si. "Levaremos mais alguns anos para ter carros totalmente automáticos. Mas, até lá, vamos desfrutar de inúmeros benefícios das tecnologias que já estão sendo desenvolvidas para tornar o carro mais seguro, estável e limpo", diz Chunka Mui, ex-engenheiro do Massachussetts Institute of Technology (MIT) e autor do livro Driverless Cars - Trillions Are Up for Grabs ("Carros sem motoristas - Trilhões estão em disputa", ainda sem tradução no Brasil). Pense nos celulares, que foram incorporando câmeras, aceleradores e outras tecnologias que ninguém imaginava ver em um telefone – mas que, somadas, deram origem uma nova categoria de produto, o smartphone. O carro vem passando por uma transformação semelhante. Radares, sensores de imagem e calor, câmeras inteligentes, sistemas de reconhecimento da fala, GPS superprecisos, roteadores para conexão à internet... Aos poucos, os veículos vão ganhar novas e surpreendentes funções. A Volkswagen, por exemplo, já comercializa, desde 2010, modelos com o opcional Park Assist, um sistema que faz a baliza e estaciona o carro sozinho. Da mesma forma, os carros mais avançados em circulação no Brasil trazem sensores de ré, bluetooth para comunicação por voz, tela integrada com aplicativos diversos de navegação, música e entretenimento, entre outras mordomias. Ou seja: a transformação está em pleno andamento – e, quando menos esperar, você terá se acostumado a uma forma totalmente diferente de circular pelas ruas. Para começar, você não vai mais guiar seu próprio carro. Ele será controlado por um robô, que poderá obedecer às ordens de um sistema central capaz de gerenciar o trânsito de toda a cidade, desviando você para o melhor caminho, evitando acidentes e congestionamentos. Ele provavelmente não será só seu – será compartilhado com outros usuários para evitar o excesso de veículos nas ruas. Finalmente, o carro estará integrado com os sistemas de transporte coletivo – imagine pagar a tarifa de car sharing, a passagem de ônibus e o tíquete do metrô, tudo com o mesmo cartão. Um passo essencial para atenuar os problemas de mobilidade nas grandes metrópoles. MOTORISTA? Há muitos anos, o governo norte-americano estimula empresas a desenvolver carros não tripulados. Parte desse estímulo fica evidente no Darpa Grand Challenge, uma competição tecnológica criada pela Agência de Pesquisa Avançada em Projetos de Defesa dos Estados Unidos, conhecida como Darpa. De tempos em tempos, a agência convoca universidades e empresas para apresentarem soluções a determinados problemas e as ideias mais promissoras recebem polpudos prêmios em dinheiro. Entre 2004 e 2007, o desafio da Darpa foi desenvolver um carro que zanzasse pelas ruas de forma 100% autônoma. Por trás disso havia, é claro, um objetivo militar: até 2015, o governo dos Estados Unidos quer que um terço dos veículos de terra de seu Exército consigam cruzar desertos e se embrenhar sozinhos em zonas conflagradas – uma defesa poderosa contra as recorrentes emboscadas que matam soldados norte-americanos nos fronts do Afeganistão. Mas a competição deixou um legado que vai muito além das táticas militares. Hoje, praticamente todas as montadoras – General Motors, BMW, Ford, Mercedes-Benz. Toyota, Nissan etc. – disputam uma corrida à parte para ver quem irá colocar no mercado o primeiro modelo capaz de atravessar as cidades sozinho. Uma das líderes na disputa é o Google, uma novata no mundo automobilístico. Em 2007, a gigante do sistema de buscas convocou os pesquisadores que mais se destacaram do Darpa Grand Challenge e começou a desenvolver um software próprio de navegação para carros autônomos. O primeiro protótipo surgiu em 2010 – e foi um sucesso. O Google Driverless Car, como é conhecido, não é exatamente um novo modelo de carro, e sim um equipamento que funciona acoplado a veículos convencionais. Por meio de uma série de sensores a laser, radares e câmeras, a engenhoca dirige normalmente pelas ruas: vai de um ponto a outro, para nos semáforos, mantém uma distância segura dos demais carros, dá a preferência na faixa de segurança e freia imediatamente diante de um obstáculo inesperado – por exemplo, uma pessoa que decide atravessar a rua sem olhar para os lados. Já é possível ver algumas unidades transitando pelo campus do Google, em Mountain View, na Califórnia. O sistema só não está pronto para ser usado porque ainda esbarra em algumas dificuldades. Uma delas é o preço: juntos, os equipamentos ainda custam mais do que os carros em que estão sendo testados – cerca de 150 mil dólares. Talvez por isso, os projetos mais bem acabados de carros autônomos venham de marcas de luxo, como a BMW e a Mercedes-Benz. Em Stuttgart, na Alemanha, a Mercedes está testando uma versão semiautônoma do Classe S – o plano é colocá-lo no mercado europeu a partir de 2014. O veículo traz câmeras em estéreo, que reconhecem distâncias e profundidades, e um sensor infravermelho para detectar obstáculos mesmo à pouca luz. Ao comando do motorista, assume o volante com destreza digna dos melhores choferes. Já A BMW está desenvolvendo novas versões-conceito da Série 5, com um piloto automático que faz todo o trabalho do motorista nas famosas autobahns alemãs. Nos arredores de Munique, onde vem sendo avaliado, o carro deixa ótimas impressões. Acelera até 120 km/h, realiza ultrapassagens e, quando necessário, se desvia de motoristas que surgem desavisadamente pelo caminho. Entrar em um esportivo de luxo e não dirigi-lo pode parecer um tanto desestimulante. Em compensação, os sistemas de direção autônoma tornarão o trânsito mais seguro e sustentável. E aí está a dura verdade: robôs dirigem melhor do que nós, humanos. O Google estima que, com eles, será possível reduzir os acidentes de trânsito em até 90%. "Carros autônomos não cometem imprudências, não tomam decisões por impulso e se mantêm dentro dos padrões de direção defensiva", diz Jay Baron, presidente do Centro de Pesquisa Automotiva dos Estados Unidos (CAR), que reúne cientistas e pesquisadores das maiores montadoras norte-americanas. Hoje, no mundo todo, os acidentes matam cerca de 1,2 milhão de pessoas por ano, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Só no Brasil, são 43 mil mortes a cada ano. E a maior parte delas ocorre devido à imprudência humana. Isso não significa que você perderá totalmente o controle do seu veículo. Os modelos do futuro terão a opção de direção manual para aqueles momentos em que vale a pena acelerar, sentir o motor e fazer as curvas com as próprias mãos. "A diferença é que haverá um sistema que vai supervisionar o veículo o tempo todo. E, se você cometer alguma imprudência ou fizer uma manobra arriscada, o sistema poderá entrar em ação e impedi-lo de ir adiante", descreve Baron, do CAR. No resto do tempo, os próprios robôs vão dirigir – e o farão com muito mais eficiência que nós, humanos. Conectados entre si, eles saberão na hora onde há acidentes, bloqueios, protestos e eventuais pontos de lentidão. Tal como o Waze, aquele aplicativo para celular que faz leituras inteligentes dos receptores de GPS de outros usuários, eles poderão calcular automaticamente a melhor rota até o destino desejado. Por isso, o Google – que comprou o Waze em junho deste ano por mais de US$ 1 bilhão – projeta uma redução de 90% também no tempo médio desperdiçado no trânsito. Para ter uma ideia; cada paulistano perde, em média, 2h43min por dia em deslocamentos, conforme um estudo realizado em 2009 pelo Ibope. Na São Paulo de 2030, usando a projeção do Google, o tempo médio cairia para apenas 16 minutos por dia. MAIS ESPAÇO Em dezembro de 2001, o empresário norte-americano Dean Kamen anunciou que havia inventado uma máquina capaz de revolucionar o transporte nas grandes cidades. Batizado como Segway, era um veículo individual que se equilibrava sobre duas rodas e andava na direção em que o condutor inclinava o corpo. Kamen imaginava que, no futuro, os moradores das grandes cidades trocariam seus carros por Segways – pelo menos para percorrer trechos mais curtos – e abririam, assim, muito mais espaço para a circulação nas ruas. Hoje, 12 anos depois, o cenário imaginado por Kamen ainda parece longe de se realizar (veja outros inventos que pretendiam salvar o mundo no quadro Mobilidade Fail). Mas não se pode dizer que sua invenção foi esquecida. O andador individual, hoje, é utilizado em estacionamentos de shoppings, serviços de vigilância e policiamento ostensivo de locais restritos a pedestres. E relegou ao mundo pelo menos uma ideia importante: a de que é preciso reduzir o tamanho dos veículos para liberar mais espaço nas ruas. Daí que os automóveis do futuro serão bem menores do que os atuais. A General Motors, por exemplo, apresentou em 2009 um carro-conceito conhecido como EN-V, que paira sobre duas roda utilizando o mesmo princípio tecnológico do Segway. Parecido com um grande casulo, o veículo tem espaço para apenas dois passageiros e deve ser lançado até 2021. Seu comprimento é de apenas 1,5 metro, menos da metade dos supercompactos atuais, como o Kia Picanto, o Fiat 500 e o Mini Cooper, que têm 3,5 metros de uma ponta à outra. Não é lá muito espaçoso – quem senta no carona fica com os braços encostados nos do motorista. Sua velocidade máxima é de monótonos 40 km/h e cada carga na bateria é suficiente para percorrer apenas 40 quilômetros. Mesmo assim, o EN-V traz características interessantes. A começar pelo design: trata-se do primeiro modelo que anda conectado às redes de gerenciamento do trânsito – a sigla EN-V vem de Eletric Networked-Vehicle, ou Carro Elétrico Conectado. Em torno dele vão embutidos três tipos de sensores, além de antenas wireless, GPS e controladores que leem as condições da rua, detectam prováveis obstáculos, estacionam sozinhos e tornam possível pensar no ideal do carro à prova de colisões. Por isso ele não tem para-choques, cockpit reforçado e nenhuma outra barreira mais sólida entre o passageiro e o ambiente externo: em um carro que nunca bate, basta a proteção do casulo. Veículos como o EN-V ajudarão a combater um das principais causas dos problemas do trânsito atual: o espaço absurdo que as pessoas ocupam com seu carro nas ruas. Em São Paulo, nos horários de pico, cerca de 78% da área disponível nas vias públicas fica debaixo de automóveis convencionais, com até cinco lugares. Só que o número de passageiros que trafega nesses automóveis é muito pequeno – mal chega a 28% das pessoas em trânsito, segundo a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), responsável pela pesquisa. Enquanto isso, os ônibus seguem a proporção inversa: espremem-se em apenas 8% do asfalto, mas carregam até 68% dos passageiros da cidade. Não é à toa que estão sempre lotados. "A população urbana está crescendo muito e todos desejam ter seu próprio veículo. Se nada for feito, as metrópoles vão parar", diz o professor Odilon Pavón Duarte, da Faculdade de Engenharia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Hoje, segundo a Organização Mundial da Indústria Automobilística, circulam pelo planeta cerca de 1 bilhão de carros. Até 2035, a frota deve chegar a 1,7 bilhão de unidades. De nada vai adiantar reduzir o tamanho dos carros se eles continuarem sendo usados como hoje. E aí está uma importante notícia: você não precisará ser dono de um veículo para andar em um. Basta estar disposto a compartilhá-lo com os outros. São cada vez mais comuns os serviços de car sharing, um negócio parecido com o das locadoras – a diferença é que o cliente pode alugar o carro para trajetos de curta duração e depois largá-lo em estações predeterminadas, como já acontece com as bikes de aluguel que se proliferaram nas capitais brasileiras. Normalmente, o serviço é oferecido por empresas especializadas. Mas já existem redes de car sharing tipo peer-to-peer (P2P), em que uma pequena frota é compartilhada e mantida por uma comunidade independente de usuários. Até a BMW, uma tradicional fabricante de automóveis, se arriscou no setor com o DriveNow, um serviço de compartilhamento lançado em 2012 em São Francisco que também atende cinco cidades alemãs. A diferença do DriveNow para outros sistemas é que os carros podem ser deixados em qualquer lugar, e não em estações. Entre os especialistas, há a convicção de que o compartilhamento vai se tornar não só mais popular mas obrigatório em algumas regiões das grandes metrópoles. E a razão é simples: dividir carros ajuda a desafogar o trânsito. Uma pesquisa da Zipcar, empresa norte-americana que popularizou o conceito de car sharing, aponta que cada veículo compartilhado atrai usuários suficientes para tirar 15 carros das ruas. O impacto é tão expressivo que algumas cidades já incluem o car sharing no seu planejamento de transporte. O projeto mais arrojado vem de Masdar City, erguida pelos sultões do petróleo em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes. Criada em 2006, Masdar quer ser vista pelo mundo como a "cidade do futuro". Para isso, conta com um aparato de energias 100% limpas e renováveis e um sistema de transporte à prova de engarrafamentos e poluição. Parte desse sistema se baseia em um conjunto de carros autônomos conhecidos como PRT (Personal Rapid Transit), que percorrem determinadas rotas, como os ônibus. Só que não há motorista e cobrador. A tarifa é paga com cartão de crédito e, em vez de 44 assentos, há apenas quatro. A expectativa é de que o PRT seja utilizado para ajudar a desentupir o trânsito em áreas de grande movimentação. Metrópoles como Nova York, Londres, Sidney e Singapura, por exemplo, já proibiram (ou cogitam proibir) a circulação de carros em bairros movimentados. E é aí que entram os novos meios de locomoção automatizada. "A tendência para os próximos 50 anos é a individualização do transporte público. Será um sistema formado por veículos individuais, mas que não pertencem a ninguém. São compartilhados", diz Lincoln Paiva, presidente da consultoria Green Mobility, de São Paulo. No futuro, é possível imaginar uma integração com o transporte coletivo. Quem comprar uma passagem poderá fazer um trecho de ônibus, passar para um metrô e terminar a viagem em uma unidade de car sharing. No Brasil não há, ainda, projetos tão arrojados como o de Masdar – aqui, o compartilhamento só existe em São Paulo, onde funciona a Zazcar. Mas não falta gente disposta a se aventurar nesse filão. Em Porto Alegre, três estudantes de engenharia da UFRGS criaram uma startup de car sharing que vai utilizar veículos 100% elétricos. O plano da empresa, a MVM Technologies, é inaugurar o serviço ainda em 2014 – no início, restrita a estudantes e professores da UFRGS. Quem alugar um carro terá um tempo preestabelecido para chegar ao destino. "Queremos que a utilização seja funcional e ajude a melhorar o trânsito. Não faz sentido as pessoas usarem o serviço para ficar dando voltinhas", diz Lucas André de Paris, um dos sócios da MVM. Os veículos serão comprados da espanhola Hiriko a US$ 25 mil a unidade. Além de motor elétrico inteligente, que economiza energia durante as inevitáveis paradas pela cidade, os modelos têm a peculiaridade de serem dobráveis: quando necessário, recolhem-se à metade do tamanho original e facilitam a vida de quem busca um lugar para estacionar. BUG NO SEMÁFORO Uma questão elementar, porém, ainda nos mantém longe do ideal dos carros superinteligentes: afinal, o que acontece se der bug no sistema? E se houver alguma mudança imprevista no trânsito? Coisas que o motorista brasileiro já dá por corriqueiro, como um bloqueio, uma rua no sentido inverso, um bueiro aberto ou um tronco de árvore na pista? A resposta para essas e outras perguntas depende não só dos carros mas também dos lugares onde eles vão trafegar. Isso porque as novas tecnologias de navegação e conexão móvel exigem certas condições mínimas para funcionar direito, como banda larga estável, sinal disponível de redes 3G ou 4G, sinalização clara, asfalto decente nas ruas etc. São poucas as regiões que oferecem isso tudo. "A viabilidade dessas tecnologias vai depender muito da infraestrutura de cada cidade", diz Marcelo Ehalt, diretor de Engenharia e Tecnologia da Cisco Systems do Brasil, uma das empresas que encabeçam o desenvolvimento de softwares e equipamentos para tornar os carros mais conectados. Alguns modelos, por exemplo, baseiam-se na leitura da faixa contínua nos acostamentos para manter o carro no rumo certo. No Brasil, eles provavelmente se perderiam nas curvas, já que somente 10% das estradas do país são pavimentadas e devidamente sinalizadas, segundo o Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes (DNIT). Por isso, os engenheiros da Cisco acreditam que a transformação do carro acontecerá em quatro etapas (ou "pilares"). Primeiro, o carro vai incorporar novos equipamentos de conexão com o mundo, como antenas, receptores, sensores e chips. Depois, será a vez de ligar esses equipamentos uns com os outros – imagine, por exemplo, conferir no seu smartphone se os pneus estão cheios ou se você esqueceu os faróis ligados. Só então vêm a terceira etapa, que é conectar os carros entre si e com a infraestrutura da cidade, e a quarta, que é transferir a montanha de dados gerada por essa rede a um centro de inteligência capaz de processá-los na nuvem. Essa comunicação vai se dar em uma faixa de frequência exclusiva, conhecida como Padrão DSRC, pouco suscetível a interferências. O problema é que nem todas as cidades estão preparadas para tê-la. Um dos lugares mais preparados do mundo para o carro do futuro é Songdo, cidade que está sendo construída do zero na Coreia do Sul, a 65 quilômetros de Seul. Com um investimento equivalente a RS 80 bilhões, o governo sul-coreano quer entregar a cidade já conectada à Internet das Coisas, como é conhecida a rede que unirá os objetos do dia a dia. Nas ruas, o asfalto de Songdo terá sensores capazes de detectar a presença de veículos e pessoas. Já os semáforos funcionarão de acordo com o trânsito: ao primeiro sinal de congestionamentos, eles abrem o sinal verde até dissipar o fluxo. E se você estiver a caminho do shopping, pode conferir na tela do seu tablet onde há uma vaga disponível de estacionamento. É parecido com o que ocorre em San Francisco (EUA), onde um sistema monitora 8,2 mil lugares para deixar o carro – quem preferir pode até pagar o parquímetro usando o celular e um cartão de crédito. "É muito mais do que conectar o carro, é conectar a cidade inteira", diz Ehalt, da Cisco, que está envolvida no projeto de Songdo. Com as tecnologias adequadas, o trânsito se tornará muito mais seguro do que hoje. Afinal, robôs não têm dúvidas, não hesitam, não cometem erros e nem provocam acidentes. "Se eu perguntar ao Google qual é o melhor caminho para chegar ao meu destino, ele me dará uma resposta. Mas, se eu perguntar a minha esposa, é provável que ela me responda com outras perguntas. Humanos são falíveis", diz Hitendra Patel, diretor do IXL Center, centro de pesquisas ligado à Hult International Business School, de Boston (EUA). Especialista em inovação, Patel acredita que, no futuro, os carros formarão uma grande rede neural capaz de aprender com a própria experiência. Recheados de sensores, os veículos vão colher dados sobre tudo – as condições de cada rua, os horários de maior movimento, as melhores rotas para certo destino. Aí bastará cruzar essas informações e analisá-las para ter um retrato completo de como funciona o trânsito da cidade. "O sistema vai aprender e compartilhar o aprendizado com os nossos carros, gerando um trânsito muito mais eficiente", diz Patel. TANQUE CARREGADO O maior obstáculo ao sonho da reinvenção do carro é energético. Não há, ainda, nenhuma alternativa que supere a velha gasolina em termos de praticidade, potência e custo. Os motores elétricos normalmente são fracotes e atingem baixas velocidades. A exceção são os carros da Tesla Motors, montadora de Palo Alto, no Vale do Silício. Seu novo Modelo S, lançado em 2012, traz um motor ultrapotente, com 416 cavalos, e pode chegar a impressionantes 200 km/h. O problema, aí, é o custo – cada unidade não sai da concessionária por menos de US$ 57 mil, ou cerca de R$ 130 mil, valor que pode não parecer muito para um carro de luxo no Brasil, mas que é alto para os gringos. Além disso, carregar a bateria não é tarefa das mais simples. Ainda há poucos postos adaptados nos Estados Unidos, e cada parada exige pelo menos 30 minutos para o veículo atingir apenas meia-carga, suficiente para 240 quilômetros. Se preferir, o motorista pode recarregar em casa, ligando o carro direto na tomada. Nesse caso, é preciso esperar de oito a dez horas para o Modelo S ficar de "tanque" cheio. Mesmo assim, o futuro do carro passa pela extinção dos combustíveis derivados do petróleo. "Em termos de tecnologia, o motor a combustão está prestes a virar história", diz o engenheiro Plínio Cabral Júnior, que dirige a área de sistemas e operações da General Motors na América do Sul. No mundo todo, empresas correm contra o tempo para desenvolver combustíveis alternativos mais limpos e eficientes. A Tata Motors, da Índia, vem testando um veículo conhecido como AirPod, que é movido a ar comprimido, chega a 80 km/h e tem autonomia para percorrer de 150 a 200 quilômetros. Na Holanda, pesquisadores da Universidade de Eindhoven vêm testando (com sucesso) o primeiro carro com cinco lugares totalmente movido a energia solar. E algumas empresas já cogitam usar materiais de baixa radioatividade como o tório, encontrado em rochas – para alimentar motores que jamais precisariam ser recarregados. O horizonte mais promissor, porém, é o da célula de combustível. Basicamente, trata-se de uma reação química que transforma determinadas substâncias, como o hidrogênio, em energia elétrica. Várias montadoras vêm testando a tecnologia em seus veículos. Um exemplo é o Projeto Equinox, que avalia o desempenho da célula de combustível em um veículo do tipo SUV da General Motors. Até agora, os resultados têm sido animadores. No final de outubro, um dos carros movidos a célula de combustível da marca completou 100 mil quilômetros rodados – com uma economia equivalente a 378,5 mil litros de gasolina. "A vantagem é que ele usa os mesmos combustíveis que temos hoje, mas de uma forma que não gera nenhum gás poluente. O único resíduo é água", diz Cabral Júnior, da GM. Rodar sem poluir é o último desafio a ser superado na busca de carros mais eficientes e sustentáveis. Hoje, motores a combustão deixam escapar na atmosfera o equivalente a 2,7 bilhões de toneladas de dióxido de carbono por ano, segundo a Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês). A chegada dos motores movidos a energia elétrica ou qualquer outra fonte alternativa é vital para limpar o ar e conter o efeito estufa. E pode até gerar benefícios extras. No livro Reinventing the Automobile: Personal Urban Mobility for the 21st Century ("Reinventando o automóvel: mobilidade individual urbana para o século 21", ainda não disponível no Brasil), os autores, William Mitchell, Cristopher Borroni-Bird e Lawrence Burns, afirmam que, no futuro, os veículos poderão ser recarregados a distância. Se preferirem, os motoristas poderão revender a carga em outro momento e ganhar uns trocados quando o preço da energia estiver mais favorável. Certo, mesmo, é que o seu carro nunca mais será o mesmo. INTELIGÊNCIA SOBRE RODAS O carro do futuro vai se tornar uma espécie de smartphone sobre rodas. Equipado com GPS, radares, conexão wireless, baterias que se recarregam a distância e piloto automático, ele vai se tornar um verdadeiro centro de entretenimento ambulante e fará parte de um grande sistema programado para evitar acidentes, dissipar congestionamentos e reduzir o tempo no trânsito. Veja como funcionará: CARROS COM SEXTO SENTIDO - Supersensores serão capazes de detectar tudo que acontece ao redor do veículo. Se uma criança atravessar a rua na hora errada, o sistema acionará os freios do carro, evitando uma tragédia. Também evitarão a colisão entre veículos e ajudarão a prevenir barbeiragens – já imaginou um carro que breca sozinho quando um motorista rebelde assume o volante e tenta passar o sinal vermelho? A INTERNET DO MOVIMENTO - Carros vão coletar e compartilhar as informações sobre o trânsito. Essa rede será capaz de estabelecer as melhores rotas, evitar a formação de congestionamentos, encontrar e até reservar uma vaga de estacionamento. Quer embarcar em um carro compartilhável? Basta fazer o pedido no aplicativo do seu celular, e o sistema se encarrega de enviar uma unidade não tripulada até onde você está. COMBUSTÍVEL WIRELESS - Cem por centro elétricos, os carros serão recarregados em plataformas wireless - bastará parar na estação para a energia ser transmitida às baterias. As estações serão alimentadas por fontes limpas, como usinas eólicas e painéis solares. Se faltar vento ou sol, o motorista poderá vender a energia armazenada em seu veículo para outros motoristas. QUANTO CUSTA O PEDÁGIO DAS 18H? - As grandes cidades serão divididas em zonas pedagiadas, e a tarifa será regulada pela oferta e demanda em tempo real, como na bolsa de valores. O motorista que for até o centro da cidade na hora mais movimentada do dia terá de pagar um pedágio maior do que aquele que escolher um momento mais calmo. Mas você não vai precisar separar moedas: tudo será automático, debitado no cartão de crédito. DENTRO DO CARRO DO FUTURO O carro do futuro vai se tornar uma espécie de smartphone sobre rodas. Equipado com GPS, radares, conexão wireless, baterias que se carregam à distância e piloto automático, ele se tornará um verdadeiro centro de entretenimento ambulante e fará parte de um grande sistema programado para evitar acidentes, dissipar congestionamentos e reduzir o tempo no trânsito. Veja como funcionará: 1- VOLANTE PARA QUEM PRECISA - O piloto automático pode ser desativado caso você prefira guiar o veiculo. O volante continuará lá (só) por isso. 2- PILOTO REALMENTE AUTOMÁTICO - Basta entrar, estabelecer o destino e descansar - o carro do futuro faz o resto do trabalho. O trajeto pode ser acompanhado na tela e, se você quiser, pode alterar o percurso. 3- CENTRAL DE ENTRETENIMENTO - O carro do futuro será projetado para tornar mais agradáveis as horas em que você passa no trânsito. Acesso à internet, games da hora, acervo digital do filmes, espaço office: tudo à disposição no cockpit. 4- UM LUGAR PARA RELAXAR - A cabine vai lembrar mais um sala de espera do que o interior de um veículo. Não descarto uma mesa de centro e um café. 5- DINHEIRO QUE ABRE PORTAS - Os carros compartilháveis serão abertos e acionados não mais com chaves, mas com o seu cartão de crédito ou a sua impressão digital. Basta entrar, pagar e sair andando. MOBILIDADE FAIL Há mais de um século, a humanidade busca soluções para descongestionar o trânsito nas cidades. Confira as ideias mais malucas que surgiram – e sumiram – nesse período. SEGWAY - Em 2001, o empresário Dean Kamen disse que apresentaria um invento capaz de revolucionar o transporte nas grandes cidades. Expectativa, especulação, ansiedade – e uma grande decepção. O Segway, embora muito bacana, jamais revolucionou nada a não ser a forma como os seguranças transitam nos estacionamentos dos shoppings. ESTEIRA ROLANTE - Que tal transitar pelas ruas da cidade sem dar um passo sequer? Essa foi a ideia que mobilizou – literalmente – os franceses durante a Feira Mundial de Paris, em 1900. Na época, eles construíram uma esteira rolante, 100% de madeira, que transportava as pessoas num trajeto de 3,5 km. Nunca vingou. BUSÃO A JATO - Em 1956, os italianos tiveram uma ideia aparentemente genial para agilizar o transporte público: o ônibus a jato. O Monotral Golden Dolphin era uma espécie de turbina com 36 assentos que chegava a incríveis 200 km/h. Uma pena - ou ainda bem - que nunca saiu do papel. CARRO-BOMBA - Em 1971, a Ford lançou um modelo possante, com linhas elegantes e estabilidade nas curvas. O Ford Pinto - o nome torna tudo ainda mais nonsense - deveria ser o novo carro dos sonhos da família norte-americana. A não ser por um detalhe: ele explodia em caso de colisão. PASSE LIVRE E AÉREO - O que fazer para solucionar a falta de espaço nas ruas? Em 1964, a prefeitura de Pittsburg, nos EUA, pensou ter encontrado a resposta com o Skybus, um ônibus que circulava em pistas suspensas. A engenhoca custou US$ 740 milhões para ser construída e demorou apenas 15 anos para ser finalmente esquecida. CARRO VOADOR? - Em 1999, a SUPER contou como o engenheiro Paul Moller estava desenvolvendo o Skycar - isso mesmo, um carro voador. A previsão era de que, em 2046, torcedores poderiam chegar ao Maracanã por meio de um "vertiporto", um aeroporto vertical. Ainda há tempo até 2046, mas pelo menos acertamos que o estádio seria reformado de novo. PARA SABER MAIS Reinventing the automobile: personal mobility for the 21st century, William Cristopher Borroni-Bird e Lawrence Burns, MIT Press, 2010. Driverless cars - Trillions are up for grabs, Chunka Mui e Paul B. Caroll, Cornerloft Press, 2013. 3#2 FAÇA VOCÊ MESMO – PRODUZA SUA PRÓPRIA ENERGIA Na teoria, é possível ganhar dinheiro produzindo energia elétrica. Uma regulamentação da Aneel, de dezembro de 2012, liberou uma espécie de escambo: quem produz mais energia do que consome pode vender eletricidade para os outros consumidores. Basta se acostumar com a ideia de manter um chiqueiro no pátio ou pedalar muito em bicicletas ergométricas. Não é dinheiro fácil. REPORTAGEM / Melissa Schröder ILUSTRAÇÃO / Paulo Pittella EDIÇÃO / Alexandre de Santi CATA-VENTO BENEFÍCIO: os mais simples (160 W de potência) geram cerca de 40 kWh por mês, o equivalente ao consumo da sua geladeira. QUANTO CUSTA: de R$4 mil a RS 10 mil dependendo da potência. Com sopros de 10km/h a 12km/h, um pequeno cata-vento já é capaz de manter a geladeira ligada. A energia é produzida no aerogerador pela força do vento e depois levada para um sistema de baterias. Elas permitem usar a eletricidade mesmo quando para de ventar. Antes de adquirir a tecnologia, vale conferir se o regime de ventos obedece uma regularidade no endereço da sua casa. BICICLETAS ELÉTRICAS BENEFÍCIO: duas pessoas pedalando em uma bicicleta ergométrica geram energia suficiente para manter o aparelho de som ligado QUANTO CUSTA: cerca de R$2.250 por bicicleta Academias e hotéis já utilizam bicicletas que transformam pedaladas em eletricidade. Os pedais movimentam um dínamo, que gera energia elétrica a partir da mecânica. É claro que, para uma casa, o projeto é pouco rentável — afinal, um ciclista solitário não faz milagre. Mas, em uma academia com 20 bicicletas que oferece quatro aulas de spinning por dia, o resultado são 300 kWh por mês, o suficiente para iluminar mais de seis casas ao mês. PLACAS SOLARES BENEFÍCIO: placas fotovoltaicas podem gerar 10kWh de energia em um dia de Sol, o equivalente ao gasto de um ventilador ligado 5 horas por dia durante um mês inteiro. QUANTO CUSTA: cerca de R$ 14 mil para casas que consomem 250kWh ao mês. As placas fotovoltaicas que estão ficando cada vez mais eficientes, operam a partir da incidência do Sol sobre o painel, que descola elétrons, produzindo corrente elétrica. A energia pode ser armazenada em baterias ou jogada na rede pública para virar desconto na fatura. MINI-HIDRELÉTRICA BENEFÍCIO: uma roda d’água com gerador acoplado pode produzir até 100 watts em corrente contínua, potência suficiente para iluminar uma pequena residência. QUANTO CUSTA: de R$10 mil a R$18 mil. Sua mãe estava usando a velha roda d'água na decoração de casa? Pode recuperar o artefato e colocar para funcionar. Basta ter um córrego com pequenas quedas ou correnteza perto de casa para produzir energia. A mini-hidrelétrica funciona pela ação da água, que, ao cair na roda, impulsiona o dínamo e produz energia. BIOGÁS BENEFÍCIO: 64m3 diários de biogás mantêm um gerador de 7,5 kW funcionando por 16 horas. É energia o suficiente para abastecer o consumo de uma televisão, chuveiro e ferro de passar. São necessários 425 porcos. QUANTO CUSTA: entre R$ 10 mil e R$ 100 mil, dependendo do tamanho, modelo e material do biodigestor. O combustível vem da decomposição de resíduos orgânicos (restos de comida e fezes de bovinos, porcos, aves e humanos). A transformação ocorre no biodigestor, um recipiente onde os dejetos são colocados e tampados. Lá dentro, bactérias decompõem o material, gerando o biogás, que pode ser queimado para abastecer geradores, fogões e aquecedores. Claro que somente produtores rurais possuem chiqueiros tão grandes, mas matéria-prima não falta. 3#3 ZOOM – ANTES QUE ELES PARTAM Para clicar aquele que poderá ser o último registro de tribos à beira da extinção, o fotógrafo Jimmy Nelson foi para 44 países e capturou as tradições de 35 culturas entre 2009 e 2012. O resultado está no recém-lançado Before They Pass Away ("Antes que eles partam", sem edição no Brasil). FOTOS / Jummy Nelson REPORTAGEM / Melissa Schöreder EDIÇÃO / Sílvia Lisboa DROKPA Durante sua passagem pela Índia, Nelson conheceu os drokpas, tribo que habita um palco de inúmeros conflitos e guerras: o estado de Jammu e Caxemira. Cerca de 2,5 mil drokpas vivem no vale de Ladakh, onde sobrevivem do cultivo de hortaliças. Adoram plantar flores, que são usadas na cabeça como ornamento. Descendem dos Dards, uma antiga tribo ariana. Por terem vivido muito tempo isolados, reproduzindo-se entre si, o povo seria o último representante dos autênticos arianos, grupo indoeuropeu que povoou a península indiana por volta de 1500 a.C. HIMBA Na tribo seminômade Himba, não há chuva ou sol que faça o fogo sagrado se apagar. Os pastores do norte da Namíbia mantêm uma chama acesa dia e noite para intermediar o contato deles com seus ancestrais e com o seu deus, Muruku. As mulheres usam um creme feito com gordura e argila no corpo chamada otjize, que ajuda na proteção contra o sol e o clima seco. Os himbas usam poucas roupas, mas compensam em acessórios. A aparência define a importância que cada membro tem no clã. LADAKHI Durante quatro meses do ano, os ladakhis trabalham duro no campo. É um esforço coletivo para garantir seu sustento mais tarde, quando o deserto frio, próximo ao Himalaia, onde residem, enfrenta temperaturas de -30 °C. Mesmo assim, não dá para dizer que os oito meses restantes são tediosos. A tribo aproveita o inverno para realizar festivais e celebrações quase ininterruptas. É a oportunidade ideal para mostrar o goncha, vestido tradicional da tribo, e cumprir antigos rituais, alguns de origem anterior ao budismo. MAORI Quando os europeus desembarcaram na Nova Zelândia, o local era habitado pelos maoris. Os ancestrais polinésios dessa tribo chegaram às ilhas há cerca de mil anos. As tatuagens no rosto, que indicam a posição social e são uma prova de virilidade dos guerreiros, fazem parte da tradição. Os desenhos maoris ficaram famosos pelo mundo e muita gente resolveu tatuar as figuras pelo corpo. KAZAKH Perambulando pelas montanhas da Mongólia com seus cavalos, os kazakhs são vistos sempre ao lado de suas fiéis águias. As aves são usadas para a caça e, claro, são um motivo de orgulho. Outro símbolo que identifica os kazakhs são os casacos de pele e os chapéus espalhafatosos. O povo descende dos hunos e de tribos turcas, mongóis e indoiranianas que povoaram a zona entre a Sibéria e o mar Negro. PARA SABER MAIS Before They Pass Away 2013, Jimmy Nelson, teNeues US$150. tencues.com 3#4 PERFIL – O COWBOY DO XINGU Ele enfrentou índios, autoridades, invasores de terras. Agora, está do outro lado do balcão, à frente de uma ONG que luta pela agropecuária responsável na floresta. O texano John Cain Carter quer salvar a Amazônia. REPORTAGEM / Sabrina Craide Foto / Tiago Nunes DESIGN / Tiago Eiras EDIÇÃO / Alexandre de Santi Em uma pequena sala na avenida das Indústrias, em Goiânia, o som do ar-condicionado e das obras ao redor abafam a voz do fazendeiro texano John Cain Carter, que há nove anos trocou suas terras, de 8 mil hectares, na região do Alto Xingu, por um escritório para tocar a ONG Aliança da Terra. Enquanto mostra fotos antigas do Texas e um mapa da região onde fica a Fazenda Esperança, em que viveu cinco anos com a família, sem energia elétrica e telefone, Cárter revela saudade da mata. "Adoro o cheiro da terra depois da chuva, adoro acordar às 5 da manhã e escutar os papagaios, gosto de dar toque em vaca, de inseminar. Sinto falta e quase tenho depressão", diz. O saudosismo pelo Xingu tem algo de irônico. Nesses cinco anos, Carter foi ameaçado de morte, enfrentou índios, pistoleiros e a falência generalizada de políticas capazes de conter o clima de faroeste na região, um cenário retratado no documentário O Vale dos Esquecidos, de Maria Raduan. Cárter chegou pela primeira vez à fazenda, que era do sogro, um tradicional criador de gado nelore, em 1996, pilotando seu avião, depois de servir ao Exército dos EUA e passar uma temporada no Iraque. Viu índios pelados, onças cruzando a mata e foi atraído pelo desafio: "Isso é o Velho Oeste". Carter conheceu as entranhas de um Brasil selvagem, onde fazendeiros mantêm pistoleiros na folha de pagamento para espantar invasores e grileiros. "Eles passavam seis meses por ano dentro da mata pegando grileiros, matando, batendo, quebrando dentes", diz. Com medo de ter as terras invadidas, o texano passou noites deitado na estrada com os vaqueiros para vigiar sua propriedade. Via a todo momento caminhões com madeira ilegal e matas sendo queimadas para virar pasto. E foi também pilotando seu avião que Carter viu sua fazenda sendo invadida. "O câncer chegou à nossa terra", disse, dramático, à esposa. Entrou na mata camuflado, passou dias queimando alojamentos de invasores, mas garante que não matou ninguém. Envolveu-se em disputa até com os xavantes da região, que mataram 12 nelores seus para alimentar a tribo — cada animal valia R$ 15 mil. Os índios estavam acampados ao lado da fazenda de Carter após terem sido retirados das terras onde viviam, em uma polêmica disputa. O fazendeiro foi tirar satisfação sobre o roubo e encontrou índios pintados e armados com arco e flecha. Mesmo assim, peitou o cacique. O líder disse: "Me desculpe. Meu povo está morrendo de fome na beira da estrada. Sete crianças já morreram". Carter se comoveu, apertou a mão do cacique e prometeu levar uma animal por mês para alimentar os índios. Virou amigo dos xavantes. Carter diz que procurou autoridades, entidades e até ONGs estrangeiras em busca de ajuda para conter as irregularidades que presenciava, mas não teve respostas. Afirma que foi ameaçado de morte, teve suas terras queimadas e seu avião foi sabotado. Carter conta que foram colocados pregos no aileron e no flap do avião, que servem para controlar o movimento e reduzir a velocidade. Os pregos foram pintados de branco para não serem percebidos antes do voo. "Foi terrorismo puro, mas vencemos." Numa tarde abafada, a filha de 1 ano ensaiava os primeiros passos na varanda da casa. Foram alguns instantes de distração, e a menina quase foi atacada por uma cascavel. Carter matou o animal, mas o episódio colocou ponto final na movimentada passagem da família pelo Xingu — curiosamente, depois de ter enfrentado tantos homens, foi vencido pela natureza. Cansado da inoperância do poder público, decidiu trabalhar ao lado dos fazendeiros para ensiná-los a produzir sem destruir a floresta. Em 2004, Carter fundou a Aliança da Terra e trocou a mata pela sala com ar-condicionado em Goiânia. No início, os produtores desconfiavam do gringo que tinha ideias de conservação, achando que ele queria roubar dados dos fazendeiros. Aos poucos, foi ganhando a confiança e hoje a entidade já tem mais de 500 propriedades cadastradas, no total de 3 milhões de hectares monitorados. O trabalho começa com a coleta de dados das propriedades e um diagnóstico para ver o que deve ser melhorado, que inclui o replantio e a conservação na beira dos rios, controle da poluição e do fogo e condições de trabalho adequadas. O fazendeiro se compromete voluntariamente a se adequar, de acordo com suas condições financeiras. A ONG também mantém uma rede de brigadas voluntárias de incêndio e dá assistência técnica aos produtores. Entre 2009 e 2012, os pecuaristas da Aliança investiram cerca de R$ 22 milhões em adequações, sempre de olho no reconhecimento do mercado. A meta para 2014 é lançar um selo de origem para os produtos que saem das fazendas cadastradas pela ONG. Com ele, será possível rastrear, até mesmo por smartphones, de onde veio a carne e a soja que estão sendo consumidas. Para Carter, essa é uma exigência do mercado. "Daqui a 50 anos, ser um produtor vai ser igual a ser dono de arma ou piloto de avião; vai precisar de uma licença. A exigência para a comida vai ser tão grande que vai ter que ter regras para o jogo", prevê. O debate sobre a agropecuária responsável não é novo, mas ganha força à medida que a população mundial cresce e o Brasil ganha destaque na produção de alimentos. O planeta deve chegar a 9,6 bilhões de habitantes em 2050. A FAO, o órgão das Nações Unidas para a alimentação e a agricultura, estima que a produção de alimentos no mundo vai aumentar em 70% para atender esses 9 bilhões. E o Brasil deve responder por 40% do crescimento. Produzir mais comida sem destruir ainda mais as florestas se tornou inevitável. Para chegar lá, o plano do governo e de entidades como a Aliança da Terra é aumentar a produtividade de áreas já abertas, contendo novos desmatamentos. Uma equação simples que deve ser lembrada pelos produtores é que, se não houver florestas, o regime hídrico sofrerá alterações e a irrigação ficará comprometida, o que acaba sendo um tiro no pé. "A preservação é vista como um custo ao crescimento econômico, e não como algo que é importante inclusive para garantir esse crescimento", diz o biólogo Paulo Moutinho, que dirige o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia. Na Amazônia, é comum ver agricultores usando o fogo para preparar a terra e desmatando pequenas áreas para aumentar a produção. Para Moutinho, esse ciclo pode ser quebrado com assistência técnica e linhas de crédito apropriadas para melhorar o uso das áreas já desmaiadas. O governo federal oferece R$ 1 milhão por produtor, com juros de 5% ao ano, para o cultivo de florestas e a manutenção da reserva legal nas fazendas. Nos últimos três anos, foram repassados RS 4,5 bilhões para essa linha de crédito, e para a safra 2013/2014 serão novos RS 4,5 bilhões — abaixo dos R$ 70 bilhões estimados para a agricultura tradicional. Outra iniciativa que já existe para frear o desmatamento é a moratória da soja, promovido pelas associações brasileiras das indústrias de óleos vegetais e de exportadores de cereais, que se comprometeram a não vender ou financiar a produção em áreas da Amazônia desmatadas após 2006. A preocupação de John Carter não era à toa. No ano em que a Aliança foi fundada, houve o segundo maior pico de desmatamento da história. Mas, desde 2004, uma série de ações fez com que o problema caísse mais de 80%, segundo dados do Projeto de Monitoramento do Desflorestamento na Amazônia Legal (Prodes). A primeira foi a criação de áreas de conservação e terras indígenas, o que protegeu grande parte da floresta. Também foi nesse período que o Ministério do Meio Ambiente fez a sua lista negra, com embargos e restrições de crédito a produtores que têm relação direta com o desmatamento. Ou seja, a redução do problema não passa apenas pelo trabalho da Aliança da Terra, e a situação está longe de ser tranquila. Invasões e grilagem continuam sendo rotina. Mesmo quando os fiscais do Ibama chegam a tempo no local, não conseguem aplicar a multa porque ou os donos não são encontrados ou a ação está sendo feita por outras pessoas, sem o conhecimento dos proprietários, diz o diretor de políticas para o combate ao desmatamento do ministério, Francisco Oliveira Filho. Até 2015, Carter promete lançar um livro contando o que viveu nas florestas da Amazônia. "Quero contar a história como eu vi e quero fazer antes de alguém me matar." Ele prevê um best-seller. MADEIRA! O desmatamento na Amazônia vem caindo desde 2004, quando atingiu o pico. (EM KM2/ANO) 2004: 27.772 2005: 109.014 2006: 14.286 2007: 11.651 2008: 12.911 2009: 7.464 2010: 7.000 2011: 6418 2012: 4.571 PARA SABER MAIS Vale dos Esquecidos, documentário, Maria Raduan, 2010 3#5 MUNDO – QUEM TEM O QUÊ Estamos longe de um planeta onde todas as mais de 7 bilhões de pessoas que vivem no mundo poderão ler, tomar água limpa, acessar a internet, abrir conta no banco, escovar os dentes e - por que não? - viajar no espaço. As estatísticas mostram que comprar um celular é mais fácil do que usufruir do luxo do saneamento básico no banheiro de casa. CELULAR: 83% (6 BILHÕES DE CHIPS DE CELULARES - Em 2014, o número de chips em uso deve superar o número de pessoas, mas isso não significa que todos os habitantes da Terra vão ter um celular. Muitas pessoas têm dois aparelhos ou contas em duas operadoras de telefonia.) SANEAMENTO: 65% ENERGIA ELÉTRICA: 83% ÁGUA LIMPA: 89% ALFABETIZAÇÃO: 83% INTERNET: 29% ESCOVA DE DENTES: 59,7% (4,3 BILHÕES POSSUEM ESCOVA DE DENTES - No Brasil, 58% da população não têm acesso a produtos de higiene bucal - contrariando a tendência mundial. Mesmo nas capitais brasileiras há pessoas sem condições de comprar as escovas.) CONTA BANCÁRIA: 50% (3,6 BILHÕES TÊM CONTA NO BANCO - Além de viver contando trocados, a população mundial de baixa renda está distante dos serviços bancários. Cerca de metade dos habitantes do planeta não têm onde guardar o pouco dinheiro que possui.) FACEBOOK: 17% (1,19 BILHÃO ESTÁ NO FACEBOOK - Os usuários da rede social mais popular do mundo clicam 4,5 bilhões de vezes todos os dias no botão de curtir. E cerca de 4,75 bilhões de atualizações de status, vídeos e fotos de gatos e de comida são compartilhados a cada 24 horas.) TETO: 77% VIAGEM DE AVIÃO: 5% VIAGEM AO ESPAÇO: 0,000007% (536 PESSOAS JÁ VIAJARAM PARA O ESPAÇO - Poucos humanos tiveram a chance de realizar o sonho de qualquer criança. E nem todos voltaram para contar a aventura. Vinte e um astronautas morreram durante missões espaciais.) REPORTAGEM / Melissa Schröder DESIGN / Rafael Quick EDIÇÃO / Alexanare de Santi 3#6 ECONOMIA – A IDADE DO LITIO No século 20, ele foi um item discreto em produtos que definiram uma época: antidepressivos, celulares, refrigerantes, carros e bombas atômicas. Mas, nas baterias de smartphones e motores elétricos, o mercado do lítio deve quadruplicar em 10 anos. REPORTAGEM / Igor Natusch ILUSTRAÇÃO / Patrick Melgaço EDIÇÃO / Alexandre de Santi Quando os carros começaram a circular, na aurora do século 20, motores a vapor, gasolina e eletricidade conviviam nas metrópoles. O petróleo ainda não havia vencido a corrida para impulsionar os veículos por um motivo: para ligar o carro, o motorista precisava girar uma manivela enjoada, que frequentemente quebrava o braço do operador. Fora isso, os carros impulsionados por diesel e gasolina eram barulhentos e soltavam fumaça. Já os automóveis elétricos eram silenciosos e limpos. Mas as baterias duravam pouco e eram muito pesadas. O inventor Thomas Edison viu uma oportunidade aí e passou praticamente uma década trabalhando no desenvolvimento de baterias mais leves e duradouras. Em 10 de maio de 1907, Edison registrou uma patente em que descrevia a melhoria de 10% no desempenho de baterias após adicionar 2 g de hidróxido de lítio para cada 100 ml de solução eletrolítica, como conta o jornalista Seth Fletcher em Bottled Lightning: Superbatteries, Electric Cars and the New Lithium Economy ("Relâmpago engarrafado: superbaterias, carros elétricos e a nova economia do lítio", ainda inédito no Brasil). Não vingou. Mas uma nova geração de carros elétricos está pronta para provar que o palpite de Edison era profético: até 2020, a consultoria Deloitte estima que os carros elétricos vão representar até um terço das vendas em países desenvolvidos. E esse veículos rodarão com baterias de lítio. A principal vantagem está no peso. Um átomo de lítio pesa 30 vezes menos que o de chumbo. Quando a GM lançou o modelo EV-1, de bateria de chumbo, primeiro carro elétrico produzido em massa por um grande fabricante, em 1996, a bateria pesava 594 kg. E o carro tinha apenas dois lugares - o resto do cockpit era ocupado pela bateria. O EV-1 fracassou, é claro. Hoje, a GM fabrica o Volt, com bateria de lítio de 197 kg, um terço da ancestral, e lugar para quatro pessoas. Além disso, baterias de lítio são mais eficientes. Mas isso você já sabe desde que começou a usar um celular nos anos 90. De lá para cá, os aparelhos ficaram muitos menores e muito mais potentes. Se não fossem as baterias de lítio, melhoradas ano a ano, sequer existiria iPhone. Smartphones não caberiam no bolso e teriam de ser recarregados a toda hora. Por tudo isso, o lítio sairá dos bastidores e se tornará um dos protagonistas da economia do século 21, a exemplo do petróleo no século passado. A Sociedad Química y Minera de Chile, uma das maiores (e poucas) produtoras de carbonato de lítio no mundo, prevê um aumento de pelo menos 30% ao ano na demanda do metal, uma escalada que deve dobrar o consumo do minério até 2020 de acordo com um relatório de 2012 da Dahlman Rose, instituição financeira especializada em metais e mineração. O mercado do lítio, que girava US$ 11 bilhões em 2010, deve quadruplicar para US$ 43 bilhões em 2020 de acordo com a David + Company, consultoria especializada em tecnologia. "A grande questão com a qual estamos sendo confrontados é: será que iremos trocar nossa dependência de petróleo pela do lítio?", pergunta Ona Egbue, pesquisadora da Universidade de Minnesota-Duluth (EUA). Ela desenvolveu, ao lado de outros dois pesquisadores e com financiamento do Departamento de Energia dos EUA, um estudo sobre a cadeia global do lítio. Os dados mostram que o equilíbrio dessa cadeia é frágil e que muitos fatores - geopolíticos, econômicos e até técnicos - podem complicar a produção industrial com base em lítio no futuro. Ona explica que mais de 90% das reservas exploradas hoje estão em apenas quatro países: China, Chile, Argentina e Austrália. "É uma cadeia ainda mais restrita que a do petróleo", diz. COADJUVANTE VERSÁTIL Apesar de ter acertado no conceito, Edison perdeu a corrida dos combustíveis automotivos para outro grande inventor da época. Em 1912, Charles Kattering deu vida à partida elétrica para carros e aposentou a temida manivela. Por causa de detalhes como esse, o petróleo virou o combustível-padrão dos automóveis. Mas, no século que passou, desde a patente de Edison, o lítio foi um coadjuvante sempre presente. Acreditava-se, por exemplo, que sais de lítio ajudavam a eliminar ácido úrico, e médicos receitavam bebidas com pitadas do metal para uma variedade de situações. Em 1929, quando a Lei Seca nos Estados Unidos já havia consolidado uma inovadora indústria de bebidas, que, mais tarde, daria origem aos refrigerantes, chegou ao mercado a Bib-Label Lithiated Lemon-Lime Soda, que continha citrato de lítio. Era apenas uma das tantas bebidas aditivadas com o elemento, concebida para curar a ressaca, mas a Bib-Label logo trocou de nome para 7-Up Lithiated Lemon-Lemon e deu origem ao 7UP, um dos refrigerantes mais populares do mundo (hoje, sem lítio). Em 1949, o psiquiatra australiano John Cade relatou resultados positivos no uso de lítio para tratar pacientes. Mas o metal passou por um período de má reputação na mesma época depois que várias pessoas morreram de intoxicação por lítio contido em remédios para o coração. Para completar, em 1954, a maior bomba nuclear testada pelos EUA, detonada no atol de Bikini, tinha lítio enriquecido, contribuindo para a fama de elemento perigoso. Com isso, a descoberta de Cade ficou esquecida por décadas. O metal voltou à moda em 1970, quando as autoridades norte-americanas aprovaram o lítio para uso psiquiátrico - dando razão ao australiano. Havia fundamento, afinal, para o seu uso no alívio da ressaca: ele é eficaz contra distúrbios como a esquizofrenia e o transtorno bipolar. Hoje, está entre os antidepressivos mais confiáveis (um estudo publicado em 2009 mostrou que adição de até 59 mg de lítio na água da torneira reduziu taxas de suicídio em 18 cidades do Japão). O papel econômico psiquiátrico do lítio, no entanto, é praticamente irrelevante. Seu potencial está nas avenidas e nos bolsos dos consumidores. RESSACA ECONÔMICA Desde 2000, o preço do lítio triplicou, A popularização de celulares ajudou nisso, mas são as quantidades utilizadas em tablets, notebooks e automóveis elétricos que ajudam a explicar melhor o boom do metal. Em um celular comum, vai apenas uma pitada de lítio: 1,7 g. Num tablet, 20 g. E são 19,2 kg nas baterias de carro. Ou seja, a expansão da frota elétrica depende de muito lítio, e as preocupações de Ona Egbue se explicam por que o metal, embora abundante e barato, depende de alto investimento inicial para ser extraído. Um dos três elementos primordiais criados minutos após o Big Bang (e terceiro elemento da tabela periódica), ele não é encontrado livre na natureza (apenas associado em coisas como pedras) e pega fogo até em contato com o ar (um dos motivos pelo qual levou tanto tempo desde Thomas Edison para se tornar economicamente viável). Para complicar mais, as maiores jazidas ainda não exploradas do planeta estão em países de turbulento histórico geopolítico: Afeganistão e Bolívia. Em 2010, o governo dos Estados Unidos identificou grandes depósitos de minerais em solo afegão, um tesouro inicialmente avaliado em quase US$ 1 trilhão. Concentradas principalmente na província de Ghazni, as reservas podem oferecer amplo suprimento de metais, como ferro, cobalto e ouro - além, é claro, muito lítio. Ninguém sabe ao certo quanto lítio existe no Afeganistão, mas todos parecem apostar que não é pouca coisa. O Pentágono, por exemplo, já indicou que Ghazni pode ser a maior fonte de lítio do mundo. O presidente afegão, Hamid Karzai, disse mais de uma vez que seu país será "a capital mundial do lítio", comparável à Arábia Saudita e suas reservas de petróleo. O atual governo afegão tem incentivado privatizações de estatais ligadas à extração de recursos minerais, numa tentativa de encorajar os investidores. O problema é encontrar quem se arrisque a extrair tanta riqueza de um país de frágeis alicerces políticos e carente de infraestrutura. O Afeganistão sofre os efeitos da guerra ao terror instituída pelos EUA desde 2001, que causou dezenas de milhares de mortes entre militares e civis, e a retirada das tropas internacionais ainda parece distante. Tudo isso, como era de esperar, mantém os investimentos longe. Já na Bolívia, estão as maiores jazidas comprovadas de lítio do mundo. Segundo a Agência de Pesquisa Geológica do governo dos EUA, são mais de 9 bilhões de toneladas - um terço do total das reservas dos cinco principais produtores. O governo boliviano é bem mais otimista, falando em até 100 bilhões de toneladas. A fonte de tanta riqueza é o Salar de Uyuni, um espetacular deserto de sal localizado no altiplano ao sul do país. São 12 mil km2 de sal a 3.760 metros de altitude, uma enorme fonte de recursos na qual o lítio é a estrela principal. O governo boliviano aposta tanto no lítio que o presidente, Evo Morales, criou um órgão específico para controlar a extração e o tratamento do metal. Mas o processo anda devagar. O plano inicial era retirar lítio de Uyuni em 2009, mas vem sendo adiado. Para financiar a extração, os países precisam contar com colaboração externa. A Bolívia já assinou uma parceria comercial com a Holanda em agosto deste ano para a produção de baterias de lítio. Karzai andou oferecendo sua riqueza mineral a países como Japão e China. "A questão é se essa exploração será economicamente viável. Se a Bolívia deseja produzir no futuro, as parcerias precisam ser travadas agora", diz Ona Egbue. Inclusive com os Estados Unidos, por mais que as relações entre Evo Morales e Barack Obama andem pouco amistosas hoje em dia. Em setembro deste ano, por exemplo, o presidente da Bolívia insinuou que os norte-americanos incentivam guerras no Oriente Médio e que Obama está disposto a invadir "qualquer país" em busca de fontes energéticas. "Um acordo teria potencial positivo para ambos, mas como lidarão com suas divergências?", diz Ona. Numa irônica reviravolta do destino, o lítio ainda deve provocar muita ressaca. 6 COISAS que você não imagina que são feitas com lítio - Graxa lubrificante - Cabines de aeronaves - Purificação de ar em submarinos e naves especiais - Combustível propulsor de foguetes - Fogos de artifício - Reatores nucleares QUANTO LÍTIO? Antidepressivo 0,3 g Celular comum 1,7 g Tablet 20 g Carro elétrico – ao kg PRINCIPAÍS JAZIDAS DE LÍTIO NO MUNDO 2013 – EM TONELADAS BOLÍVIA 9 bilhões CHILE 7,5 bilhões ARGENTINA 6,5 bilhões EUA 5,5 bilhões CHINA 5,4 bilhões AUSTRÁLIA 1,7 bilhão Fonte: Agência de Pesquisa Geológica do governo dos EUA (USGS) PARA SABER MAIS Bottled Lightning: Superbattcries, Electric Cars, and the New Lithium Economy, Seth Flecher, Hill and Wang, 2011. 3#7 SAÚDE – COMIDA QUÍMICA Permitimos substâncias proibidas na Europa e importamos produtos banidos pela China. Somos campeões no consumo de defensivos agrícolas condenados em outros países. Por que o Brasil usa tanto agrotóxico? REPORTAGEM / Lydia Cintra FOTO / Arthuzzi DESIGN / Rafael Quick EDIÇÃO / Alexandre de Santí Endosulfan é um agrotóxico usado em lavouras de café e soja que causa distúrbios hormonais e aumenta o risco de câncer. Foi proibido na Alemanha em 1991 e no resto da Europa pouco depois. No Brasil, o endosulfan foi totalmente banido somente em julho de 2013. Pelos ares, um problema parecido. A pulverização feita por aviões é regulamentada pelo Ministério da Agricultura, mas, nas fazendas europeias, jogar agrotóxico do céu já faz parte do passado desde 2009. Estudos mostram que, mesmo seguindo todas as recomendações de temperatura e ventos, somente 32% das substâncias despejadas do céu permanecem nas plantas. O restante contamina solo, água e áreas vizinhas às plantações. Por mais que você faça esforço para acordar cedo e escolher as mais vistosas verduras e frutas da feira orgânica do bairro, os agrotóxicos (ou defensivos agrícolas, como prefere a indústria do setor) estão por toda a parte no Brasil. Resultado de uma política que incentivou o país a se tornar um dos maiores fornecedores de produtos agrícolas do mundo, os químicos encontram no Brasil terreno fértil para se pulverizar. O país é um dos campeões no consumo de agrotóxicos, o que, segundo a indústria química, não passa de um efeito colateral de um objetivo nobre; aumentar a produtividade das lavouras brasileiras. O setor da aviação agrícola argumenta, por exemplo, que suprimir as baforadas de agrotóxicos reduziria em até 40% a produtividade. Ninguém discorda dos benefícios do agronegócio eficiente, que traz bons resultados para o Brasil nas exportações e assegura (ou pelo menos deveria assegurar) preços mais baixos nas gôndolas de supermercados. Mas, vistas com lupa, as regras brasileiras sobre o uso de químicos nas lavouras parecem estagnadas no tempo. Um dossiê de 2012 da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) aponta que, dos 50 produtos mais utilizados nas lavouras brasileiras, 22 são proibidos na União Europeia, o que faz com que o país seja o maior consumidor de agrotóxicos já banidos em outros locais do mundo, de acordo com a entidade. Outro documento, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mostra que grande parte do estoque de produtos organofosforados banidos na China em 2007 tem sido enviados ao Brasil. A consequência: em 2011, uma pesquisa da Universidade Federal do Mato Grosso em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz comprovou que até mesmo o leite materno pode conter resíduos de agrotóxicos. O estudo coletou amostras em mulheres do município de Lucas do Rio Verde (MT), um dos maiores produtores de soja do país. Em 100% delas foi encontrado ao menos um tipo de princípio ativo. Em algumas, até seis tipos. E em 70% das amostras o endosulfan estava presente. Hoje, é difícil dissociar safras recordes e indústria química, responsável pela fabricação de herbicidas, inseticidas e fungicidas, que matam e controlam a disseminação de plantas daninhas, insetos e fungos nas plantações. Só em 2012, 185 milhões de toneladas de grãos foram colhidos no Brasil. Para chegar lá, agricultores têm uma infinidade de opções tecnológicas para evitar perdas de produção: cerca de 1.640 agrotóxicos estão registrados no país. INCENTIVO PÚBLICO Para entender como chegamos a uma posição de destaque no ranking químico, é preciso retroceder pelo menos até 1975, quando o regime militar incentivou o uso de agrotóxicos com o Plano Nacional de Defensivos Agrícolas, que condicionava a obtenção de crédito rural à aplicação de pesticidas. "Foi também nessa época que apareceram as primeiras denúncias de contaminação de alimentos e intoxicação de trabalhadores rurais", explica o engenheiro agrônomo e consultor ambiental Walter Lazzarini, envolvido na formulação da Lei dos Agrotóxicos brasileira, em 1989, que estabeleceu regras mais rigorosas para a concessão de registros de novos produtos. A lei vigora até hoje, com algumas mudanças no texto original. O gargalo, porém, está no cumprimento da legislação. "O país investe menos do que deveria em fiscalização e monitoramento", comenta Decio Zylbersztajn, professor e criador do Centro de Conhecimento em Agronegócios da FEA/USP. No Brasil, o processo de registro de novos produtos passa por três ministérios (Agricultura, Meio Ambiente e Saúde), mas o número de pessoas que trabalham com agrotóxicos nesses órgãos é quase 20 vezes menor que a equipe dedicada ao assunto nos EUA, onde cerca de 850 pessoas atuam na área. Aqui, os fabricantes têm isenção de alguns impostos, e o preço de registro de novos agrotóxicos é de no máximo US$ 1 mil. Nos EUA, custa até US$ 630 mil. Outro ponto polêmico: a legislação brasileira não prevê reavaliações periódicas obrigatórias dos agrotóxicos registrados. Nos EUA, os produtos são reavaliados a cada 15 anos (e cada reavaliação custa US$ 150 mil para o fabricante), e na União Europeia, a cada dez anos. "O avanço da ciência permite identificar efeitos nocivos não observados no processo de registro e, com base em uma reavaliação, medidas podem ser tomadas para mitigar esses efeitos", defende Robson Barizon, pesquisador de Dinâmica de Pesticidas no Ambiente da Embrapa. Em 2008, a Anvisa elegeu 14 princípios ativos para reavaliação. Apenas cinco foram concluídas até agora. "O processo de reavaliação é um trabalho científico e por isso o embasamento para a decisão final precisa estar muito bem sustentado", explicou a agência por meio de sua assessoria de imprensa. "A Anvisa teve algumas dificuldades por causa da judicialização da questão por parte de empresas que tentaram impedir as reavaliações." Um dos defensivos ainda em análise é o glifosato, um dos herbicidas mais vendidos no mundo, introduzido no mercado pela Monsanto nos anos 70 sob o rótulo Roundup. No Brasil, 55 produtos à base de glifosato são autorizados para mais de 20 culturas, como feijão, arroz e banana. Outra política brasileira que gera protestos: uma instrução aprovada em 2010 permite que os fabricantes usem os resultados de seus estudos para plantas com características botânicas semelhantes. Por exemplo: um agrotóxico autorizado para o alface poderá ser registrado para outras 10 verduras, como o agrião e a rúcula. "Esse cenário exige menos recursos e estrutura laboratorial das empresas", diz Barizon. A decisão, claro, não agrada a todos. "A composição dos alimentos é diferente. A população não pode correr o risco de ser cobaia de produtos aprovados por semelhança", diz o consultor ambiental Walter Lazzarini. Por outro lado, a indústria critica o tempo de espera para novos registros, que demora em média 33 meses. "O sistema regulatório para agroquímicos encontra-se em uma situação inaceitável. É muito truncado. São três agências e cada uma tem o seu tempo para avaliar", reclama Geraldo Berger, diretor de Regulamentação da Monsanto. PRECISAMOS DELES? Os agrotóxicos se popularizaram a partir da Segunda Guerra Mundial, quando houve investimentos massivos em armas químicas. Muitos dos produtos desenvolvidos para conflitos foram depois destinados à agricultura. Um dos exemplos mais emblemáticos foi o agente laranja, usado pelos EUA no Vietnã para arrancar as folhagens das árvores e aumentar o campo de visão dos soldados norte-americanos. Um dos seus princípios ativos (o 2,4-D), ainda está autorizado no Brasil para arroz, cevada, café, soja e outros. A proliferação química começou a ser contida nos anos 60, quando a bióloga norte-americana Rachel Carson denunciou que inseticidas organoclorados como o DDT possuem efeitos nocivos à saúde e à natureza. Seus estudos originaram o livro Primavera Silenciosa, um marco na crítica aos químicos. Nele, Rachel relatou que o DDT foi encontrado no fígado de aves e peixes de todas as ilhas oceânicas do planeta. A repercussão da obra levou à criação da Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA) em 1970 e culminou na proibição da substância no país. Aqui, o DDT saiu do mercado em duas etapas: em 1985, quando foi proibido no campo, e em 2009, ano do banimento definitivo. Enquanto isso, a demanda por tóxicos crescia junto com a necessidade de alimentar os bilhões pelo mundo. Cultivar uma única espécie em um terreno onde dezenas de plantas costumavam conviver abre espaço para explosões de "pragas" isto é, uma superpopulação incentivada pela ausência de predadores. "A homogeneização é a pior maneira de aproveitar espaços, sol e água. Essas áreas exigem aplicações massivas de químicos", afirma Leonardo Melgarejo, agrônomo do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Nos últimos anos, produtores brasileiros ainda tiveram que enfrentar a aparição de pragas inesperadas, de difícil controle. O fungo da ferrugem asiática, por exemplo, gerou perdas que chegaram a 40 milhões de sacas de soja na safra 2012/2013, segundo a Associação Nacional de Defesa Vegetal. Mas, se não houvesse controle, o Brasil dificilmente estaria na segunda colocação da produção mundial de soja. "Sem essa indústria, não só Brasil, mas o mundo teria grande dificuldade de suprir alimento para a população", defende o professor Zylbersztajn. Para ele, cumprir as regras de segurança é mais importante do que produzir apenas alimentos orgânicos, por exemplo. "O agrotóxico vai deixar resíduo? Sim. Assim como quando você toma remédios acaba tendo efeito colateral. Mas qual é a alternativa? Não tem alternativa. É o melhor que a gente consegue fazer", conclui. A indústria argumenta que a inevitável queda de produtividade torna a alimentação 100% orgânica inviável. "Os agroquímicos são necessários para manter o nível de produção que temos no Brasil. A maior sustentabilidade que podemos proporcionar para a agricultura é produzir mais com menos", diz Berger, da Monsanto. Há quem discorde. Para Leonardo Melgarejo, a policultura é mais produtiva e fornece alimentos mais saudáveis. "Os custos de largas áreas sustentadas por agroquímicos não justificam os resultados. Parte do esforço dirigido para a manutenção do atual modelo deve ser redirecionada para a construção de outro, mais compatível com as necessidades da maioria." Em 16 municípios do Rio Grande do Sul, por exemplo, 400 famílias participam de um projeto de cultivo de arroz sem agrotóxicos. O rendimento da produção, cerca de 3,75 toneladas por hectare, é menos da metade de uma lavoura tradicional, tratada com químicos. "Eles dominam uma tecnologia que concorre com lavouras modernas, praticam custos inferiores e não poluem as águas. Se esses resultados foram obtidos sem apoio intensivo de políticas públicas, o que podemos esperar na presença de crédito, pesquisa e assistência especializada?", pergunta Melgarejo. As respostas podem estar com o consumidor, que decide o que vai comer. OS PROIBIDÕES Cinco casos de químicos extremamente tóxicos que o Brasil demorou (ou demora) para banir: ENDOSULFAN – Banido no Brasil em julho de 2013, era utilizado na produção de cana-de-açúcar, soja, algodão e café. Está relacionado a doenças e distúrbios no sistema nervoso, pode provocar câncer e até mutações genéticas. Havia sido proibido na Alemanha em 1991 e, logo depois, em toda a União Europeia.. METAMIDOFÓS – Está em tomate, batata, feijão e soja e já foi proibido nos seguintes lugares: Paquistão, Indonésia, Kuwait, Japão, Costa do Marfim, China, Europa e, só em 2012, no Brasil. Provoca doenças endócrinas, reprodutivas e prejudica o desenvolvimento fetal na gravidez. PARAQUATE – Presente nas lavouras de banana, arroz e muitos outros, pode provocar morte em 48 horas por falência dos órgãos se for ingerido em excesso. Atinge os sistemas neurológico e reprodutor. Proibido na União Europeia, ainda é autorizado no Brasil. Está em reavaliação, mas o processo não foi concluído. PARATIONA METÍLICA – Da cebola ao arroz com feijão, passando por batata, alho, milho e trigo: tudo tem a substância que provoca problemas cardiovasculares, respiratórios, Câncer e outros. Proibido no Japão, China e Europa. Passa por reavaliação aqui e segue livre. FORATO: Usado em milho, amendoim, feijão e café, está relacionado a problemas neurológicos e pode provocar tremores, convulsões e hemorragias. Já foi banido dos EUA e União Europeia, mas pode ser usado no Brasil. A Anvisa está reavaliando, mas não concluiu o processo. TOP CONTAMINADOS A Anvisa analisou sete alimentos em 2012 para determinar seus níveis de intoxicação. O percentual revela quantas amostras continham algum tipo de irregularidade: A Anvisa considera que existem três tipos de irregularidades nos alimentos. As porcentagens finais são a junção das três: - Alimentos que apresentam agrotóxicos não autorizados. - Alimentos que apresentam ingredientes autorizados, mas acima dos limites máximos permitidos. - Alimentos que presentam as duas coisas juntas: agrotóxicos não autorizados e limites de resíduos acima do permitido. Morango 59% Pepino 42% Abacaxi 41% Cenoura 33% Laranja 28% 3#8 INOVAÇÃO – O INCRÍVEL MANUAL DE INSPIRAÇÃO NA NATUREZA No pântano, no meio do mato, no fundo do mar, dentro de uma colmeia, não importa. Unidos, empresários e cientistas estão buscando na experiência de 3,8 bilhões de anos da natureza ideias para desenvolver produtos supermodernos. REPORTAGEM / Melissa Schröder e Valquíria Vita EDIÇÃO / Alexandre de Santi e Rossana Silva Usada para descrever soluções copiadas do meio ambiente, a biomimética era, até alguns anos atrás, uma expressão restrita aos laboratórios. Agora, a ciência das invenções inspiradas na natureza está deixando de ser apenas um jargão científico para chegar ao mercado, tornando palpável a sabedoria do planeta na oferta de respostas às mais variadas situações do cotidiano, desde uma tinta que repele sujeira até o uniforme que vai camuflar automaticamente os soldados americanos no futuro (veja ao longos das páginas ao lado). Janine Benyus, bióloga norte-americana e fundadora do Biomimicry Institute, focado em difundir as técnicas da biomimética, foi a responsável por popularizar esse conceito em 1997. No livro Biomimética: Inovação Inspirada pela Natureza, ela detalhou como a ciência estava estudando as melhores ideias de mares, florestas e desertos para resolver os problemas do século 21. Claro, o homem sempre copiou a natureza - em coisas simples e sofisticadas, como os aviões, que não passam da imitação de pássaros. A novidade de Janine foi propor essa inspiração como um método de trabalho, uma abordagem sistemática para resolver problemas. Desde então, seu telefone tocou bastante. Designers, arquitetos e empresários foram até a bióloga para entender como eles poderiam se inspirar na natureza para criar novos produtos. Mas eles não queriam apenas a sua consultoria, e sim (e essa foi a parte que a deixou mais feliz) ser levados para o mato, para o deserto, para o fundo do mar. Saindo dos escritórios, das fábricas e das salas de reunião, eles entraram em contato direto com a natureza para tirar dela não a matéria-prima, mas ideias - respostas a suas perguntas. Desde então, o site Ask Nature, uma espécie de catálogo online mantido pelo instituto de Janine, já catalogou cerca de 2 mil projetos biomiméticos. "Quando escrevi o livro, estava falando com cientistas, que estavam estudando, e não comercializando isso. Depois, as companhias começaram a me ligar, pedindo biólogos para seus departamentos de desenvolvimento", diz Janine. Como o serviço não existia, ela criou o Biomimicry 3.8 (o inglês para biomimetismo, seguido do número que representa 3,8 bilhões de anos de evolução), um programa que treina profissionais de diversas áreas para desenvolver projetos inspirados na natureza. "A biomimética agora está sendo ensinada nas universidades", diz. Ao olhar para a natureza não como um ambiente selvagem, mas como o resultado de um sofisticado sistema evolutivo que produziu soluções eficientes e baratas (em alguns casos, muito à frente da nossa tecnologia), alguns empresários passaram a tirar o chapéu para o planeta. Em um dos projetos mais ambiciosos, por exemplo, a libélula foi o ponto de partida de barcos cujo teto solar tem a forma de asas que conseguem aproveitar as duas energias mais comuns da Terra: a do sol e a do vento. O sistema da empresa australiana SolarSailor utiliza painéis no topo da embarcação que conseguem capturar, com a ajuda de um software, o recurso natural que estiver mais abundante no momento. O mecanismo se inspirou nas asas largas e flexíveis da libélula, que capturam a radiação solar, aquecem seus músculos e preparam o inseto para o voo. Além disso, a libélula aproveita o movimento duplo de suas asas para manipular o ar ao redor delas e atingir melhor mobilidade e precisão no seu voo. O fabricante garante economia de combustível de até 50%, dependendo da aplicação, e o projeto rendeu à empresa o prêmio Energy Globe Award de 2013, um conhecido prêmio de meio ambiente. No outro ano, chegará ao mercado a primeira garrafa de água que se enche sozinha. Inspirados pelo besouro-da-namíbia, os pesquisadores da empresa NBD Nano anunciaram que vêm produzindo protótipos de um recipiente que consegue extrair água do ar e armazenar mais de 3 litros do líquido por hora. A garrafa copia o princípio do inseto que habita uma das regiões mais áridas do planeta. Todos os dias, ele sobe as dunas do deserto africano, às margens do Atlântico, e deixa a brisa bater na sua carapaça, aproveitando-se de um complexo processo que permite a condensação da água no seu corpo. A garrafa também combina um material que atrai e outro que repele a água. Enquanto o primeiro faz a coleta, o segundo é responsável por direcionar as gotas para um reservatório. O mesmo besouro também inspira as malhas coletoras de água de uma organização canadense sem fins lucrativos, a FogQuest, que você vê ao lado. As duas experiências têm inúmeras aplicações, mas os empreendedores citam os benefícios para habitantes de vilas pobres, que poderão obter água potável perto de sua casa, em vez de caminhar longas distâncias carregando baldes sobre a cabeça. Não é à toa que o arquiteto Michael Pawlyn, outro entusiasta da biomimética, compara a natureza a um catálogo de produtos. "Estamos tão fascinados com a nossa própria tecnologia que esquecemos que, fora disso, existe um mundo que está se desenvolvendo há bilhões de anos", resumiu o engenheiro Jamie Miller, outro fã, em palestra do TED. Para Janine, foi incrível testemunhar como o seu conceito saiu dos laboratórios e parou nas pequenas empresas e nas corporações - e hoje, já está dentro das casas, espalhado pelo mundo. "O número de produtos inspirados na natureza dobra a cada ano", diz a bióloga. MINIRROBÔS VOADORES Inspiração: ABELHAS Os robobees poderão substituir abelhas, procurar por vítimas de desastres, monitorar o tráfego e mapear o clima. 1- SENSOR ÓTICO - Os olhos dos RoboBees, um sensor minúsculo que pesa 25 mg, desenvolvido especialmente para o projeto, permitem que os robôs voadores encontrem e se desviem dos alvos visualmente. 2- ASAS - Músculos artificiais são capazes de bater as asas 120 vezes por segundo. Pesquisadores de Harvard já conseguiram fazer as abelhas mecânicas voarem por 15 minutos e querem mantê-las no ar por mais tempo. 3- SISTEMA NERVOSO - Um sistema eletrônico de nervos (um chip que age como uma espécie de cérebro) diz quando a abelha deve bater as asas, por exemplo. 4- APÊNDICES DE POLINIZAÇÃO - Os RoboBees podem ajudar na polinização artificial de plantas e se tornar uma resposta para resolver o problema da diminuição de abelhas no planeta. 5- FONTE DE ENERGIA - Os insetos artificiais ainda dependem de uma fonte externa de energia. Por isso, os cientistas ainda estão trabalhando para criar baterias muito pequenas para serem instaladas neles. UNIFORMES CAMALEÕES Inspiração: CAMALEÕES E LULAS Quando serviu como militar no Afeganistão, o bioengenheiro norte-americano Kit Parker percebeu que os uniformes camuflados tornavam os soldados alvos fáceis para os inimigos. Segundo Parker, não há nada de discreto no uniforme camuflado e alguns soldados estão sendo mortos justamente porque podem ser vistos de longe. De volta aos laboratórios de Harvard, ele está se dedicando a criar uniformes que se adaptam automaticamente ao ambiente. Afinal, se camaleões e lulas podem se camuflar conforme a situação, por que o Exército norte-americano, dos drones e dos óculos de visão noturna, não pode recriar a tecnologia da natureza? Atualmente, os soldados recebem dois uniformes, um verde e outro marrom-claro, para combiná-los de acordo com o ambiente. O problema é que, frequentemente, as missões acontecem em mais de um cenário e não há vestiário no campo de batalha para trocar de roupa. Para criar o uniforme camaleão, Parker está, na verdade, buscando mais inspiração nas lulas do que nos lagartos que mudam de cor. Os moluscos também são considerados mestres na camuflagem. Eles têm reservatórios de pigmentos nas camadas da pele, que são expelidos e fazem com que mudem de cor. O pesquisador trabalha na análise de como as proteínas da pele das lulas permite essa troca de cor. Parker quer aplicar pigmentos semelhantes em fibras têxteis e criar um tecido que dará aos soldados o poder de se camuflar de verdade. A expectativa é que a tecnologia esteja pronta em cinco anos. ÁGUA QUE VEM DO AR Inspiração: BESOUROS Desde 2000, a Fogquest, organização sem fins lucrativos, utiliza uma malha que captura gotículas de umidade suspensas no ar. 1- Todas as noites, o besouro-da-namíbia sobe as dunas do deserto africano e deixa a brisa bater na sua carapaça. 2- Como o besouro fica mais frio que o ar, a água que flutua com o vento condensa no seu corpo. 3- Nas costas do besouro, uma zona armazena a água capturada do vento. Em outras palavras, ele coleta o sereno em suas próprias costas. Pela manhã, consegue, finalmente, ingerir o gole diário e vital de água. 1- A malha, semelhante a uma grande rede de pesca (com buracos muito menores, é claro), é erguida em elevações como se fosse um outdoor. 2- Um material atrai a umidade até a malha, onde as gotículas de água presentes no ar se condensam. 3- Um segundo material, que repele a água, direciona as gotas até um reservatório. O líquido coletado já abastece habitantes de regiões áridas, como Guatemala, Etiópia, Chile, Nepal, Eritreia e Marrocos. TINTA AUTOLIMPANTE Inspiração: BORBOLETAS As asas da Morpho, conhecida no Brasil como borboleta-seda-azul, estão sempre limpas sem que ela gaste tempo ou energia na faxina. A combinação da superfície das suas asas com propriedades das moléculas de água impede a aderência da sujeira e torna a lavagem pela chuva mais rápida. Inspirada pela borboleta, uma empresa europeia, a Sto, decidiu fazer uma tinta que copia o princípio autolimpante do inseto voador, uma propriedade também presente na flor de lótus, cujas pétalas estão sempre limpas, mesmo no meio de um pântano. O produto foi lançado na linha de tintas Lotusan - o sonho de qualquer dona de casa. Ao observar como as asas da borboleta e das pétalas da flor dispunham do mecanismo autolimpante, os pesquisadores da Sto desenvolveram um sistema com materiais (eles não revelam de que tipo) que recobrem a tinta, impedindo que a água e a sujeira grudem na superfície. Essa camada protetora evita especialmente que fungos e algas se desenvolvam na parede. Depois da tinta ser aplicada, toda a água que for derramada sobre ela sairá rolando, levando junto a sujeira da superfície. O resultado será uma parede permanentemente limpa e seca. Adaptável para concreto, alvenaria e gesso, a tinta já está sendo usada em "edifícios autolimpantes". Um galão de 15 litros custa a partir de £ 159 (cerca de R$ 594), 40% a mais do que a linha convencional da empresa. A Sto diz que uma fachada pintada com o seu produto requer uma manutenção menor, mas adverte que o efeito não é vitalício: em algum momento, será necessário pintá-la de novo. AQUECEDOR EFICIENTE Inspiração: LAGOSTAS O aquecedor Hotzone, que utiliza lentes que concentram até cinco vezes mais energia, foi baseado nos olhos dos crustáceos. 1- Nos olhos da lagosta, cada um dos lados desses tubos é como um espelho, e a geometria deles faz com que a luz fique concentrada num único ponto. 2- Esse foco concentrado num objeto em particular é o que permite à lagosta enxergar com precisão em águas turvas para atacar suas presas. LENTES ESPELHADAS - No look, o aquecedor não se parece com a lagosta. Mas o HotZone utiliza lentes parecidas com as do olho do crustáceo para turbinar o poder de aquecimento. Elas concentram até cinco vezes mais energia infravermelha. CALOR CONCENTRADO - A fabricante, a Schaefer, diz que o aparelho direciona o calor para um único ponto ou pessoa, e não para o ambiente todo. A temperatura máxima é alcançada em três minutos, de acordo com a empresa. CONCRETO FEITO COM AR Inspiração: CORAIS Para cada nova tonelada de cimento produzida, uma tonelada de CO2 é emitida na queima de combustíveis fósseis - e o gás carbônico é aquele que causa, entre outros problemas, o aquecimento global. Brent Constantz, fundador da Calera, uma empresa californiana, observou a natureza e descobriu que esse mesmo gás se dissolve nos oceanos e forma outra molécula, a CO3, ou carbonato. Juntando isso com o cálcio da água do mar, nasce o carbonato de cálcio, que é sólido. É assim que se formam os corais. A empresa percebeu que, em vez de emitir CO2 para produzir cimento, poderia capturá-lo e imitar o processo realizado nos oceanos, usando o gás como matéria-prima. Hoje, cada tonelada de cimento produzida pela Calera utiliza meia tonelada de CO2 capturado da atmosfera. A fábrica transforma o CO2 em mineral por meio da precipitação aquosa, um processo que imita o que acontece no fundo do mar, para transformá-lo em carbonato de cálcio sólido, um material com a consistência de um fino pó branco, que pode ser usado como base para a fabricação de vários produtos, especialmente o cimento. Nos Estados Unidos, a empresa já vendeu seu cimento para projetos como a reforma das calçadas de um município e o nivelamento do terreno de um edifício comercial. O carbonato de cálcio, nesses casos, funciona como um produto complementar, substituindo cerca de 15% do cimento comum na mistura para a preparação do concreto. O cimento feito da Calera também foi usado na fabricação de vasos de plantas e bancos decorativos. 4# GUIA dezembro 2013 ed. 327 4#1 TECH 4#2 CULT 4#3 E SE... E SE AS ABELHAS SUMIREM? 4#4 MANUAL – COMO FAZER UM FORNO SOLAR 4#1 TECH O FIM DAS PICADAS Sem usar veneno nem repelente, adesivo "esconde" qualquer pessoa do radar natural dos mosquitos, evitando que eles piquem. Pode ser o fim de uma das maiores inconveniências do verão - e ajudar a acabar com doenças graves, como malária e dengue. TEXTO / Bruno Garattoni e Fernando Badô OS MOSQUITOS - Quando querem encontrar alimento, os mosquitos fazem como a maioria dos animais: se guiam pelo cheiro. Eles não têm um sistema olfativo como o nosso, mas são capazes de detectar o CO2 que exalamos enquanto respiramos. O mosquito segue a trilha desse gás para chegar até você - e aí pica sua pele para sugar sangue. O ADESIVO - Os criadores do adesivo descobriram uma substância que supostamente impede os mosquitos de detectar CO2. Eles não revelam a composição dessa substância, desenvolvida em parceria com a Universidade da Califórnia (Riverside) e a Fundação Bill Gates. Mas dizem que é natural e não inclui nenhum tipo de veneno. O TRUQUE - A pessoa cola o adesivo, que tem mais ou menos o tamanho de um selo, em cima da roupa. Ele começa a liberar a substância ativa, que age sobre o cérebro dos mosquitos e impede que eles cheguem perto. A pessoa sente um cheiro perfumado e discreto. O efeito dura 48 horas. O PRODUTO - O adesivo já está sendo produzido pelo laboratório americano Olfactor, que promete colocá-lo no mercado em 2014. O preço supostamente será inferior ao dos inseticidas e repelentes atuais. KITE PATCH NOS EUA: N/D kitepatch.com 1- CASE SOLAR - Além de ter uma bateria extra, que aumenta a autonomia do celular, este case é coberto por células fotovoltaicas – que transformam a luz do sol em eletricidade e ajudam a carregar a bateria do aparelho. Tem versões para iPhone e Galaxy. SURFR NOS EUA: R$ 195 enerplex.biz/surfr 2- SEM ENERGIA - Coloque seu iPhone ou iPad neste suporte de madeira e ele amplificará naturalmente o som em até 400%. E sem baterias nem energia elétrica, usando apenas a boa e velha acústica. KOOSTIK NOS EUA: R$ 207 koosttk.com 3- BOLSA DE LAVAR - Parece uma sacola, mas é uma lava-roupas. Basta colocar as peças, adicionar água e sabão líquido e esfregar a bolsa por 40 segundos. O segredo é que dentro dela há uma placa ondulada, como a de um tanque de lavar, que gera atrito contra as roupas - e as faz ficarem limpinhas. SCRUBBA NOS EUA: R$ 142 goo.gl/I2LXCh 4- FRIO RENOVÁVEL - Uma geladeira comum, exceto por um detalhe: 100% alimentada por painéis de energia solar. Com uma recarga completa, que leva cerca de oito horas sob sol forte, a bateria dura até cinco dias. SUNDANZER DCF 225 NOS EUA: R$ 2.840 sundanzer.com 5- AIRBAG DE AVALANCHE - Esta mochila é projetada para salvar a vida de esquiadores e alpinistas. Se perceber que está vindo uma avalanche, a pessoa puxa uma cordinha e a mochila se infla como um balão, evitando que o indivíduo seja soterrado pela neve. HALO 28 NOS EUA: R$ 2880 goo.gl/xlWpvS 6- TOQUE DE MADEIRA - Chega de interagir com o seu computador usando teclado e mouse de plástico ou metal. Este conjunto de mouse e trackpad é feito de madeira, funciona em PC e Mac e está disponível em plátano e nogueira. ORÉE NA EUROPA: R$ 450 oreedesign. Com COMO REAPROVEITAR UM SMARTPHONE VELHO Sabe aquele celular bem velho, que mal funciona e ninguém quer? Dá pra transformá-lo em algo útil: uma câmera de segurança. PASSO 1- Instale o aplicativo Web of Cam (www.webofcam.com), que é grátis e tem versões para iOS, Android e Symbian. PASSO 2- O celular antigão será transformado em câmera de segurança – e você poderá ver as imagens pela internet. 4#2 CULT A série preferida do presidente Obama não é baseada em fatos reais, mas bem que poderia ser. Ao retratar a eterna caça dos agentes da CIA aos terroristas árabes (o que inclusive já rendeu uma penca de acusações de racismo), Homeland explora na ficção a tensão real entre o Oriente Médio e os Estados Unidos. ACOMPANHE A MOVIMENTAÇÃO DOS PERSONAGENS DA SÉRIE E ENTENDA A LIGAÇÃO ENTRE OS ACONTECIMENTOS DA FICÇÃO E OS DA REALIDADE. Alerta: se você não quer spoilers, vire a página agora. Síria NA SÉRIE - Local em que Brody, soldado americano que ficou oito anos desaparecido depois de ser capturado no Iraque, foi mantido em cativeiro. NA REALIDADE - Os sírios foram contra a Guerra do Iraque e, recentemente, os Estados Unidos ameaçaram fazer uma intervenção no país para derrubar o presidente Bashar al-Asad Afeganistão NA SERIE TEMP. 1, EP. 1 - Onde Brody foi encontrado pelos soldados americanos. NA REALIDADE - O país foi invadido pelos Estados Unidos depois dos atentados de 11 de setembro e parte das tropas continua por lá. Palestina NA SÉRIE - Onde nasceu Abu Nazir, o vilão que planeja atacar os EUA. NA REALIDADE - Nos anos 40, os norte-americanos apoiaram a criação de Israel no território palestino Líbano .NA SÉRIE TEMP. 2, EP. 2 - Os agentes da CIA Carrie e Saul foram até Beirute encontrar uma informante que era casada com um dos líderes do Hezbollah. NA REALIDADE - O Hezbollah continua muito poderoso internamente e se posicionou a favor do regime de Bashar al-Assad na Síria, chegando inclusive a enviar tropas para o país vizinho. Arábia Saudita NA SÉRIE TEMP. 1, EP. 6 - A norte-americana Aileen Morgan se apaixonou por um local quando foi morar lá com o pai, um executivo do ramo do petróleo, e acabou recrutada pela Al-Qaeda. NA REALIDADE - É a parceira dos Estados Unidos no Oriente Médio Irã NA SÉRIE TEMP 3, EP. 7 - O terrorista Majid Javadi foi mandado para lá depois de ser recrutado pela CIA. NA REALIDADE - A relação entre Irã e EUA sempre foi tensa, mas no final de novembro os dois países assinaram um acordo que prevê o congelamento do programa nuclear iraniano em troca da suspensão de antigas sanções impostas ao país pelos norte-americanos. Langley, EUA NA SÉRIE E NA VIDA Sede da CIA No Brasil, a série é transmitida aos domingos pelo canal FX. ANTONIO PRATA NU, DE BOTAS 1 LIVRO EM 12 NÚMEROS A INFÂNCIA DE Antonio foi na década de 80 e ele era fã do Bozo. Era tão fã que um dia ligou para o 236-0873, o número que aparecia na tela durante o programa. E falou com o palhaço. Antonio tinha UM PENICO da Turma da Mônica. Ele ouviu na TV que o mundo ia acabar no ano 2000. Ficou chateado: não ia mais poder brincar na rua. Antonio Prata fez coco nas calças. Quando tinha quatro anos, mas fez. Ou pelo menos é o que ele diz. Em Nu, de Botas, o cronista relembra várias passagens da sua infância, mas não garante que todas sejam reais - mesmo porque não dá para confiar na memória de uma criança de quatro anos. E a verdade é que, fictício ou não, o pequeno Antonio é um dos melhores personagens da nossa literatura nos últimos tempos. NU, DE BOTAS, Antonio Prata, Cia. das Letras, R$ 31. Sempre que acordava, ele procurava um sinal de doença para poder fugir da escola. Odiava quando a mãe pegava o termómetro e dizia: 36,5 °C. PALAVRAS-CHAVE: Quantas vezes elas aparecem no livro. Turma da Mônica 9 Adulto 27 Cueca 33 Mãe 142 Cocô 21 Mundo 50 Um dia, fez arte e foi se esconder num cantinho do lavabo. Calculou que poderia ficar lá por 24 meses – depois disso, já estaria muito grande e não caberia mais. CINE SUPER Resumimos duas horas de filme em meia dúzia de palavras. ÁLBUM DE FAMÍLIA SINOPSE - Julia Roberts tenta estrangular Meryt Streep. ESTREIA 27 de dezembro A VIDA SECRETA DE WALTER MITTY SINOPSE - Ben Stiller passa a primeira metade do filme imaginando como seria bom ser Sean Penn e a segunda metade efetivamente tentando ser Sean Penn. ESTREIA 27 de dezembro AJUSTE DE CONTAS SINOPSE - Sylvester Stallone e Robert de Niro fazem a primeira luta da história do UFC da Terceira Idade. ESTREIA 10 de janeiro NINFO-MANÍACA – PARTE 1 SINOPSE - Essa é a "parte 1" porque a protagonista precisa de dois filmes inteiros para nos assustar com toda sua vida sexual. ESTREIA 10 de janeiro THE DELIVERY MAN SINOPSE - Homem vira pai de 533 filhos depois de doar esperma para uma clínica que não tinha muito material no estoque. ESTREIA 10 de janeiro OSCAR EM DOSE DUPLA Pela primeira vez, uma mesma cena pode ser indicada ao Oscar por dois filmes. É que o longa Gravidade, do diretor Alfonso Cuarón, é um dos favoritos para levar a estatueta em 2014. E o filho de Cuarón, Jonás, resolveu filmar o outro lado da cena em que a personagem de Sandra Bullock conversa pelo rádio com um homem que fala uma língua indecifrável. No curta, nós descobrimos que o homem é groenlandês e acompanhamos a conversa do ponto de vista dele. Para assistir ao curta, acesse bit.ly/ic2wfDh. 3 ATORES QUE BRIGARAM COM DIRETORES Estreia em dezembro Azul é a cor mais quente, drama francês sobre uma garota de 15 anos que se apaixona por outra menina. Depois do lançamento (e de levarem a Palma de Ouro), as protagonistas acusaram o diretor, Abdellatif Kechiche, de assédio moral. E aí começou uma troca de farpas pública que já dura alguns meses. Relembre outros barracos do cinema: MEGAN FOX E MICHAEL BAY TRANSFORMERS A atriz disse em uma entrevista que Bay era "como Hitler" e que trabalhar com ele era um "pesadelo". Foi afastada do último filme da série. GEORGE CLOONEY E DAVID O. RUSSELL THREE KINGS Clooney reclamou depois que o diretor demonstrou com muita vontade como queria que outro ator fosse jogado no chão em uma cena, e os dois começaram a trocar socos de verdade. LILY TOMLIN E DAVID O. RUSSELL HUCKABEES Dessa vez, Russell descascou a atriz quando ela não concordou com uma mudança no roteiro. O bate-boca foi registrado em vídeo: bit.ly/bLYMmZ. 4#3 E SE... E SE AS ABELHAS SUMIREM? Sem sua polinização, um terço dos vegetais desaparece, empobrecendo gôndolas e paisagens. O sumiço leva à criação de um santuário, onde as últimas abelhas zunem em paz. Que tal uma visita guiada? TEXTO / Emiliano Urbim ILUSTRAÇÃO / André Ducci Bom dia! Bom dia a todos. Vieram bem no barco? É normal ter um pouco de enjoo, não se preocupem. Vocês conseguem me ouvir aí atrás? Sejam muito bem-vindos à Primeira Reserva Apiária do Atlântico Sul, mais conhecida como Ilha das Abelhas, menos conhecida como Abilha - é, o apelido não pegou. Assim como é uma honra para nós recebê-los, é um privilégio para vocês estar aqui, não é mesmo? Vocês fazem parte de um clube seleto: são pouquíssimos os candidatos que recebem o visto para conhecer este santuário da natureza, um dos lugares mais vigiados do mundo. Não sei o que vocês fizeram para estar aqui, nem me interessa. Só me resta lhes dar os parabéns. Bem, nunca é demais lembrar que vocês acabam de desembarcar no último local do planeta Terra onde ainda é possível encontrar abelhas que produzem mel. Sim, senhora, vai haver degustação de mel e você pode comprar o quanto quiser na lojinha. Mas vamos aproveitar o passeio, não é mesmo? Me acompanhem até o vestiário, por favor. Pendurados nos cabides, com os nomes de vocês, estão seus uniformes de apituristas. Sim, é um antigo uniforme de apicultor, mas acharam que chamar de apiculturista agregaria valor. Peço que todos vocês se besuntem abundantemente de repelente e só depois comecem a vestir as roupas, absolutamente imprescindíveis para a realização do passeio. Ela existe para proteger vocês das abelhas, mas principalmente para proteger as abelhas de vocês. Como vocês sabem, ou deveriam saber, as abelhas começaram a desaparecer em 2006. Nunca se soube com certeza a causa do Distúrbio do Colapso de Colônias. Muitos falaram em um tipo específico de pesticida. Alguns apostaram em ácaros nas colmeias. Pode ter sido fungos, vírus, destruição do habitat natural. Provavelmente uma soma de todos esses fatores. O fato é que nunca se chegou a uma solução. E as abelhas desapareceram do mundo inteiro, a não ser por esta pequenina ilha. Desculpem o tom melancólico, somos obrigados por lei a passar esse conteúdo. Quem tiver dificuldade é só me chamar que eu ajudo a fechar o zíper. Primeiro aviso: os kits foram montados com base em medidas que vocês nos passaram. Se vocês engordaram, emagreceram ou mentiram, sinto muito. Segundo: essa é a última oportunidade que vocês têm para ir ao banheiro sem serem incomodados pelas nossas anfitriãs. Aproveitem. Todo mundo pronto? Por favor, me sigam por este longo corredor. Vejo que hoje temos gente de todo o mundo. Bem: não interessa de onde vocês vieram, com certeza é uma paisagem muito diferente do que vocês vão ver aqui. As paisagens que vocês estão acostumados a ver são, por assim dizer, meio monótonas, certo? Que plantas vocês conhecem? Soja. Milho. Isso mesmo, arroz. Tudo bege. Aqui, se preparem: vocês vão encontrar um arco-íris. Um mosaico. Um caleidoscópio. Sua metáfora favorita não será suficiente. De tirar o fôlego, não é? Toda essa diversidade – para ser correto, essa biodiversidade — só é possível graças à polinização que as abelhas fazem, levando o pólen de planta em planta. Tenho impressão de que vocês estão com dificuldade em identificar algumas espécies, me permitam ajudar. Aquilo ali é café. Ali, uma laranjeira, cheia de laranjas. Aquilo ali tem a cor parecida, mas é uma cenoura. Temos também abóboras, melões, chuchus, pepinos, quiabos, cebolas. Essa se chama melancia. É vermelha por dentro, uma delícia. Sim, está tudo à venda na lojinha. Melancia também, mas atenção ao excesso de bagagem, senhora. Gente, gente. Aqui, por favor. Chegou o grande momento. Tudo muito exuberante, muito deslumbrante, mas está faltando alguma coisa, não é mesmo? Faltam as estrelas da festa! Para chamar as abelhas, vou usar este spray especial. Vou poupá-los dos detalhes sórdidos, mas ele atiça os hormônios sexuais dos insetos. Peço que vocês não realizem movimentos bruscos e permaneçam em seus lugares para não atrair picadas. Assim que eu espalhar o líquido no ar, elas devem ser atraídas. Em três, dois... zum. Calma. Esse barulho vem delas mesmo, é o zumbido do enxame. É natural que elas cerquem vocês, chegem perto. Estão curiosas, não estão acostumadas a humanos de fora. Reparem nos tons de preto, de amarelo. Reparem nos olhos. Sempre reparo nos olhos. E pronto. Passeio encerrado, deem adeus a essa maravilha. Sim, senhora, agora é a degustação de mel. Tem na lojinha. Mais barato que no freeshop. 4#4 MANUAL – COMO FAZER UM FORNO SOLAR Os raios solares viajam 150 milhões de quilômetros para chegar à Terra e, depois dessa jornada, o mínimo que você pode fazer é aproveitá-los. Veja como cozinhar usando a energia do Sol e aquela antena abandonada. TEXTO / Melissa Schröder ILUSTRAÇÃO / Gil Tokio MATERIAIS: Uma antena parabólica desativada Papel-alumínio Cola de madeira Palha de aço e água corrente Corrente ou arame Gancho ou parafuso grande Panela com duas alças 1- Encontre uma antena parabólica fora de uso e limpe com palha de aço e água corrente. 2- Faça uma mistura de 50% água e 50% cola de madeira. 3- Aplique a mistura sobre a antena e cole o papel-alumínio em tiras. Recorte os excessos. ATENÇÃO: a face espelhada do papel alumínio deve ficar virada para cima. 4- Na ponta da haste da antena, coloque um parafuso ou gancho para servir de suporte para a panela. 5- Prenda as alças da panela com um arame ou uma corrente. 6- Pendure a panela no parafuso ou gancho. 7- Posicione a antena na direção do Sol. ATENÇÃO: O forno deve ser reposicionado a cada 20 ou 30 minutos para acompanhar o movimento dos raios. COZINHANDO O melhor horário para cozinhar é das 8h às15h. É possível usar o forno solar mesmo em dias parcialmente nublados desde que o Sol brilhe por pelo menos 20 minutos em cada hora. O risco de queimar os alimentos é muito reduzido. O cozimento lento em temperaturas mais baixas aumenta o valor nutritivo dos alimentos e realça o sabor. Fonte: Solar Cookers International. www.solarcookers.org