0# CAPA fevereiro 2015 SUPER INTERESSANTE www.superinteressante.com.br EDIÇÃO 343 – FEVEREIRO / 2015 [descrição da imagem: roupa característica do Islã. Um turbante branco, mas não aparece a cabeça. Manto verde com detalhes em branco e aparece a mão esquerda, fechada, pousada sobre o lado esquerdo do peito,. Esta figura está à frente da representação de uma porta, fundo escuro e paredes com detalhes da cultura.] MAOMÉ A FACE OCULTA DO CRIADOR DO ISLÃ POR ALEXANDRE VERSIGNASSI Ele fundou uma nação baseada em direitos trabalhistas e livre mercado. Tinha uma esposa que ganhava mais que ele e emancipou as mulheres. Conheça o verdadeiro homem por trás do Islamismo. [outros títulos] BATERIA FRACA: O GARGALO DA ERA DIGITAL COMO CONVENCER OS OUTROS APRENDA A COZINHAR NA LAVA-LOUÇAS MUSICA E FILME: À LA CARTE OU RODÍZIO? AS ORIGENS GRINGAS DA FEIJOADA CADEIRA É O NOVO CIGARRO? Passamos o dia sentados. Pode ser que isso esteja arruinando nossa saúde. ______________________________ 1# SEÇÕES I 2# REPORTAGENS 3# SEÇÕES II _________________________________ 1# SEÇÕES I fevereiro 2015 1#1 AO LEITOR – NEGÓCIO ARRISCADO 1#2 MUNDO SUPER 1#3 SUPER NOVAS 1#4 SUPER NOVAS – A CHINA DA CHINA 1#5 CIÊNCIA MALUCA 1#6 SUPER NOVAS – A OLIMPÍADA DOS ÍNDIOS 1#7 PAPO – HÁ MUITA VIDA NO SURTO DE EBOLA” 1#8 MATRIZ – SERIAL KILLERS 1#9 BANCO DE DADOS – DESSALINIZAÇÃO DE ÁGUA 1#10 COORDENADAS – SEDA, GUERRA E PAZ 1#11 ORÁCULO 1#12 CONEXÕES – BROWSER A BOWSER 1#13 ESSENCIAL – VAI DE RODÍZIO OU À LA CARTE? 1#1 AO LEITOR – NEGÓCIO ARRISCADO ESSE NOSSO NEGÓCIO DE PUBLICAR IDEIAS - sejam elas impressas em papel ou traduzidas em bytes - é muito arriscado. Afinal, não tem jeito de eu saber, enquanto escrevo por aqui, como é que nossas ideias vão soar para você aí. Pode ser que você se ofenda. Pode ser que algo que dissemos com a melhor das intenções bata em seus ouvidos como uma provocação. Pode ser que alguma ideia nossa se perca num labirinto de mal-entendidos e acabe resultando em tragédia. Para dar um exemplo mais concreto: alguns muçulmanos acreditam que representar a imagem do profeta Maomé é não apenas um sacrilégio para um fiel da religião mas também uma ofensa grave mesmo quando cometida pelo seguidor de qualquer outra religião. Embora o Alcorão não diga palavra sobre o tema, nos últimos anos, com a radicalização do choque de civilizações entre o Islã e o "Ocidente", muita gente foi condenada à morte pelo simples "crime" de desenhar Maomé. Isso posto, talvez seja imprudente da nossa parte imprimir na capa desta edição uma representação visual de Maomé - ainda que ele apareça sem rosto. E aí? Como faz? Como a gente contorna esse risco? Aqui, na SUPER, a gente acredita que não tem jeito de garantir que ninguém vá se ofender com algo que publicamos. Assumimos plena responsabilidade pelo que escrevemos, mas não tem como se responsabilizar pelo que os outros entendem daquilo que escrevemos. Seria impossível tomar decisões se ficássemos tendo que responder a mil perguntas antes: "Será que alguém vai se magoar?", "Será que vão entender?", "Será que estamos contrariando algum interesse?", "Será que vão nos atacar/nos processar/nos prender/cancelar a assinatura?". Diante dessa impossibilidade prática, a gente procura seguir apenas uma única regra, bem simples. Buscamos responder a uma só pergunta: "Será que esse tema é do interesse do público?" Se a resposta for sim, vale a pena correr certos riscos - afinal, é essa a nossa missão. Esta edição foi concluída sob o luto do massacre em Paris dos colegas de profissão do Charlie Hebdo. Achamos que, em meio à histeria diante desse ataque covarde à expressão, algumas coisas deixaram de ser ditas. Supomos que nosso público gostaria de saber que homem foi esse em nome do qual uma barbaridade dessas foi cometida - por mais que talvez alguns se chateassem por tratarmos Maomé como um homem. Pensamos também que era um bom momento para mostrar que a intolerância não está limitada a nenhum grupo político ou religioso - por mais que possa soar irritante para alguns lembrar que atrocidades contra a liberdade de expressão não são uma exclusividade islâmica. Lamentamos se alguém se ofender com alguma dessas decisões editoriais. Mas não tínhamos como não fazer nosso trabalho. Denis Russo Burgierman, DIRETOR DE REDAÇÃO DENIS.BURGIERMAN@ABRIL.COM.BR 1#2 MUNDO SUPER TSUNAMI DE REVOLTA CRISTÃ A última capa da SUPER (Êxodo, jan/15) exaltou leitores religiosos. Foram mais de 750 comentários no Facebook (on.fb.me/1Gks60C), em discussão acalorada sobre o poder de Deus e a abertura do Mar Vermelho. NÃO FOI COLAPSO no clima, não. Foi meu Deus que agiu! - CAIO SANTOS O CLIMA deixou os israelitas passarem sem perigo e matou somente os egípcios... Esse é meu garoto! Vocês são uma piada quando tentam refutar alguma verdade bíblica. - MÍRIAM ANCILLA DOMINI RODRIGUES FAZEM DE TUDO para excluir Deus, mas ele não será excluído. Desistam! - VANESSA MENEZES MAIS UMA VEZ a falsa ciência tentando negar a existência de um Deus soberano, que tem o controle da História! - JOSÉ FÁBIO TANTAS COISAS PRA ESTUDAR, vão perder o precioso tempo da ciência com algo simplesmente indiscutível. - PRISCILA BERTOGLIA A SUPER SÓ ME DESAPONTA nesse quesito! Poderiam falar de ciência sem tentar derrubar a fé e os dogmas religiosos dos outros. - JULIANA BERNABE SILES VOCÊS AINDA NÃO CONHECERAM A VERDADE libertadora, por isso blasfemam o nosso Criador. Pobres coitados, se acham superiores em sua própria ignorância. - EDSON SOUZA A MÍDIA TENTA convencer as pessoas de que o que está na Bíblia é mentira e que nada daquilo aconteceu pela vontade de Deus. Explicar o inexplicável. - EVELYN GAETE TENHAM VERGONHA na cara, seus ateus de uma figa. - GILSON BESERA RETROSPECTIVA SUPER 2014 Todo ano, a gente faz uma seleção das coisas mais legais dos últimos 12 meses. Personalidades que se destacaram, os melhores livros, sites, jogos, HQs, discos, filmes e séries lançados, além dos melhores momentos da SUPER. As de 2014 renderam 314 mil visualizações. Já conferiu? Vai lá no Superblog! abr.ai/1zunuRS FÍSICA DO FUTURO Sei que gostar da matéria revela minha idade, mas quem não viu mais de duas vezes cada filme da série De Volta para o Futuro? Fiquei pensando: será que esses filmes são premonições? Como não acredito em nada disso, só sei de uma coisa: a física nunca me pareceu tão interessante quanto agora. Valeu, SUPER! GÍLIA SÁ, sobre a reportagem O Futuro do Pretérito (jan/15). TRADUZINDO O ECONOMÊS Gostaria de parabenizar a SUPER pela abordagem que tem dado aos temas indecifráveis de economia, em especial nos textos O Fantasma da Máquina (dez/14) e Estamos Amarrando Cachorro com Linguiça (nov/14). Outra surpresa foi a reportagem Os Verdadeiros Donos do Mundo (dez/14), com a discussão sobre a liberdade de mercado e a desigualdade social. GABRIEL DE LIMA COSTA 5 LEITORES OPINAM NO POST 6 PENAS DE MORTE BIZARRAS 1- Acho que os marginais deveriam morrer da mesma forma como assassinaram suas vítimas. Isso sim seria justiça! - RE ESCUDEIRO 2- Vingança não é justiça. - GABRIEL SILIONI 3- Sei que é uma atitude radical, mas em alguns casos é a única opção. Só não concordo com a barbárie na aplicação da pena. - GENI SILVA 4- Achei um ninho de assassinos aqui. - FERNANDO KLITZKE 5- Quem dera essa barbárie estivesse fora de moda. Aqui, no Brasil, nunca esteve tão em evidência. - LÚCIA AQUINO abr.aí/1wm30Ss TROFÉU PIADISTA DO MÊS Já sei que tenho dois ouvidos direitos. - LILIAN SCHETTINI, no post "Ouvido esquerdo entende melhor o sarcasmo". SUPER BANCA COMO PLANTAR, REGAR E COLHER DINHEIRO DOSSIÊ SUPER R$ 14 Conheça (e entenda) todas as formas de investimento ao seu alcance. O LADO BOM DOS SEUS PROBLEMAS LIVRO R$ 29,90 Defeitos podem ser suas maiores virtudes. Entenda por quê. FOI MAL Traduzimos o filme The Perfect Storm como A Tempestade Perfeita, mas o título do filme em português é Mar em Fúria (Cult, jan/15). Na ilustração, o valor do número pi aparece como 3,1415924..., entretanto, esse último número da sequência é 6 (Papo, jan/15). SUPER CUPIDO Não me encontro efetivamente encalhada, mas foi propícia a matriz Desencalhe.com (dez/14). Me aventurei no OkCupid, que agrupa pessoas por QI. O site faz um primeiro filtro no intuito de "aprender" o seu tipo preferido e ajudar nas próximas seleções. Eis que me deparo com um rosto conhecido. Corri para o Facebook e, entre meus amigos, encontro a pessoa em questão. Era um (re)início de conversa. Fizemos curso técnico juntas, ambas com 17 anos na época. Combinamos de sair, bebemos, conversamos. Nós duas nos formamos em letras e não usamos o técnico para nada em nossa vida. Ela me confessou que era bissexual e acabou rolando um beijo. Hoje? Passamos o Ano-Novo juntas na praia e continuamos a sair! - NATHALIE BERGAMO FALE COM A GENTE REDAÇÃO - superleitor@abril.com.br, av. das Nações Unidas, 7221, 14º andar, CEP 05425-902, São Paulo, SP, fax 11 3037-5891. PUBLICIDADE - publiabrif.com.br SP 11 3037-5189, RJ 21 2546-8100. Outras praças: 11 3037-5759. Vendas Diretas: 11 3037-5000. SAC - abrilsac.com abrilsac.lojaabril@abril.com.br SP 11 5087-2112 Outras Praças 0800-7752112 Segunda a sexta, das 8 às 22h. ASSINATURAS - assineabril.com SP 11 3347-2121 Outras Praças 0800-7752828 Segunda a sexta, das 8 às 22h. Sábado, das 9 às 16h. 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Primeiro, os cientistas deram choques elétricos nas lesmas. Os neurônios sensoriais, que detectam o choque, formaram conexões com os neurônios motores - que fazem a lesma se retrair. Essa conexão dura alguns dias, mesmo na ausência do choque. A lesma "se lembra" dele, cria uma memória. Só que, logo em seguida, as cobaias receberam queleritina, uma substância que desfaz as ligações entre neurônios. As sinapses sumiram, a memória foi destruída. Mas o mais impressionante veio depois. As lesmas tomaram uma injeção de serotonina (neurotransmissor presente também em humanos). Consequência: as conexões entre os neurônios se refizeram espontaneamente. Ou seja, a memória foi recuperada. Além de provar que é possível recuperar uma memória destruída, o estudo levantou uma hipótese intrigante. Talvez as memórias não sejam armazenadas nas sinapses - e sim dentro dos próprios neurônios. Isso pode ser uma esperança para quem sofre de Alzheimer (doença que bloqueia as sinapses, levando à perda de memória). "Se encontrarmos uma maneira de restaurar as sinapses desses pacientes, suas memórias poderão retornar", diz o neurocientista David Glanzman, líder do estudo. SANGUE DE BOI TEM PODER Uma fazenda de criação de gado em Kiserian, no Quênia, teve uma ideia inteligente para aproveitar o sangue dos aproximadamente 120 bois e 400 ovelhas que abate a cada dia: transformá-lo em biogás, que pode ser engarrafado e vendido. O sangue, que até então era jogado fora (e podia contaminar o meio ambiente), agora é recolhido e misturado com as fezes dos animais. A mistura se decompõe e produz o biogás, que é bastante inflamável e pode ser usado para alimentar fogões e geradores. A fazenda já usa o gás para gerar a própria energia, mas agora pretende começar a engarrafá-lo e vendê-lo por US$ 8 o botijão - metade do preço cobrado pelo gás tradicional (GLP). CAI USO DE ÁLCOOL E CIGARRO ENTRE JOVENS Pesquisa com 40 mil adolescentes dos EUA revela queda no consumo de bebida e principais drogas; maconha sobe de patamar e ultrapassa cigarro. Quantos % já consumiram pelo menos uma vez na vida: Álcool: 49,3% Cigarro: 22,6% Maconha: 33,7% LSD: em torno de 1% Cocaína: em torno de 1% Ecstasy: em torno de 1% No Brasil, a pesquisa mais recente foi realizada em 2010, com 50 mil estudantes. ÁLCOOL: 60,5% CIGARRO: 16,9% MACONHA: 5,7% LSD: 1% COCAÍNA: 2,5% ECSTASY: 1,3% GASTRONOMIA Íma melhora sabor da cerveja - Durante a fabricação dela, é possível submetê-la a um campo magnético - e deixá-la mais gostosa. Basta colocar um íma sobre um tubo pelo qual a cerveja passa. O campo magnético espalha as partículas de lúpulo, que reagem melhor com os demais ingredientes. SAÚDE Após 18 anos, ciência descobre novo antibiótico - A teixobactina é produzida por micróbios que vivem no solo - e elimina bactérias resistentes aos remédios tradicionais. A última família de antibióticos foi descoberta em 1997. HISTÓRIA Sedes do Projeto Manhattan viram pontos turísticos - Os laboratórios, as fábricas e os reatores onde a bomba atômica foi criada e produzida, nos anos 1940, vão virar patrimônio histórico dos EUA. São 30 lugares, em três estados, alguns dos quais poderão ser visitados. VIADUTO "COME" POLUIÇÃO DOS CARROS Reator captura CO2 e luz para produzir algas. Instalado num viaduto em Genebra, o sistema usa os gases liberados pelos carros para alimentar uma população de algas - que podem ser usadas para produzir cosméticos, plásticos e biocombustível. 1- O CO2 entra no sistema por meio de uma abertura que fica na parte de baixo do viaduto. 2- Ele chega a uma tubulação com água e algas - que se alimentam de CO2 e sol. 3- As algas se multiplicam rapidamente. Quando os tubos ficam cheios, elas são coletadas. 100 BILHÕES de árvores estão sendo plantadas na China para formar o Grande Cinturão Verde: uma faixa que cobrirá 4.500 km, no norte do país, para impedir o avanço da areia vinda dos desertos de Taklamakan e Gobi sobre as cidades da região. O projeto deve terminar em 2050. "Essas DIFERENÇAS DE QI são preocupantes", disse a cientista Robyn Whatt, autora de um estudo que mediu o efeito dos ftalatos (substâncias presentes em plásticos, borrachas e cosméticos) sobre 328 grávidas. As mulheres que sofreram maior exposição aos ftalatos tiveram filhos com QI menor, 6 a 7 pontos abaixo das demais crianças. 1#4 SUPER NOVAS – A CHINA DA CHINA Os chineses ganham mal. Mas as empresas de lá querem pagar menos ainda - e estão indo para a África. TEXTO Patrícia Noriyassu OPERÁRIO CHINÊS COME O PÃO QUE O DIABO AMASSOU. Ganha pouco, trabalha demais, vive mal. Tanto que, em 2010, houve nada menos do que 14 suicídios na Foxconn, que produz os gadgets da Apple e de várias outras marcas ocidentais. Preocupado com a repercussão negativa, o governo tem tentado melhorar as coisas - na região de Shenzen, onde fica a maior parte das fábricas de tecnologia, o salário mínimo subiu 25% nos últimos dois anos (e hoje é de R$ 766). Mas isso desagradou às empresas, que estão migrando para um lugar onde a mão de obra é mais barata: a África. "Para sobreviver, muitas se deslocaram para o interior da China ou para países em desenvolvimento, como os africanos", diz a chinesa Xiaofang Shen, professora de estudos internacionais da Universidade Johns Hopkins, nos EUA. Supostamente, isso é necessário para que as empresas chinesas possam manter sua principal característica; os preços ultrabaixos. Mais de 2.500 empresas chinesas já estão instaladas no continente africano, em países como Nigéria, África do Sul, Zâmbia, Gana e Etiópia, onde os salários são bem pequenos. Na Etiópia, por exemplo, um operário ganha de US$ 30 a US$ 50 por mês. Eles produzem calçados, roupas, material de construção, eletrodomésticos e até automóveis. É possível que, ao comprar alguma coisa bem barata, vejamos cada vez menos a inscrição Made in China - e cada vez mais Made in África. 1#5 CIÊNCIA MALUCA TEXTO Carol Castro ABR.AI /CIENCIAMALUCA Data de nascimento causa depressão Um grupo de cientistas submeteu 400 pessoas a testes de personalidade, viu em qual época cada uma tinha nascido e concluiu: a estação do ano em que você nasce determina o risco de ter transtornos de humor. Nascer no verão é ruim: aumenta a chance de ser bipolar. As melhores épocas são outono e inverno. Receber salário pode matar Nos dias de pagamento, o número de mortes súbitas cresce até 23%. A conclusão é de pesquisadores suecos, que acompanharam por seis anos a vida de trabalhadores do país. É que, com dinheiro no bolso, as pessoas tendem a consumir mais bebida e junk food. E isso pode deflagrar infartos e derrames. Você é igual ao seu carro Cientistas fotografaram 30 pessoas e os carros delas. Um grupo de voluntários olhou as fotos dos carros - e tinha de adivinhar, entre seis rostos, qual era o dono do automóvel. Eles acertaram (mais vezes do que se simplesmente estivessem chutando). É que, ao comprar um carro, você inconscientemente escolhe um cuja frente se pareça ao seu rosto. 1#6 SUPER NOVAS – A OLIMPÍADA DOS ÍNDIOS Primeira edição dos Jogos Mundiais dos Povos Indígenas será realizada em setembro em Palmas, capital do Tocantins, e vai reunir 2.300 atletas indígenas de 23 países, como Austrália, Japão, China, Filipinas, Rússia, Noruega e Brasil - que será representado por 22 etnias. A cidade espera receber 100 mil visitantes para o evento, que terá modalidades de demonstração e de competição. TEXTO Marcos Ricardo dos Santos JOGOS DE DEMONSTRAÇÃO Cada modalidade é praticada por apenas uma etnia. Não há vencedor; o objetivo é apenas apresentar os esportes. 1- RÕNKRÃ JOGO DE BOLA USANDO BASTÃO COMO É: Uma espécie de hóquei. Duas equipes de dez jogadores usam uma borduna (bastão), de 1,30 metro, para rebater uma bola e tentar fazer gol. QUEM VAI JOGAR:índios Kayapó 2- XIKUNAHATI JOGO DE BOLA COM A CABEÇA COMO É: Mais ou menos como o futevôlei, mas sem os pés: só é permitido tocar na bola com a cabeça. Cada equipe tem de 8 a 10 atletas. O jogo acontece num campo de terra batida. A bola pode pingar uma vez antes de ir para o campo adversário. O campo tem uma linha demarcatória no meio, mas sem rede entre os dois lados. QUEM VAI JOGAR: índios Pareci (MT) 3- JAWARI JOGO DE FLECHA EM MOVIMENTO COMO É: 15 atletas de cada lado. A cada rodada, um de cada time avança - e tenta acertar o outro com uma flecha (cuja ponta é de cera e não machuca). Quem for alvejado está fora. Ganha o time que ficar por último. OUEM VAI JOGAR: índios Kuikuro (MT), Kamayurá (MT) e outros JOGOS DE COMPETIÇÃO São disputados por várias etnias para ver qual é a melhor. 1- CABO DE FORÇA COMO É: Prova coletiva, com versões masculina e feminina, uma das mais populares dos jogos. Cada tribo inscreve duas equipes, cada uma com 10 atletas e 2 reservas. Ganha quem puxar o cabo mais forte e derrubar o grupo adversário. Os times derrotados vão sendo eliminados. FAVORITOS: Enawenê – nawê (MT), Wai Wai (PA) e Pataxó (BA) 2- ARREMESSO DE LANÇA COMO É: Cada etnia inscreve dois atletas, que têm direito a 3 arremessos cada um. Ganha quem conseguir jogar a lança, que tem 1,80 metro de comprimento, mais longe. FAVORITOS: índios Kanela (TO) e Tikuna (AM) 3- CORRIDA DE TORA COMO É: Duas equipes, cada uma com 10 atletas, se revezam, carregando toras feitas da palmeira buriti. As mulheres carregam uma tora de 100 kg, e os homens levam 120 kg. O percurso pode chegar a 1 km. FAVORITOS: Kanela (TO) e Gavião Pakatejê (PA) 1#7 PAPO – “HÁ MUITA VIDA NO SURTO DE EBOLA” Para o médico brasileiro que enfrentou a doença pessoalmente, quem não quiser o ebola batendo à porta deve voltar olhos e recursos para a África. ENTREVISTA Mariana Sgarioni MÁRCIO SILVEIRA DA FONSECA Médico infectologista carioca, 42 anos, trabalhou com os Médicos Sem Fronteiras (MSF) na epidemia de ebola em Bo, Serra Leoa, em 2014. Tratou de HIV, tuberculose e outras doenças infecciosas em Moçambique, Camboja e Guiana. Há o risco de o ebola sair da África e se espalhar? O país que quiser barrar o ebola tem que atuar no coração da epidemia. Um dos jeitos é dando dinheiro, mas não é só isso. Construir novos centros e principalmente enviar gente para trabalhar é essencial. Na Libéria, a situação melhorou. Mas em Serra Leoa piorou. E na Guiné a transmissão continua. Não existe fronteira eficiente contra a transmissão. Mas países com mais recursos não correm tanto risco como a África. Por quê? Na África, talvez pelo estilo de vida, os doentes demoram a procurar o serviço de saúde. Ficam quatro, cinco dias em casa, com febre, diarreia, vômito e contaminando outras pessoas. Essa demora vem do que sabem da doença. Elas sabem que quase todo mundo que entra no isolamento acaba morrendo. Como o cadáver é extremamente infectante, em geral, a pessoa acaba não tendo um funeral religioso, o que é muito agressivo para eles. E vira um motivo para fugir do tratamento, pois pensam: "Já que vai morrer mesmo, melhor que morra em casa, com a família e com um funeral digno". A realidade do surto é parecida com a ficção? Corpos cobertos, caminhões de mortos, pânico? Quando a epidemia foi declarada como emergência internacional, a situação na Libéria era tétrica. Pessoas mortas na rua e tal. Em Bo, em Serra Leoa, onde eu estava, o que eu tive foi a sensação de estar no epicentro do problema. Já no aeroporto, temos que responder a questionários, há pessoas medindo sua temperatura, avisos por todas as partes. O ebola é a conversa em todos os lugares. Pessoas evitando de se tocar com medo de infecção. Entre nós, profissionais de saúde, costumamos brincar que o lugar mais seguro nessas epidemias é dentro da enfermaria junto com os doentes confirmados de ebola. Ali dentro você está paramentado, não tem um centímetro de pele exposta, não vai pegar. O risco é quando você sai. Não é desesperador lidar com gente morrendo o tempo todo? O legal é perceber como, num ambiente de tanta morte, é possível ver tanta vida. Você vê um familiar apoiando o outro, alguém aparecendo para tomar conta com todo carinho da criança que ficou órfã, os profissionais locais, apesar de tudo, mantendo o sorriso. Ou pacientes que sobreviveram deixando o centro de isolamento dançando. Olhar nos olhos de quem entra naquela enfermaria achando que vai morrer (e muitos morrem mesmo) é duro. Ao mesmo tempo, temos a possibilidade de ter contato com o que há de mais belo da solidariedade humana. O ebola não é uma novidade. Mas só agora parece que existe um interesse real em vacinas e remédios. Agora começou a correria mesmo. O ebola, se a gente for relativizar, matou uma quantidade muito pequena de gente em décadas. Tem doença muito mais importante: HIV, tuberculose, malária. Estão todas lá, disputando recursos. De todo modo, não existe uma bala mágica que vai ser a salvação. Há terapias promissoras, mas ainda é difícil imaginar isso sendo produzido em larga escala. O que a gente vê é que quem é tratado na Europa ou nos EUA não morre. Ou morre pouco. Elas receberam tratamentos de suporte que todos deveriam receber - como hidratação intensa, por exemplo. O ebola nem sempre é uma declaração de morte - quem for tratado em um lugar com recursos provavelmente vai sobreviver. 1#8 MATRIZ – SERIAL KILLERS Banho de sangue para ficar jovem, carne humana vendida como lombo de porco e muitos estrangulamentos se misturam no doentio mundo dos assassinos em série. POR Alexandre de Santi, Marcel Hartmann e Paula Bustamante MONSTRO DOS ANDES (COL) Período dos crimes: 1978-1983 Assassinatos que renderam condenações: 110 Assassinatos estimados pela polícia: 350+ Atacou garotas no Peru, no Equador e na Colômbia. Todoas tinham entre 9 a 12 anos. LAS POQUIANCHIS (MEX) Período dos crimes: 1950-1964 Assassinatos que renderam condenações: 91 Assassinatos estimados pela polícia: 50 Quatro Hermanas donas de bordéis. Matavam prostitutas, seus filhos e clientes. DOUTOR MORTE (ING) Período dos crimes: 1975-1998 Assassinatos que renderam condenações: 15 Assassinatos estimados pela polícia: 250 Médico, usava injeções letais de heroína. As vítimas eram idosas. MIYUKI ISHIKAWA (JAP) Período dos crimes: 1885-1948 Assassinatos que renderam condenações: 103 Assassinatos estimados pela polícia: 139 Parteira japonesa que tinha gosto por tirar a vida de bebês. Escondia os corpos pela cidade. GILLES DE RAIS (FRA) Período dos crimes: 1432-1440 Assassinatos que renderam condenações: 140 Assassinatos estimados pela polícia: 140 + Precursor dos serial killers, lutou ao lado de Joana d’Arc THUG BEHRAM (IND) Período dos crimes: 1790-1840 Assassinatos que renderam condenações: 125 Assassinatos estimados pela polícia: 931 Matava usando lenços indianos. É considerado o maior serial killer da história. CONDESSA SANGRENTA (HUN) Período dos crimes: 1580-1611 Assassinatos que renderam condenações: 80 Assassinatos estimados pela polícia: 650 Matava servas e lendas dizem que se banhava em seu sangue para se sentir jovem. FRITZ HAARMANN (ALE) Período dos crimes: 1918-1924 Assassinatos que renderam condenações: 27 Assassinatos estimados pela polícia: 100 + Sodomizava as vítimas, mordia as gargantas e as vendia como carne de porco. JANE TOPPAN (EUA) Período dos crimes: 1857-1938 Assassinatos que renderam condenações: 31 Assassinatos estimados pela polícia: 100 + Enfermeira que usava porções de morfina e atropina. Desejava liquidar com mais pessoas do que qualquer um na história. MANÍACO DO ARCO-ÍRIS (BRA) Período dos crimes: 2007-2008 Assassinatos que renderam condenações: 13 Dava pauladas e tiros em gays na Grande São Paulo. Até hoje ninguém sabe quem é. MONSTER KILLER (CHN) Período dos crimes: 1999-2003 Assassinatos que renderam condenações: 67 Levou um pé da namorada e quis se vingar da sociedade. Invadia casas com um machado na mão. CHIKATILO (UCR) Período dos crimes: 1978-1990 Assassinatos que renderam condenações: 53 Cortava a língua de moças e garotos com os próprios dentes e removia seus órgãos. PEDRINHO MATADOR (BRA) Período dos crimes: 1960- Assassinatos que renderam condenações: 71 Entre as vítimas, 41 foram na prisão. Esfaqueou o pai e arrancou seu coração. MANÍACO DO PARQUE (BRA) Período dos crimes: 1998- Assassinatos que renderam condenações: 9 Prometia transformar mulheres em modelos, mas enforcava as candidatas. AILEEN WUORNOS (EUA) Período dos crimes: 1989-1991 Assassinatos que renderam condenações: 6 Prostituía-se na estrada, entrava no carro e matava a tiros. Confessou seis mortes e inspirou o filme Desejo Assassino. CAÇADOR DE RUHR (ALE) Período dos crimes: 1955-1976 Assassinatos que renderam condenações: 8 A polícia encontrou carne humana em seu freezer e uma mão sendo cozida com batatas. JACK ESTRIPADOR (ING) Período dos crimes: 1888 Assassinatos estimados pela polícia: 5 Cortava a garganta e retirava vísceras de prostitutas na era vitoriana. VAMPIRO DE NITERÓI (BRA) Período dos crimes: 1991-1992 Assassinatos que renderam condenações: 13 Assassinatos estimados pela polícia: 14 Abusava, estrangulava e bebia o sangue de crianças para ficar bonito e puro como elas. 1#9 BANCO DE DADOS – DESSALINIZAÇÃO DE ÁGUA Ela não é nova – soldados a bebiam na Segunda Guerra. Mas só nos últimos anos a água dessalinizada se popularizou. Hoje, ela já beneficia 300 milhões de pessoas. O próximo pode ser você. Por Inara Negrão e Débora Spitzcovsky 150 PAÍSES JÁ USAM A DESSALINIZAÇÃO como alternativa para obter água potável. A demanda pelo processo cresce a um ritmo de 15% AO ANO. 45% DA ÁGUA DESSALINIZADA DO MUNDO é produzida na Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Kuwait, Catar, Barein e Omã. Mais de 90% da água potável desses países é obtida assim. 17 MIL USINAS de dessalinização de água do mar existem no mundo. 1 DESSAS USINAS está no Brasil, em Fernando de Noronha. ELA PRODUZ 650 m3 DE ÁGUA POR DIA. Isso equivale a 0,1% da produção da maior usina do mundo, em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos. 100% DA ÁGUA DESSALINIZADA em Noronha é consumida pela população do arquipélago: 2884 pessoas. MAIORES CAPACIDADES INSTALADAS (em milhões de m3 de água/dia) 1º ARÁBIA SAUDITA 13,3 2º ESTADOS UNIDOS 10,6 3º EMIRADOS ÁRABES 8,9 4º ESPANHA 5,8 5º CHINA4,7 6º KUWAIT 2,9 7º AUSTRÁLIA 2,1 8º ARGÉLIA 2,1 9º ISRAEL 1,9 19º BRASIL 1,1 300 MILHÕES DE PESSOAS TÊM ACESSO À ÁGUA POTÁVEL graças aos métodos de dessalinização. R$ 1 a R$ 2,50 PREÇO PARA DESSALINIZAR 1M3 DE ÁGUA. O custo depende se ela é salgada (mais sais) ou salobra (menos sais). O tratamento da água doce custa R$ 0,75/m3. HÁ DOIS MÉTODOS USINAS DE ÁGUA SALGADA Mares e oceanos SISTEMAS DE ÁGUA SALOBRA Aquíferos e açudes 2750 SISTEMAS de dessalinização em poços subterrâneos existem no Brasil. Eles se concentram em 8 ESTADOS. 1- BA 32% 2- CE 28,5% 3- PE 14% 4- PB 7,7% 5- MG 5,7% 6- RN 5,6% 7- PI 5,5% 8- SE 2% Quanto mais ao sul, mais doce é a água do subsolo. CRESCIMENTO NO BRASIL O número de sistemas mais que duplicou. 2012: 1200 2014: 2750 Fontes: Associação Internacional de Dessalinização; Kepler Borges França, coordenador do Laboratório Nacional de Referência em Dessalinização das Águas, da Universidade Federal de Campina Grande; Global Water Intelligence e International Desalination Association GWI/IDA (DesalData; Programa Água Doce, Ministério do Meio Ambiente. 1#10 COORDENADAS – SEDA, GUERRA E PAZ Casa de Jim Thompson, Bangcoc, Tailândia. O museu que conta a história de um orgulho nacional e homenageia tempos mais pacíficos no país. TEXTO Fred Di Giacomo NO ESCRITÓRIO DE JIM THOMPSON, em Bangcoc, há dois horóscopos pendurados na parede. Um prevendo sorte em 1959, outro premeditando azar àqueles nascidos no ano do cavalo ao fazer 61 anos. O americano Thompson era membro da OSS, a precursora da CIA. Na Segunda Guerra, ele desembarcaria na Tailândia de paraquedas, mas o conflito acabou, então ele resolveu ir de avião mesmo assim. Thompson decidiu viver lá e revitalizar a indústria da seda local. A cultura tecelã tailandesa estava abandonada, e seus habitantes compravam tecido mais barato (e de pior qualidade) da China. Ele ajudou o país a reaver esse orgulho, ficou rico e se mudou para um luxuoso imóvel. O ano era 1959. Thompson acabou colecionando inimigos, que não gostavam de um estrangeiro que dizia conhecer a Tailândia melhor que muitos locais. Além disso, o governo americano desconfiava dele, que apoiava democratas tailandeses e o líder comunista Ho Chi Minh, no Vietnã. A bela casa de Thompson hoje é um museu, onde se assiste à produção tradicional de seda. Ela é ricamente decorada com porcelanas chinesas e tapeçarias coloridas, que contam a vida de Buda ao estilo do budismo tailandês, muito influenciado pelo hinduísmo. O chão do primeiro andar é de mármore italiano e a construção é toda cercada por árvores típicas das florestas da região. Um eclético paraíso tropical, alheio ao golpe de Estado e aos subsequentes protestos que tomaram a Tailândia em 2014. Não que seja novidade no país. Esse foi o sexto golpe desde o dia em que Thompson saiu para uma expedição na mata, em 1967, e nunca mais foi visto. Nascido em 1906, ano do cavalo, ele tinha 61 anos. VÁ - Estação National Stadium do trem de superfície. O museu fica bem em frente ao estádio. QUANDO - Novembro a fevereiro: o calor não é de rachar e não há chuvas de monções. ESTE MÊS NESTE PLANETA 32’91' S 68’84' 0 ENOFESTA Cerca de 200 mil pessoas, entre turistas e produtores locais, celebram a cultura do vinho em desfiles e espetáculos em Mendoza, Argentina. Dia 28. 64’83'N147'70' 0 ARTE ÁRTICA O maior torneio de esculturas de gelo do mundo ocorre em Fairbanks, Alasca. Elas pesam até 20 ton. e usam o chamado "diamante do Ártico", gelo de uma lagoa local. Dia 23. UM MOMENTO 19/2, 12H Início do 4L Trophy, rali de 6 mil quilômetros entre a França e o Marrocos. Os participantes doam material escolar a colégios marroquinos no caminho. 10.000 homens lutam por bastões atirados de uma janela do templo de Saidai-ji, em Nara, Japão. O vencedor é abençoado com 12 meses de sorte. Dia 21. QUE LUGAR É ESSE? 1- Foi povoado no século de dom Pedro. 2- Abriga dois terços de um patrimônio. 3- É conhecido pela Serra da Bodoquena RESPOSTA Mato Grosso do Sul, que foi povoado no séc. 19. A maior parte do Pantanal está lá, assim como Bonito, na Serra da Bodoquena. 1#11 ORÁCULO Edição Felipe van Deursen ABR.AI/BLOGDOORACULO ROSQUINHAS E PNEUS Existe mais informação num objeto com um buraco no meio do que sonha nossa barriga apaixonada. D’OH! Rosquinha embebida em brigadeiro de delegacias, tirai-me um questionamento que há muito (dez minutos, hehe) me atormenta: o que mudaria se a Terra tivesse forma de rosquinha? - MATEUS PARMA, BELO HORIZONTE, MG Tudo. A Terra donut seria estéril e, possivelmente instável. A incidência solar seria bem diferente por causa do formato do planeta, o que traria diferenças severas de temperatura. A força gravitacional variaria horrores de acordo com a região do planeta. Isso tudo poderia fazer na Terra o que aconteceu em Marte: lá, a atmosfera rarefeita se dissipou e os oceanos evaporaram há cerca de 3 bilhões de anos. MICTORIOLOGIA Por que nós, homens, abrimos as pernas quando vamos fazer xixi? - RENATO CARDOZO, SÃO PAULO, SP Para dar mais estabilidade. Se você estiver esvaziando a bexiga de pernas coladas, é mais fácil ocorrer uma mudança no seu centro de gravidade que o desequilibre. Em termos práticos: se estiver de pés juntos, basta uma ombrada para você, possivelmente, cair no chão e se emporcalhar todo. Além disso, com os pés separados, existem menos riscos de urinar em cima do seu sapato lustroso. Quem é a pessoa que desenha nosso dinheiro? Como é esse processo? - LEONARDO ANDREOLI, PASSO FUNDO, RS É um grupo de cerca de dez profissionais, entre eles designers e gravadores de valores, que esculpem as moedas. Primeiro, eles estudam temas e tecnologias de segurança. Depois, desenvolvem as características do dinheiro, como tamanhos das notas e materiais usados na impressão. O trabalho pode durar muito tempo. A segunda família do real, por exemplo, levou seis anos para ser lançada. CORAÇÃO DE MELÃO Lorde das respostas, quando estamos aéreos, por que sentimos frio na barriga ao lembrar da pessoa amada? - VIKTOR FERNANDES, VOLTA REDONDA, RJ O que ocorre é que você não consegue manter o foco. Quando estamos apaixonados, uma área do cérebro chamada tegmental ventral é ativada. Ela produz a tal dopamina, neurotransmissor envolvido no controle das emoções. A descarga de dopamina muda os níveis de hormônios, que provocam palpitações no coração, agitação e perda de apetite - os sintomas típicos do famoso frio na barriga. Pronto, agora você já tem o que falar na abordagem à pessoa amada. De nada. BLECAUTE SINISTRO Se o Sol apagasse agora, quanto tempo nós ainda teríamos de vida? - VINÍCIUS DOS SANTOS, CASCAVEL, PR Em 8 minutos e 20 segundos veríamos que o Sol apagou (esse é o tempo que a luz solar demora para chegar à Terra). Em poucas semanas, todos morreríamos. O calor interno do planeta e o isolamento térmico proporcionado pela atmosfera segurariam as pontas por alguns dias, até o ficar insustentável. Para completar o quadro, sem Sol não haveria evaporação da água, chuvas nem ventos. Uma delícia, QUER QUE DESENHE? Por que pneu novo de carro tem pelinhos? - MULLER PIEPER FERREIRA, BAIXO GUANDU, ES 1- É sobra de fábrica. Primeiro, máquinas misturam a borracha, resultando numa massa pegajosa. 2- A massa passa por vários processos. Depois, já circular, ela vai para a prensa de vulcanização, onde, com o calor extremo, nasce o pneu. 3- Para expelir o ar quente, pequenos furos são feitos. Á saída do vapor leva um pouco de borracha, formando os cabelinhos. ORDEM NO TRIBUNAL! Qual é a do martelo do juiz? Para que ele serve? - GUILHERME BIANCHI, FLORIANÓPOLIS, SC Basicamente para acalmar os ânimos no tribunal. O martelo de madeira é uma tradição do common law anglo-saxão, sistema jurídico usado na Inglaterra e nos Estados Unidos, entre outros. No Brasil, onde vigora o sistema romano-germânico, o mais comum do mundo, os tribunais usam uma campainha. MARTELOTECA MARRETA BIÔNICA - Arma clássica de Chapolim Colorado. TUBARÃO-MARTELO - Sphyrna spp.: 430 kg e feio pacas. MJÖLLNIR - Trovão infalível do deus Thor. HAMMER - Arma dos soldados de Bowser (ver "Conexões"). PÁ PUM Misturar melancia com vinho mata? - LUCAS DA SILVA, CAMPO DO TENENTE, PR Assim como "manga com leite dá dor de barriga" e "mamão com ovo mata", isso é puro mito alimentar. NÚMERO INCRÍVEL -170 °C Temperatura da superfície da Terra se o Sol morresse. UM DADO RELEVANTE COM ALGUMA LIGAÇÃO 170 D.C Ano da morte de Ptolomeu, um dos maiores astrônomos da Antiguidade. OUTRO DADO RELEVANTE SEM NENHUMA LIGAÇÃO 170% Aumento de casos de dengue na Malásia em 2014. PERGUNTE AO ORÁCULO! Escreva para superleitor@abril.com.br com o assunto "Oráculo" e mencione sua cidade e Estado. 1#12 CONEXÕES – BROWSER A BOWSER TEXTO Ana Prado BROWSER - Navegador de internet, é uma ferramenta que interpreta linguagens de programação e permite interagir com sites. Essas ferramentas funcionam em um sistema específico de navegação, a World Wide Web, o famoso "www", criado por... TIM BERNERS-LEE - Físico britânico e cientista da computação. Dentre as premiações que ganhou por sua contribuição à tecnologia, destaca-se o Prêmio Japão, concedido por esse país, que, apesar de distante, tem coisas em comum com o Brasil, como os... LOVE HOTELS - Locais para encontros sexuais, semelhantes aos nossos motéis. Assim como no Brasil, no Japão há vários motéis temáticos, com camas em forma de vagão de trem e barco, por exemplo. Uma das empresas que investiu no setor foi a... NINTENDO - Fundada por Fusajiro Yamauchi, ela já atuou nos mercados de táxi, arroz instantâneo, baralho e rede de TV (além dos motéis), antes de apostar em videogames. Nesse ramo, criou personagens famosos, como o inimigo de Super Mário,... BOWSER - Rei de uma tribo de tartarugas (entre elas os Hammer Bros.) e eterno sequestrador da princesa Peach. Marcou presença em todos os aparelhos da Nintendo, como o DS, que em 2006 ganhou uma inovação: seu próprio browser. 1#13 ESSENCIAL – VAI DE RODÍZIO OU À LA CARTE? Em 2014, uma tendência se consolidou: produtos digitais estão cada vez mais sendo vendidos do mesmo jeito que a maioria das churrascarias serve carne: em sistema de rodízio. Mas isso não quer dizer que o modelo esteja decidido. TEXTO Pedro Burgos NÃO SE SABE QUAL FOI A PRIMEIRA churrascaria a adotar o modelo "pague uma vez e coma o quanto quiser" , mas ninguém duvida de que foi uma grande ideia. Se o preço é justo, é bom negócio tanto para quem vende quanto para quem come. O mesmo modelo, depois de fazer sucesso com sushi e pizza, virou moda para vender filmes, música e outros conteúdos pela internet. É essa a aposta da Netflix, que já tem mais de 50 milhões de assinantes no mundo. As pessoas pagam uma mensalidade relativamente baixa (menos de R$ 20 por mês) e podem ver milhares de filmes e séries a hora que quiser no smartphone, no notebook, na TV ou no tablet. O chamado serviço de streaming (do termo em inglês para "transmitir dados") tem ajudado os estúdios a enfrentar a pirataria, e algumas pesquisas mostram que nos países onde o Netflix chega o tráfego ilegal de dados diminui. Ou seja: parece que as pessoas topam abrir mão do torrent ou do DVD de 5 reais se a alternativa legal for prática e barata. O mesmo acontece com a música. Serviços como Spotify, Deezer e Rdio permitem ouvir dezenas de milhões de músicas, em alta qualidade, e baixar tudo para o celular por menos que o preço de um CD por mês. Alguns oferecem até a opção de acessar tudo de graça, com intervalos comerciais. Os artistas e a gravadora ganham dinheiro a cada execução de suas músicas – mais de 70% do faturamento do Spotify vai para o pagamento de royalties. Parece a solução perfeita no mundo pós-CD. Parece. Mas nem todo mundo está feliz com esse novo cenário porque, mesmo com o crescimento dos serviços de streaming - o Spotify saltou de 10 para 15 milhões de assinantes em 2014 -, o faturamento da indústria musical continua caindo. Justamente porque muita gente que pagava à la carte pelos downloads em serviços como o iTunes, da Apple, passou a adotar o rodízio mais barato do Spotify. As vendas de música, em todos os formatos, movimentou em 2014 menos que a metade de dez anos atrás, o que é assustador. Por isso, os serviços de streaming, que eram tidos como a salvação da indústria, começaram a ser vistos como vilões por alguns artistas. A principal porta-voz dos descontentes é a americana Taylor Swift. Ela foi a sensação da música pop do ano que passou: teve o clipe mais assistido do YouTube e, em uma época na qual quase ninguém compra álbuns, vendeu mais de 1 milhão de cópias apenas na semana de estreia de seu 1989. É a melhor estreia no mundo desde 2002. Dias antes de 1989 ser lançado, Taylor decidiu tirar suas músicas do Spotify, o que fez com que a única maneira legal de ouvir suas novas músicas fosse comprar o disco. O gesto não foi só uma sacada de marketing mas também um protesto. A cantora diz que o valor pago aos artistas pelos serviços de streaming é minúsculo: dependendo do contrato, entre US$ 0,006 e US$ 0,0084 (de 1 a 2 centavos de real). Um músico só consegue ganhar o equivalente a um salário mínimo nos Estados Unidos (cerca de 3.300 reais) se sua música tocar 4 milhões de vezes por mês no Spotify. Para ganhar o mesmo valor com CDs, bastaria vender 3.800 cópias. O Spotify se defende, em seu blog, dizendo que já pagou mais de 2 bilhões de dólares em royalties e que, quanto mais assinantes houver, maior será o bolo a dividir entre os artistas. Ou seja, eles pedem paciência. E não só para os músicos, mas também para seus investidores, já que em oito anos de vida o site ainda não deu um tostão de lucro, o que gera dúvidas sobre a sustentabilidade da empreitada. Do lado do streaming de vídeo, há outro tipo de problema: quanto mais gente assina o Netflix, mais caro fica para a empresa o acordo com as produtoras de filmes e séries. Não é à toa que o catálogo seja tão cheio de velharias - é o que dá para pagar. A produção de séries próprias, como as aclamadas House of Cards e Orange Is the New Black, é na verdade uma necessidade - comprar os direitos para transmitir uma série de sucesso custa uma fortuna, mais caro que produzir. Para melhorar a oferta de novidades, o Netflix teria que cobrar mais. A empresa até fez esse experimento no último trimestre, aumentando sua assinatura em dois dólares. O resultado: nunca cresceu tão pouco, e suas ações caíram quase 30% nos últimos meses do ano. O Netflix pode, no fim das contas, ser só mais um canal de um novo tipo de TV, e não a solução para tudo. Em abril, a HBO deve estrear sua versão 100% por streaming, totalmente fora dos pacotes de TV a cabo. Não será barato, mas as pessoas poderão ver séries superproduzidas como Game of Thrones, ao mesmo tempo que passam na TV. No Brasil, a Globo tem um serviço semelhante, pago. O futuro pode ter, então, vários bufes - para diferentes paladares. E a turma de apetite grande vai ter que pagar muitas mensalidades. O modelo rodízio agora está sendo testado com outros conteúdos. A Amazon lançou no Brasil no fim do ano passado um serviço de assinatura de livros digitais. Por 20 reais, o consumidor pode baixar o que quiser de um acervo de 700 mil e-books. A Sony apresentou em janeiro o PS Now: por 20 dólares por mês, o gamer desfruta de um catálogo de 102 jogos. A Abril, empresa que edita a SUPER, também está experimentando com o serviço de bufê - no iba Clube, por R$ 20, é possível baixar quatro títulos de revista por mês, em quantidades ilimitadas. Esses novos serviços têm sido bem aceitos pelo público e estão tirando dinheiro dos equivalentes à la carte. O iTunes, talvez o maior deles, perdeu 13% das vendas no ano passado. Mas isso não quer dizer que o problema esteja resolvido. Antes de comemorar o sucesso, as empresas de streaming terão que arrumar um jeito de fazer a conta fechar. Há décadas, as churrascarias rodízio sabem que só há duas maneiras de fazer isso: cobrar mais do freguês ou diminuir a qualidade da comida. _____________________________________________ 2# REPORTAGENS fevereiro 2015 2#1 CAPA – MAOMÉ – A FACE OCULTA DO CRIADOR DO ISLÃ 2#2 CULTURA – ARTE CONDENADA 2#3 COMIDA – FEIJOADA DESCRONSTRUÍDA 2#4 ECONOMIA – ALUGO: CASA, FURADEIRA, CARRO, TEMPO, WI-FI, CONHECIMENTO, PRATO, MÃO DE OBRA, CAMA, MESA, BANHEIRA, FORÇA BRUTA, SERRA TICO-TICO, PACIÊNCIA, MARTELO, FOGÃO, IDEIAS, JOIAS, TODA A VIZINHANÇA. 2#5 TECNOLOGIA – BATERIA FRACA 2#6 COMPORTAMENTO – COMO CONVENCER QUALQUER PESSOA A FAZER QUALQUER COISA – INCLUSIVE A LER ESTA REPORTAGEM 2#7 SAÚDE – PARA LER EM PÉ 2#8 COMIDA – ÁGUA, SABÃO E DELÍCIA 2#1 CAPA – MAOMÉ – A FACE OCULTA DO CRIADOR DO ISLÃ TEXTO Alexandre Versignassi "Quem matar um ser humano (...) terá matado a humanidade inteira. Quem salvar uma vida humana terá salvo toda a humanidade." ALCORÃO - QUINTA SURATA, VERSÍCULO 32 Ele criou uma nação fundamentada em direitos trabalhistas, juros baixos e livre concorrência de mercado. Tinha uma esposa que ganhava mais do que ele e emancipou as mulheres quando assumiu o poder. Conheça a face realmente oculta do criador do islamismo. A MAIOR DOR DE CABEÇA DOS ÁRABES que controlavam Meca, a cidade sagrada, tinha nome e sobrenome: Muhammad ibn Abdallah - Maomé, em português. O plano era acabar com ele de uma vez. Aquele "poeta insano", como eles diziam, tinha virado uma ameaça. Ele vinha angariando partidários fervorosos. Agora era questão de tempo até que o poeta, que se dizia profeta, assumisse o poder na cidade. "Maomé deve morrer" era a ordem. Mas não era simples matar um político em ascendência. Para evitar que a culpa recaísse sobre um assassino específico, e dificultar retaliações, eles bolaram um crime perfeito: cada um dos líderes da cidade deveria designar "um soldado forte e bem-nascido" de seu clã. O grupo invadiria a casa de Maomé no meio da madrugada, e cada um desferiria sua própria punhalada. Todos matariam o profeta, diluindo a culpa entre os membros do consórcio de assassinos. Não deu certo, claro, se não este texto não estaria sendo escrito. E não só porque se trata de um artigo sobre a vida dele. Mas porque, sem a religião que ele criou, o mundo seria um lugar bem diferente. E bem pior, como vamos ver mais adiante. Por outro lado, é óbvio: o que motivou este texto foi a violência dos extremistas islâmicos, uma minoria estridente que comete crimes em nome de sua religião, sem saber que outro grande delito que está perpetrando é contra o próprio islamismo e, mais ainda, contra a imagem de Maomé, um homem que trabalhou pela civilização, não pela barbárie. Vamos conhece-lo melhor nas próximas páginas. O ÚTERO Meca já era sagrada quando o bebê Maomé nasceu ali, no ano de 570. Bem sagrada: recebia peregrinos de todos os cantos da Península Arábica. Tudo por causa de um meteorito; a Pedra Negra, que caiu nas redondezas da cidade sabe-se lá quando e acabou virando um objeto de culto. Em algum momento da história, que nunca foi registrado, os árabes colocaram muros em volta da pedra, cobriram e pronto: a casinha virou um santuário, a Caaba - o Cubo. Junto dela, colocaram 360 deuses, na forma de estatuetas. Um para cada dia do ano - que eles pensavam ter 360 dias. O ritual ali era dar sete voltinhas em torno da Caaba. Provavelmente porque esse é o número de dias de cada fase da Lua. Os deuses, afinal, podiam não ser astronautas, mas eram astros. A Lua era Hubal, uma divindade que ajudava os humanos a prever o futuro. Vênus, o planeta, era Uzza, a deusa do amor. Acima de todos, na sala da presidência celestial, sentava-se um deus tão poderoso que nem tinha nome. Era apenas "o deus": al-Ilah. E do mesmo jeito que "vossa mercê" virou "você", al-Illah virou Allah. E Allah também era Javé. Os judeus tinham escrito a Bíblia mil anos antes. Ela já era o texto mais conhecido do mundo. E a ideia central ali, você sabe, era a de que Javé, o Deus do "d" maiúsculo, tinha criado o mundo e feito uma aliança com um homem chamado Abraão, o patriarca dos judeus. Graças à forte presença de comunidades judaicas na Arábia, essa ideia estava tão impregnada ali que os próprios árabes se viam como um povo quase bíblico. Acreditavam que também eram descendentes de Abraão, o homem que falava com Deus. A diferença é que, enquanto os judeus descenderiam de um dos filhos do profeta, Isaac, os árabes viriam do primogênito de Abraão: Ismael, o filho que ele teve com a escrava da família. Fazia sentido, já que a Bíblia dizia que Ismael foi mesmo morar nas bandas da Arábia, ainda que não dê mais detalhes além de dizer que ele "se tornou um bom atirador de flechas e arranjou uma mulher egípcia". Só faltou combinar com os árabes que Javé era o único deus. Na cabeça deles, o deus de Abraão convivia com a deusa do amor, o deus da lua, a deusa do destino... E atendia pelo nome de "O deus": Allah. A verdade é que cabia de tudo na mente do árabe típico daqueles tempos - igual cabe na do brasileiro típico destes tempos, que sincretiza catolicismo com umbanda e espiritismo sem problema nenhum. Havia até quem fosse à Caaba prestar culto a Jesus Cristo, uma divindade que vinha ganhando terreno naquele panteão. Em suma, Meca era um tabule de crenças. E foi em meio a esse carnaval religioso que nasceria Maomé, o filho do seu Abdallah e da dona Amina. O MENINO Abdallah, rapaz boa pinta, estava indo para a casa da noiva. Não era um dia qualquer: logo mais, aconteceria a noite de núpcias dele com a jovem Amina. Mas no meio do caminho apareceu uma mulher. Uma estranha interceptou o futuro pai de Maomé na rua e o convidou para conhecer sua cama. Uau. Mas ele recusou educadamente e seguiu seu caminho rumo a outra cama, aquela onde consumaria seu casamento. Mas homem você sabe como é. Abdallah cruzou com a estranha no dia seguinte e perguntou se o convite ainda estava de pé. Não estava. Porque mulher, bom, você sabe como é: "Ontem você tinha um brilho nos olhos", ela disse. "E hoje não tem mais. Não quero." O tal brilho não era uma figura de linguagem. Segundo a tradição islâmica de onde vem essa história, os olhos de Abdullah realmente emitiam luz. E por um motivo claro: naquela noite, ele e Amina conceberiam o embrião de Maomé. O brilho era uma manifestação da semente do Profeta, que estava prestes a sair do pai e ser plantada no útero de sua mãe. Claro que esse episódio da literatura islâmica é provavelmente tão factual quanto a história dos Reis Magos na literatura cristã. É só uma lenda composta para dar um caráter sobrenatural ao nascimento de Maomé, do mesmo jeito que a historinha da Estrela de Belém faz do parto de Jesus um acontecimento transcendente. Com ou sem luz nos olhos, o fato é que Abdallah e Amina foram mesmo os pais de Maomé. Mas não por muito tempo. O pai nem viu o filho nascer. Morreu enquanto Amina ainda estava grávida. O casal já vivia apertado. Os bens de Addallah somavam cinco camelos e algumas ovelhas - o que fazia dele um membro da "classe média baixa", caso existisse um IBGE em Meca. Agora, com ele morto, as perspectivas para Amina eram trágicas. Mas ela segurou a barra. Teve o filho sem problemas e propiciou uma infância saudável ao menino, com direito até a um "intercâmbio" com uma família de beduínos para aprender cedo as agruras do deserto - coisa que toda criança árabe tinha de fazer na época para "crescer forte". Mas Amina não teve tanto tempo para curtir o filho: morreu antes de ele completar 7 anos. Os dentes de leite do garoto mal tinham caído e ele já era órfão de pai e de mãe. Então foi morar com o avô. E o avô morreu também. Agora Maomé tinha 8 anos e um destino: virar escravo. Esse era o fado da maior parte dos órfãos da época. Sem uma família para ajudar, a única saída era trabalhar em troca de (pouca) comida pelo resto da vida. Mas Maomé escapou dessa sina graças a um tio, Abu Talib, que era irmão do falecido Abdullah. O homem teve pena do sobrinho e decidiu adotá-lo. E o garoto finalmente ganhava uma família completa. Mais do que isso, na verdade. Abu Talib era um xeique, um chefe de clã. Só para situar: estamos na Arábia pré-islâmica, uma terra sem rei, onde o que vale é a lei tribal. O xeique é o cacique, mas não manda sozinho. Para cuidar dos cultos religiosos, você tem o kahin, sujeito que cuida dos cultos e baixa o santo, servindo de porta voz para os deuses da tribo - deuses que gostavam de falar em rimas, já que recitar poesia nas celebrações era a especialidade dos kahins. No Poder Judiciário, você tem o hakam, um juiz de pequenas causas. O trabalho do hakam, aliás, não era dos mais complicados, porque a ética que reinava ali era a do olho por olho. A lei da retribuição. Quebrou o nariz de alguém? Seus dias de simetria facial acabaram. Matou? Morreu. Mas esse sistema tribal estava entrando em crise. Àquela altura, a vida nômade, com tribos de pastores vagando em busca de pasto e só se cruzando de vez em quando, estava com os dias contados. O comércio já era forte o bastante para sustentar centros urbanos. E o normal agora era várias tribos ocuparem a mesma cidade. Só tinha um problema: as leis de cada tribo só valiam dentro de cada tribo. Se você matasse alguém de fora, problema do morto. Era como se um morador de Ipanema tivesse carta branca para quebrar narizes no Leblon. Não tinha como dar certo. Tanto não tinha que o único caminho viável foi a formação de "megatribos". Vários clãs foram se unindo, via casamentos arranjados, que providenciavam laços de sague. Depois de algumas décadas, vinha o resultado: uma megatribo, que acabava subjugando as menores: podiam quebrar narizes à vontade. Sem medo de punição. Em Meca, a megatribo era a dos Quraysh. Eles controlavam o comércio e as finanças da cidade. Os peregrinos da Caaba, por exemplo, eram uma fonte de renda garantida para os mecanos: propiciavam feiras e mercados vibrantes em volta do santuário. Mas, se você quisesse fazer parte da festa, abrindo uma barraquinha numa dessas feiras e mercados, não tinha jeito: teria que pagar impostos gordos para os líderes dos Quraysh. Isso concentrava a renda. Então, se você precisasse de um cascalho para abrir sua barraquinha, teria que pedir emprestado para os Quraysh mesmo. E eles cobravam juros extorsivos. Não porque fossem perversos, ou burros (juro alto demais = inadimplência = mau negócio para o credor). Eles cobravam juro de agiota porque, quanto mais calotes rolassem, melhor. Explico. É que a garantia mais comum da época para casos de calote era particularmente interessante para o credor: pessoas. Você pedia um empréstimo e deixava um filho como garantia, ou você mesmo. Se você não pagasse, o credor ganhava um escravo. Num tempo sem máquinas, em que o trabalho braçal valia bem mais do que hoje, ganhar escravos valia mais a pena do que receber os empréstimos de volta. E, se a garantia fosse uma esposa ou uma filha, melhor ainda: ela acabaria engrossando o harém do credor. Foi nesse cenário que Maomé cresceu. Mas não só nesse. É que o tio Abu Talib, além de Xeique e bem relacionado com os Quraysh, era um exportador, dono de caravanas de camelos que transportavam alimentos, especiarias e objetos preciosos deserto adentro. Ainda criança, Maomé começou a participar dessas viagens. E foi ótimo: o menino conheceu comunidades cristãs e judaicas bem mais a fundo do que se tivesse passado a vida em Meca. O fato de ele ter se inteirado bem sobre as duas religiões monoteístas ajudou lá na frente, quando ele criaria a terceira. Mas isso talvez nunca tivesse acontecido se Maomé não cruzasse o caminho de uma certa mulher, 15 anos mais velha que ele. A mulher que dominaria seu coração. E salvaria sua mente. O HOMEM Maomé estava com 25 anos e sem grandes expectativas. Ainda não tinha um negócio próprio. Dependia da boa vontade do tio para ter casa e emprego. Pelo menos ele já tinha feito uma bela reputação na arte que Henry Ford um dia chamaria de "comprar como se fosse lixo, vender como se fosse ouro". Era um baita negociante. E logo a fama do rapaz lhe renderia frutos. Nessa época, ele teve a sorte de ser contratado por alguém bem mais rico que seu tio. Alguém poderoso, respeitado e que, contra todas as normas sociais da época, cometia o disparate de não ser homem: Khadija. Num tempo em que mulher era propriedade, e nem podia herdar bens se o marido morresse, Khadija era uma mulher emancipada. Uma self-made woman de 40 anos, dona de caravanas extremamente lucrativas, e que, mesmo não sendo mais nenhuma menininha, estava entre as mulheres mais cobiçadas da cidade. Bom, Khadija agora precisava de alguém para chefiar uma caravana para a Síria, mil quilômetros ao norte de Meca. Ela tinha ouvido falar muito bem de Maomé, então convidou o rapaz. Foi uma aposta vencedora: Maomé voltou da Síria com o dobro dos lucros que ela esperava. Aí foi paixão à segunda vista: ela ficou tão encantada que pediu o rapaz em casamento. Consta que ele não pensou duas vezes. Agora Maomé estava por cima da carne-seca. Ao assumir o controle das caravanas de Khadija, finalmente conseguiu ter seu próprio (e grande) negócio. Virou um comerciante reverenciado até pela elite. Nessa época, seu melhor amigo passou a ser o próspero Abu Bakr, um Quraysh também dono de caravanas. E Maomé ganhou a honra de recolocar a Pedra Negra na Caaba, depois de uma reforma que os líderes da cidade tinham feito no santuário. Mas ele não se sentia confortável com a situação. Se por um lado ele lucrava com o sistema de Meca, já que tinha se tornado um comerciante próspero, por outro, ele simplesmente não engolia a ditadura Quraysh. Os textos islâmicos sobre a vida do Profeta, que começaram a ser escritos enquanto ele estava vivo, reiteram que Maomé não suportava ver tanta gente se tornando escrava por não conseguir pagar dívidas. Ele também achava absurda a ideia de a elite de Meca ser imune à lei da retribuição. Mas não protestava. E ainda tinha um comportamento contraditório; apesar de fazer doações frequentes aos mais pobres e ser contra o escravagismo, tinha seu próprio escravo, Zayd. Além das doações, outra coisa que ele fazia para aplacar a consciência era sair para meditar sozinho nas montanhas em volta da cidade. E foi num desses retiros, quando já tinha 40 anos, que Maomé teve a maior de todas as experiências, segundo a liturgia islâmica. Ele sentou numa caverna para meditar, quando ouviu uma voz, que lhe surgiu na cabeça. Uma voz autoritária, que dizia; - Recita! - Recitar o quê?, perguntou. - Recita!! Então Maomé recitou, mesmo sem saber o que iria recitar. Entrou numa espécie de transe e sentiu as palavras fluírem: "Recita, em nome do seu Senhor que criou/ Criou a humanidade a partir de um coágulo de sangue/ Recita, que seu Senhor é generoso/ Aquele que ensinou pela escrita/ Ensinou à humanidade o que ela não sabia". Não era um texto duro e seco, como está aqui. Em árabe, são versos gostosos de ouvir, feitos para cantar, já que têm uma métrica sofisticada e rimam. Os dois primeiros, por exemplo, fecham com palavras terminadas em "laq" (pronuncia-se "láco"). Os três últimos, com palavras que acabam em "am". Poesia, em suma. Ao estilo dos kahins. Essa foi a primeira das várias recitações que Maomé faria nos 23 anos seguintes. E que dariam origem ao Alcorão (literalmente, "A Recitação"). Mas, segundo a tradição islâmica, não foi fácil para ele. Maomé ficou atordoado com a experiência de ver os versos saírem pela sua boca sem que ele soubesse o que estava acontecendo. Ele suava, tremia. E saiu da caverna direto para casa. Só relaxou depois de ser ninado nos braços da mulher. "Khadija...", ele suspirou, mais calmo. "Acho que fiquei louco." Hoje, 1,6 bilhão de pessoas discorda dessa afirmação. Mas naquele dia, bastava Khadija. Ela confortou o marido. Depois, para que Maomé entendesse melhor o que tinha acontecido com ele na caverna, decidiu levá-lo a um especialista, digamos assim. Era Waraqa, um primo cristão de Khadija, versado nas escrituras judaicas e nos Evangelhos. E o diagnóstico foi imediato: aquelas eram palavras de Deus, Waraqa disse. O Criador estava se manifestando pela boca de Maomé. Ele era seu Mensageiro. Seu Profeta. E as mensagens tinham um intuito: deixar claro para o povo árabe que só existia um Deus. O Deus: Allah. Todas as outras divindades seriam ilusórias. Dali em diante, Maomé passaria a pregar o monoteísmo vorazmente. Ia até a Caaba e discursava para os politeístas. Além de vociferar que os deuses deles não existiam, deixava claro que ele próprio era uma parte da história entre Deus e os homens. Allah, ele dizia, contou com vários profetas: Adão, Noé, Abraão, Moisés, Davi, Jesus. E agora tinha mais um, ali, diante deles: Maomé. Na prática, a religião que Maomé criava naquele momento era um reflexo do próprio caldo cultural de Meca: tinha um pouco de cristianismo, muito judaísmo e um belo tempero árabe, com a poesia que remetia à cultura ancestral dos kahin. Só que Maomé tinha muito mais do que poesia para entregar. Foi aí que começaram os seus problemas. E sua ascensão. O PROFETA O Maomé resignado, que tentava aplacar a consciência fazendo caridade e isolando-se nas montanhas, estava morto. Agora nascia outro homem: o Profeta vivo, que peitava os Quraysh sem medo, descendo a lenha na cobrança de juros e, heresia máxima, pedindo a libertação dos escravos. Começou libertando o seu, diga-se. Mesmo com esse discurso, Maomé angariou seguidores entre os homens ricos de Meca. Provavelmente pela beleza das recitações, muitos realmente o viam como um novo Abraão, um novo Moisés. A começar por seu amigo Abu Bakr, o comerciante Quraish. Seu primeiro ato como seguidor de Maomé, inclusive, foi gastar uma fortuna comprando escravos de seus colegas comerciantes para libertá-los. Some tudo isso ao fato de que a própria mensagem monoteísta de Maomé também tinha um potencial destrutivo: se aquele homem continuasse convencendo gente na Caaba de que os deuses ali dentro eram de mentira, os peregrinos que se convencessem poderiam não voltar mais. Péssimo negócio para os Quraysh, que controlavam o comércio em torno do santuário. Pois é. Tinha chegado a hora de tomar uma providência contra o recitador. Mas não seria fácil, porque o número de seguidores dele só crescia. No começo, eram só Abu Bakr, Zayd, seu escravo alforriado, Khadija, claro, e o menino Ali, de 13 anos - um primo de Maomé. Mas agora era diferente. Ele somava centenas de fies. Além disso, seu tio Abu Talib era próximo demais dos Quraysh. Isso ajudava a manter as espadas deles longe do pescoço de Maomé. Mas não por muito tempo. Quando Maomé tinha 50 anos, no ano de 620, Abu Talib morreu, deixando o caminho mais livre para os Quraysh. E pior ainda: Khadija também faleceu, aos 65. Sem suas duas maiores referências na vida, e ciente de que o pior se avizinhava, Maomé começou a tecer um plano para deixar Meca, mas sem largar seus seguidores. Líderes de outra cidade, Medina [*A cidade ainda se chamava Yathrib nessa época. Foi rebatizada como Medina no início do século 7 pelo próprio Maomé], tinham convidado Maomé para servir como haran, julgando uma disputa interna entre os clãs locais. O Profeta, então, orientou seus seguidores a se mudar para Medina, 300 quilômetros ao norte, sem alarde, para não chamar a atenção. Mas logo que os Quraysh perceberam o movimento decidiram agir. O temor agora era que Maomé estivesse formando um exército. Foi aí que, em setembro de 622, decidiram matá-lo, lançando mão daqueles soldados "fortes e bem-nascidos". Mas os cães de aluguel dos Quraysh tiveram uma surpresa. Quando arrombaram a casa do Profeta, quem estava na cama era seu primo Ali. Maomé tinha acabado de fugir para Medina, junto com Abu Bakr. Ali, poupado, logo mais se juntaria aos dois. Esse dia da fuga se tornou tão importante para o islamismo que o ano de 622 ficaria marcado para sempre. Tornaria-se o ano 1 da nova religião. O ano 1 d.H. (depois da Héjira, "Fuga", em árabe). E isso não aconteceria simplesmente porque o Profeta escapou da morte. Mas porque foi em Medina que Maomé fez sua maior obra: criou sua própria civilização. Maomé agora era xeique. Longe de Meca, seus seguidores formavam uma tribo de fato: a Ummah ("comunidade"). Uma tribo que não era unida por laços de sangue, mas por uma ideologia. Ideologia que Maomé logo tiraria do mundo das ideias. Uma de suas primeiras medidas no campo das coisas práticas foi baixar a Selic. Ou quase isso. O Profeta achava que os juros extorsivos estavam no cerne dos problemas de Meca, certo? Então ele criou um BNDES em Medina: os membros da Ummah concediam empréstimo a juro zero para outros "afiliados". Outro problema que ele via em Meca era o monopólio dos Quraysh no comércio. Medina também tinha uma tribo que dominava o comércio, a Banu Qaynuca, de origem judaica. Ninguém podia vender nada em Medina sem pagar uma taxa a eles. Maomé acabou com isso. Não na pancada, mas criando uma feira concorrente, que não cobrava taxa nenhuma. Nisso, ele quebrou o monopólio e forçou uma baixada nos preços. Capitalismo de raiz. De raiz mesmo; a Ummah abastecia seus mercados emboscando caravanas nos arredores de Meca. Os saques também alimentavam outra novidade; um Bolsa Família. Todo membro da Ummah deveria pagar um imposto de acordo com suas posses, o zakat. E o dinheiro ia para seguidores mais pobres, que nem tinham como pagar imposto nenhum. Zakat significa "purificação". Ou seja, o imposto tinha um sentido religioso: os mais ricos "purificavam-se" ao doar sistematicamente uma porcentagem dos seus ganhos. Mas vale lembrar: a religião era tão intrincada com todo o resto da vida social que nem havia uma palavra para "religião". E ainda houve as reformas jurídicas. A lei principal continuava sendo o olho por olho, mas Maomé introduziu uma mudança fundamental ali. "A retribuição por uma injúria é uma injúria igual", diz o Alcorão, refletindo as leis tribais da Arábia. Mas tinha um complemento interessante ali: "Aqueles que esquecerem a injúria e buscarem uma reconciliação serão recompensados por Deus" (42:40). Além disso, a lei deixava claro que, dentro da igualdade da Ummah, não existiam fiéis "mais iguais", como acontecia com a elite de Meca. Um bandido poderoso, portanto, deveria ter o mesmo tratamento de um ladrão pé-de-chinelo, pelo menos no papel. Outra mudança importante foi no campo dos direitos das mulheres. Maomé tinha se tornado polígamo em Medina. Como qualquer xeique da época, tinha várias esposas e concubinas. Mas era natural que, como viúvo de uma mulher poderosa, ele também entendesse que mulheres não eram camelos. Então ele concedeu um direito importantíssimo às mulheres da Ummah: elas poderiam herdar propriedades, pela primeira vez na história das Arábias. Ele também proibiu que maridos se apropriassem dos dotes de casamento, pagos pelo pai da noiva no ato do casório. O dinheiro deveria ser mantido como uma poupança exclusiva da mulher, funcionando como um seguro em caso de divórcio. Em suma: se Maomé ressuscitasse hoje, deveria ser chamado para dar palestras de gestão pública. Seu pacote de reformas deu tão certo que vários habitantes de Medina entraram para a Ummah. Até porque era fácil: bastava aceitar que só havia um deus e que Maomé era seu profeta, estar disposto a pagar o zakat e pronto: você se tornava membro da tribo do Profeta. Tribo que, conforme foi ganhando mais membros, começou a ser conhecida por outro nome: Islã ("subordinar-se a Deus"). E seus membros passariam a ser chamados de "muçulmanos" ("aqueles que se renderam a Deus"). Mas quem não tinha se rendido a nada eram os Quraysh, lá em Meca. Eles não tinham esquecido a ameaça que Maomé representava. Ainda queriam matá-lo de todo jeito. A primeira batalha entre os Quraysh e a Ummah aconteceu dois anos depois da Héjira, em 624. Foi num daqueles roubos de caravana. O pessoal de Meca soube, via espiões infiltrados em Medina, que os muçulmanos iriam saquear uma caravana específica, que vinha da Palestina. Então colocaram um exército de mil homens para protegê-la. Maomé chegou com 300. Deveria ser o seu fim. Não foi. Talvez por excesso de confiança dos Quraysh, talvez por muito mais excesso de confiança dos muçulmanos, o fato é que Maomé venceu. Dali para a frente, seguiram-se anos de batalhas. Entre uma luta e outra, Maomé continuava tendo seus transes e recitando o futuro Alcorão. Os versos mais belicosos do livro sagrado são justamente dessa época. O mais conhecido é a surata (capítulo) 9, versículo 5: "Matem os idólatras, onde quer que eles estejam; capturem, acossem, embosquem". O contexto real deste texto é o da guerra contra os Quraysh, que infiltravam espiões em Medina. "Idólatra" (ou "politeísta", ou "infiel", dependendo da tradução) não é qualquer um que não seja muçulmano. A palavra está ali para representar um inimigo específico, e de um conflito que aconteceu há quase 1.500 anos. E isso não significa que o Islã tenha mais apreço pela violência que outras religiões. Algumas partes do Antigo Testamento parecem ter sido escritas por Quentin Tarantino, dada a torrente de sangue. E o próprio Cristo, que aconselhava dar a outra face em caso de agressão, chegou a dizer: "Não pensem que vim trazer paz ao mundo. Não vim trazer paz, mas a espada" (Mateus, 10,34). E isso não significa que o cristianismo pregue a violência. No caso do Islã, vale o mesmo raciocínio. De qualquer forma, Maomé foi mais feliz que seus predecessores bíblicos quando empunhou sua espada: ele passou por cima dos adversários. Em 629, com os Quraysh cansados de guerra e o Islã mais forte do que nunca, o Profeta reuniu um exército de 10 mil homens e marchou para Meca. Acabou conquistando a cidade sagrada sem nem derramar sangue, já que o inimigo se rendeu na hora. Pronto. Com Meca sob seu controle, Maomé agora era o homem mais poderoso da Arábia. Um destino que parecia distante do menino que nasceu sem pai e perdeu a mãe tão cedo. Seu primeiro ato foi libertar todos os escravos de Meca. O segundo, despejar os deuses da Caaba, destruindo as imagens deles e consagrando o santuário a Allah - a Pedra Negra ficou, para a alegria de quem gosta de meteoritos. Maomé também poupou as estátuas de Jesus e da Virgem Maria, os únicos personagens do Alcorão representados por imagens dentro da Caaba. Mas Maomé não se aproveitou do poder. Não corou-se "rei de Meca" nem nada. Voltou para Medina, que tinha se tornado sua cidade de fato, e morreu em paz, aos 62 anos, deixando 12 viúvas, 3 filhos, 4 filhas e uma nova nação. EPÍLOGO Abu Bakr assumiu a liderança do Islã aos 58 anos, tornando-se o primeiro Califa ("sucessor", em árabe). O jovem Ali, que ainda tinha 30, era o favorito de uma parte dos seguidores. E ainda é. A sucessão criou uma dissidência pró-Ali hoje conhecida como "xiita", que forma uma minoria de 10% dentro do Islã. Os descendentes dos que apoiaram Abu Bakr são a maioria "sunita", que segue a suna, a "tradição", iniciada naquela época. Os sucessores do Profeta não pararam em Meca. Continuaram a expansão da Ummah e, 50 anos depois da morte de Maomé, seus domínios estendiam-se até o Irã. Mais 50 anos e o norte de África e um pedaço da Índia já era deles. Outros 50, e eles já dominavam a Espanha - uma terra tão distante que, quando era meio-dia nessa ponta ocidental do império, o Sol já estava se pondo nos domínios mais orientais. Mas esse não foi só um dos maiores impérios do mundo. Foi um dos mais criativos também: enquanto a Europa se afundava na escuridão da Idade Média, o Islã construiu sua própria "Europa" alguns graus de latitude mais abaixo. Um continente unificado por uma nova religião, e que deixou como maior legado a ciência: boa parte da matemática que conhecemos hoje veio de gênios que nasceram sob a religião de Maomé. Uma religião humanitária, que, ao propor uma sociedade menos desigual e mais aberta ao diálogo, encarnou muito do que a humanidade tem de melhor. Que meia dúzia de psicopatas não acabem com esse legado. VELHO TESTAMENTO A mitologia do islamismo tem raízes profundas no judaísmo, que surgiu mais de mil anos antes do nascimento de Maomé e tinha presença forte na Península Arábica. O rol de figuras sagradas das duas religiões é o mesmo: Noé (Nuh, em árabe), Moisés (Musa), Abraão (Ibrahim)... "Deus escolheu Adão, Noé e a família de Abraão [...] acima de todas as Suas criaturas." "A Moisés, nós demos o Livro, e depois dele enviamos uma sucessão de Mensageiros." - ALCORÃO - SURATAS 3, VERSÍCULO 33, E 2, VERSÍCULO 87 EVANGELHOS Jesus, no Alcorão, é retratado como um dos profetas que precederam Maomé. Mas trata-se de um homem comum, sem caráter divino. Maria, sua mãe, aparece mais no livro sagrado do islamismo do que nos Evangelhos. É vista como um exemplo máximo de virtude. "Os anjos disseram: Maria, Deus te escolheu e te purificou. Ele escolheu você entre todas as mulheres do seu tempo." - ALCORÃO - SURATA 3, VERSÍCULO 42 O ROSTO PROIBIDO Não existe lei alguma no Alcorão proibindo a representação do rosto de Maomé. O problema é que, meros 200 anos após a morte do Profeta, já havia 700 mil leis islâmicas em voga pelo mundo. Algumas delas realmente proibiam a representação, para que Maomé não fosse idolatrado como um deus (já que só existiria um Deus). Seja no Islã, seja na vida laica, tem lei que pega e lei que não pega. Essa pegou. "Chame a humanidade para a Peregrinação [à Meca]. Eles virão a você a pé, montados em camelos, de todo lugar, por longínquo que seja. Que eles se purifiquem, cumpram seus votos e circungirem a Antiga Casa [a Caaba]." - ALCORÃO - SURATA 22, VERSÍCULO 42 ESPADA E CIÊNCIA Os judeus viveram enclausurados entre superpotências. O cristianismo virou a religião de Roma com o Império em decadência. O Islã não: surgiu como nação e como religião ao mesmo tempo e foi bem-sucedido ao expandir suas fronteiras (como todas as nações tentavam fazer). Suas fronteiras estendiam-se da Espanha à Índia, e serviram de lar para a ciência de ponta, enquanto a Europa se afundava nas trevas das Idade Média. "Ó, Profeta, combata aqueles que negam a verdade e os hipócritas e seja implacável com eles. O inferno será sua morada." - ALCORÃO - SURATA 9, VERSÍCULO 42 PARA SABER MAIS No God But God - The Origins, Evolution, and Future of Islam. Reza Aslam, Random House, 2011 The Oxford History of Islam. John L. Esposito, Oxford University Press, 1999 2#2 CULTURA – ARTE CONDENADA O JORNAL FRANCÊS GHARLIE HEBDO FOI ATACADO POR SATIRIZAR MAOMÉ. DOZE MORRERAM. NÃO FOI A PRIMEIRA VEZ QUE O MERO EXERCÍCIO DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO TERMINOU EM TRAGÉDIA. LEMBRAMOS OUTROS CASOS EM OUE O EXTREMISMO TENTOU IMPOR O SILÊNCIO. SEM SUCESSO. AFINAL, UMA OBRA DE ARTE JAMAIS É SILENCIADA. TEXTO Camila Almeida 1- O CARMA DO PROFETA KURT WESTERGAARD foi o primeiro cartunista a sofrer repressão por retratar Maomé. O dinamarquês, em 2005, foi convidado pelo jornal Jyllands-Posten a desenhar o profeta como ele o imaginava. Colocou uma bomba sob o turbante. Embaixadas dinamarquesas foram incendiadas. Ele precisou se exilar com a esposa e se mudaram nove vezes. Quando voltaram, a casa foi invadida por um muçulmano com um machado. O artista se escondeu no banheiro e escapou, mas vive alerta e cercado por seguranças. 2- DE ALIADO A PERSEGUIDO SONG BYEOK é um pseudônimo. O artista norte-coreano, que hoje precisa viver na Coreia do Sul, convive com a perseguição por suas imagens críticas ao regime comunista. Quase impossível acreditar que, antes de satirizar Kim Jong-il, o artista o pintava como o "Estimado Líder" nas propagandas do governo. Quando a fome se alastrou pelo país nos anos 1990, Byeok tentou fugir em busca de comida, mas acabou capturado. Como punição, agravada pela traição, terminou num campo de trabalho forçado. Teve dentes e ossos quebrados e perdeu um dedo. Em 2001, conseguiu fugir e, desde então, ataca o regime em suas obras. No mesmo dia em que finalizou esta imagem de Kim Jong-il vestido de Marilyn, em 2011, o déspota morreu. 3- NOTAS PERIGOSAS ANNA POLITKOVSKAYA era uma repórter de um jornal russo conhecido por coberturas investigativas. As reportagens dela sobre a Segunda Guerra na Chechênia alertavam para os abusos cometidos pelas autoridades russas. Em 2001, foi detida pelo exército acusada de ter acesso a informações secretas. Se refugiou em Viena depois de ser ameaçada várias vezes por e-mail. Em 2004, publicou A Rússia de Putin, um relato pessoal, que revela a face tirana do presidente. No mesmo ano, foi envenenada com chá num avião, mas sobreviveu. Dois anos depois, foi assassinada no prédio onde morava, em 7 de outubro, dia do aniversário de Putin. 4- CONTRA A SUBMISSÃO O cineasta holandês THEO VAN GOGH produziu, em 2004, um curta-metragem que questionava a violência sofrida pelas mulheres muçulmanas, já enraizada na cultura e na lei. Submission, como o filme foi intitulado, é também uma das traduções para a palavra "Islã", em árabe. No mesmo ano, o cineasta foi assassinado por um muçulmano enquanto ia, de bicicleta, para o trabalho. Theo Van Gogh foi baleado oito vezes e quase foi degolado. Duas facas foram deixadas, enfiadas no corpo dele. Nas investigações, a polícia descobriu que o assassino tinha ligações terroristas. 5- CIÊNCIA VS. IGREJA GIORDANO BRUNO tinha vínculos profundos com a Igreja. Além de filósofo, era também teólogo e frade da ordem dominicana. Mas passou seis anos preso e, em 1600, foi queimado vivo pela Inquisição. Sua maior heresia foi a publicação do livro Acerca do Infinito, do Universo e dos Mundos, de 1584, que tem como base os estudos do astrônomo e matemático Nicolau Copérnico. Bruno afirmava que a Terra, afinal, não era o centro de tudo e acreditava num Universo infinito, com mundos cheios de seres inteligentes. Para a Igreja, era uma ameaça: haveria mais de um Deus? O autor é considerado precursor da filosofia moderna. 6- ORGIA DA CONTESTAÇÃO Não à toa, o aristocrata francês e escritor MARQUÊS DE SADE deu origem à palavra sadismo. Sua libertinagem lhe rendeu inúmeras prisões, perseguições e a internação num hospício, onde morreu. Retratou banquete de fezes, tortura, incesto e orgias sem fim em 120 Dias em Sodoma, escrito enquanto ele estava preso na Bastilha, em 1785. Foi produzido em letras mínimas, num rolo de pergaminho, por medo de que o confiscassem. 7- UM SOLDADO ABALADO NO REIGH OTTO DIX era um jovem alemão quando foi convocado para a Primeira Guerra. Mas foi ferido em batalha e precisou se afastar das trincheiras. Começou a pintar, com traços expressionistas, as tragédias que presenciou. Chegou a se tornar professor de arte, mas foi obrigado a se demitir quando o nazismo assumiu a Alemanha. Suas pinturas foram queimadas e ele foi forçado a trabalhar como artista do Reich. Na imagem, o quadro A Guerra de Trincheiras, da série World War I. 8- REPRESSÃO COMUNISTA O renomado artista AI WEIWEI, conhecido por criticar o autoritarismo na China, foi confinado em casa em 2010, quando o regime engrossou. Passou três meses sob vigilância ininterrupta de guardas. Em 2011, desapareceu por mais três meses, seu estúdio foi invadido e várias obras foram confiscadas. Após libertado, recebeu uma multa de US$ 2,4 milhões por evasão tributária. Mais de 30 mil pessoas fizeram doações para ajudá-lo (dinheiro que o artista devolveu). Até hoje, vive supervisionado pelo estado. Esta foto faz parte do ensaio Fuck Off e foi usada como póster do filme sobre sua vida, Never Sorry, traduzido em português como Sem Perdão. 2#3 COMIDA – FEIJOADA DESCRONSTRUÍDA A saga dos ingredientes que surgiram separados por eras e continentes e se encontraram em restaurantes do Rio e do Recife no século 19, onde criaram o cozido mais famoso do Brasil. POR Felipe van Deursen, Inara Negrão, Arthuzzi e Luiz Felipe Silva A CONSTRUÇÃO DO PRATO Os ingredientes vêm de vários lugares e chegaram ao Brasil de feitos diversos 15.000 A.C. FEIJÃO-PRETO Origem: América do Sul Feijão preto era comum entre os índios, que o chamavam de comaná. FARINHA Origem: América do Sul Tradicionalmente indígena, foi incorporada pelos imigrantes PIMENTA-MALAGUETA Origem: América Central e do Sul Já existia na Amazônia, nos Andes e no Caribe. Colombo a levou à europa em 1494. 10.000 A.C. ARROZ Origem: Ásia Quem trouxe: Imigrantes europeus (séc. 18) 4000 A.C. PAIO E LINGUIÇA Origem: Grécia Quem trouxe: Colonizadores portugueses (séc. 16) A linguiça portuguesa surgiu na região de Trás-os-Montes, onde nasceu o cozido transmontano, espécie de pai da feijoada. 3000 A.C. CARNE SECA Origem: Egito Quem trouxe: Colonizadores portugueses (séc. 16) Segundo alguns estudiosos, os neandertais já consumiam carne seca. CEBOLA E ALHO Origem: Ásia Quem trouxe: Colonizadores portugueses (séc. 16) Persas e egípcios usavam cebola e alho em receitas. 2000 A.C. LARANJA Origem: Ásia Quem trouxe: Colonizadores portugueses (séc. 16) Base da alimentação dos escravos, que a incorporaram à feijoada 1500 A.C. BACON Origem: China Quem trouxe: Colonizadores portugueses (séc. 16) Defumar e salgar carne suína ficou popular na Europa medieval. SÉC 3 A.C. COUVE Origem: Europa Quem trouxe: Colonizadores portugueses (séc. 16) A couve manteiga, espécie mais comum, ficou popular na Europa na Idade Média. SÉC. 2 PÉ, RABO ETC. Origem: Europa Quem trouxe: Imigrantes europeus (séc. 19) COSTELA Origem: Europa Quem trouxe: Imigrantes europeus (séc. 19) Comemos porco há milênios. Mas esses cortes só surgiram no Império Romano. Do uso dessas carnes nasceu o cassoulet, o primeiro cozido moderno. SÉC. 5 LOURO Origem: França Quem trouxe: Colonizadores portugueses (séc. 16) Em Portugal, era usado em receitas com longo tempo de cozimento. Virou tempero de feijão e, consequentemente, da feijoada. SÉC. 18 TORRESMO Origem: Europa Quem trouxe: Imigrantes europeus (séc. 19) Comum em Portugal, onde era frito a seco. Acredita-se que a fritura banhada em óleo seja uma adaptação dos escravos do Brasil. PARENTES DA FEIJOADA 1- Locro ARGENTINA 2- Maniçoba BRASIL 3- Cachupa CABO VERDE 4- Cozido transmontano PORTUGAL 5- Cassoulet FRANÇA 6- Fabada asturiana ESPANHA 7 Cassouela ITÁLIA 8- Fassulha ORIENTE MÉDIO 9- Feijoada à Ibó MOÇAMBIQUE 2#4 ECONOMIA – ALUGO: CASA, FURADEIRA, CARRO, TEMPO, WI-FI, CONHECIMENTO, PRATO, MÃO DE OBRA, CAMA, MESA, BANHEIRA, FORÇA BRUTA, SERRA TICO-TICO, PACIÊNCIA, MARTELO, FOGÃO, IDEIAS, JOIAS, TODA A VIZINHANÇA. Estamos entrando em uma nova era da economia, em que tudo pode ser compartilhado. Com menos intermediários, menos desperdício e mais oportunidades. Mas também menos direitos, menos privacidade e mais desigualdade. Seja bem-vindo. A casa é sua (e de todo mundo). REPORTAGEM Pedro Burgos EDIÇÃO Karin Hueck DEPOIS DE SEGUIDAS QUEDAS, a Petrobras chegou ao início do ano de 2015 com o mesmo valor de mercado que tinha em 2004; cerca de 40 bilhões de dólares. Por essa medida, a gigante brasileira virou uma empresa menor que a novata Uber, que apesar de ainda não estar na bolsa, é avaliada em 41 bilhões de dólares. Se você nunca ouviu falar, não se preocupe. A Uber foi criada em 2009 nos EUA e é, essencialmente, um aplicativo para celular que compete com os táxis e está dobrando de tamanho a cada 6 meses. Ela já está presente em mais de 53 países, inclusive no Brasil. Ambas, de alguma forma, estão ligadas à indústria automotiva. A Petrobras fornece o combustível para os carros rodarem. A Uber permite que qualquer pessoa se cadastre como "taxista". Nela, de um lado, qualquer um pode usar seus próprios carros para ganhar sustento como motorista e, de outro, clientes garantem um serviço superior (em conforto e muitas vezes preço) em relação ao táxi. Hoje a Uber é o maior exemplo de empresa que possibilita o que os estudiosos chamam de "economia compartilhada" ou "economia sob demanda". Os termos são novos e ainda estão aguardando definições exatas, mas é só dar uma olhada em centenas de empresas parecidas para entender como elas estão mudando profundamente a nossa economia. Ao lado da Uber, o AirBnB é a mais famosa face do movimento. Também baseado em um aplicativo (ou site), ele conecta pessoas que querem passar alguns dias em alguma cidade do mundo com donos de quartos, casas, apartamentos e até barcos dispostos a alugá-los - e cobra uma pequena comissão. Em poucos anos, ele já vale mais que qualquer rede de hotéis e tem 1 milhão de casas catalogadas na sua plataforma. Dezenas de empresas parecidas pipocaram ao redor do mundo. Pessoas se ajudando, freando o consumismo desenfreado parece uma utopia hippie. Mas na verdade é só a confirmação da ideia bem capitalista de maximizar a eficiência do que temos à nossa disposição: dinheiro parado no banco, carro na garagem ou tempo no final do dia. É um pouco a volta da ideia de uma biblioteca, onde os livros passam pela mão de mais gente e têm uma vida útil muito maior. Com a diferença de que não é o governo ou uma escola gerenciando esses bens, mas os próprios indivíduos através de aplicativos no celular ou redes sociais - daí muitos chamarem isso de "economia peer-to-peer" (pessoa para pessoa). Todas essas empresas só existem graças à tecnologia. Mas isso não seria problemático para as velhas empresas? À primeira vista, sim. Uma enorme parte delas fez a sua fortuna apostando na ideia de que as pessoas queriam possuir coisas. A economia compartilhada marca uma mudança de mentalidade: para uma quantidade crescente de gente, especialmente mais jovem, é melhor ter acesso do que posse. Por essa lógica, não queremos mais carros, exatamente, mas a utilidade do carro. Ter o aplicativo da Uber no celular é a garantia que você chegará rápido e confortavelmente a qualquer lugar. E, se fizer a conta de gasolina, estacionamento e estresse gastos atrás do volante, verá que é possivelmente mais barato. À primeira vista, a economia colaborativa reduz o consumo - o que poderia, em tese, machucar a economia. Mas não necessariamente. "Podemos ver esse fenômeno como uma busca para outro tipo de economia, uma em que os negócios se preocupam mais com o reúso, o reparo e o acesso a bens de alta qualidade, em vez da manufatura de bens baratos e descartáveis", diz Yassi Eskandari-Qajar, diretora do Centro de Leis para Economia Sustentável, da Califórnia. Não é difícil provar esse argumento: uma casa bem decorada no AirBnB é mais confortável do que um hotel fajuto. A mesma ideia vale para os serviços. Há uma infinidade de novas plataformas que ligam demandas específicas a prestadores de serviços rápidos. Quer alguém para buscar comida em um restaurante que não oferece delivery? Há o Postmates, nos EUA, que emprega 6 mil entregadores. Precisa de alguém para traduzir um documento de coreano para espanhol? No Mechanical Turk, da Amazon, alguém faz isso no mesmo dia cobrando centavos por frase. Precisa de alguém que pinte sua casa amanhã? O site brasileiro Getninjas mostrará uma lista, com avaliações de clientes anteriores. Alguém para gerenciar todas essas outras pessoas? Há o Alfred, que oferece (adivinhe) mordomos que podem até separar a sua roupa suja. Alguns especialistas defendem que esse tipo de contratação de serviços é diferente da economia compartilhada, que troca bens. Por isso, o movimento é chamado de "on-demand economy" (economia sob demanda). Da mesma forma que clientes podem usar diversos aplicativos da nova economia ao mesmo tempo, pessoas também podem oferecer diferentes serviços. Segundo informações da Freelance Union, espécie de "sindicato dos freelancers", um terço dos americanos já faz algum trabalho fora do "emprego", o que permite horários flexíveis, por exemplo, para pais que querem cuidar dos filhos em casa. Com a facilidade de conseguir vários freelancers com os aplicativos, não é difícil imaginar que essas pequenas demandas, somadas, virem o trabalho da pessoa. "Muitos freelancers veem essa forma de trabalho como a melhor maneira de tomar controle de sua vida", definiu Sara Horowitz, diretora executiva da Freelance Union, à revista Fast Company. Ou seja: a economia colaborativa reduz o consumismo exagerado, cria carreiras com mais liberdade e tira o poder de grandes corporações para devolvê-lo às pessoas - tudo isso enquanto oferece serviços e produtos melhores e mais baratos. "Os fundamentos econômicos dessa transição apontam para implicações positivas; taxas de crescimento econômico mais altas, um melhor padrão de vida, mais inovação e menos barreira de entrada para empreendedorismo", resume Arun Sundarajan, professor de economia digital da New York University, um dos muitos na academia simpáticos à ideia. Só há o que comemorar, certo? HMM, NÃO É BEM ASSIM Os americanos podem estar deslumbrados com as possibilidades dessa nova economia, mas para pessoas de países mais "atrasados" é relativamente fácil e barato para alguém um pouco mais rico achar pessoas para cuidar do cachorro, passar a roupa ou levar o carro para oficina. É só achar algum imigrante/ migrante/menos favorecido disposto a aceitar um salário baixo em troca de um serviço. Da mesma forma, a ideia de trocar roupas de criança ou pegar todo tipo de objeto emprestado com os vizinhos não é novidade para quem mora na periferia - o uso consciente dos recursos já é prática corriqueira. Não há nada de revolucionário nisso. Em um artigo para a revista online Quartz, o indiano Leo Mirani escreveu que tinha todas essas conveniências da nova economia em Bombaim, na Índia, bem antes do smartphone. "Não foi a tecnologia que acelerou a economia sob demanda. Mas uma enorme massa de pessoas pobres", conclui, dizendo que a "economia da Uber" só é possível graças à desigualdade. Não é surpresa que muitas das empresas dessa nova economia tenham surgido, ou ganhado tração, logo depois da crise de 2008. "As pessoas que estão dirigindo para estranhos entre meia-noite e oito da manhã, ou executando todos esses trabalhos de meio-período, fazem isso porque não têm uma alternativa melhor", diz Steven Strauss, professor de políticas públicas de Harvard. Para ele, basta ver que a maior parte de quem vai atrás dessas novas oportunidades - que ele chama de gig economy ("economia do bico") - são os americanos que não têm ensino superior, para quem a renda caiu até 20%, em termos reais, na última geração. Em um cenário econômico incerto, dirigir para a Uber parece uma boa oportunidade. Pelas contas da empresa, os motoristas chegam a ganhar 6 mil reais por mês, ou até 90 mil dólares por ano nos EUA, especialmente se trabalharem em horários com menos oferta, como de madrugada. Parece atraente, mas nenhum desses trabalhos configura o que convencionou-se chamar de emprego. Não há férias remuneradas, 13º, plano de saúde, previdência ou mesmo garantia de serviço. Por isso Guy Standing, economista da Universidade de Londres, chama essa crescente classe de freelancers de "precariado" - em oposição ao proletariado. Em um livro influente (Precariat, sem tradução para o português), ele diz que as lutas dos movimentos trabalhistas, as CUTs do mundo, ainda precisa alcançar a nova realidade. Se o conceito de "firma" perde sentido, também vai com ele o "plano de saúde da firma". Isso coloca mais pressão para que os sistemas públicos de saúde funcionem bem. Para a economia sob demanda ser bem sucedida, Standing argumenta, é preciso que os governos criem redes de seguridade social mais robustas. Se por um lado as empresas da nova economia exigem que os governos cuidem mais dos cidadãos, por outro elas querem que nenhuma lei atrapalhe a sua entrada nos mercados. Experimente, em uma cidade como São Paulo, conversar com um taxista sobre a Uber. Durante esta reportagem, conversei com três. Eles reclamam que os carros da Uber não são vistoriados pelos órgãos oficiais, que os motoristas não precisam passar por checagens de antecedentes criminais e que falta segurança ao passageiro. Para ser tão bom e barato, taxistas argumentam, eles não concorrem em igualdade com os negócios antigos. De fato, como qualquer pessoa pode se cadastrar no aplicativo, a Uber já registrou casos criminosos ao redor do mundo: em Londres, passageiros foram vítimas de homofobia durante uma carona e, em Chicago, uma mulher foi estuprada pelo motorista depois de pedir um carro alcoolizada e desmaiar no trajeto. A pressão dos grupos de taxistas fizeram a Uber se adequar a leis locais em diversos países da Europa e dos EUA - isso para não falar de onde foram banidos, como Espanha e Índia. A adequação deve acontecer no Brasil também. A mesma batalha se dá para o AirBnB, que sofreu ações em cidades como San Francisco e Nova York, e passaram a recolher um imposto semelhante ao dos hotéis. Apesar de ser uma oportunidade fácil para empregar quem está fora do mercado, a economia sob demanda pode afetar o salário também. Quando precisamos de alguém para fazer uma pequena reforma em casa, normalmente conversamos com outras pessoas para buscar indicações e não temos uma base muito grande para comparar - até por uma questão de tempo. Isso significa que nem todas as pessoas que fazem obras na cidade estão no mesmo "mercado". Essa imperfeição da concorrência faz com que seja possível que as pessoas cobrem preços diferentes, atendam em bairros específicos e tenham tabelas decididas por elas mesmas. No caso de serviços como o Handy (que oferece reparos para casa), a coisa muda de figura: há um preço único - normalmente baixo para ser atrativo -, e os prestadores de serviço precisam se adequar a essa realidade. Por último e não menos importante, há a questão da privacidade. Para que esses serviços funcionem, normalmente é preciso se cadastrar usando telefones reais e perfil no Facebook. Um táxi que você pega na rua não sabe nada sobre você, mas um executivo da Uber causou um escândalo ao mostrar a uma repórter uma lista de todas as corridas que ela havia feito com o serviço. Em uma época em que surgem novas demandas de proteção à privacidade, a quantidade de informações que esses serviços têm é assustadora. Pode ser que as questões de privacidade sejam resolvidas, assim como as regulações. A tecnologia tem um papel fundamental, mas ela, e os bilhões de dólares investidos nas empresas, não provoca a revolução sozinha. É necessária uma mudança comportamental da sociedade - querer uma vida fora da firma, um governo que dê mais garantias, confiar mais em estranhos - para que o novo mercado funcione. Resta saber se os vencedores nessa nova economia irão compartilhar os ganhos. ÚNICO DONO Procura um castelo inflável? Uma escada de 10 metros? Um caiaque? Aqui você vê quem tem essas coisas encostadas em casa. zilok.com DIRETO COM O PROPRIETÁRIO Precisa de um carro? Aqui você pode alugar um perto de você, de alguém que deixa o possante parado o dia todo. Entre e saia dirigindo! relayrides.com OPORTUNIDADE A economia compartilhada permite até que você empreste dinheiro de outras pessoas comuns - a juros mais baixos! Kisskissbank bank.com PERMUTA Aqui você pode oferecer uma hora de algo que você saiba fazer-como tocar guitarra - e trocar pelas habilidades de outra pessoa, como aulas de coreano. bliive.com SEMI-NOVO Seu bebê cresceu e você não tem onde por aqueles macacõezinhos? Este site aluga roupas de neném (e de adulto). thredup.com PRONTO PARA PASSEAR Você tem um dedo verde, mas mora em apartamento? Aqui você se conecta com pessoas com jardins em busca de alguém que possa cuidar deles. fandshare.net Na economia tradicional é assim: Todo mundo tem uma coisa de cada em sua casa – um carro, um quarto sobrando, uma caixa de ferramentas – muitas vezes encostadas e sem uso. A Palavra-chave aqui é a posse. Na economia compartilhada, o importante é a utilidade do objeto. Em vez de todo mundo ter tudo repetido em sua casa, bens e serviços são trocados, diminuindo a necessidade da posse. Isso só funciona graças aos dados em rede. Mas nem tudo é perfeito. A economia compartilhada floresce graças à desigualdade, achata os salários e compromete empregos tradicionais. Além disso, pode botar os usuários em risco e invadir sua privacidade. 2#4 TECNOLOGIA – BATERIA FRACA ELAS DURAM POUCO E VIVEM NOS DEIXANDO NA MÃO. ENTENDA POR QUE AS BATERIAS SÃO O PONTO FRACO DO MUNDO DIGITAL - E SAIBA O QUE FAZER PARA DAR UM GÁS AS SUAS. REPORTAGEM Bruno Romani EDIÇÃO Bruno Garattoni 7% é o aumento médio na capacidade das baterias a cada 18 meses. Nesse mesmo período, a potência dos chips de computador aumenta 100%. O BOEING 787 É O AVIÃO COMERCIAL mais sofisticado de todos os tempos. Sua criação levou sete anos, consumiu US$ 32 bilhões e exigiu o trabalho de 46 empresas, além da própria Boeing. O resultado é uma maravilha de engenharia, com 2,3 milhões de peças. Mas apenas uma foi suficiente para desmontar todo o projeto - e fazer com que o 787 ficasse proibido de voar, em qualquer lugar do mundo, durante três meses e meio. A culpa não era das turbinas ou dos computadores de bordo. Era de algo bem prosaico: a bateria, que começou a dar problemas (em quatro casos, pegou fogo). É que a Boeing tinha decidido usar baterias de lítio, como as presentes em nossos celulares, tablets e notebooks, para alimentar os sistemas elétricos do avião. O problema foi corrigido, e hoje o 787 voa tranquilamente. Mas o caso mostra bem o papel das baterias no mundo tecnológico. Elas são o ponto fraco. Vivem nos deixando na mão. Quantas vezes o seu celular pifou na rua - ou você ouviu dizer que os carros elétricos ainda não "pegaram" porque as baterias são muito fracas? Elas estão sempre aquém do ideal. Muito aquém, na verdade. A cada 18 meses, os chips de computador dobram de velocidade. Esse fenômeno foi descrito pela primeira vez em 1965 por Gordon Moore, então presidente da Intel, e ficou conhecido como Lei de Moore. Já as baterias... Nesse mesmo período, sua capacidade aumenta apenas 7%. Isso significa que elas levam 20 anos para alcançar a mesma evolução que os chips têm em um ano e meio. Mas por que é assim, afinal? Os chips melhoram rápido porque podem ser miniaturizados. Na CPU do seu computador, há bilhões de transistores - espremidos no espaço de um selo. Com as baterias, não é assim. Elas funcionam graças a reações entre elementos químicos - que não podem ser miniaturizados. O material de que a bateria é feita tem determinada capacidade de reter energia - e não há muito que possamos fazer para melhorar. "Isso é determinado pela natureza", resume Winfried Wilcke, diretor de pesquisas em nanotecnologia e energia da IBM. As baterias só dão saltos quando a ciência descobre novos materiais ou novos processos químicos. E isso acontece bem raramente. A bateria (termo emprestado da terminologia militar, como em "bateria de canhões") foi inventada pelo italiano Alessandro Volta, em 1800. Cinquenta e nove anos depois, o francês Raymond Gaston Plante inovou. Usou dois pedaços de chumbo, os polos, mergulhados numa mistura de ácido sulfúrico e água. Quando a bateria era ligada, elétrons escapavam do polo negativo, que se oxidava, e iam em direção ao polo positivo, que liberava oxigênio. Ou seja: formava-se uma corrente elétrica. Só que os materiais iam se desgastando, até que a bateria pifava. Plante teve a ideia de fazer o contrário, ou seja, dar um choque elétrico nela - e descobriu que ficava boa de novo. Nascia a primeira bateria recarregável. Elas começaram a ser utilizadas para alimentar luzes ferroviárias, faróis marítimos e em carros elétricos primitivos. As baterias de chumbo-ácido são resistentes, e até hoje essa tecnologia é usada em carros e barcos. Ela tem um grande defeito: as baterias são muito grandes e pesadas. Esse problema começou a ser resolvido em 1899, quando o inventor sueco Waldemar Jungner criou uma versão em que o polo negativo era de cádmio, e o positivo era de níquel. Nascia a bateria de níquel-cádmio (NiCd). Ela ganhou popularidade nos anos 1940, com o surgimento do walkie-talkie: um rádio portátil que os soldados americanos usavam para se comunicar no front. Depois da Segunda Guerra, a bonança vivida pelos EUA turbinou o mercado de eletrônicos. Surgiu uma infinidade de relógios, telefones, brinquedos e gadgets, muitos deles alimentados por baterias de NiCd. Mas elas tinham dois grandes problemas. O primeiro é que o cádmio é altamente tóxico. As baterias de NiCd podem contaminar rios e solo, e por isso seu uso foi restringido em diversos países. Na União Europeia, por exemplo, estão banidas desde 2008. O outro problema é o chamado "efeito memória". Era preciso descarregar totalmente a bateria de NiCd antes de recarregá-la. Do contrário, a bateria estragava. Se você usasse 50% da energia dela, por exemplo, e aí tentasse recarregá-la, ela desenvolvia uma "memória" - ficava viciada e, dali em diante, só recarregava pela metade. A solução veio com as baterias de níquel-hidreto metálico (NiMH), que substituem o cádmio por uma liga de metais não tóxicos e chegaram ao mercado em 1989. Eram bem menos poluentes, guardavam até 40% mais energia e supostamente não tinham efeito memória. Passaram a ser usadas em aparelhos eletrônicos, em satélites e até no telescópio espacial Hubble. Com o tempo, percebeu-se que a coisa não era tão boa. As baterias de hidreto também ficavam viciadas. E não davam conta de alimentar a nova geração de gadgets, como filmadoras e CD players portáteis, que sugavam mais e mais energia. Aí a indústria decidiu apostar em outro metal, o lítio (cujo nome vem de lithos, palavra grega que significa "pedra"). Ele já era usado em equipamentos militares, e tinha uma potência absurda: as baterias de lítio chegavam a alcançar 3,6 volts, o triplo das tradicionais. Eram uma maravilha, exceto por um porém: o material pegava fogo com facilidade. Durante as pesquisas, houve vários incêndios e pelo menos uma morte. Mas as baterias de lítio que usamos hoje não trazem o metal em estado puro, e sim uma mistura menos explosiva (íons de lítio). Além disso, têm circuitos internos que controlam o fluxo de energia, impedindo que oscile bruscamente - o que poderia fazer a bateria pegar fogo. Quando ouvimos falar de baterias que explodiram, geralmente se trata de versões falsificadas, nas quais os circuitos de proteção falharam. Mas nem sempre. Em 2006, a Dell recolheu 4,1 milhões de baterias de laptop, que haviam sido fabricadas pela Sony e apresentavam risco. O lítio é ruim, mas é o melhor que temos. Ainda não foi descoberto um material mais poderoso que ele. E há quem diga que isso nunca irá acontecer. "Não haverá mais grandes descobertas de materiais", acredita Wilcke, da IBM. A grande aposta é aperfeiçoar o que já existe, criando novas combinações com o lítio. Uma das pesquisas, liderada por Wilcke, tenta criar baterias de lítio-ar. Elas são abertas e reagem com o oxigênio do ar. Graças a isso, armazenam mil vezes mais energia do que as baterias tradicionais. Seus criadores esperam que cheguem ao mercado em 2020. Podem ser a solução definitiva para os carros elétricos. Mas não vão resolver o problema dos celulares. "As baterias de lítio-ar são abertas, mas é necessário filtrar o ar que elas recebem. Não há problemas em fazer isso em um carro, mas o mesmo não acontece em um celular", explica Wilcke. Seria preciso acoplar um purificador de ar no smartphone, que ficaria bem maior e mais pesado. Para os aparelhos de bolso, a grande esperança está em coisas incrivelmente pequenas: os vírus. Cientistas do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) estão criando baterias que combinam lítio e um vírus geneticamente modificado. Ele se chama M13 e tem uma habilidade meio ciborgue: produz ferro. Conforme o vírus se multiplica, ele vai se agrupando e forma microfios perfeitos, que não têm imperfeições e por isso conduzem muito bem a corrente elétrica. Esses microfios podem ser usados dentro de baterias, que graças a isso duram até 3 vezes mais - ou podem ser construídas num tamanho muito menor sem perder potência. Os botões da sua roupa poderiam ser baterias, por exemplo. O exército dos EUA já manifestou interesse na tecnologia. Mas ela só vai se concretizar se o mundo tiver lítio suficiente para produzir baterias. E ele não é infinito. No século 21, o lítio será cada vez mais importante - tanto que há quem o considere o novo petróleo. Com todos os conflitos, e as controvérsias, associadas a isso. A CORRIDA DO LÍTIO Hoje, os maiores produtores de lítio são Austrália (41%), Chile (38%), Argentina (10%) e China (9%). Uma única mina, recém-descoberta na Austrália, tem 4,3 milhões de toneladas do metal, o suficiente para alimentar o mundo pelos próximos 30 anos. "As reservas mundiais não estão em questão", diz Jon Hykawy, analista de materiais da consultoria Byron Capital. Tem bastante lítio no planeta. Mas isso pode mudar - talvez antes do que se imagina. O milionário sulafricano Elon Musk é dono da Tesla Motors, uma fabricante de carros elétricos, que produz 33 mil carros por ano. Uma empresa relativamente pequena, mas com enorme potencial - tanto que seu valor de mercado é US$ 30 bilhões, mais da metade da gigantesca General Motors. Musk quer transformar o carro elétrico num produto de massa. E acredita que a chave para isso é criar baterias mais leves e potentes. Por isso, está construindo uma fábrica no estado de Nevada, nos EUA, que produzirá 500 mil baterias de lítio para carros por ano - o que equivale a dobrar toda a produção mundial. Ela vai custar R$ 6 bilhões, terá 6.500 funcionários e deverá ficar pronta em 2016. É um megaprojeto, que pode aumentar muito a demanda por lítio - e acirrar a disputa por ele. Se isso acontecer, a Bolívia vai dar um grande salto. É que ela é dona do salar de Uyuni, planície que contém uma enorme quantidade de lítio: o suficiente, estima-se, para aumentar em 50% as reservas mundiais. Ao longo das próximas décadas, os bolivianos poderão adquirir um poder comparável ao que os países produtores de petróleo têm hoje. Em vez de sheiks vestindo turbantes, os símbolos de riqueza farta e rápida serão os multimilionários andinos. E as superpotências mundiais, que hoje fazem de tudo para colocar as mãos no petróleo do Oriente Médio, fatalmente irão atrás do lítio boliviano. Isso pode transformar a geopolítica mundial. Mas talvez não impeça que as baterias continuem nos deixando na mão. NÃO FIQUE SEM CARGA Como fazer a bateria render NÃO FORCE - Sempre que possível, não deixe a bateria ficar com menos de 40% de carga. Forçar a bateria a ir até o fim desgasta o lítio - com o tempo, isso faz com que ela passe a reter menos energia. TIRE DO BOLSO - As baterias odeiam calor. Se forem mantidas a 25 °C, perdem 20% de capacidade por ano. Quando você estiver trabalhando, tire o celular do bolso e deixe-o sobre a mesa. GUARDE DIREITO - Vai ficar um tempo sem usar a bateria? Guarde-a carregada a 40%. Do contrário, ela poderá sofrer danos permanentes. CONTROLE A TELA - Entre nas configurações do iOS ou do Android e desligue o ajuste automático de brilho da tela. Deixe a luminosidade entre 15 e 20%. É plenamente suficiente para você usar o celular e economiza muita bateria (em alguns casos, dobra a autonomia). EVITE APPS MILAGROSOS - No Android, existem diversos aplicativos que prometem fazer a bateria durar mais - fechando os programas que estão abertos no telefone. Na prática, isso não economiza energia (e pode acabar tendo o efeito oposto). VIDA NOVA As baterias perdem capacidade após 1.000 recargas - o que, nos smartphones, dá três anos de uso. Aí, o melhor é trocar mesmo. Veja como: IPHONE ONDE - Na assistência técnica ou numa loja Apple (goo.g//40XbuK). QUNATO - R$ 300 em SP (o preço pode variar em outros estados devido aos impostos locais). PRAZO - 10 dias úteis. SAMSUNG ONDE - Assistência técnica (goo.gl/FUDjfu). QUANTO - Varia conforme a oficina. A SUPER consultou três autorizadas em São Paulo, que passaram valores entre R$ 90 (para Galaxy S4) e R$120 (S5). PRAZO - Também varia. Nas lojas consultadas, a troca é na hora. MOTOROLA ONDE - Assistência técnica (goo.g//omtf26). QUANTO/PRAZO - Varia conforme a oficina. A SUPER consultou três autorizadas em São Paulo. Todas disseram que só podem informar os preços após o celular passar por uma avaliação técnica. PLANO B Outra opção é comprar uma bateria externa, que serve em qualquer celular (R$100), ou um case com bateria (há versões para iPhone e alguns Samsung, em torno de R$ 200). 2#6 COMPORTAMENTO – COMO CONVENCER QUALQUER PESSOA A FAZER QUALQUER COISA – INCLUSIVE A LER ESTA REPORTAGEM REPORTAGEM Carol Castro EDIÇÃO Karin Hueck TODO MUNDO AO SEU REDOR está tentando persuadir você. A marca de molho de tomate no supermercado, o político no horário gratuito, o amigo que chamou você para o bar: todos querem se dar bem à sua custa. Você mal se dá conta, mas suas escolhas (de molho, de candidato, de amigo) se apoiam em ideias pré-fabricadas - por você ou pelos outros - sobre o que é certo ou errado, bonito ou feio, gostoso ou ruim. É completamente irracional. É nesse mundo inconsciente que se esconde a chave da persuasão. O lado consciente do cérebro absorve 40 bits de informação por segundo. Já o inconsciente processa 11 milhões por segundo. Para cada neurônio que trabalha racionalmente, 10 milhões de outros estão na ativa sem você perceber. É por isso que uma simples palavra pode fazer você mudar de ideia. Quer ver? Uma pesquisa da Universidade de Nova York entregou diferentes palavras a voluntários para que formassem frases. Quem havia recebido termos que remetiam à velhice passava a caminhar mais devagar. Quando as expressões se associavam a dinheiro, as pessoas tomavam decisões mais egoístas. Isso acontece porque a mente não dá conta de decidir tudo, o tempo todo, de forma racional. Demandaria muita energia. Para ajudar nessa tarefa, o piloto automático trabalha com atalhos associativos: velhice lembra precaução e lentidão, e assim por diante. Aprenda aqui alguns corta-caminhos da mente para fazer as pessoas caírem no seu papo. (E para você não cair no papo dos outros.) A ESPINHA ERETA Antes de você abrir a boca, seus gestos falam por você. E influenciam inconscientemente suas decisões. "Alguns nanossegundos antes da decisão racional, você já mostra sinais - e quem está ao seu lado capta isso", explica Nick Morgan, especialista em oratória e autor do livro Power Cues, sem edição em português. Isso porque gestos demonstram emoções. Se você pedir um aumento a seu chefe enquanto estala os dedos, ele entenderá que você está nervoso. Quando sobe ao palco para uma apresentação, seu corpo entra em alerta: batimentos cardíacos aceleram, as pupilas se dilatam etc. O corpo entrega sua apreensão. "Se você sente medo, por exemplo, coloca a mão no estômago, como se estivesse pronto para a briga", conta Morgan. O mesmo vale para braços cruzados, mãos no bolso ou mãos na nuca. A solução? Gestos abertos. Ocupe o maior espaço possível para parecer maior e mais intimidador, como um animal amedrontador. Mãos na cintura e braços para cima ajudam. "Deixe os braços soltos e separados em qualquer situação. Isso irá mostrar abertura para o diálogo", complementa. Você também pode se aproveitar do que diz o corpo das outras pessoas. Se seu parceiro, por exemplo, der um passo para trás enquanto você tenta negociar o próximo destino das férias, é melhor mudar o andamento da conversa. "Quando confiamos e as coisas vão bem, nós nos mantemos perto. Afastamento é um mau sinal", diz Morgan. Outro gesto que funciona é copiar o tom de voz e o ritmo da fala da outra pessoa (funciona com gestos também). Não tenha vergonha: imite mesmo. Se ele tiver o costume de terminar as frases com um "né?", abrace o "né?" você também. Ele vai enxergar em você alguém que pensa parecido e ficar mais aberto para o diálogo. ME AJUDE A TE AJUDAR Reciprocidade. As pessoas tendem a retribuir o tratamento que recebem. O comportamento é uma herança do passado, de uma época em que a colaboração era essencial para a sobrevivência. Nossos ancestrais só sobreviveram porque se agruparam em sociedades nas quais a troca de favores era rotina (uns cuidavam da caça, outros da agricultura, outros da segurança e por aí vai). Bebês de três meses já têm um primitivo senso de justiça e preferem pessoas que fizeram favores. Ou seja, se quiser algo de alguém, seja generoso também. Mas nunca cobre pelo passado ("Pó, chefe não vai me liberar hoje? Fiquei sexta até às oito da noite aqui!"). Negociações funcionam melhor quando envolvem trocas futuras. "Quando você valoriza as pessoas, é mais fácil persuadi-las", conta Stuart Diamond, professor da Universidade da Pensilvânia. Em certa ocasião, ele precisou de um favor da atendente do guichê de uma companhia aérea, que não parecia disposta a ajudar. Estava claramente cansada e mal-humorada. Diamond percebeu que nenhum dos clientes se importava com a mulher. Aproximou-se e perguntou se ela estava bem. "Ela sabia que eu queria um favor. Mas só eu parei 10 segundos para perguntar como ela se sentia", conta. Ele conseguiu o que queria. INFLE EGOS Pessoas adoram ser coerentes e fazem de tudo para não se contradizer. Basta analisar as discussões políticas nessas últimas eleições; no momento mais ferrenho de embate, poucos eleitores já decididos conseguiam ver os pontos positivos do candidato adversário e as deficiências do presidenciável escolhido. Mudar de opinião pareceria incoerente, o que é associado a pessoas fracas ou hipócritas. Já a coerência está ligada à inteligência e pessoas de índole forte. Mas há um jeito de fazer qualquer um mudar de ideia. Basta começar com ideias simples. Ou pedidos pequenos. E criar compromissos. Pesquisadores da Califórnia conseguiram jogar com a busca por coerência e usá-la favoravelmente. Eles pediram a alguns moradores permissão para instalar em frente à casa deles um grande painel publicitário sobre segurança no trânsito. Quase ninguém topou. Tentaram então uma tática diferente. Pediram, primeiro, para que os cidadãos assinassem um abaixo-assinado a favor da manutenção do embelezamento da Califórnia. Duas semanas depois, retornaram e pediram a permissão para o tal painel. O resultado surpreendeu: as chances de conseguir instalar o outdoor cresciam significativamente após terem participado do abaixo-assinado. A petição criou um compromisso: apesar do out-door em si não deixar o estado da Califórnia mais belo, ele refletia o compromisso das pessoas como cidadãos. No abaixo-assinado, as pessoas haviam mudado sua auto-imagem para melhor, como cidadãos com espírito público, que colaboram com as causas da cidade. Então instalar um painel em frente à casa passou a fazer sentido. Pesquisas aumentam a credibilidade dos dados e fazem você CONFIAR nas informações. PAPAGUEIE Quantas vezes você não comprou algo sem muita vontade, tipo uma cocada na praia, só por ter simpatizado com o vendedor? "As pessoas preferem dizer sim a solicitações se elas gostam de você. Não há surpresa nisso", diz Robert Cialdini, especialista em persuasão. Segundo pesquisa da Universidade da Pensilvânia, menos de 10% dos negócios fechados têm a ver com conteúdo. Mais de 50% têm a ver com vínculo e confiança. Mas como criar esses vínculos? Qualquer gosto ou história parecidos vale: uma cidade em comum, a praia preferida, ideologia política, um hobby, religião, um tipo de música. Na década de 1970, quando havia uma clara divisão de estilos entre a galera hippie e os caretas, pesquisadores andaram pelas universidades com roupas parecidas a uma dessas tribos. E paravam alunos para pedir uma moeda para fazer um telefonema. Quando aluno e pesquisador compartilhavam o mesmo estilo visual, o pedido era atendido em mais de dois terços das vezes. Quando isso não acontecia, menos da metade dos alunos dava a moeda. É o que psicólogos chamam de efeito halo. Você, inconscientemente, passa a gostar de (quase) tudo que envolve aquela pessoa. Como faltam dados suficientes para julgar de verdade um produto ou uma pessoa, a mente se apega a um atributo positivo e conclui que todo o resto também é bom. 95% das pessoas são imitadoras. Apenas 5% são iniciadoras. TODO MUNDO LEU ISTO Use e abuse da opinião pública favorável. Sabe aquela ideia de que a fila significa que a balada está boa? É sua mente cortando caminho na opinião da maioria; há uma ideia pronta no inconsciente de que quando a maioria apoia uma ideia é porque ela faz sentido. Também vem dos tempos da sobrevivência: se você visse a sua tribo inteira correndo em pânico, provavelmente havia algum predador vindo em sua direção. É o efeito manada. Assim, quanto mais gente você puder levar para o seu lado, melhor. Por exemplo: ao negociar a escolha do filme do cinema, você pode jogar com os dados de público - "Ah, a estreia atraiu tantos milhões de pessoas no mundo todo!" Ou citar os amigos que já viram. Seguimos a manada com mais afinco quando ela vem junto da opinião de uma autoridade no assunto. "Pessoas serão mais persuadidas quando virem que você tem conhecimento e credibilidade no tema", diz Cialdini. É o que revistas tentam ao buscar fontes renomadas, como estas citados aqui. Funcionou para você? Risadas falsas no fundo de programas fazem o público RIR MAIS e por mais tempo. 2#7 SAÚDE – PARA LER EM PÉ Passamos grande parte do tempo sentados. As cadeiras são nossas companheiras inseparáveis. Mas também minam nossa saúde e nos roubam anos de vida. Veja como a humanidade se deixou seduzir (e escravizar) por elas - e como evitar que façam mal a você. TEXTO Thais Hararí EDIÇÃO Bruno Garattoni VOCÊ JÁ PAROU PARA PENSAR quanto tempo passa sentado? Durante as refeições, no trabalho, na escola, no cinema, no cabeleireiro, tomando sol na praia, jogando cartas com os amigos... As cadeiras (e seus descendentes fofinhos, os sofás) estão em praticamente todas as situações do dia a dia. É impossível imaginar o mundo sem elas. Mas esse móvel já foi considerado um item de luxo. É impossível saber exatamente quando a primeira cadeira foi criada, mas os exemplares mais antigos são do século 7 a.C. e estão expostos em museus do Egito - onde, acredita-se, a peça tenha sido inventada. As primeiras cadeiras eram feitas de ébano ou marfim e pertenciam às classes mais abastadas. Foi assim durante toda a Antiguidade. Em Roma, por exemplo, elas costumavam ser feitas de mármore e custavam muito caro. As classes mais baixas tinham de se contentar com banquinhos sem encosto. Durante a Idade Média, a cadeira continuou carregando certa mística. Mesmo nas famílias mais ricas, só o dono da casa podia se sentar nelas. Nem os filhos do rei francês Luís XIV tinham permissão para usar cadeiras - na presença do pai, eles só podiam se sentar em banquinhos. Foi só depois da Revolução Industrial, no final do século 18, que esse cenário se transformou definitivamente. Surgiram novas ferramentas e técnicas para tratar a madeira, as cadeiras deixaram de ser feitas a mão e passaram a ser produzidas em larga escala. Ficaram muito mais baratas, ao alcance de qualquer pessoa. Além de abaixar os preços, a tecnologia mudou o próprio formato das cadeiras. No século 19, o austríaco Michael Thonet inventou um jeito de entortar madeira usando vapor quente, o que permitiu a elaboração de móveis mais delicados. "Até então, para desenhar uma curva, era preciso usar uma serra. Além de ser mais difícil, gerava muito desperdício de madeira", conta a desenhista industrial Teresa Ricetti, professora da Universidade Mackenzie. Na técnica bolada por Thonet, a madeira é deixada sobre vapor quente e amolece, o que permite mudar seu formato. O austríaco criou modelos icônicos, que são populares até hoje. Sabe aquela cadeira de balanço da vovó, com assento e encosto de palha? Foi Thonet quem desenhou. Também é bem provável que você já tenha visto - ou tenha na sua casa - o modelo nº 14, outro clássico com assento de palha e encosto formado por apenas duas tiras de madeira arredondadas. Quem projetava uma cadeira pensava principalmente na estética e não dava muita bola para o conforto. Ele só começou a ser levado em conta no final do século 19, quando surgiram os primeiros modelos desenhados para melhorar o posicionamento da coluna, evitando dores nas costas. É nessa época que aparecem as cadeiras especialmente projetadas para uso profissional, como a cadeira de dentista, a de cabeleireiro, a de costureira e a de escritório - que foi criada em 1896 pelo americano Herbert Andrews e permitia ajustar a altura do assento e do encosto para que pessoas de vários tamanhos pudessem se sentar corretamente em frente a uma máquina de escrever. As cadeiras de escritório que usamos hoje são descendentes diretas dela. Mas também foram muito influenciadas por pesquisas feitas na década de 1970. Uma das primeiras cadeiras ergonômicas foi a Ergon Chair, lançada em 1976 pela empresa americana Herman Miller. Ela trazia uma novidade, que virou equipamento de série em todas as cadeiras de trabalho - um compartimento de gás comprimido, que funciona como amortecedor e ajuda na hora de regular a altura do assento (coloque a mão embaixo da sua cadeira de trabalho, e você irá encontrar uma alavanca que controla esse sistema). Mas, nessa mesma época, a história de amor da humanidade com as cadeiras começou a dar os primeiros sinais de desgaste. AI, MINHAS COSTAS Na década de 1970, o médico Alf Nachemson, da Universidade de Gotëborg, na Suécia, revolucionou os estudos sobre cadeiras. Ele avaliou nove voluntários em 26 situações diferentes (sentados, deitados, tossindo, pulando etc.) e mediu a pressão sobre os discos da região lombar, na parte de baixo das costas. Nachemson constatou que, quando a pessoa está sentada, sua coluna recebe 40% mais pressão do que quando está de pé. Ele descobriu algo que hoje parece óbvio, mas na época foi muito surpreendente: sentar faz mal para a coluna. Quando você está de pé, pés e pernas sustentam o peso do corpo. Mas, quando você está sentado, a coluna e a bacia têm de fazer esse trabalho sozinhas - pois não recebem a ajuda das pernas e dos pés, que estão relaxados. E isso gera uma sobrecarga inevitável. Mesmo se você se sentar na melhor cadeira do mundo e mantiver uma postura perfeita (veja infográfico nas próximas páginas), suas costas vão sofrer. Sem contar que é muito difícil ficar perfeitamente ereto, certinho, o tempo todo. "As áreas mais afetadas são as regiões lombar e dorsal (das costelas) , além do pescoço", explica o ortopedista Roberto Guarniero, do Hospital Santa Catarina, em São Paulo. Depois de algum tempo sentado, a pessoa quase sempre adota posturas erradas sem perceber. Quem trabalha muito tempo no computador, por exemplo, tende a jogar o corpo para a frente e se aproximar da tela. Isso aumenta a pressão sobre os discos vertebrais e sobrecarrega ainda mais a parte posterior da coluna, que fará força para tentar puxar o corpo para trás e impedir que você caia de cara na mesa. "Pode provocar dor na lombar, no pescoço e entre as escápulas", explica o ortopedista Ivan Rocha, do Hospital das Clínicas. As costas não são a única vítima. Uma pesquisa feita com 220 mil pessoas pela Universidade de Sydney, na Austrália, constatou que quem passa 11 horas por dia sentado tem 40% mais chance de morrer (independentemente da causa) nos próximos três anos, comparado a quem fica apenas quatro horas por dia sentado. O pior é que esse risco aumenta mesmo se a pessoa estiver em forma e praticar atividade física. Ou seja: em tese, não adianta ficar prostrado e depois ir à academia, ou correr um pouquinho no parque, para compensar. Como todo estudo que mede risco, a pesquisa australiana trabalha com probabilidades - e o mais provável é que não aconteça nada, ou seja, você não morra nos próximos três anos, mesmo se ficar sentado um tempão. Mas outro levantamento, também feito por cientistas australianos, sugere que isso pode cobrar a conta mais tarde, na velhice. Eles compararam os hábitos de 11 mil pessoas e descobriram que quem passa 3 horas por dia sentado vive 2 anos a menos, em média. E, se você acrescentar mais 2 horinhas no sofá vendo TV, pior ainda: sua expectativa de vida cai mais 1,4 ano. Se você está lendo esta reportagem sentado, já deve ter começado a sentir uma dorzinha nas costas. Aconteceu comigo depois de todas as horas sentada, dias a fio, que passei pesquisando, fazendo entrevistas e redigindo este texto. E minha cadeira de trabalho é terrível: tem encosto mole e um apoio para os braços que não regula. Então decidi me levantar e ir até as lojas procurar as melhores cadeiras à venda no Brasil. Experimentei várias. A de que mais gostei foi a Sayl, da marca Herman Miller. No dia em que virar chefe, vou querer uma. É superconfortável e tem um visual descolado e moderninho, mas também impondo certa autoridade. Adorei. Pena que eu tenha mesmo de esperar virar chefe para ter essa oportunidade. A cadeira dos meus sonhos custa a bagatela de R$ 2.900. E, por melhor que uma cadeira seja, só poderá atenuar (nunca eliminar) os prejuízos à saúde de ficar muito tempo sentado. Talvez a saída seja aderir às standing desks, ou seja, em que se trabalha de pé. Elas existem desde o século 18, mas têm ganho adeptos nos últimos anos. É que, além de supostamente evitar os malefícios de ficar sentado, emagrece: a cada hora trabalhando em pé, queimam-se de 20 a 50 calorias a mais. Mas fazer isso o dia inteiro cansa e também tem seu lado ruim: problemas circulatórios e dores nas costas. O ideal, segundo especialistas, é mesclar as duas coisas. Se você trabalha sentado, levante e ande um pouco a cada hora. Faz bem para o corpo - e para a cabeça também. SENTE AQUI As cadeiras que marcaram a história — e os corpos — da humanidade. Relaxar não é para todos NOME Klismos ANO Século 5 a.C. Vem da Grécia antiga, mas é surpreendentemente atual. Suas formas arredondadas permitem manter uma postura relaxada, com as costas apoiadas sobre o encosto levemente inclinado. Quando foi criada, sentar - especialmente em peças que permitiam se reclinar - era sinal de status. Apoio de braço NOME Barrel ANO Século 15 Durante a Idade Média, as cadeiras se tornaram mais elaboradas. Quanto maiores e mais enfeitadas eram, mais rico era o dono. Os modelos mais caros, como este, ganharam uma inovação: apoios para os braços. Produção em massa NOME Cadeira número 14 ANO 1859 Criada pelo austríaco Michael Thonet, foi a primeira a ser fabricada em larga escala. É fácil e barata de fazer porque tem poucas peças: apenas seis pedaços de madeira, dez parafusos e duas arruelas. De pernas para o ar NOME Eames lounge chair, número 670. ANO 1965 Foi desenhada pelo casal Charles e Ray Eames, que se inspiraram nas cadeiras dos clubes ingleses. É um dos objetos de design mais marcantes do século 20 - e, graças ao otomano (banquinho), muito confortável também. A mais comum hoje NOME Synthesis 45 ANO 1971 É o modelo que deu origem às cadeiras de trabalho modernas. Faz parte de uma linha de móveis criada pelo italiano Ettore Sttotsass, que queria reinventar os escritórios com linhas mais leves e cores alegres. De patrão NOME Aeron ANO 1992 Criada pela empresa americana Herman Miller, foi a primeira a destacar tecnologia e ergonomia como principais argumentos de venda. Não é estofada, sustenta o peso do corpo com telas. Isso deixa o ar passar e reduz a pressão sobre as pernas, ajudando a circulação. MUITO ALÉM DA COLUNA Ficar muito tempo sentado afeta as costas - mas não só. 1- CORAÇÃO - Os músculos queimam menos gordura e o sangue circula mais devagar quando sentamos. Por isso, a chance de ter pressão e colesterol altos é maior. 2- PÂNCREAS - Nos sedentários, as células demoram mais para absorver glicose e produzir energia. Isso força o pâncreas, que é obrigado a produzir mais insulina, e pode levar ao desenvolvimento de diabetes. 3- PERNAS - Sofrem uma piora na circulação sanguínea. A consequência são tornozelos inchados e formação de varizes. 4- CÉREBRO - O movimento dos músculos faz com que o sangue circule, levando oxigênio ao cérebro. Quando sentados, as funções cerebrais diminuem. 5- COLUNA / PESCOÇO - Risco de hérnia de disco na lombar. A musculatura na região fica tensionada, afetando o posicionamento dos discos vertebrais. Depois de várias horas sentado, você se inclina para a frente - causando dores no pescoço. A POSTURA CORRETA Sentar direito afasta dores e lesões por esforço repetitivo. 1- COSTAS - O encosto da cadeira deve chegar até o meio da coluna. Assim, é possível manter o desenho natural das costas e apoiá-las corretamente. 2- BRAÇOS - É importante que a cadeira tenha um apoio para eles. Se não tiver, apoie os antebraços e punhos na mesa. Evite digitar com os braços "voando". 3- JOELHOS - Deixe-os paralelos, para a frente, e flexionados - o ângulo entre coxa e panturrilha deve ser de 70 a 90 graus. 4- PERNAS - Devem ficar totalmente apoiadas no assento. Para que isso aconteça, pode ser necessário ajustar a distância do encosto. 5- PÉS - Devem ficar inteiramente apoiados no chão (não só as pontas). Isso ajuda a redistribuir parte do peso do corpo, reduzindo a pressão sobre a coluna. 2#8 COMIDA – ÁGUA, SABÃO E DELÍCIA A nova ideia para salvar o planeta é deixar o fogão de lado e cozinhar a sua comida na lava-louças (sim, junto com a louça suja). Supostamente, isso reduz muito as emissões de CO2. Mas será que a comida fica boa? Investigamos que história é essa — e testamos as principais receitas. TEXTO Sara Magalona EDIÇÃO Bruno Garattoni INSTRUÇÕES GERAIS 1- Escolha um frasco que possa ser bem vedado. A melhor opção é UM POTE DE GELEIA, AZEITONA OU PALMITO. Evite recipientes de plástico. 2- Coloque o frasco com a comida e a LOUÇA SUJA JUNTAS NA MÁQUINA. Adicione sabão normalmente. 3- Escolha o modo de lavagem mais adequado para cozinhar cada alimento. Peixes, crustáceos e moluscos: modo Rápido Carne vermelha: modo Normal Ovos, vegetais e FRUTAS: modo Intenso “MAS E AÍ, DEU CERTO.'" Entre meus amigos e parentes, não houve quem não fizesse essa pergunta ao saber do meu repentino - e estranho - interesse em cozinhar usando a máquina de lavar louça. É isso mesmo. Deixei de lado o fogão e o micro-ondas e resolvi preparar minha comida na máquina, ao mesmo tempo que ela lavava a louça da refeição anterior. A suposta vantagem disso é que economiza energia (dispensa o gás do fogão ou a eletricidade do micro-ondas), o que reduz as emissões de CO2 - e ajuda a salvar o planeta. "Passei nove anos testando alternativas para cozinhar reduzindo o impacto ambiental e percebi o potencial do lava-louça para economizar energia. Usar o vapor e a água quente da máquina permite cozinhar a custo zero. Com a vantagem de não precisar monitorar o processo", diz a chef italiana Lisa Casali, que aprimorou a técnica e escreveu um livro com receitas para fazer na máquina (Cozinhando no Lava-Louça, editora Alaúde): Ao longo de vários dias, segui as dicas de Lisa e tentei de tudo um pouco. Preparei ovos com tomate e ervas, frango com limão e gengibre, musse de maçã com canela e compota de frutas, tudo na minha lava-louça. Como? Misturando os ingredientes, colocando em recipientes à prova d'água e seguindo algumas instruções simples - veja na página anterior. A água quente jogada pela máquina aquece os recipientes e cozinha os alimentos. É fundamental ficar atento a um detalhe. "Para evitar a contaminação por bactérias, principalmente em carnes, o cozimento precisa ser a 70 °C", explica a nutricionista Karin Honorato. Em geral, as lava-loucas atingem essa temperatura - mas, em alguns casos, é necessário selecionar manualmente a opção no painel da máquina. Enquanto comia, eu me perguntava se estava mesmo salvando o planeta. Fazendo as contas, descobri que a diferença era mesmo grande. Se as quatro receitas tivessem sido preparadas no meu fogão, que é alimentado por gás natural, teriam consumido aproximadamente 2 metros cúbicos de gás. Ao ser queimada, essa quantidade de gás teria liberado cerca de 4,7 kg de CO2 na atmosfera. É bastante coisa: equivale ao CO2 emitido por um carro popular (motor 1.0) num percurso de 47 km. Cozinhar polui. Mas, ao preparar minha comida na máquina de lavar-louça, foi diferente. Na prática, as receitas não emitiram nenhum CO2 - porque eu aproveitei as ocasiões em que já iria usar a máquina para lavar louça. Ou seja; na prática, o preparo das refeições não teve impacto ambiental. Eu só gastei a água e a energia que iria consumir, de qualquer maneira, usando a máquina na lavagem da louca. Bacana. Segundo os fabricantes, cozinhar na lava-louças não estraga o aparelho. O grande obstáculo é cultural mesmo. "Para o brasileiro, é complicado misturar um equipamento de limpeza (a lavadora) com o preparo de alimentos", diz Juliana Passos, supervisora de marketing da Electrolux. Eu misturei. Algumas das minhas receitas ficaram ruins - mas outras até que ficaram bem boas. Leia os textos a seguir para saber no que deu. COMO COZINHAR NA LAVA-LOUÇAS Parece bizarro. Mas é fácil, não prejudica a máquina - e às vezes fica até gostoso. COMPOTA DE FRUTAS COM IOGURTE E CEREAIS INGREDIENTES: 200 g de frutas da estação 1 colher (chá) de mel 1 colher (chá) de açúcar mascavo Suco de limão-siciliano 200 ml de iogurte natural 3 colheres de sopa de granola MODO DE PREPARO: Lave e corte as frutas e coloque num pote de 500 ml. Acrescente mel, açúcar mascavo e o suco do limão-siciliano. Cozinhe no ciclo Intenso, (leva de 2 a 3h e tem temperatura de 60 °C). RESULTADO: Não tive paciência e fiz num ciclo mais rápido. Usei ameixas e pêssegos. Ao abrir o pote, veio o cheiro, não muito convidativo - parecia de sauna. Como a receita não especifica a quantidade de suco de limão, espremi meio limão. Foi exagero. Além disso, as frutas continuaram firmes, não se dissolveram como deveriam. Com o iogurte e a granola, a receita fica boa para comer no café da manhã. Sem isso, seriam apenas frutas com gosto de limão. BOCADINHOS DE FRANGO, LIMÃO E GENGIBRE COM VAGENS SALTEADAS INGREDIENTES: 1 peito de frango Raspas da casca e suco de 1 limão Pedaço de gengibre fresco 2 colheres (sopa) de azeite Sal Cebolinha 250 g de vagem 1 dente de alho Pimenta-do-reino MODO DE PREPARO: Refogue a vagem numa frigideira. Corte o frango em cubos e coloque num pote de 300 ml. Adicione as raspas e o suco do limão, gengibre ralado, azeite, sal e cebolinha picada. Acione o ciclo Intenso da lava-louças. RESULTADO: Fiquei receosa sobre o cozimento do frango e estava certa. Ele ficou meio cru - o que é perigoso para a saúde. Por causa do limão, uma amiga achou o gosto parecido com o de ceviche. Não faria a receita novamente. OVO COM TOMATE E ERVAS INGREDIENTES: 1 ovo 1 tomate pequeno 2 colheres (sopa) de azeite Sal Alecrim Orégano Pimenta-do-reino MODO DE PREPARO: Pique o tomate e coloque em um pote de 200 ml. Em seguida, quebre o ovo e adicione. Junte o azeite e os temperos. A receita deve ser preparada no ciclo Intenso. RESULTADO: Foi a receita que ficou mais gostosa. O sabor do ovo se destacou – principalmente porque usei um de pata, mais forte. MUSSE DE MAÇÃ COM CANELA INGREDIENTES: 1 maçã 1 limão-siciliano 1 colher (chá) de açúcar mascavo Canela em pó MODO DE PREPARO: Descasque e rale a maçã e coloque em um pote de 250 ml. Adicione raspas da casca do limão-siciliano e também um pouco do suco. Acrescente o açúcar e a canela. Tampe bem e coloque na lava-louça, ajustada para o modo Normal. RESULTADO: Não virou musse. Virou apenas uma mistura de maçã - sólida - com canela. Parte da culpa foi minha (usei um ralador largo e os pedaços ficaram meio grandes). A hora de abrir o pote é fantástica, porque vem um cheiro de canela bem forte. E até que ficou gostoso. __________________________________________ 3# SEÇÕES II fevereiro 2015 3#1 TECH 3#2 CULT 3#3 E SE... – E SE O HOMEM MAIS RICO DO MUNDO DOASSE TUDO? 3#4 MANUAL — COMO DEIXAR A SUA CASA LIMPA – SEM SUAR A CAMISA 3#1 TECH A MELHOR CAMA DO MUNDO Ela monitora os seus sinais vitais e grava o que aconteceu de noite. Tem colchão regulável, se adapta à temperatura do corpo - e possui até um sistema que faz a outra pessoa parar de roncar. TEXTO Bruno Garattoni e Fernando Badô OS SENSORES - Embutidos dentro do colchão, medem respiração, batimentos cardíacos, movimentos do corpo durante o sono e quantas vezes você se levantou - caso tenha feito isso - durante a noite. Os dados são enviados para um app (para iPhone e iPad), que calcula por quanto tempo e quão profundamente você dormiu. O COLCHÃO - São sete camadas, com espessuras e espumas diferentes. Mas o segredo está na quinta. Ela é formada por bolsas infláveis, que você pode encher ou esvaziar (por meio do aplicativo). Isso permite ajustar a dureza do colchão, deixando-o mais firme ou mais macio. Esse controle é independente para cada lado da cama. O CALOR - Você já acordou com frio no meio da noite? Tem explicação científica: conforme o sono fica mais profundo, o metabolismo desacelera e a temperatura corporal cai até 0,5 grau. O fabricante dessa cama diz ter a solução. O colchão é feito de um material térmico, que absorve o calor do corpo e o libera gradualmente durante a noite, evitando o frio. E O RONCO - A cama tem uma função de massagem, ideal para relaxar antes de dormir. E se o seu cônjuge começar a roncar, sem problema. Aperte um botão e o lado de lá da cama se inclinará 6 graus. O movimento é suave, não acorda a outra pessoa. Mas é suficiente para alterar a posição do corpo dela - fazendo-a parar de roncar. SLEEP NUMBER ILE NOS EUA: R$ 20.700 (TAMANHO QUEEN) sleepnumber.com 1- UM LED DIFERENTE Há diversas lâmpadas de LED, inclusive várias que podem ser controladas via aplicativo. Mas esta é a única que se ajusta sozinha, mudando o tom da luz (mais azulada ou mais amarelada) conforme o momento do dia. STACK ALBA NOS EUA: R$ 390 stacklighting.com 2- PROTETOR DE SHOW Música ao vivo é legal, mas pode detonar os seus ouvidos (se a banda ultrapassar 100 decibéis, o que é comum, você começa a sofrer dano auditivo após 60 minutos). Estes protetores filtram o volume excessivo sem estragar o som. DUBS NOS EUA: R$ 65 geidtibs.com 3- CINCO K Sabe as moderníssimas televisões Ultra HD (também conhecidas como 4K)? Este iMac já está um passo à frente: tem tela 5K. Ela mede 27" e tem resolução de 5.120x2.880 pontos. Quatro vezes mais que o iMac comum. IMAC RETINA 5K NO BRASIL: R$ 14.000 apple.com/br 4- CHAVEIRO IDEAL Vive esquecendo o cabo para carregar o celular? 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(Use esta dica para o bem e não faça bobagem, ok?) PASSO 1 - Acesse o Google Translate (translate.google.com). No campo que aparecerá na parte esquerda da tela, digite o endereço do site que você quer acessar. PASSO 2 - O endereço aparecerá em forma de link. Clique nele e navegue normalmente. 3#2 CULT OLHA SAUL AQUI DE NOVO Saul Goodman, o advogado espertalhão de roupas espalhafatosas, está de volta em Better Call Saul, spin-off de Breaking Bad, que estreia no canal AMC, nos EUA, em 8 de fevereiro (no Brasil, não havia data de lançamento até o fechamento da edição). O seriado, escrito pelos mesmos Vince Gilligan e Peter Gould do fenômeno Breaking Bad, cujo fim ainda não foi superado pelos fãs, volta seis anos no tempo em Albuquerque para mostrar o início da carreira do picareta. Alguns poucos personagens estão de volta, como Mike (Jonathan Banks). Mas a maior parte é de gente nova. Veja o que Saul tem a dizer. POR: Mariane Morisawa PAPO COM BOB ODENKIRK Sente pressão por protagonizar o spin-off de Breaking Bad? Talvez eu devesse! (risos) Mas não sinto. Acho que, por estar no showbiz há 30 anos, não reverencie tanto a TV. A única questão para mim era se Vince (Gilligan) e Peter (Gould) realmente queriam fazer o seriado por razões criativas ou por pressão do público. Mas Vince não liga para essas coisas. Só quer explorar bons personagens. Better Call Saul nasceu de brincadeiras durante as filmagens de Breaking Bad. Quando a coisa ficou séria? Bem, eu não levei a sério até esta manhã, quando comecei a dar entrevistas! (risos) Mas já na primeira cena que fiz em Breaking Bad, as pessoas falaram: "Queremos o spin-off!" Era um personagem extravagante, que fez barulho quando apareceu. Não houve hesitação da sua parte? Fiquei preocupado de me afastar da minha família, que mora em Los Angeles, porque tinha de rodar em Albuquerque. Pensei que talvez não conseguisse. Mas aí meus filhos me fizeram sentir que tinham idade suficiente para entender por que eu estava fazendo. O Saul Goodman de Better Call Saul é muito diferente? Ele é. Até porque era muito claro que tudo aquilo no escritório era falso, era uma persona. Ele disse logo de cara que Saul Goodman não era seu nome. Então, quando ele sai do escritório, sabe-se que vai ser um cara diferente. Não sei se as pessoas vão ficar chocadas porque vão ver Saul, ou o cara que se torna Saul, nos bastidores. Ele era o alívio cômico em Breaking Bad. Continua assim? Continua sendo engraçado, mas saí da filmagem me lembrando dos momentos dramáticos. Better Call Saul é muito séria. Vince e Peter são escritores sérios e não acreditam que as pessoas mudam facilmente, só encurraladas. Foi só ao assistir ao primeiro episódio que me lembrei como a série era engraçada. MELHOR NA SEGUNDA VEZ? Conheça os Spin-Offs mais amados. FRAZIER (1993-2004) Talvez o mais bem-sucedido spin-off de todos, nasceu de CHEERS. PINKY E O CÉREBRO (1995-1998) Produzido por Spielberg, o desenho nasceu a partir de ANIMANIACS para “tentar conquistar o mundo”. LEI E ORDEM: SVU (1999-??) Ripado do quase homônimo LEI E OREDEM, este filhote ficou maior que papai. INCEPTION & BELLE & SEBASTIAN Era uma vez um livro infantil francês sobre um menino órfão e seu cachorro. A historinha fez tanto sucesso que virou programa de TV. O programa fez tanto sucesso que nomeou uma banda indie. A banda fez tanto sucesso que a série foi resgatada e agora virou um longa. E Belle e Sebastian viveram felizes para sempre. 12 de fevereiro nos cinemas. 1964 livro 1965 série de tv 1996 banda 2013 filme RECEITAS LITERÁRIAS Cartas e diários antigos mostram que alguns autores universais se deliciavam tanto com alguns quitutes que resolveram anotar as receitas em punho próprio. Tente aqui adivinhar quem tinha fome do quê. (Gostou das receitas? Confira o blog que tenta recriar os pratos que autores como Tolkien, Victor Hugo e Lewis Carroll gostavam de comer: PAPERANDSALT.ORG) A- Leon Tolstói B- Ernest Hemingway C- Allan Ginsberg 1- Ensopado de verão 2- Mac’n’cheese 3- Hambúrger do velho oeste RESPOSTAS: a2, b3; c1. "Amal Alamuddin é uma advogada de direitos humanos que trabalhou com Kofi Annan na Síria e investiga crimes de guerra na faixa de Gaza com a ONU. Ainda assim, hoje é o seu marido que vai ganhar um prêmio em homenagem à carreira." – TINA FEY, sobre a mulher de George Clooney e a futilidade dos prêmios de Hollywood. GALERIA DE JOGOS MS-DOS Você, filhote dos anos 1980, chora todas as noites de saudades dos seus games que rodavam em DOS? Não chore mais. Agora tem tudo para download. Confira a nossa seleção para os iniciantes em jogos vintage. ABR.AI/DOS-GAMES GOSTA DE GTA? BAIXE Wolfenstein (1981) Com tiros em primeira pessoa, foi esse game que ensinou a humanidade a gostar de sangue pixelado. GOSTA DE PLANTS VS ZOMBIES? BAIXE Lemmings (1991) Nesse jogo de estratégia, você ajuda uns gnomos-zumbis a sobreviver a quedas, fogos e espinhos. GOSTA DE PERGUNTADOS? BAIXE Carmen Sandiego (1985) Por meio de perguntas, você banca o detetive e descobre onde está a ladra foragida. CHECK LIST FEVEREIRO BROAD CITY - Depois de Sex in the City e Girls, eis outra série sobre mulheres tentando descobrir seu papel no mundo em Nova York. Mas, dessa vez, com mais palavrões, mais escatologia e muito menos glamour. Segunda temporada, no Comedy Central. LEVIATÃ - O melhor filme estrangeiro do Globo de Ouro é esse longa russo, que conta a história de um homem que luta contra o prefeito de sua cidade, um político corrupto que está tentando roubar sua terra. 15 de janeiro nos cinemas. BIRDMAN - Nesse filme, Michael Keaton interpreta um ator esquecido que quer reconquistar a fama. Keaton e o diretor Iñárritu foram tão bem que acabaram indicados ao Oscar. 29 de janeiro nos cinemas. MARINA ABRAMOVIC - A artista/performer mais famosa do mundo entra em cartaz em São Paulo durante um mês. A sérvia vai trazer intervenções nas quais o público poderá participar e retrospectivas em vídeo. Já vai ficando na fila. 10 de março no Sesc Pompeia. 3#3 E SE... – E SE O HOMEM MAIS RICO DO MUNDO DOASSE TUDO? Caso se livrasse de uma vez de seus bilhões, Bill Gates implodiria o sistema financeiro mundial. E o mundo. Mas sua história não seria esquecida: passaria a cada geração de sobreviventes. TEXTO Amarílis Lae e Alexandre Versignassi "ERA UMA VEZ, HÁ MUITO TEMPO..." "Há quanto tempo, vovó?" "Muito, muito tempo. Milhões de anos." "Milhões? Caramba... Posso contar até um milhão? Um, dois, três..." "Depois você conta, meu amor. Agora vamos prestar atenção na historinha, tá? Como eu ia dizendo... Era uma vez um reino muito bonito, mas também com muitos problemas. Havia pessoas pobres e outras ricas. Na verdade, havia muita gente pobre e pouca gente rica. Mas, entre os ricos, havia um homem, William, que era o mais rico de todos, e também muito generoso." "Já sei! Era o rei!" "Não. Ele era um empresário e todos o conheciam como Bill. Ele ainda era adolescente quando começou a criar um negócio chamado programas de computador - os registros mostram que tinha algo a ver com janelas. E, aos 59 anos, tinha acumulado uma fortuna de 80 bilhões de dólares." "Dólares? Quanto é em blattodeas? Vamos calcular?" "Depois você calcula, querido. Onde eu estava mesmo? Ah, sim. Todos os anos, o homem mais rico do mundo destinava parte da fortuna para ajudar os menos favorecidos. Ele e sua esposa, Melinda, criaram a maior fundação filantrópica que existia." "Já sei! A Melinda era uma princesa e comeu uma maçã com inseticida!" "Não, era formada em ciência da computação e sei lá se gostava de maçãs. Posso continuar? Bom, a fundação, que tinha o nome dela, chegou a investir 30 bilhões de dólares em educação e saúde. O tesouro era usado para combater as doenças que atingiam os mais pobres do reino, como tuberculose, malária..." "Malária? Nunca ouvi falar disso. Vamos pesquisar!" "Pelo amor de santa Blattaria: ca-la-do. Quem fala agora sou eu. Quer dizer, era Bill. Todo ano, ele reunia seus seguidores e fazia um discurso. E, no último, estava bem otimista. Lembrou que todos os indicadores apontavam para um mundo melhor. Fez uma previsão ousada: disse que, em 20 anos, não haveria mais pobres no reino. Mesmo assim, no dia em que completou 60 anos, Bill foi para o jardim de sua mansão e ali ficou durante horas, meio triste. Queria fazer mais, ver o resultado de seu trabalho. Mas como? Naquela noite, durante o baile de aniversário, surgiu com um sorriso diferente. E anunciou uma decisão de estremecer as antenas: ia doar todo o dinheiro que tinha. Todo, até o último centavo. E ninguém foi capaz de dissuadi-lo. Só tinha um problema: a maior parte da fortuna de Bill estava em ações das empresas mais valiosas do mundo." "O que quer dizer 'ações'?" "Shhh! Para doar todo seu dinheiro, Bill tinha que vender essas ações, e aí entrou em cena uma das leis mais antigas da história: a da oferta e demanda. Quando Bill colocou todas suas ações no mercado, o valor delas despencou. Os outros acionistas, assustados, trataram de vender as suas também, antes que o preço caísse ainda mais. E, quanto mais gente colocava suas ações à venda, mais o preço cala. Afinal, quem iria comprar papéis que mais ninguém quer? Num reino que já enfrentava frequentes crises econômicas, a queda vertiginosa das ações das maiores empresas só trouxe pânico. O mundo financeiro entrou em colapso. E aí, meu netinho, teve início uma longa, profunda e catastrófica depressão." "Vovó, tem certeza de que é uma história infantil?" "Como a instabilidade econômica é mãe da instabilidade política, armou-se o caos. Todos os grupos queriam o poder. E usavam todas as armas de que dispunham - incluindo bombas que voavam de um canto a outro e destruíam tudo ao redor. Bombas nucleares. Bum! Bum! Bum! Não havia mais reino, nem Bill, nem bilhões. Apenas morte, devastação, horror, gritos e ranger de dentes." "Manhê! A vovó está me assustando de novo!" "Só sobreviveram as baratas, nossos ancestrais. Após milhões de anos de evolução, aqui estamos. E todos foram felizes para sempre. Fim." "Mamãe, por favor!" "Ok, ok. Só falta a moral da história. Vamos lá; o que aprendemos com o que a vovó contou?" "Para sobreviver... só com sangue de barata!" "Respeite sua vó. Já pra cama." "Mamãe... Já disse para não contar essas histórias para o Gregor. Quem vai cuidar depois, se ele tiver mais uma daquelas noites de sonhos intranquilos e acordar aos berros, achando que virou humano?" 3#4 MANUAL — COMO DEIXAR A SUA CASA LIMPA – SEM SUAR A CAMISA Você mesmo pode limpar e arrumar o seu cafofo - sem gastar muito tempo e sem ficar exausto. Basta conhecer estes truques. TEXTO Thais Harari QUARTO TECLADO LIMPINHO - Retire o pó com um secador de cabelo, e depois use um cotonete embebido em álcool para limpar os espaços entre as teclas. CAMA FEITA - Coloque um pouco de talco entre o colchão e o lençol. Ele absorve a umidade, inibe os ácaros e deixa um cheiro bom. COZINHA MICRO-ONDAS - Coloque uma colher de chá de vinagre num copo d'água e esquente por cinco minutos. Depois limpe o interior do aparelho com um papel toalha. PANELA MANCHADA? - Cubra a área com água, adicione duas colheres de sopa de bicarbonato de sódio. Espere uma hora e lave. A mancha sairá fácil. BANHEIRO AZULEJOS SEM MOFO - Aplique vinagre branco nos rejuntes, espere duas horas e depois limpe tudo com uma bucha. TORNEIRAS TININDO - Passe um pouco de cera de carro nas torneiras e demais metais do banheiro. Isso evitará que a água manche as peças. SALA JUNTE OS CACOS - Quebrou um copo? Use miolo de pão para limpar os pedaços de vidro do chão. XÔ, POEIRA - Envolva uma meia de seda nas mãos para tirar o pó dos móveis. Você pode fazer o mesmo com a vassoura, cobrindo as cerdas com a meia. O pó adere ao tecido - em vez de se espalhar pela casa toda. ARMÁRIO CHEIROSO - Limpe o interior dele com um pano embebido em vinagre para eliminar o cheiro de mofo. LOUÇA - Primeiro, deixe de molho com um pouco de detergente. Espere dez minutos. Ensaboe a louça toda e só então enxague. MANCHAS DE CAFÉ, VINHO, KETCHUP? - Misture uma colher de vinagre de vinho branco com duas de água. Aplique a solução com uma esponja, deixe agir por 20 minutos, e limpe com água. ACABOU DE DERRAMAR? - Jogue sal na área afetada. Ele absorverá parte do líquido, o que facilitará a limpeza depois.