0# CAPA 14.5.14 ISTOÉ edição 2320 | 14.Mai.2014 [descrição da imagem: foto de corpo inteiro, do general Carlos Cruz. Está de uniforme militar, com uma metralhadora pendurada no ombro direito. Olha para frente, sério.] UM GENERAL BRASILEIRO NO COMANDO DA MAIOR GUERRA DO MUNDO _______________________ 1# EDITORIAL 2# ENTREVISTA 3# COLUNISTAS 4# REPORTAGEM ESPECIAL 5# BRASIL 6# COMPORTAMENTO 7# MEDICINA E BEM-ESTAR 8# ECONOMIA E NEGÓCIOS 9# MUNDO 10# CULTURA 11# A SEMANA _____________________________ 1# EDITORIAL 14.5.14 "TEMPO RUIM NO PLANALTO" Carlos José Marques, diretor editorial Vivem-se dias de tensão no QG da presidenta Dilma Rousseff. Uma reunião com todos os ministros foi convocada às pressas para irradiar boas-novas sobre a economia. Cresceu no mercado a desconfiança de que as coisas podem desandar nessa área, na eventualidade de um segundo mandato, e o governo quer frear a escalada desses rumores lançando uma contraofensiva de medidas. De saída a emenda foi pior que o soneto. A elevação do valor do Bolsa Família e a correção da tabela do IR soaram como políticas populistas e eleitoreiras. Mesmo intramuros do Planalto a revisão para cima do IR já é tida como um erro, uma vez que a discussão do tema no Congresso poderá desgastar ainda mais a imagem da presidenta. A oposição resolveu entrar com representação no TSE pedindo multa por propaganda antecipada. As decisões oficiais, em ritmo de corrida presidencial, parecem obedecer, todas elas, a um mesmo figurino de paliativos e agrados aqui e ali sem qualquer compromisso com o longo prazo. Os ajustes necessários ao País que fiquem para depois! A improvisação, recorrendo a artifícios contábeis, virou tônica e a conta, inevitavelmente alta, está sendo empurrada para mais adiante. De preferência para depois das eleições. Perdida nesse caldeirão de equívocos e no afã de frear o desgaste medido nas pesquisas, Dilma decidiu tomar as rédeas da campanha e voltou a ocupar canais de rádio e televisão, falando como candidata, para promover “realizações” e lançar promessas. Não convenceu. Sua tática de exaltar melhorias que não se confirmam na prática – como a do “crescimento com estabilidade” e a do “controle rigoroso da inflação” – só aumentou a turba de insatisfeitos com a sua gestão. Os escândalos sobre estatais, que não saem do noticiário, têm provocado um peso extra a derrubar o prestígio da presidenta. O mentor e padrinho político, Lula, com o objetivo de afastar a onda de apelos por sua volta, tratou de relançar antecipadamente o nome dela à reeleição em encontro com mais de 800 delegados do PT dias atrás. A militância hesita. A presidenta, que ouviu os primeiros apupos, sente no ar o clima de conspiração e vai para um tudo ou nada quase na base do desespero. 2# ENTREVISTA 14.5.14 HELIO DE LA PEÑA - "A POLÍTICA DE COTAS É INSATISFATÓRIA" O comediante diz que ter bons colégios em áreas pobres é a melhor forma de fazer os negros ascenderem na sociedade e fala do humor feito atualmente por Mariana Brugger Helio de la Peña, 54 anos, carrega o subúrbio do Rio de Janeiro, onde nasceu, no nome artístico. Batizado Helio Antônio do Couto Filho, acrescentou a homenagem à Vila da Penha, bairro onde foi criado, ao se tornar comediante. Fanático por futebol e torcedor do Botafogo, o ex-Casseta falou com ISTOÉ sobre suas expectativas para a Copa e sobre a reação contra o racismo do lateral-direito do Barcelona, Daniel Alves. “Ao engolir a banana, ele engoliu o racista”, afirma o humorista, que conta ter sido vítima de preconceito antes de ser famoso. Depois de quase 20 anos ao lado dos sócios e amigos do “Casseta & Planeta” (1994-2012) fazendo graça em esquetes sobre o cotidiano do brasileiro, ele se prepara para dar vida a um só personagem: Edmúcio, traficante de “A Segunda Dama”, seriado que estreia na Rede Globo esta semana. Casado com a fotógrafa Ana Quintela, pai de dois filhos, Peña também escreve um livro sobre relacionamentos que deve ser lançado este ano, compõe sambas e dedica-se à natação. Ele nada cinco vezes por semana – dois dias na piscina e três no mar – e integra uma equipe que participa de travessias marítimas. Istoé - Acha que a campanha #somostodosmacacos, lançada nas redes sociais logo depois que o jogador Daniel Alves comeu a banana em campo, terá efeito a longo prazo? Helio de la Peña - Antes dessa confusão toda, o Celso Athayde, fundador da Central Única das Favelas (Cufa), já tinha lançado uma campanha parecida. O que acho mais interessante é essa discussão estar em pauta. Hoje há espaço para expor a indignação. O oportunista sempre vai arrumar uma maneira de se aproveitar da situação, mas isso não diminui a força da campanha. Istoé - O Brasil ainda é um país muito racista? Helio de la Peña - O negro ainda é discriminado no Brasil. Quando eu era um negro qualquer, fui parado pela polícia, revistado e coloquei a mão na parede inúmeras vezes. Recentemente passei por uma situação curiosa. Fui com meu pai visitar uma amiga dele em um prédio na zona sul do Rio e o porteiro não me reconheceu. Quando nos mandou subir, ele nos encaminhou para o elevador de serviço. Perguntei por que teríamos que ir por ali e ele ficou dando desculpas. Fiquei com pena da ignorância dele. Istoé - Houve outras situações como essa depois da fama? Helio de la Peña - Levei meu filho ao hospital e, quando fui terminar de preencher a ficha para ele, o atendente disse que eu havia cometido um engano, pois tinha escrito que meu filho era negro. Confirmei que ele era negro sim, mas como se tratava de alguém famoso, o atendente trocou para “moreno”. Ele achou que, devido ao meu status, era melhor colocar que meu filho era menos negro. Istoé - Você era discriminado na escola? Helio de la Peña - Estudei no Colégio São Bento (instituição tradicional só para meninos no Rio de Janeiro) e nunca sofri nenhuma atitude racista, mas havia um constrangimento em ser o único negro, um dos poucos pobres e um dos raros suburbanos. Como vivi em ambientes elitizados, sempre fui confrontado por esse desconforto de quando um Brasil se encontra com outro. Brincava dizendo que me sentia o Mogli, o menino preto. Istoé - Hoje, um menino negro estudando em uma escola tradicional ainda se sente como Mogli? Helio de la Peña - Em alguns ambientes isso mudou, em outros não. A relação de cor e renda permanece muito parecida. Quanto mais você sobe na favela, mais negros existem. São poucos os negros com uma boa renda que não sejam artistas, músicos ou jogadores de futebol. Quantos negros são generais? Quantos são diplomatas? Ainda é muito pouco. Istoé - O que acha da política de cotas? Helio de la Peña - As cotas são uma resposta imediata, porém insatisfatória. Acho que traria mais resultado ter um colégio de alto nível dentro da favela, para aumentar a chance de formar negros e mestiços com condições de competir de igual para igual na sociedade. Preferia que eles tivessem condição de passar no vestibular da maneira que ele é. Istoé - A atriz Lupita Nyong’o foi eleita a mulher mais bonita do mundo pela revista americana “People”. Achou justo? Helio de la Peña - Sinceramente, achei um exagero escolher a Lupita Nyong’o. Quando tentam forçar essa discussão, reforça-se o preconceito de um lado ou de outro. A revista coloca você contra a parede: se você não achar ela a mais bonita é racismo? Istoé - Uma das bandeiras da Fifa para a Copa do Mundo no Brasil é a luta contra o racismo em campo. Isso é possível? Helio de la Peña - Acredito que atitudes racistas serão mais denunciadas e, portanto, devem acontecer menos. Mesmo porque o racismo no Brasil não se manifesta nos estádios de futebol como na Europa. Até por causa disso estranhei mais a situação do Tinga (jogador do Cruzeiro que foi ofendido por torcedores do time peruano Real Garcilaso, em fevereiro, em partida pela Libertadores). do que a do Daniel Alves. O Peru é um país cheio de negros e índios. Foi muita baixaria. Istoé - Acredita que as promessas para a Copa serão cumpridas? Helio de la Peña - Acho que vamos pagar muitos micos, especialmente na área de telecomunicações e aeroportos. Nunca consegui postar uma foto na mesma hora dentro de um estádio brasileiro. Mas sou do time que quer ter Copa e que quer ganhar, mesmo que isso venha a favorecer eleitoralmente alguém. Istoé - O que acha dos estádios construídos para o Mundial? Helio de la Peña - A gente já i maginava que teria algum tipo de roubalheira e superfaturamento, só não imaginava que chegaria a esse ponto. Não tinha necessidade de fazer megaestádios em lugares sem grandes times de futebol, como em Cuiabá. Como vão ocupar isso? No de Brasília devem fazer um campeonato de propina. Istoé - Quem viu o “Casseta & Planeta” no ar imagina com quais situações o grupo estaria fazendo graça. Qual cena gostaria de fazer em um ano como esse? Helio de la Peña - Gostaria de ver a presidenta Dilma Rousseff treinando a Seleção com o Luiz Felipe Scolari na Granja Comary. Acho que a maior vontade dela é fazer parte disso, fazer preleção para os jogadores... Istoé - O “Casseta & Planeta” acabou de vez? Helio de la Peña - O “Casseta” não vai voltar. Ainda somos sócios, mas o grupo tomou rumos diferentes. Uma coisa é você, sozinho, se reinventar. Outra coisa é reinventar um grupo depois de 20 anos. Istoé - Qual é o futuro do humor brasileiro? Helio de la Peña - A tendência é ter de tudo um pouco, porque tem gente que faz bem personagem, outros fazem stand-up, paródia ou improviso. Antigamente você só conseguiria produzir e divulgar humor se estivesse empregado em um jornal ou emissora. Essa geração agora trabalha a coisa mais crua, fundo de quintal. Por outro lado, tem muita coisa sendo produzida. É fácil fazer um vídeo ruim. Fazer um de qualidade é muito mais complicado. Istoé - É mais difícil fazer humor com a ditadura do politicamente correto? Helio de la Peña - O humor era muito unilateral. Se alguém se sentisse ofendido, o máximo que podia fazer era mandar uma carta. Hoje há liberdade para falar e responder. O que não consigo entender é por que quem faz algo para chocar se incomoda com a reação dos impactados. Até porque, quando a piada é bem-feita, o efeito da reação é menor. O exemplo disso é a websérie do Porta dos Fundos sobre Aids. Por que os aidéticos não falam mal? Porque é divertido, mas não escarnece do doente. Istoé - O que acha dos bad boys do humor, como Rafinha Bastos e Danilo Gentili? Helio de la Peña - Tanto o Rafinha quanto o Gentili são figuras que têm um público enorme. Tem gente que gosta de fazer e tem gente que gosta de consumir esse tipo de humor. Não é o meu caso, nem um nem outro. Istoé - O ex-Casseta Claudio Manoel disse que vocês não tinham liberdade para parodiar propagandas e emissoras concorrentes, como o seriado “Tá no Ar”. Isso é verdade? Helio de la Peña - De fato, nas últimas temporadas do “Casseta”, a gente gostaria de ter esse espaço e não podíamos fazer isso. Mas esse programa é engraçado, acho que segue a mesma linha do nosso e do “TV Pirata” (1988-1990). Istoé - No seriado “A Segunda Dama”, seu personagem, Edmúcio, é chefe do tráfico do morro local e negro. Acredita que isso reforça estereótipos? Helio de la Peña - Ele é um bom personagem, não pensei “mais uma vez escolheram um negro para fazer papel de traficante”. Se o Edmúcio fosse um loiro iriam falar que o Brasil não era assim. Na verdade, somos um país de mestiços. Se você for em Bangu 1, a maior parte de presos é de mestiços, esse que é o estereótipo. Istoé - Algum traficante serviu de inspiração? Helio de la Peña - Os poderosos do crime de hoje gostam de andar na moda e não ficam superarmados, para isso servem os capangas. Sempre que uma figura é presa, vemos nos jornais seus sinais de riqueza. Sempre observei isso, por curiosidade. Não tenho contato nem amizade com ninguém do tráfico, mas é inevitável ver essas figuras no Rio. Istoé - Como avalia a política de pacificação do Rio de Janeiro? Helio de la Peña - Espero que não seja uma medida de governo, e sim uma política de Estado. Houve um avanço porque essas comunidades, hoje pacificadas, eram completamente dominadas pelo tráfico. Mas só uma ação policial não vai resolver a violência no Rio. Faltam outros aparelhos do Estado, como hospitais, escolas e material humano. Além disso, esses maus policiais prestam um grande serviço contra o processo de pacificação. 3# COLUNISTAS 14.5.14 3#1 RICARDO BOECHAT 3#2 LEONARDO ATTUCH - O DESAFIO DE EDUARDO CAMPOS 3#3 RICARDO AMORIM - UM PAÍS DE ANTÔNIOS 3#4 PAULO LIMA - OLHAR SUPERIOR 3#5 GISELE VITÓRIA 3#6 BRASIL CONFIDENCIAL 3#1 RICARDO BOECHAT Com Ronaldo Herdy Transplantes De coração A cena teve testemunhas e comoveu. Dois passageiros em voo lotado da Gol, que partia de Maringá (PR) na quinta-feira 1º, abriram mão de seus lugares para que uma equipe médica levasse um coração para um possível receptor em São Paulo. Agiram por amor. Nos quatro primeiros meses deste ano, 2.772 órgãos e tecidos foram transportados de graça pelas companhias aéreas – 20% a mais do que em 2013. Em tempo: o coração do início da nota foi implantado com sucesso. Política Nada decidido É quase unânime entre analistas políticos a certeza de que a campanha presidencial deste ano será difícil. Para Ricardo Guedes, do Instituto Sensus, Dilma Rousseff elegeu Aécio Neves como maior adversário, após exibição do incisivo programa do PSDB no horário eleitoral obrigatório. O setor elétrico, no qual a presidenta no passado mostrava pulso e conhecimento, é agora ameaça à sua reeleição, sobretudo se houver racionamento de água e cortes de energia. STJ É raro A partir de 11 de junho não haverá decisões colegiadas no Superior Tribunal de Justiça, por determinação do presidente da Corte, Felix Fischer. A medida vigora até julho, em função da Copa. Os ministros tomarão decisões monocráticas – cada um julga por si. Isso é comum em cortes de primeira instância, mas raro em tribunais superiores – daí a estranheza dos advogados. Legislativo Na pauta Para garantir a segurança de incapazes e crianças – como o menino Bernardo Uglione Boldrini, 11 anos, achado morto em um matagal no Rio Grande do Sul, assassinado com uma injeção letal –, o deputado federal Guilherme Mussi (PP-SP) apresentou projeto na segunda-feira 5, em Brasília, para o qual já busca apoio de lideranças de todos os partidos. Entre outras restrições, ele propõe a perda imediata dos direitos da guarda para quem esteja respondendo a processo por oferecer perigo a um menor ou à sociedade. Medicina Sem burocracia Audiência pública na terça-feira 13, na Câmara dos Deputados, discutirá “Os aspectos regulatórios e o tratamento de cânceres e tumores rápidos”. Luciana Holtz, presidente do Instituto Oncoguia, de São Paulo, defenderá “mais agilidade e transparência da Anvisa nos processos de aprovação de medicamentos de ponta para os pacientes brasileiros”. Trabalho Em impedimento Não será pacífica a tentativa de mudar a Lei Pelé, para permitir que um jogador de futebol vire técnico profissional, após pendurar as chuteiras, sem formação em educação física. O deputado federal José Rocha, que lidera movimento nesse sentido, ouviu em sessão da Comissão de Esporte, na segunda-feira 5, Vágner Mancini, treinador do Botafogo. “Ele é um que está ilegal na profissão”, acusa Jorge Steinhilber, presidente do Conselho Federal de Educação Física, crítico da mudança. Saúde Pública Chegou a hora Entra em vigor esta semana resolução (2.056/13) do Conselho Federal de Medicina que estabelece um check-list mínimo para qualquer unidade de saúde pública funcionar. As exigências vão da necessidade de pia, maca coberta com lençol e lixeira de pedal em um ambulatório até à existência de desfibrilador em clínica médica. Quem estiver fora do padrão, segundo o CFM, será interditado. Copa Vai bombar? Jérôme Valcke declarou na Suíça que viveu um “inferno” na organização da Copa do Mundo. Dias piores parecem vir, o que deixaria o secretário-geral da Fifa mais atarantado. Um grande instituto de pesquisa captou 65% de possibilidade de haver protestos no País durante o torneio. E isso antes de a Anistia Internacional lançar no mundo, na quinta-feira, 8, o movimento “Brasil, Chega de Bola Fora”, em prol do direito de liberdade de manifestação na Copa e contra a criminalização dos participantes. Infraestrutura Vitória do caos O futuro é sombrio para usuários do aeroporto Tom Jobim, no Rio de Janeiro. A Infraero não assinou o contrato de R$ 12,1 milhões com o consórcio Ideal/Global, vencedor da licitação para instalar 16 novos elevadores e oito plataformas de transporte de pessoas com deficiência física no aeroporto. O pregão foi em janeiro último. Sem o “ok” da estatal as obras estão no papel. Ou seja, na Copa do Mundo o quadro será o atual – filas imensas para usar poucos e obsoletos equipamentos. O prazo de dois anos para tudo ficar 100% avança, já comprometendo a mobilidade na Olimpíada. Entidades de classe Ação & reação O Ministério Público Federal notificou os dirigentes do Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte e do Serviço Social do Transporte Nacional no mês passado. Quer a revogação imediata do Ato Normativo 161/2012, que dificulta nas duas entidades a fiscalização da Controladoria-Geral da União e do TCU. Se a norma não cair, os procuradores da República moverão Ação Civil Pública contra o Senat e o Sest até o próximo mês. Energia Mão de obra ilegal Soma R$ 300 mil a condenação aplicada à Eletrobras pelo TRT da 10ª Região, que abrange Brasília. A estatal foi punida por contratar terceirizados – aliás, mal crescente no serviço público. O caso julgado envolve R$ 7,6 milhões em despesas com 90 secretárias executivas e 70 contínuos. Para os desembargadores, não importa se o grupo faz trabalho administrativo. Pela Constituição, ingresso em órgão público e estatais só por concurso. Nenhum contrato será renovado e fim de papo. Eleições 2014 Nas mãos dela Caso a presidenta Dilma Rousseff não consiga, no Ceará, fazer com que os Ferreira Gomes (o governador Cid e seu irmão Ciro) apoiem Eunício de Oliveira, pré-candidato ao governo do Estado, o senador seguirá caminho solo, levando mais uma banda do PMDB para outro destino: os braços de Eduardo Campos, de quem é amigo de longa data. Varejo Guerra de tevês Válida até 13 de julho, a campanha “Emoção em Dobro no Ar” alavancou as vendas de tevês Samsumg na Casas Bahia (compre uma de 60 polegadas e leve outra de 51 por R$ 1, se o Brasil ganhar a Copa). A Via Varejo diz que os aparelhos de tela grande (acima de 60) – antes 5% do total de tevês vendidas na Casas Bahia – agora batem 20%. A promoção também acirrou a guerra entre fabricantes: a partir de agora, em redes varejistas, a Sony dará um aparelho de 32 de graça para quem adquirir outro de 70. Aviação Civil A bordo Até o início de maio, 2,4 milhões de bilhetes foram vendidos em voos destinados às cidades-sedes da Copa do Mundo – de 6 de junho a 16 de julho. A tendência é de crescimento ao longo das próximas semanas, diz a Anac. Contudo, nenhuma autoridade do setor aéreo arrisca prever que todos os assentos disponibilizados para o período serão negociados (11,5 milhões). Em outras palavras, 25% das poltronas hoje têm dono. Esporte Eterno... E moderno No embalo da Copa, “Pelé Eterno” será oferecido em 80 países, em quatro idiomas, no iTunes. O próprio rei lançará a novidade, na quinta-feira 15, na loja da Apple no Shopping Village Mall, na Barra da Tijuca. Em relação ao filme produzido em 2004, a versão digital de agora está mais enxuta, mas sem perder a essência que levou Pelé a considerar o longa “a bíblia de minha vida”, segundo o produtor Aníbal Massaini. 3#2 LEONARDO ATTUCH - O DESAFIO DE EDUARDO CAMPOS É impossível estar à direita de Aécio e à esquerda de Dilma ao mesmo tempo. A fórmula deve mudar. Pressionado pelas pesquisas que o apontam distante de um eventual segundo turno o ex-governador pernambucano Eduardo Campos, pela primeira vez, sinalizou ao eleitor que o senador Aécio Neves (PSDB-MG) é antes um adversário – e não um aliado – no esforço comum de destronar o PT. Campos primeiro disse estar “à esquerda” de Aécio e, em seguida, endossou a crítica de sua vice, Marina Silva, que afirmou que o PSDB tem “cheiro de derrota” no segundo turno. Por fim, afirmou que tem mais capacidade de unir o País do que o tucano. O estar “mais à esquerda” seria explicado, segundo Campos, pelas origens dos dois candidatos. Ele, neto de Miguel Arraes, entusiasta das Ligas Camponesas e perseguido pela ditadura; Aécio, neto de Tancredo, um conciliador nato, que conseguiu se equilibrar em momentos antagônicos da vida política brasileira. Ocorre que, ao eleitor, interessa mais as atitudes do que a história. E ao propor pontos como a meta de inflação de 3% ao ano e a autonomia do BC e também não desmentir o rumor de que o banqueiro Roberto Setubal, do Itaú Unibanco, seria seu ministro da Fazenda, Campos sinalizou estar à direita – e não à esquerda de Aécio. Tentou se vender ao chamado mercado como um personagem mais ortodoxo do que o rival. Ao mesmo tempo, no que diz respeito ao social, ele tem adotado a linha de que “é possível fazer mais”. Numa entrevista a uma rádio mineira, prometeu ampliar o Bolsa Família. O ponto é que é impossível estar à direita de Aécio e à esquerda de Dilma ao mesmo tempo. A conta não fecha, como, aliás, foi notado por Dilma. Ela lembrou que trazer a inflação a 3% seria uma medida recessiva, que exigiria juros altíssimos, elevaria o desemprego a 8,2% e, reduziria a margem de manobra para gastos sociais. Isso não significa que Campos não tenha condições de crescer. Mas o espaço que ele deve ocupar no imaginário deve ser o do novo. Dos três principais candidatos, foi ele quem produziu o fato mais importante da pré-campanha, ao laçar Marina Silva. Mas a presença da ex-senadora não cai bem nos salões empresariais que Campos frequenta e o discurso do socialista aos figurões da economia também afugenta os marineiros. O casamento, até agora, subtraiu mais do que somou. Caberia à dupla tentar encarnar o sentimento dos brasileiros que foram às ruas em junho, incomodados com a má qualidade de serviços públicos e a captura do País pela agenda das grandes empreiteiras – que, coincidentemente, foram o alvo de manifestações na última semana. Em vez de tentar conquistar os corações dos ricos, com mais juros, e as mentes do povão, com mais Bolsa Família, Campos só tem um caminho: o de tentar convencer o eleitor de que é capaz de entregar um Estado mais eficiente. Uma agenda que interessa a todos, insatisfeitos com o fato de um país próspero como o Brasil ainda oferecer serviços públicos tão precários. 3#3 RICARDO AMORIM - UM PAÍS DE ANTÔNIOS Economista, apresentador do "Manhattan Connection" (Globo News) e presidente da Ricam Consultoria (www.ricamconsultoria.com.br) "Com crédito farto, mas com conhecimentos financeiros limitados, muitos se endividaram além das suas possibilidades". Antônio Belo é um cara bem-sucedido. Aos 34 anos, ocupa um cargo de alta gerência em uma multinacional, tem prestígio e um bom salário. Com isso, conseguiu financiamento para comprar um bom apartamento e um carro bacana, que são muito desfrutados. Infelizmente, além das dívidas dos financiamentos do apartamento e do carro, Antônio deve no cartão de crédito e no cheque especial e não sabe nem o tamanho das dívidas, nem quanto paga de juros. Pessoas como Antônio, que mesmo ganhando bem estão atoladas em dívidas, são raras, certo? Infelizmente, não. Uma pesquisa exclusiva – com 1.555 brasileiros entre 18 e 60 anos das classes A, B e C em 255 municípios – da minha empresa, a Ricam Consultoria, em parceria com a Ilumeo, descobriu que os Antônios são a regra, não a exceção. Mais importante, ela aponta a principal causa de o Brasil ter se tornado um país de Antônios: o analfabetismo financeiro. O mau desempenho da educação no Brasil não é novidade para ninguém, porém um aspecto importante costuma ser relevado. Falta ensino sistemático em finanças pessoais desde nosso ensino básico. Nunca chegamos a aplicar em nossas vidas a maior parte do que aprendemos na escola, mas não aprendemos ou aprendemos mal algo que usaremos em toda a vida: finanças pessoais. No Brasil da hiperinflação, as opções na vida financeira das pessoas eram limitadas e os horizontes, curtos. Todos sabiam exatamente o que fazer com o dinheiro. Assim que você recebia o salário, você comprava tudo que precisava porque já no dia seguinte tudo estaria mais caro e no final do mês, talvez, você só pudesse comprar metade do que comprou no dia 1º. Praticamente não havia oferta de crédito. Portanto, ninguém poderia se endividar, nem que quisesse. As opções de investimento também eram limitadas e de curtíssimo prazo, lideradas pelo overnight – investimentos em renda fixa renovados diariamente. Há 20 anos, a hiperinflação ficou para trás e a realidade financeira no País mudou radicalmente. Acesso a crédito deixou de ser um problema, permitindo que dezenas de milhões de brasileiros comprassem produtos e serviços que antes só faziam parte dos seus sonhos. Por outro lado, com crédito farto, mas com conhecimentos financeiros limitados, muitos se endividaram além das suas possibilidades. Segundo dados da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), hoje duas em cada três famílias brasileiras têm dívidas. Mais grave, a pesquisa Ricam-Ilumeo indicou que dos que devem no cheque especial, por exemplo, sete em cada dez não sabem quanto pagam de juros e um em cada três não tem nenhum tipo de planejamento em relação a em quanto tempo pretende pagar as dívidas. Eu não conheço ninguém que compre um produto sem nem saber quanto custa, mas a maioria das pessoas faz exatamente isso quando se endivida. Apenas um em cada três brasileiros anota e controla seus gastos. Se o quadro é preocupante com relação a gastos e endividamento, não é melhor em relação a poupança e investimentos – 43% dos pesquisados nunca ouviram nenhuma dica ou orientação financeira. Apenas 12% já investiram em previdência privada. Em um país em que a solvência da previdência pública daqui a algumas décadas está longe de ser garantida, não planejar a aposentadoria pode custar muito caro. Pior, apenas 3% já investiram em ações, contra 64% que já investiram na caderneta de poupança. Infelizmente, em períodos longos de tempo, a segurança da caderneta de poupança acaba custando muito caro. Tanto nos últimos dez anos quanto nos últimos 20 anos, a rentabilidade da poupança ficou para trás da dos títulos públicos, dos CDBs, da bolsa, dos imóveis e do ouro. Felizmente, cada vez mais, instituições financeiras, como bancos e corretoras, e empresas em geral investem na capacitação financeira de clientes e funcionários. Bancos, por exemplo, não têm interesse em que as pessoas se endividem além do que podem pagar, pois, nesse caso, acabarão levando calotes. Para as empresas, funcionários com problemas financeiros são muito menos produtivos porque sua atenção não está no trabalho. O que nossa pesquisa sugere é que o trabalho de alfabetização financeira de nossos Antônios é cada vez mais urgente e importante. 3#4 PAULO LIMA - OLHAR SUPERIOR Paulo Lima é fundador da editora e da revista Trip Ovos de Páscoa vencidos largados num depósito a céu aberto? Carcaças de cocos verdes abandonadas depois de um domingo de sol em Copacabana? Que diabo é isso afinal?. Seria um amontoado de capacetes solitários rejeitados por hordas de motoboys? Ou um bando de leguminosas mutantes em estado de decomposição? (sim, houve quem achasse se tratar de repolhos). “Na maioria das vezes, vendo esta imagem, as pessoas levam um tempo para perceber do que se trata”, conta, rindo, Cássio Vasconcellos, o autor da foto. E foi intencional – ele clicou esse “cemitério de orelhões” com ângulo fechado para gerar esse estranhamento. A imagem é uma das muitas fotos aéreas originais e belíssimas que o artista paulistano vem elaborando desde que juntou duas paixões: a fotografia e a aviação, especialmente os helicópteros, que inclusive pilota. “É impressionante como voando encontro agrupamentos de objetos sucateados: grupos de carros incendiados, só kombis, carros de bombeiros, carros de polícia. Esse cemitério de orelhões eu encontrei por acaso, não tenho ideia do que será feito com eles.” Do tipo raro dos que falam menos e produzem mais, Cássio Vasconcellos é um dos grandes artistas brasileiros contemporâneos. Ele vem construindo sua obra desde os 15 anos, quando se apaixonou pela fotografia ao pegar a câmera de seu pai durante uma viagem. A partir daí, dedicou-se com obstinação a essa arte que, na época, apanhava para ser reconhecida como tal. Sua primeira série, “Chaminés”, de 1985, foi feita quando aos 20 anos foi para Nova York e passou cinco meses fotografando a cidade. Desde então, para cada série a técnica pode mudar, variando de sofisticados softwares a pinceladas de produtos químicos sobre as ampliações, mas é sempre usada a serviço da poesia que cada imagem possa revelar. Vídeos inquietantes fotografados por Polaroid (série Rostos – 1990) ou polaroides de vistas noturnas de cidades como São Paulo, que acabaram resultando no livro “Noturnos – São Paulo”, são só alguns dos brilhantes exemplos. Ao longo destes quase 30 anos de carreira, Cássio vem também ajudando a formar e profissionalizar o mercado da arte da fotografia no Brasil. Além de autor respeitado e valorizado, é sócio da galeria Fotospot. No dia 17 de maio, seu terceiro livro,“Aéreas do Brasil” (BE? Editora), será lançado na abertura da exposição homônima, no Paço das Artes (Av. da Universidade 1, Cidade Universitária – USP). 3#5 GISELE VITÓRIA Gisele Vitória é jornalista, diretora de núcleo das revistas ISTOÉ Gente, ISTOÉ Platinum e Menu e colunista de ISTOÉ De volta às novelas Após sete anos afastada da tevê, Letícia Birkheuer prepara sua volta às novelas. A atriz já está confirmada no elenco da próxima novela das nove da Globo, “Falso Brilhante”, que substituirá “Em Família”. “Já está tudo certo. Fiquei feliz com o convite do Aguinaldo Silva. Esse personagem é um presente”, diz Letícia. Nesse intervalo cabalístico, Letícia foi casada e teve um filho com o joalheiro Alexandre Furmanovitch. Ela dará vida à jornalista Érika, coincidentemente o mesmo nome de sua personagem de estreia como atriz, em “Belíssima”, em 2006. “Por enquanto estou estudando com a coach Andréia Cavalcanti e já fiz alguns laboratórios. Mas preciso me preparar bastante”, diz. Letícia está na fase de workshops e passou um dia na redação de uma revista. “Foi muito interessante estar do outro lado e observar o dia a dia de alguns jornalistas e editores.” “Me sinto debutante” A primeira Flip ninguém esquece. Nesse clima, Fernanda Torres estreia na Festa Literária de Paraty. Lá, a autora do romance “Fim” lança um livro de crônicas. À coluna, ela fala sobre a expectativa desta sua primeira vez: ISTOÉ – Como será esta estreia? Fernanda – Me sinto um pouco debutante. Estou revivendo a sensação que tive aos 17 anos, com o cinema, quando fui apresentada ao circuito dos festivais. ISTOÉ – Já esteve na Flip? Fernanda – Sempre quis ir, mas nunca fui. Jamais pensei que desencantaria a vontade não só como ouvinte, ou curiosa, mas para lançar um livro de crônicas depois de ter publicado um romance. E a Flip deste ano é dedicada a Millôr Fernandes, grande amigo dos meus pais, com quem convivi desde criança. A coincidência tem um significado simbólico para mim. ISTOÉ – Millôr leu seus textos? Fernanda – Millôr gostou de alguns dos artigos que escrevi, mas faleceu antes do meu “Fim”. Gostaria que ele tivesse lido. Tem muito dele ali. Vai ser bom estar na companhia do gênio do Méier, pela primeira vez, em Paraty. No baile, no cinema e em família O casal Sean Penn e Charlize Theron foi o centro das atenções no Baile de gala do MET 2014, em Nova York. Recém-assumidos, Penn e Charlize chegaram de mãos dadas ao red carpet. Vinham de um encontro das famílias em Malibu. Um brunch reuniu a mãe do ator, Eileen Ryan, a mãe da atriz, Gerda Maqritz, e o pequeno Jackson, filho adotivo da atriz. Segundo o jornal britânico “The Mirror”, o casal namora há quatro meses, mas já divide o mesmo teto e pensa em casamento. O ator cogitaria adotar o filho da loira. Andam tão grudados que decidiram ainda trabalhar juntos: Charlize será estrela do próximo filme que Penn vai dirigir: “The Last Face”, drama filmado na África, e que terá Javier Bardem no elenco. Balas Qual é a música Em discurso pró-Brasil no Fórum de Comandatuba do Lide, Abilio Diniz confundiu a plateia ao atribuir aos Beatles a autoria de “We Are the Champions”, lendário sucesso do Queen, de Freddie Mercury. “Ele entende tudo de supermercado e nada de música”, brincou um empresário. Pulinhos no karaokê No mesmo evento, Indio da Costa, vice de Serra na campanha presidencial de 2010, soltou a voz a ponto de dar pulinhos num dueto de karaokê com Daniela Mercury. A cantora preferiu não acompanhar o tom Pavarotti do político entoado na música “Eva”. Chile e Argentina amam “Morena” Nanda Costa filma em Chicago o longa “Love Film Festival”. Volta em breve ao horário nobre da Globo, na novela “Falso Brilhante”, de Aguinaldo Silva. E está no ar na série “O Caçador”, suspense no qual contracena com Cauã Reymond. Mas é por Morena, sua personagem na novela “Salve Jorge”, que Nanda é parada nos aeroportos internacionais. A novela, que enfrentou problemas no País após o fenômeno de “Avenida Brasil”, é sucesso no Chile e na Argentina. Nesses países, a novela tem tanta audiência quanto “Avenida Brasil”. “Outro dia estava em um aeroporto em Nova York e um grupo de chilenas animadíssimas veio falar comigo. Na verdade, com a Morena”, conta. Beijo e não me liga! Fernando Meirelles não usa celular. “Preciso estar desconectado para trabalhar”, diz. Mas o cineasta aguarda e-mails para fechar a agenda do elenco de seu filme “Nêmesis”, produção europeia da Pathe Filmes. A polêmica com os Keneddy o fez perder distribuidores e atores americanos em 2013. O filme baseia-se no livro “The True Story of Aristotle Onassis, Jackie O, and the Love Triangle That Brought Down the Kennedys”. Enquanto isso, o diretor segue com outros projetos, como a minisérie “Os Experientes”, para a Globo. Tudo tocado de casa. Ele é adepto do home office e não tem sala na produtora O2. 3#6 BRASIL CONFIDENCIAL Por Paulo Moreira Leite Um teste com erros demais no Itamaraty Participantes do concurso de ingresso à carreira diplomática no Itamaraty desconfiam que o excesso de erros em provas realizadas no mês passado seja mais do que simples coincidência. Dez questões foram anuladas por serem inconsistentes e sete tiveram o gabarito alterado por serem de redação confusa. A prova teve ainda questões de economia e direito que não constavam nas matérias previstas no edital. A confusão representa sete pontos numa prova em que a diferença entre o primeiro e o centésimo colocado foi de seis pontos. Pedágio de mala Na semana passada, três famílias que chegaram dos Estados Unidos pelo aeroporto de Brasília foram surpreendidas com uma proposta dos fiscais de alfândega da Receita Federal. Eles cobraram R$ 500 por mala para que a bagagem não fosse aberta. Como todos aceitaram pagar, não houve denúncia formal. Bicadas tucanas O senador Aécio ­Neves tem defendido o nome do colega Aloysio Nunes como seu vice na chapa que disputará a Presidência da República. No PSDB, o nome de José Serra parece ter mesmo a preferência do deputado baiano Jutahy Magalhães. Os aliados de Aécio espalham que, se virar vice, Serra passará a conspirar para se tornar o titular. Canal direto O vice-presidente, Michel Temer, tem sido preterido por Dilma no diálogo com o PMDB. A presidenta prefere falar diretamente com Eunício Oliveira, Eduardo Braga e Renan Calheiros. Confia mais neles para acalmar os ânimos de Henrique Alves e Eduardo Cunha na Câmara. Alves, aliás, rompeu compromisso com o Palácio do Planalto ao aprovar o piso dos agentes de saúde. Dilma ficou uma fera. Índios bombeiros O Ibama contratou quase 700 índios para atuar como bombeiros nas regiões de florestas. Este ano, serão dados 25 cursos de capacitação a outros 1.250 indígenas nos Estados do Amazonas, Rondônia, Pará, Maranhão, Mato Grosso, Tocantins e Mato Grosso do Sul. A ideia é formar brigadas para atuar nas regiões mais críticas do País no período da seca, quando há maior risco de incêndio florestal. Simulador em debate Quem defende o uso de simuladores em autoescolas alega que o equipamento não tem apenas um, mas quatro fornecedores. O Cade já analisou a questão e decidiu que não existe cartel. Onde o simulador já está em uso, como Rio Grande do Sul e Acre, o desempenho dos alunos nas aulas práticas tem melhorado com impacto direto na redução do custo do processo para conseguir a habilitação. Em outros países, alunos que fizeram treinamento no simulador mostraram índice mais baixo de acidentes nos cinco primeiros anos de direção. Mantendo distância O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, respondeu com um enfático “não, obrigado!” à oferta de apoio à sua reeleição feita pelo ex-prefeito Gilberto Kassab (PSD). O tucano não esqueceu a derrota que lhe foi impingida por Kassab em parceria com José Serra em 2008. A frota de Youssef A Polícia Federal suspeita que o doleiro Alberto Youssef mantém uma frota de aeronaves em nome de parentes. Seu sobrinho Kalil Youssef Youssef tem registrado em seu nome o avião prefixo PP BPH, de Londrina. No nome de Alan Augustus Youssef Soloviov está o prefixo PT DRJ, operado pela Seven Táxi Aéreo Ltda., do Paraná. Toma lá dá cá O deputado Rogério Carvalho (PT-SE) foi relator do programa Mais Médicos aprovado pelo Congresso. ISTOÉ – A população gosta do programa, mas a aprovação popular caiu... ROGÉRIO – A aprovação, antes, era da novidade, de quem não tinha nada e agora tem alguma coisa. O primeiro atendimento melhorou muito no País inteiro. Mas quem conseguiu alguma coisa quer mais. É normal. ISTOÉ – O que falta? ROGÉRIO – Faltam médicos, para começar. Temos 12.800 vagas nas faculdades e é preciso que essas pessoas se formem e comecem a trabalhar. Isso vai ocorrer em cinco anos. Mas a mudança para um sistema de saúde pública universal, que a classe média possa utilizar, pode levar dez. ISTOÉ – Por quê? ROGÉRIO – Gastamos R$ 900 reais/ano por habitante e queremos uma saúde europeia, em que o Estado gasta pelo menos R$ 6 mil. Mas também falta gestão. Ainda não entendemos que é possível gastar R$ 2 bilhões com gestão e ganhar R$ 5 bilhões. É um debate que a sociedade não compreendeu e quando ouve falar em verba para saúde pública acha que é desvio e vai perder dinheiro. Rápidas Ficou perdido entre o Planalto e o Ministério do Meio Ambiente o troféu pela pior ideia do mês: deixar a presidenta ir até Uberaba assinar um decreto de preservação ambiental numa exposição de gado zebu. O senador Blairo Maggi (PR-MT), além de querer tirar da senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) a presidência da CNA, propôs ao Planalto manter o ministro Neri Geller em 2015, seu afilhado político. Fechado o acordo, Maggi é candidato a governador de Mato Grosso. Cordão de isolamento A ideia da presidenta Dilma Rousseff de isolar áreas próximas aos eventos da Copa do Mundo para evitar protestos está levando organizações não governamentais a organizar atos em defesa da livre manifestação. O plano é entregar um imenso abaixo-assinado às vésperas do pontapé inicial. Retrato falado Sem verem atendidas suas reivindicações trabalhistas, os funcionários locais de postos diplomáticos brasileiros na Europa e na América do Norte prometem paralisar suas atividades nos dias 13 e 14. A presidente da Associação dos Funcionários Locais do MRE (Aflex), Claudia Rajecki, cobra resposta do chanceler Luiz Alberto Figueiredo à aprovação do PL 246, à criação de políticas salariais e ao fim da perseguição e do assédio moral. A degradação do ambiente de trabalho no Exterior chegou ao limite, com a agressão física a uma funcionária do consulado-geral em Atlanta. “Não merecemos ser humilhados. O Itamaraty deveria ser a casa do diálogo, mas ergueu um muro segregador”. Todos os bancos A Seven Táxi Aéreo recorreu à Justiça contra o Banco Central por ter perdido R$ 75 milhões em CDB feitos junto ao falido Banco Santos. Na ação, a Seven é acompanhada de seu proprietário, Oswaldo Pitol, presidente do Bancoob (Banco Cooperativo do Brasil) e da Wellborn Participações, que em 2009 comprou da Embraer um jato executivo Phenom 100 por US$ 3,65 milhões. Na tradução do inglês, Wellborn significa “bem nascido”. Anedotas do Planalto As queixas ao estilo durão de Dilma são conhecidas, mas pouca gente sabe que a presidenta parava reuniões do PAC para reclamar das apresentações de ministros que usavam gráficos com muitas cores ou letras com tamanhos diferentes. Quando estava de dieta, também pedia uma pausa para o lanche, uma omelete que era trazida pelo assessor Anderson Dornelles. 4# REPORTAGEM ESPECIAL 14.5.14 UM BRASILEIRO NO CORAÇÃO DAS TREVAS A dura missão do general Carlos Alberto dos Santos Cruz, comandante da mais importante operação da ONU no mundo. Ele tem a tarefa de dar fim ao maior conflito armado desde a Segunda Guerra Mundial, com quase seis milhões de mortos Por Yan Boechat (yan@istoe.com.br) (textos e fotos), enviado especial ao Congo As primeiras horas da manhã da quinta-feira 17 de abril estavam especialmente quentes na densa floresta que serve de fronteira natural entre a República Democrática do Congo e Uganda. Antes de se embrenhar pela vereda de terra entre as árvores, o general Carlos Alberto dos Santos Cruz retirou o colete à prova de balas e o capacete. “Se algo acontecer, é preciso ser ágil”, explicou. “O caminho é perigoso, as emboscadas são comuns.” O general tinha usado esse equipamento de mais de 15 quilos, capaz de segurar balas de fuzil AK-47, durante todo o trajeto de 40 quilômetros entre o batalhão da ONU na cidade de Beni e a trilha que o levaria a uma base rebelde conquistada pelo Exército congolês uma semana antes. Santos Cruz vestia a farda camuflada das Forças Armadas brasileiras. No ombro esquerdo, a bandeira do Brasil. No direito, a palavra “comandos”, que em todo o mundo militar carrega o mesmo significado: ali está um soldado das tropas de elite, um cara durão, preparado para sobreviver na adversidade. Três pequenas estrelas costuradas nas pontas do colarinho o distinguem como um general de divisão. Além do FAL, o fuzil usado pelo Exército brasileiro há quase três décadas, Santos Cruz levava uma pistola Glock 9mm no coldre colado à coxa direita. À medida que avançava, o acesso no terreno úmido da floresta tropical a poucos quilômetros ao sul da linha do Equador ia se estreitando. O sol logo desapareceu sob a copa das árvores. Santos Cruz teve a sensação de que estava na Amazônia. “É igual ao Brasil, não muda nada”, disse. Na longa marcha até a principal base conquistada do grupo inimigo, a paisagem dava ideia de como havia sido o combate: troncos perfurados por tiros, árvores derrubadas pelo impacto das RPGs, o chão coberto por um tapete metálico de cápsulas deflagradas. Cartazes escritos à mão indicavam a localização de minas e explosivos. Um pouco mais adiante, covas rasas ao lado da trilha ainda exalavam o cheiro forte dos corpos recém-enterrados pelos vencedores. “Muitos foram queimados, outros enterramos aqui mesmo, é menos trabalho”, explicou um soldado congolês ao lado do amontoado de terra fofa onde as moscas tentavam encontrar caminho para chegar aos restos putrefatos dos inimigos. Foram três horas de uma caminhada tensa. Com os rebeldes ainda a poucos quilômetros dali, o risco de uma emboscada não recomendava pausas para descanso. A tropa só parou ao chegar a Medina, um vilarejo improvisado no meio da floresta que o grupo radical islâmico ADF usava como uma de suas maiores bases no Congo. Logo começaram a surgir da floresta centenas de soldados. Sujos e cansados, carregando colares de munição e armamento pesado, eles saudavam Santos Cruz. Pela primeira vez, viam naquele front de batalha um militar tão graduado da ONU. O general brasileiro apertou a mão dos oficiais que combateram os rebeldes islâmicos. Aos soldados, distribuiu cigarros congoleses baratos, comprados a US$ 1 o maço. “Force Commander” No Congo, a patente de Santos Cruz importa menos que seu cargo na hierarquia militar da ONU. Ele é o comandante-geral da Monusco, a maior e mais importante missão das Nações Unidas no mundo, com um contingente de mais de 22 mil homens de 20 diferentes países e orçamento anual de quase US$ 1,5 bilhão. É uma missão histórica, em que o conceito de manutenção da paz foi alterado para imposição da paz. Não se trata apenas de semântica. Os capacetes azuis, pela primeira vez desde 1948, têm autorização para caçar, prender e matar aqueles que o Conselho de Segurança considerar inimigos. Na prática, isso significa que os soldados das Nações Unidas podem dar o primeiro tiro, tornando-se, assim, uma força de agressão – a primeira desde a criação da organização. O militar brasileiro foi indicado e responde ao secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, e ao Conselho de Segurança. No Congo, ele divide o comando da missão com um representante civil, o alemão Martin Kobler. São os dois que têm, ao menos oficialmente, a última palavra em qualquer decisão, militar e civil. A guerra no Congo dura quase 20 anos e já deixou cerca de 5,5 milhões de pessoas mortas. Nenhum outro conflito armado matou tantos seres humanos desde a Segunda Guerra Mundial. Apesar de ser o primeiro brasileiro a comandar forças militares de agressão desde a campanha da FEB na Itália, um ano e pouco atrás, em Brasília, onde mora, Santos Cruz estava mais preocupado com caminhões-pipa no Nordeste brasileiro do que com guerrilheiros africanos. O general foi compulsoriamente para a reserva em 2012, ao ser preterido para ascender à patente de general de exército. Com a carreira militar encerrada, trabalhava na divisão militar da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, em Brasília, cuidando de assuntos como a participação do Exército na distribuição de água potável em regiões afetadas pela seca. “Eu havia abandonado a farda, estava lá, engravatado, num gabinete da Esplanada, quando recebi, em março de 2013, uma ligação de Nova York”, contou ele à ISTOÉ no mês passado, enquanto comia com as mãos uma coxa de galinha frita na cantina do quartel-general da ONU em Goma, a capital da província do Kivu do Norte, onde estão concentrados 95% dos capacetes azuis no país. “Foi uma surpresa , mas não demorei três segundos para aceitar aquele convite inesperado.” ATIVO - Santos Cruz viaja pelo menos três vezes por semana a regiões isoladas do leste do Congo; em casa, gosta de assistir aos telejornais da rede de tevê Al Jazeera Santos Cruz é um homem que ri pouco. Natural da cidade de Rio Grande, no litoral gaúcho, o general aparenta ter bem menos que os 62 anos que vai completar no dia 1º de junho. Mantém seus 74 quilos com uma rotina de atleta. Corre dez quilômetros, dia sim, dia não, e segue um programa rígido de exercícios físicos. O sotaque forte dos gaúchos se foi faz tempo, assim como o hábito de tomar chimarrão. O militar deixou o Rio Grande do Sul aos 15 anos, quando foi aceito na Escola Preparatória de Cadetes do Exército, em Campinas, em 1968. “O que ficou foi a paixão pelo Internacional de Porto Alegre”, diz ele. Toda vez que seu time vence o Grêmio, Santos Cruz liga para um irmão torcedor do rival. Em Goma, o general brasileiro vive em uma confortável casa de dois quartos, próxima do quartel-general da ONU, que divide com um alto funcionário civil das Nações Unidas. Dois brasileiros fazem a escolta pessoal do general e um grupo de seis soldados das forças especiais uruguaias, equipados com fuzis FAL e uma caminhonete com uma metralhadora Mag instalada na carroceria, completam o time da segurança. Se ele está em casa, os uruguaios fazem patrulha em frente ao seu portão. Se ele se desloca, lá estão os mesmos soldados cercando seu veículo. O general não dá um passo sem que ao menos oito homens estejam acompanhando seus movimentos. Carlos Alberto dos Santos Cruz, casado, três filhos e avô de um menino, fez uma carreira típica no Exército brasileiro. Poucos anos depois de graduar-se na Academia Militar das Agulhas Negras, em 1974, seguiu para o que parece ser a obsessão dos militares nacionais: a Amazônia. Lá se tornou um especialista em guerra na selva. Nas duas décadas seguintes, sempre esteve, de uma forma ou de outra, próximo da floresta. Comandou pelotões de fronteira na região Norte e um batalhão de infantaria em Mato Grosso. Não à toa, dos seis brasileiros que lhe prestam assistência direta no Congo, quatro são especialistas em guerra na selva ou têm experiência na Amazônia. Agressividade A grande virada na carreira do general veio em 2006, quando foi apontado como o chefe militar da missão da ONU no Haiti. Foi por conta de sua ação enérgica na tomada da favela Cité Soleil, um enclave de criminosos em Porto Príncipe, a capital do país, que o general brasileiro chamou a atenção dos burocratas das Nações Unidas. Quase 40 dias de batalha – com baixas civis duramente criticadas por organizações humanitárias – garantiram a tomada do local pelas tropas da Minustah, majoritariamente brasileiras. Ao final do período em que liderou a missão, a ONU pediu ao Brasil que mantivesse Santos Cruz no comando da operação por pelo menos mais um ano. O Exército, no entanto, recusou o pedido e o general gaúcho retornou ao País. “A atitude agressiva e a determinação em agir e correr riscos foram determinantes para que seu nome fosse lembrado em Nova York. Ele está aqui no Congo por causa do Haiti e não pela influência política do Brasil no Conselho de Segurança”, diz um experiente analista de inteligência das Nações Unidas. No amplo complexo militar e civil que a ONU montou em Goma para ser o quartel-general de sua missão no Congo, Santos Cruz é um dos poucos oficiais a andar armado o tempo todo. A pistola 9mm sempre está ao alcance da mão e, por onde se desloca, carrega o fuzil FAL de fabricação argentina que pegou emprestado do batalhão uruguaio instalado na cidade. Mesmo em seu escritório – uma sala simples, de cerca de seis metros quadrados, instalada em um contêiner –, invariavelmente o fuzil está encostado na parede, ao lado de sua cadeira. “Ele gosta de manter essa imagem, mostrando aos soldados que, mais que um general, é um soldado como todos eles”, diz o major Pethias Mdoka, do Exército Malaui, que atuou diretamente com o brasileiro no último ano. Santos Cruz chegou ao Congo em julho de 2013, num momento de fragilidade da missão. Após quase 15 anos atuando no país, a ONU tinha sofrido sua maior derrota e humilhação havia poucos meses. Em novembro de 2012 um grupo rebelde supostamente financiado por Uganda, o M23, derrotou o Exército congolês, invadiu Goma e forçou os capacetes azuis a se refugiarem nos quartéis, deixando a população civil à mercê dos invasores. Foi a partir dessa derrota que as Nações Unidas decidiram criar uma força especial de ataque, a Force Intervention Brigade (FIB), e dar carta branca para o ataque. Santos Cruz recebeu a missão de expulsar o M23 de Goma, retomar a cidade e reconquistar a confiança da população e da comunidade internacional na ONU. A grande batalha Na longa planície que liga Goma ao vilarejo de Kibati, o primeiro foguete disparado por um lançador Katiuscha de fabricação russa caiu cerca de 400 metros abaixo da trincheira escavada no topo do pequeno morro em que Santos Cruz observava a movimentação das tropas. O segundo, 400 metros atrás. “Foi uma ação típica de ajuste de tiro da artilharia. Eles sabiam que estávamos lá e tentavam nos acertar”, contou o general. A terceira explosão aconteceu a menos de 30 metros. Deitados na trincheira, os militares puderam ouvir os estilhaços voando sobre suas cabeças. Em seguida, o M23 passou a atingir a periferia de Goma, logo atrás da elevação onde estava Santos Cruz. “Foi naquele momento que decidi atacar e ordenei que nossos helicópteros e nossa artilharia abrissem fogo contra eles.” Naquela tarde do dia 21 de agosto de 2013, pela primeira vez na história, a ONU abandonou sua política de isenção e neutralidade e partiu para o ataque, apoiando o Exército congolês tanto com artilharia e fogo aéreo quanto com homens no solo. “Foi uma batalha intensa, com centenas de mortos e com características muito semelhantes àquelas da Segunda Guerra Mundial”, disse o general. Da trincheira, observando o avanço das tropas e os disparos de artilharia, vieram-lhe à cabeça velhos filmes da Segunda Guerra. “E de repente eu estava lá, como um dos personagens, participando daquele filme”, contou ele. Logo no primeiro dia de combate, com foguetes e morteiros explodindo a poucos metros da base de comando, Santos Cruz começou a forjar a imagem do general que gosta de estar no campo de batalha. “Ele mostrou que não é um político, que não aceita ficar no escritório e trata os soldados de igual para igual”, disse à ISTOÉ o general tanzaniano James Mwakibolwa, que atuou na defesa de Goma. Ao longo de toda a campanha contra o M23, o general brasileiro esteve no front. Hoje, ao menos três vezes por semana, vai de helicóptero às áreas mais remotas do leste do Congo para ver de perto como estão sendo conduzidas as operações contra as dezenas de grupos armados que permanecem ativos na região. Para muitos na ONU, Santos Cruz se expõe em excesso. “Esse não é o papel de um general, de um ‘force comander’. Ele é um alvo muito valioso e parece fazer isso apenas para criar uma imagem de durão”, critica um oficial indiano. Já Santos Cruz tem uma explicação mais singela. “Eu poderia dizer que vou ao front por questões estratégicas, para incentivar meus homens ou mesmo para dar a impressão à população local de que a ONU se importa com ela”, disse o general pouco antes de embarcar em um helicóptero Orix a caminho de uma vila atacada em meados de abril por um grupo rebelde. “Tudo isso é verdade, mas o que me leva mesmo ao front é o fato de que eu gosto muito de estar lá, de estar perto dos soldados. Eles me dão coragem e me rejuvenescem.” A batalha de Goma durou sete dias e forçou o M23 a recuar. A cidade estava liberada e em dois meses o grupo rebelde financiado por Uganda, um dos mais bem armados da região, foi derrotado. “Santos Cruz chegou ao Congo com uma atitude absolutamente distinta da de todos os outros comandantes que estiveram por lá na última década, uma atitude muito proativa. É claro que essa não é a solução para todos os problemas, mas, sem dúvida, trouxe mudanças”, diz Jason Stearns, autor do aclamado “Dancing in the Glory of Monsters: The Collapse of the Congo and the Great War of Africa” (Dançando pelos Monstros: o Colapso do Congo e a Grande Guerra da África), ainda não publicado no Brasil. A guerra do Congo é um conflito complexo, com muitos atores e interesses econômicos e geopolíticos variados. Seu início tem raízes no genocídio perpetrado pela etnia hutu contra os tutsis, em Ruanda, há 20 anos. A matança desestabilizou toda a região dos Grandes Lagos Africanos, no centro do continente, e dragou para a guerra seis países – Ruanda e Uganda, de um lado, e Congo, Tanzânia, Zimbábue e Angola, do outro. O Congo foi o palco de todas as batalhas do que ficou conhecido como a Grande Guerra Africana. Oficialmente, o conflito terminou com um acordo de paz em 2002. Com o país destruído, com a absoluta ausência do Estado e uma diversidade de riquezas em uma vasta área sem controle e lei, dezenas de grupos armados passaram a dominar regiões inteiras do país. Desde então, o leste do Congo vive uma guerra sem-fim, com milícias lutando entre si, contra o próprio Exército congolês e contra exércitos estrangeiros, como as Forças Armadas de Ruanda, que ainda caçam os hutus responsáveis pelo genocídio de 20 anos atrás. Os civis são as maiores vítimas. Estima-se que até hoje entre 5,5 milhões e seis milhões de pessoas tenham morrido. Outros três milhões vivem em campos de refugiados. Dezenas de milhares de mulheres foram vítimas de estupros coletivos, que se tornaram uma arma de guerra. Diante de um cenário tão complexo, Santos Cruz sabe que não será por meio de armas, tanques e helicópteros que a situação será resolvida. “A saída sempre é política e passa pelo fortalecimento do Estado”, disse ele. “Minha missão aqui é proteger os civis e desarmar os grupos rebeldes, que, na verdade, são apenas criminosos que se aproveitam da ausência do Estado. O problema não é étnico ou ideológico, como pode ter sido no início, há duas décadas. Hoje a razão desse conflito é econômica, porque esse é um dos países mais ricos do mundo.” O Congo possui vastas reservas minerais. Estima-se que em seu subsolo esteja guardado algo como US$ 24 trilhões em ouro, cobalto, cobre, diamante e coltan, um mineral amplamente utilizado na produção de notebooks e celulares e do qual o país é o dono da maior reserva do mundo. Quase todos os grupos rebeldes que atuam no leste do país exploram essas riquezas e usam nações vizinhas para exportá-las para os Estados Unidos, Europa e Ásia. “Não resta muito a Santos Cruz além de ser o homem corajoso desse show”, observou Fidel Bafilemba, um dos coordenadores da organização Enought Project, que acompanha de perto a crise congolesa há vários anos. “Não há muito o que ele possa fazer sem que a comunidade internacional tome a decisão de parar de importar as riquezas minerais do Congo a preços baixíssimos, como ocorre hoje.” A posição de Fidel não é muito diferente da de outros integrantes de entidades que atuam no país. A organização Médicos Sem Fronteiras, que mantém no Congo sua maior operação no mundo, também é bastante crítica ao novo papel que a ONU vem tendo no conflito. “A decisão de abandonar o papel de neutralidade está comprometendo todo o serviço humanitário que tem sido desenvolvido aqui nos últimos anos”, diz Bertrand Perrochet, chefe da missão belga da Médicos Sem Fronteiras no Congo. “A população não sabe mais se um helicóptero branco da ONU vai distribuir medicamentos ou balas.” No início da tarde do sábado 19 de abril, o general Santos Cruz embarcou na caminhonete Land Cruiser blindada que tem à sua disposição para saborear um típico churrasco gaúcho no batalhão do Uruguai, o Urubatt. O quartel-general do contingente de mais de 700 soldados uruguaios fica nas proximidades do aeroporto de Goma e é uma espécie de segunda casa para o general e para os seis brasileiros que atuam diretamente como seus motoristas, auxiliares administrativos e seguranças. Nos 15 dias em que a reportagem de ISTOÉ acompanhou a rotina do militar brasileiro, Santos Cruz só foi capaz de soltar uma gargalhada nas duas vezes em que esteve no Urubatt. Ali parece ser o único lugar em que ele consegue relaxar. “Eu respeito muito as ONGs, mas acho que muito mais poderia ser feito. Milhões e milhões são gastos aqui, mas não há coordenação, não se vê esse dinheiro sendo aplicado diretamente na melhoria do país.” Ele trata as críticas que recebe como meras especulações. “Ainda não houve um caso concreto de problemas pela cor dos veículos ou helicópteros.” Santos Cruz é presença constante nas festas mensais promovidas pelo batalhão do Uruguai e que atraem tanto militares quanto civis a serviço da ONU. Batizadas de Tango Bar, as noitadas são agitadas e a pista de dança, quase sempre animada com música latina, é incrementada pela sirene vermelha de um caminhão estacionado ao lado do bar montado para atender a clientela sedenta por momentos de descontração. Na última festa, organizada no dia 12 de abril, Santos Cruz vestia calça jeans, uma camisa social branca e um colete de lã vermelho. Passou boa parte da festa na pista, dançando salsa com uma colega espanhola. Nas próximas semanas, Santos Cruz será oficializado pelo Conselho de Segurança da ONU como o escolhido para liderar a missão no Congo por mais um ano. Apesar de não confirmar, ele já foi consultado por Nova York se aceitaria ficar mais 12 meses à frente da Monusco – e aceitou. “Quando voltar para o Brasil, vou andar a cavalo”, conta ele, um praticante do Concurso Completo de Equitação, espécie de triatlo hípico responsável por matar quase uma dezena de cavaleiros no mundo todos os anos. “O concurso completo é o esporte que mais se aproxima de uma batalha militar, você corre riscos o tempo todo e eu preciso disso para viver.” 5# BRASIL 14.5.14 5#1 UMA NOVA ETAPA DA CAMPANHA 5#2 ELEIÇÃO, ACARAJÉ E ALFINETADAS COM TEMPERO BAIANO 5#3 O DUELO DAS CPIS 5#4 VÃO-SE OS ANÉIS 5#1 UMA NOVA ETAPA DA CAMPANHA Dilma, Aécio e Eduardo Campos mudam suas estratégias eleitorais com a perspectiva de segundo turno, registrada nas últimas pesquisas. A corrida, agora, é para ver quem chega lá Sérgio Pardellas (sergiopardellas@istoe.com.br) A cada nova pesquisa eleitoral, parece claro que, em outubro de 2013, quando previu a vitória de Dilma Rousseff no primeiro turno, o marqueteiro do PT João Santana mostrou-se mais eficiente para encantar os próprios clientes do que para interpretar corretamente as opções do eleitorado nas urnas. Nas últimas semanas, ao contrário do vaticínio de Santana, as pesquisas eleitorais mostraram que a eleição presidencial caminha para ser resolvida apenas no segundo turno. A pesquisa ISTOÉ/Sensus, divulgada na última edição de ISTOÉ, foi a primeira a revelar esse movimento e a nova realidade eleitoral provocou a revisão das estratégias de campanha de Dilma Rousseff (PT), Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB). Cada um deles por razões distintas. Aécio, para manter a curva ascendente registrada nos recentes levantamentos. Eduardo, com o objetivo de mostrar ao eleitorado que ele e não o tucano seria a melhor opção para enfrentar Dilma num segundo turno. E Dilma, para tentar estancar a sangria de votos observada nos últimos meses. Como, entre os três postulantes, a presidenta foi quem mais saiu perdendo, a partir dos novos números eleitorais, o comando da campanha petista teve de empreender as mudanças mais vigorosas nos rumos da campanha. A tentativa de reação começou a ser desenhada há exatos 15 dias, quando o crescimento dos candidatos de oposição foi captado com clareza por sondagens internas do PT, e se intensificou depois da publicação da pesquisa ISTOÉ/Sensus. APREENSÃO - Na quinta-feira 8, Dilma visitou as obras do Itaquerão em São Paulo. A situação cada vez mais desfavorável nas pesquisas retira a vantagem da perspectiva de poder Num encontro com a presença do presidente do partido, Rui Falcão, e dos ministros da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e de Relações Institucionais, Ricardo Berzoíni, resolveu-se abandonar a prioridade estabelecida inicialmente de dar ênfase à atuação de Dilma como gestora de grandes investimentos, que chegam a ser questionados por fatias crescentes de eleitores – como os estádios da Copa – e tem gerado protestos nas grandes capitais, como ocorreu na semana passada, quando a presidente reuniu-se com lideranças sem-teto de São Paulo. Por motivos óbvios, o Planalto também suspendeu uma discussão de bastidores sobre os projetos de governo para 2015, que envolviam eventuais ajustes na política econômica e outras áreas da administração. O foco agora é se concentrar no discurso da luta de classes que está na origem do PT, e se traduz na defesa de conquistas sociais históricas, como o Bolsa Família e a lei do salário mínimo. EM ALTA - Crescimento nas pesquisas anima os tucanos. Nunca, desde o início da campanha, Aécio Neves recebeu tantos telefonemas de empresários A primeira manifestação dessa mudança ocorreu no discurso de Dilma às vésperas do 1º de Maio, um texto que, apesar de algumas emendas e sugestões de auxiliares, deve ser lido como pura obra da presidenta. A segunda, 72 horas depois, no Encontro Nacional do PT. O saldo dessa nova linha política, materializado no anúncio do chamado pacote de bondades, que incluiu a correção na tabela do imposto de renda e reajuste de 10% no Bolsa Família, foi captado na nova rodada do Datafolha, divulgada na sexta-feira 9. A pesquisa não só referendou o levantamento da ISTOÉ/Sensus, apontando na mesma direção, como mostrou a tendência de crescimento de Aécio Neves, que subiu quatro pontos num intervalo de um mês, e de Eduardo Campos. O discurso dos petistas, agora, é de quem joga a toalha para a expectativa inicial de triunfo nas urnas no primeiro turno. “Eu sempre acreditei que seria muito difícil vencer no primeiro turno,” afirma o ministro de Relações Institucionais Ricardo Berzoini, há dois meses incorporado ao primeiro escalão do governo Dilma. “Se não foi possível ganhar no primeiro turno em 2010, quando a economia crescia 7,5% e o Lula era o presidente que havia vencido um tsunami econômico, agora temos uma situação muito mais difícil. Somos favoritos, mas teremos uma campanha dura”, resignou-se. PRUDÊNCIA - O desafio de Eduardo Campos, agora, é conseguir marcar diferenças com o candidato tucano, Aécio Neves, sem que isso signifique uma divisão na oposição Aos poucos, uma situação cada vez mais desfavorável nas pesquisas retira do Planalto e do PT uma vantagem conhecida da política: a perspectiva de poder. O ex-líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR) já se encontra em campanha de murmúrios contra Dilma. Jucá tem dito que “este governo do PT não vai mais a lugar nenhum. Agora é ver quem (da oposição) terá mais chance”. Num ambiente de acerto de contas e juras de infidelidade, o senador Eunício OIiveira (PMDB-CE), favorito ao governo do Ceará, tornou-se alvo de uma pequena anedota na semana passada. Na quarta-feira 7, Eunício manteve conversas tão demoradas com Aécio Neves e depois com o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) nas cadeiras do Senado que acabou provocando uma intervenção irritada da deputada Gorete Pereira (PR-CE): “Essa conversa está demorada demais, Eunício,” disse ela. “Seu bico está tão comprido que vai acabar virando tucano!”. A parlamentar estava exagerando. Eunício tem recebido apoio de Lula e Dilma para se unir à reeleição em seu Estado e tem atuado como um aliado firme do Planalto. Mas os conflitos locais com os irmãos Cid e Ciro Gomes seguem tão complicados que Eunício não perde uma chance para fazer uma cena típica de quem ameaça mudar de lado. DIFERENÇAS E CONVERGÊNCIAS - Em entrevista, a candidata a vice na chapa de Eduardo Campos, Marina Silva, atacou o PSDB. Aécio minimizou: "Nós não devemos temer nossas diferenças. Assim como não devemos temer nossas convergências" A constatação de que a eleição parte para uma disputa em segundo turno também tem provocado mudanças nas fileiras da oposição. Até a divulgação das últimas pesquisas, Aécio Neves e Eduardo Campos cultivavam uma convivência de quem faz aliança para combater um inimigo comum. Celebravam pontos de convergência e evitavam recordar suas diferenças. Como é natural, o ambiente de congraçamento ameaça se desfazer na medida em que um dos concorrentes – Aécio, no caso – vai tomando a dianteira nas pesquisas, numa vantagem que chega perto do dobro marcado pelo aliado-adversário. Numa ação combinada com Eduardo Campos ou não, a candidata a vice na chapa socialista Marina Silva partiu para o ataque ao PSDB na semana passada: “A gente tem que parar com essa história de querer diluir as diferenças. O PSDB sabe que já tem o cheiro da derrota no segundo turno”, disse Marina em entrevista durante evento em Tocantins. Em seus pronunciamentos, no entanto, Eduardo Campos adotou um tom mais ameno ao se referir às divergências com o PSDB. Bem implantado em Minas Gerais, seu estado natal e segundo maior colégio eleitoral do País, Aécio Neves conta com a máquina política do PSDB para chegar ao segundo turno. Para um bom número de analistas, o crescimento de Aécio no primeiro turno já era um dado esperado de sua candidatura. Mesmo assim, segundo fontes tucanas, Aécio nunca recebeu tantos telefonemas de empresários como nas últimas semanas. Em política, este é um importante sinal de que a campanha vai bem e o mais importante: finalmente há perspectiva de vitória. A dúvida consiste no segundo turno, a partir do qual a questão das alianças torna-se fundamental. Por isso, a ordem no PSDB é evitar atritos com os socialistas, e despeito das provocações de Marina Silva. Questionado sobre o assunto, semana passada, Aécio minimizou: “Nós temos diferenças e não devemos temê-las. Assim como não devemos temer nossas convergências. Elas são boas para o Brasil”, afirmou o tucano. Embora haja a compreensão de que uma fatia do PSB tem dificuldades para se aliar ao PSDB, sigla assumida pelos adversários políticos de toda a linhagem à esquerda que se iniciou com Miguel Arraes, avô do candidato socialista, os tucanos sustentam que Campos e aliados, ao intensificarem suas críticas ao atual governo, já teriam atravessado o seu rubicão, como o romano Júlio Cesar. Ou seja, o caminho dele e do PSB rumo à oposição ao PT não teria mais volta. Isso significa que PSB e o PSDB poderão marchar juntos num segundo turno, mesmo que os socialistas já tenham decidido demarcar diferenças com os tucanos na primeira etapa das eleições. Neste caso, as chances de uma vitória de Aécio nas eleições aumentariam exponencialmente. Ao confirmar nas pesquisas sua recusa em assinar um cheque em branco – este é o significado de uma vontade de segundo turno – o eleitor também diz que espera mais dos candidatos. A maioria quer mudanças. Resta saber quem vai conseguir encarnar esse desejo. Ao que indicam as últimas pesquisas, este nome não é Dilma. Mas como política é uma nuvem, já dizia Magalhães Pinto, velha raposa mineira, e cabeça de eleitor um mistério até o escrutínio dos votos, convém prudência na hora de emitir vaticínios definitivos. João Santana que o diga. 5#2 ELEIÇÃO, ACARAJÉ E ALFINETADAS COM TEMPERO BAIANO Em fórum na Bahia ficou evidente como Aécio Neves e Eduardo Campos estão abrindo canais de diálogo com o empresariado, enquanto Dilma Rousseff aumenta a temperatura de críticas ao seu redor por escolher o isolamento do poder e a estratégia de campanha Carlos José Marques Hora do happy hour no resort da Ilha de Comandatuba, no adiantado da noite da quinta-feira de comemorações do Primeiro de Maio, Dia do Trabalho. O Salão Capitania ficou apinhado por 320 CEOs e acompanhantes que confraternizavam após um típico jantar baiano regado a acarajé, frutos do mar, bom vinho e descontraída conversa. A apoteose estava por acontecer dali a instantes. Quase que inesperadamente, porque só eram aguardados na manhã seguinte durante o seminário, os pré-candidatos Aécio Neves e Eduardo Campos desembarcaram motivados naquele ambiente de convescote empresarial. Eram as atrações da 13ª edição do Fórum Empresarial que acontecia ali. E chegaram esbanjando bom humor. Campos, ao melhor estilo família, trazia a tiracolo a mulher, Renata, e o filho de três meses, Miguel, em um bebê-conforto que logo foi cercado por convivas encantados. Aécio, por sua vez, recebeu tratamento de superstar. Todos queriam tirar foto ao seu lado, abraçá-lo, tocá-lo. Eram presidenciáveis de carne e osso que não evitavam o contato direto com aquele time de eleitores de peso, ao contrário da adversária Dilma Rousseff, que, convidada, se recusou mais uma vez a estar presente – algo que tem feito rotineiramente quando surgem oportunidades como essa de tête-à-tête com o PIB. Entre tapinhas nas costas e palavras de apoio ao pé do ouvido, os dois pré-candidatos angariavam razões para sorrir e distribuíam simpatia. Aécio tinha na caravana um séquito de deputados e senadores tucanos que reforçava a claque nas animadas rodas de bate-papo. Campos arrastou para lá a vice, Marina Silva, na expectativa de arrebanhar mais alguns pontos entre simpatizantes de bandeiras ambientalistas. O cenário estava montado para o que foi entendido como uma prévia dos muitos debates eleitorais que deverão ocorrer ao longo do ano. Naturalmente, a falta de Dilma, que deve fugir do confronto direto com os rivais o quanto puder – estratégia já delimitada pela equipe de campanha –, converteu o encontro em uma autêntica festa da oposição. O organizador e entertainer do Fórum, João Doria Jr., lamentou a ausência e rogou votos para que ela ao menos participe de um almoço-debate em planejamento para São Paulo. “O isolamento de Dilma é incompreensível!”, registrou Doria, avaliando que a oposição já saiu do marasmo e da hibernação na qual se encontrava. Aécio e Campos, com o endosso do empresariado, também não pouparam críticas à postura esquiva da presidenta. “Não podemos fugir do debate, não podemos, para ter um Brasil melhor, fazer mais do mesmo e é uma pena que a presidenta Dilma não esteja aqui nos ajudando nisso”, invocou Campos. DESCONTRAÇÃO - Na chegada a Comandatuba, Aécio, com Doria, recebeu tratamento de superstar; Campos encantou os convidados ao aparecer com o filho Miguel Ambos os pré-candidatos tinham vindo, sem escala para descanso, direto dos palanques de protestos dos trabalhadores, montados momentos antes em São Paulo, onde, falando para uma plateia bem diferente, ouviram reclamações de toda ordem sobre o custo de vida. Dilma teve também a chance de medir ela mesma a temperatura do descontentamento geral e perceber desoladamente que não será fácil a sua caminhada rumo à reeleição, quando foi sonoramente vaiada por três vezes em outro púlpito, na abertura da 80ª Expozebu, em Uberaba. Seu correligionário petista, Alexandre Padilha, longe de acolhidas calorosas, experimentou na pele o nível a que chegou tal insatisfação ao ser recebido a pedras e paus quando tentou falar para um grupo de militantes da CUT naquele Primeiro de Maio. Definitivamente, o clima não andava bom para políticos da situação. Já no aprazível ambiente de Comandatuba, Aécio e Campos colhiam os louros. Mostraram-se inspirados. Chegaram até a declamar poesias. Aécio, citando versos do músico Raul Seixas para justificar sua defesa ao fim do mecanismo da reeleição, autonomeou-se uma “metamorfose ambulante”. Embora a ideia de segundo mandato tenha sido de seu mentor, Fernando Henrique, Aécio externou posição contrária: “Prefiro ser essa metamorfose ambulante, do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo”, parafraseou. Campos recorreu a Fernando Pessoa para dizer que não compactua com fisiologismos e “raposismos”: “É preciso abandonar as roupas usadas e esquecer os caminhos que levam sempre aos mesmos lugares.” ALINHADOS - Atendendo a pedidos dos organizadores, Aécio e Campos seguram juntos a bandeira do Brasil. "Não consigo vê-lo como adversário", disse Aécio O que houve em Comandatuba – e qualquer interlocutor presente confirmava de pronto essa impressão – foi uma clara proximidade de propostas entre os dois. A tal ponto que Aécio sacramentou a identidade dos anseios com uma espécie de convite na abertura de sua fala no seminário que teve início na manhã da sexta-feira 2: “Não consigo ver o ­Eduardo como adversário. Somos companheiros do mesmo sonho, queremos a mesma coisa e não vejo como, a partir de 2015, não estarmos, eu, ele e a Marina, no mesmo projeto de país.” Algum mal-estar foi notado nas expressões de Marina Silva, a única que, de cara fechada, não aplaudiu a fala do senador. Após o debate, ela tratou de delimitar as distâncias programáticas. “Há diferenças profundas nos programas de governo. Não vi ele dizer, por exemplo, que, independentemente dos partidos, quer fazer uma governabilidade recrutando os melhores”, apontou. Dias depois do evento, Campos, como líder da chapa, se viu na condição de ter de reiterar a companheira. “Temos projetos distintos, eu e o Aécio, com bases política e social distintas. Isso não impede que tenhamos capacidade de ver o que nos une. Mas oferecemos caminhos diferentes.” No meio executivo muitos interpretam a aliança com Marina como uma trava que inibe e limita ações e falas de Campos. Um “big boss” do ramo de serviços, preferindo o anonimato, chegou a dizer que Campos atua melhor quando está longe da vice. “Eu vi ele falar em outra ocasião sem a Marina e estava mais solto, à vontade para defender propostas descoladas da agenda ambiental.” Um parlamentar da bancada pernambucana confirmou que Campos vive “pisando em ovos” para não melindrar Marina e seu grupo político. João Doria, no mesmo tom, cravou que, durante as apresentações em Comandatuba, Aécio foi mais assertivo. “A sensação do empresariado é de que ele está mais livre para desenvolver suas plataformas de governo. Campos está um pouco inibido. Com Marina, ele toma muito cuidado no trato de certos temas para não feri-la ou contrariá-la.” DEBATE - "Vamos parar de hipocrisia", bradou Wagner. Aécio não contemporizou e Marina, de cara fechada, disse que ela e Campos têm diferenças profundas com o tucano Muito embora Campos tenda a acentuar seu distanciamento de Aécio daqui para a frente na corrida eleitoral, o pacto de não agressão entre os dois vigorou ao menos em Comandatuba. Lado a lado, não lançaram ataques verbais ou provocações mesmo na fase de perguntas do debate que durou cinco horas e registrou “overbooking” de presentes com cadeiras extras sendo providenciadas de última hora para acomodar a plateia. Alfinetadas ficaram na verdade por conta do governador baiano, Jaques Wagner, que anfitrionava o evento no Estado. Era previsível! Sem viva alma do PT ou de seus aliados no recinto, como único representante da ala governista, Wagner se sentiu isolado e incomodado com os aplausos à dupla oposicionista e não teve outra opção que não a de partir para o ataque. Suas intervenções fizeram a temperatura subir naquele terreiro baiano. O governador, como se diz na expressão nordestina, “deu baile” com direito a “chiliques” e contestações apimentadas na única oportunidade em que pediu a palavra para contrapor as promessas dos pré-candidatos. “Vamos deixar de hipocrisia! Quando se fala em reforma tributária, estamos falando em divisão do bolo”, reclamou, fazendo menção direta a uma das bandeiras do tucano Aécio. “É mentira afirmar que o Estado pode ser gerido como uma empresa da iniciativa privada. Não vamos abominar a política com esses clichês”, bradou. Não recebeu um único e escasso aplauso de apoio ao seu protesto. A plateia de espectadores estava decerto encantada com o que ouvia dos presidenciáveis e, percebendo o clima favorável, Aécio e Campos cortejaram com habilidade aquela parcela do PIB. Era gente do calibre de Abilio Diniz, da BRF, Rômulo Dias, da Cielo, Luiza Trajano, do Magazine Luiza, André Esteves, do Banco BTG/Pactual, Flávio Rocha, da Riachuelo, Edson Bueno, da Amil, Luiz Fernando Furlan, da BRF, e Jorge Gerdau, dono de um dos maiores grupos siderúrgicos nacionais. “Não acho, ao contrário de alguns, que o Brasil foi descoberto a partir de 2003. O Brasil é uma construção”, disse o tucano, apontando que Dilma atrasou o debate sobre o desenvolvimento do País em dez anos. “Nós poderíamos estar discutindo produtividade, mas estamos voltando a uma velha agenda, da busca pela estabilidade. Perdemos uma década com a demonização das privatizações e das parcerias com o setor privado. Agora estamos na mesma agenda em que estávamos há dez anos no setor de infraestrutura.” Saiu ovacionado. Campos também levou aplausos, embora mais contidos, quando prometeu criar um conselho de responsabilidade fiscal com o objetivo de monitorar as contas públicas. “O Brasil precisa constituir um conselho com essa missão, da mesma forma que temos as agências reguladoras”, disse o ex-governador. Na lista de transformações relacionadas pelos pré-candidatos podiam se verificar avanços promissores: corte pela metade no número de ministérios, independência do Banco Central, reforma tributária e conquistas consistentes no campo da educação – área em que ambos tinham muito a mostrar pelas experiências adotadas nos respectivos Estados que governaram. Minas, por exemplo, possui o maior índice de alfabetização do País, enquanto Pernambuco, por sua vez, criou o maior projeto educacional em vigor ao colocar boa parte das crianças em período integral nas escolas. Quem mais emocionou com o tema do ensino foi, no entanto, Viviane Senna, do Instituto Ayrton Senna, em meio às homenagens pela passagem de 20 anos da morte do piloto. Ao seu lado, João Doria conseguiu bater mais um recorde de arrecadação, de pouco mais de R$ 4 milhões, para os projetos educacionais tocados pela Instituição. Com tal rapidez ele levantou a quantia que Aécio, em tom de brincadeira, resolveu lhe dirigir um convite: “Você poderia ser o meu arrecadador de campanha. Pense nisso!”. Arrancou gargalhadas. E o tom animado prosseguiu pelo resto do dia após aquele primeiro debate que marcou a corrida presidencial na ensolarada Comandatuba. 5#3 O DUELO DAS CPIS Criadas com o intuito de investigar a Petrobras e o Metrô de São Paulo, comissões de inquérito devem se transformar em palco eleitoral. Talvez nem isso Izabelle Torres (izabelle@istoe.com.br) Os brasileiros já se acostumaram com duelos eleitorais no Congresso travestidos de Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs). Muitas delas transcenderam a retórica meramente eleitoral e avançaram na elucidação de casos que levaram à punição de políticos e empresários. Tantas outras, porém, ao não saírem do discurso e dos holofotes fáceis, terminaram em pizza. Agora, às vésperas da eleição presidencial, governo e oposição travam novamente uma guerra em torno de investigações que, se levadas a sério, podem gerar muito desgaste eleitoral para ambos os lados e, quem sabe até, ajudar a passar o País a limpo. Não é o que se descortina no horizonte. O desacerto e a falta de afinação, até mesmo entre parlamentares do mesmo lado, desenham um jogo que tem tudo para não apresentar vencedores. O enredo começou com o governo tentando livrar-se a todo custo de uma investigação exclusiva da Petrobras. Para isso, contou com o jogo arquitetado pelo presidente do Congresso, Renan Calheiros (PMDB-AL). O peemedebista aprovou duas CPIs – uma só do Senado e outra composta também por deputados (mista) – destinadas a investigar as operações da estatal. CHEIRO DE PIZZA - Presidente do Congresso, Renan Calheiros atua em sintonia com o Planalto ao criar três CPIs Ao mesmo tempo, para tentar tirar o foco sobre a Petrobras e fustigar a oposição, os governistas conseguiram aprovar, na quarta-feira 7, o requerimento para instalação da CPI do propinoduto tucano – o escândalo do Metrô de São Paulo. No início da semana passada, os tucanos paulistas já haviam sofrido outro revés. Na terça-feira 6, o Ministério Público estadual afirmou que o conselheiro do TCE-SP, ex-chefe da Casa Civil do governador Mário Covas, Robson Marinho, “recebeu pagamento de vantagens ilícitas” no caso Alstom – esquema de propinas na área de energia nos anos 1990. PROPINODUTO - MP acusou o conselheiro Robson Marinho de receber vantagens ilícitas O prazo para as indicações de quem vai compor as comissões no Congresso foi aberto no fimda última semana. Em fase bem mais adiantada está a CPI exclusiva do Senado sobre a Petrobras. O problema é que integrantes desta CPI só composta por senadores foram minuciosamente escolhidos sob a promessa de não investigar nada. É por isso que, na Câmara, temendo um acordão em forma de pizza assada no forno do Senado, governistas dissidentes se uniram à oposição em favor de uma CPI mista. “Queremos participar das investigações sobre a Petrobras porque achamos que a CPI do Senado, como foi formada, não fará esse trabalho”, explicou o líder do PSDB na Câmara, Antonio Imbassahy. Mas tudo indica tratar-se de outra investigação fadada ao fracasso. Isso porque os prazos regimentais exigidos para a instalação da CPI mista empurram o começo dos trabalhos para junho, bem próximo do início da Copa do Mundo. Em seguida, vem o recesso parlamentar, que, por sua vez, é sucedido pelo início da campanha eleitoral. Ou seja, mesmo com a oposição ganhando a batalha em torno da CPI mista, o Planalto conta com o tempo a seu favor. 5#4 VÃO-SE OS ANÉIS Procurado pela Interpol, deputado Paulo Maluf propõe acordo de US$ 1 milhão mais uma joia de sua mulher avaliada em R$ 500 mil para encerrar ação judicial e se livrar da cadeia. Há cinco anos, ele se dispôs a pagar valor 15 vezes maior e, depois, desistiu Ex-prefeito de São Paulo e deputado federal pelo Partido Progressista (PP-SP), Paulo Maluf passou as últimas três décadas entoando o mantra “eu não tenho conta no exterior”. Mas para se livrar de uma ordem de prisão preventiva expedida em 2009 pela Justiça americana e voltar a viajar pelo mundo sem correr o risco de ser preso, Maluf fez uma proposta reveladora à Promotoria de Nova York: estaria disposto a pagar uma multa de US$ 1 milhão para encerrar o processo contra ele. Ou seja, mesmo que indiretamente, ele acabou assumindo que tem dinheiro fora do País. No acordo proposto, o ex-prefeito entregaria também à Justiça americana um anel de sua esposa, Sylvia Maluf, avaliado em meio milhão de reais, hoje em poder da Justiça dos EUA. A joia da senhora Maluf, um anel de rubi e diamantes, foi confiscada pelos promotores nova-iorquinos em uma casa de leilão da cidade. NADA FEITO - Promotores só aceitam acordo com Paulo Maluf se valor proposto for significativamente aumentado O parlamentar é procurado pela polícia de 190 países e, atualmente, seu nome aparece em uma lista de 18 páginas ao lado de outros 160 criminosos brasileiros, entre os quais assassinos, assaltantes, traficantes de drogas, também perseguidos pela Interpol. Maluf e seu filho Flávio são réus nos Estados Unidos sob a acusação de roubo, fraude e lavagem de dinheiro. O deputado é acusado de desviar recursos públicos de obras quando ele era prefeito da capital paulista entre 1993 e 1996. Em 2007, pai e filho tiveram a prisão decretada em Nova York, porque, segundo promotores paulistas de um total de R$ 758 milhões desviados, US$ 17 milhões teriam passado pelo banco Safra daquela cidade. Essa é a segunda vez que Maluf tentou um acordo com os promotores de Nova York. Há cinco anos, a defesa do parlamentar propôs pagar um valor quinze vezes maior que o atual (US$ 15 milhões) para acabar com a pendenga jurídica. Acreditando na disposição do parlamentar em desembolsar a quantia, ou seja, na boa-fé de Maluf, no final de 2009, a Promotoria dos EUA retirou o nome dele da lista de procurados pela polícia internacional para que ele pudesse passar as festas de fim de ano na Europa. Só que, depois de desfrutar da viagem, Maluf abandonou o acordo sem pagar nada. O promotor do caso à época, Adam Kaufmannn, acusou Paulo Maluf de passá-lo para trás. Escaldada, a Promotoria americana, desta vez, decidiu dividir a responsabilidade pelo acordo com a Justiça brasileira e consultou o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Márcio Elias Rosa. A resposta, por ora, é negativa. A não ser que o valor proposto pelo parlamentar seja significativamente aumentado. A procuradoria alega que a proposta é muito baixa, ante o rombo de quase ­R­$ 8­00 milhões deixado por Maluf. 6# COMPORTAMENTO 14.5.14 6#1 O MUNDO NERD 6#2 BARBÁRIE SEM LIMITES 6#3 DERROTA DAS ESTRELAS 6#4 A NOVA FAMÍLIA SCOLARI 6#5 SUA MAJESTADE, JAIR RODRIGUES 6#1 O MUNDO NERD Eles deixaram de ser os esquisitos das salas de aula, conquistaram público fiel e anunciantes de peso. Saíram de trás dos computadores, têm séries de TV e até literatura própria. E o que parecia brincadeira se transformou em negócio milionário Fabíola Perez (fabiola.perez@istoe.com.br) Tudo começou com uma diversão. Em 2009, o estudante Bruno Aiub, 23 anos, conhecido como Monark, criou um canal no YouTube a fim de ensinar as melhores estratégias para jogar Minecraft – game que possibilita aos usuários construírem um mundo formado por blocos. Em novembro de 2010, o espaço batizado RandonsPlays atingiu 32 mil visualizações. Hoje, três anos depois, a audiência saltou para dez milhões de views mensais. E o que começou como um hobby se tornou um negócio lucrativo. “Sempre que via algum jogo novo fazia comentários, sátiras ou piadas e o público começou a gostar”, diz. Aiub faz parte de uma geração de nerds que ultrapassou as barreiras do preconceito no ambiente escolar e encontrou na tecnologia um aliado para ganhar o mundo. “A sociedade precisa de profissionais com conhecimento tecnológico. São essas pessoas que movimentam a economia e fazem tantas outras estarem empregadas”, afirma David Anderegg, psicólogo americano e autor do livro “Nerds: Quem São e Por Que Precisamos Deles”. Um dos protagonistas da revolução pela qual passa a cultura nerd atual é o ultra bem-sucedido Mark Zuckerberg, criador da rede social Facebook. Segundo um relatório da consultoria GMI Ratings, ele é o empresário mais bem pago dos Estados Unidos, com salário mensal superior a US$ 1 milhão. Além disso, o jovem de 29 anos é o símbolo do nerd que soube transformar sua inteligência em respeitáveis cifrões. MADE IN USA - Pierre Mantovani, criador do portal Omelete, vai trazer ao Brasil em dezembro a Comic Con Experience, versão brasileira da maior feira nerd dos Estados Unidos Inspirada na trajetória de outro exemplo bem-sucedido do universo geek, o fundador da Apple, Steve Jobs, a Rede Globo lançou, na segunda-feira 5, a novela Geração Brasil, que aborda o mundo da tecnologia. A trama gira em torno da história de sucesso do jovem Jonas Marra, interpretado por Murilo Benício, que desenvolve um computador pessoal de baixo custo. Na década de 1990, o personagem viaja aos Estados Unidos e, tempos depois, torna-se CEO de uma das maiores empresas de tecnologia e ídolo de milhares de jovens que se encantam com o mundo da informática. Quando decide voltar ao Brasil em 2014, ano de Copa do Mundo, o milionário atrai milhares de jovens que se identificam com a indústria nerd. Fora da ficção, a realidade não é muito diferente. Exemplo mais modesto, o brasileiro Leon Oliveira Martins, 30 anos, começou sua carreira nesse universo produzindo vídeos durante uma viagem pela Alemanha, em 2008. Quatro anos depois, havia criado o próprio canal no YouTube, “Coisa de Nerd”, voltado a comentários sobre jogos não convencionais. “Na época, não tinha tantas informações sobre games em português, então misturava uma série de informações para divertir e informar quem buscava estratégias de jogo”, afirma Martins. Hoje chamados de “influenciadores”, Monark e Leon têm um alto índice de audiência e contam com agências próprias para trazer mais anunciantes para seus canais. “São jovens sem histórico na televisão, mas com um nível de interatividade com o público que gera convencimento e identificação”, diz Gustavo Teles, sócio-diretor da agência Influencers. Uma pesquisa realizada pelo portal Omelete, direcionado a esse público, detectou que 32% dos nerds e geeks no Brasil possuem seu próprio canal no YouTube. “Eles começaram a gerar audiência na internet e a ser remunerados pelo Google e por outros anunciantes”, diz Teles. “Jovens como esses estão alcançando um faturamento mensal que varia de R$ 10 mil a R$ 40 mil e anunciantes de peso nos setores de tecnologia, eletrônica e telefonia.” A produção de conteúdo e os apresentadores nerds fizeram a agência Influencers triplicar sua projeção de faturamento neste ano, para R$ 1,5 milhão. “Escolhemos ter essa abordagem nerd porque eram os canais na internet com mais regularidade e onde os apresentadores tinham mais compromisso com seu público”, diz. O estudo revelou ainda que 90% dos nerds e geeks costumam ficar online mais tempo que a maioria dos brasileiros. A média do País, segundo o Ibope Mídia, é de 60 horas por mês, enquanto eles costumam gastar 84 horas. Se hoje o passatempo preferido desse público é jogar videogame, o que mais cresce, porém, é o hábito de consumir filmes e séries pela internet. Ser nerd, no entanto, nem sempre foi algo aceito e bem-visto. Muito pelo contrário. Essa turma teve de enfrentar barreiras ao longo de décadas em colégios e universidades até conseguir mostrar que, com sua inteligência – e, por que não, simpatia peculiar –, poderia ser popular e útil à sociedade. “Quando eu estava no colégio, nosso grupo era formado por pessoas excluídas. Hoje as crianças optam por ser nerds”, afirma Benjamin Nugent, autor do livro “Nerd Americano: A História do Meu Povo”. Segundo o autor, nerd virou uma identidade subcultural, assim como hippies, punks e skatistas. Os primeiros eram estudiosos que gostavam de temas relacionados a cultura, ciência e tecnologia. Pouco populares, eram arredios aos esportes. “Hoje, a questão cultural se associou à indústria do entretenimento, que passou a produzir cada vez mais coisas destinadas a eles”, diz a professora de educação e tecnologia do Instituto Federal de Pelotas (RS) Angela Dillmann Nunes Bicca, que coordena o projeto de pesquisa “Aprendendo a Ser Jovem Nerd/Geek: Um Estudo Sobre a Pedagogia Cultural da Internet”. “É um dos mercados que mais crescem no mundo”, diz ela. No Brasil, o crescimento no número de sites para esse público ocorreu mais intensamente nos últimos dez anos. Outro projeto nerd que se profissionalizou exatamente nesse período é o site Jovem Nerd. A ideia nasceu em 2002 como um blog de humor. Na época, os sócios-fundadores, Alexandre Ottoni e Deive Pazos, trabalhavam como designer e administrador, respectivamente, e dedicavam apenas algumas horas ao projeto. A grande estreia veio, porém, em 2006, quando a dupla conhecida como Jovem Nerd e Azaghal passou a comandar o Nerdcast – podcast que trata de temas que vão de eventos históricos a filmes de super-heróis e histórias em quadrinhos. “Foi um ponto de virada, passamos a acreditar que o Jovem Nerd poderia se transformar em um negócio de fato”, diz Ottoni. Hoje, o programa é um dos mais populares da internet, com uma audiência de 300 mil ouvintes por semana e prêmios nacionais e internacionais, como o de “Melhor Podcast do Mundo”. Na esteira do sucesso, outras ideias começaram a surgir. Depois de negociações com fornecedores e parceiros, nascia a Nerdstore, loja virtual de camisetas. Assim, em pouco tempo, esse público altamente segmentado começou a chamar a atenção das agências de publicidade digital, que viram no projeto uma oportunidade de se relacionar com esses consumidores fiéis. “Os anunciantes enxergaram em nossos veículos a possibilidade de fazer publicidade com mais proximidade”, afirma Guga Mafra, diretor da FTPI Digital, empresa parceira do Jovem Nerd. “Uma característica interessante do nerd é que ele influencia seus amigos e familiares”, diz. “Geralmente, é ele o especialista da família em games, tecnologia, viagens e é a pessoa disposta a conhecer e testar um novo produto.” A percepção de que o mercado nerd vem se consolidando no País ganhou força também pela facilidade de acesso ao conteúdo de internet nos últimos anos. “A rede igualou todo mundo”, diz Mafra. “Hoje é possível obter um produto em segundos pela web, tudo ficou muito mais fácil”, diz o empresário. Esse é um dos aspectos apontados pela pesquisa do portal Omelete. No levantamento, a conectividade desse público aparece diretamente relacionada aos seus hábitos. No ano passado, 57% dos entrevistados revelaram fazer compras pela internet frequentemente, 24% o fazem algumas vezes por ano e apenas 10% utilizam o e-commerce raramente. Na onda do crescimento desse mercado, o portal anunciou um aumento de 50% em seu faturamento e 31 novos contratos para este ano – um deles com uma montadora de veículos francesa que tem fábrica no Brasil. Inspirado no potencial do mercado americano, o diretor Pierre Mantovani, do Portal Omelete, tem planos de trazer ao Brasil em dezembro a Comic Con Experience. A feira será uma adaptação dos eventos que ocorrem em Nova York e San Diego, que reúnem criadores e admiradores de quadrinhos, cinema, televisão, literatura e afins. “Estamos adaptando tudo o que há de mais legal da realidade dos americanos para a nossa”, afirma Mantovani. A versão brasileira contará com uma área específica para quadrinistas do País divulgarem seu trabalho. Para ele, há uma enorme demanda de pessoas interessadas em temas geeks, mas pouca coisa boa está sendo feita em território nacional. Além disso, houve uma mudança de comportamento que fez com que os nerds conquistassem o próprio espaço. “Se minha mãe me visse com uma camiseta do Batman, me perguntaria se eu não cresci. Mas, atualmente, esses gostos passaram a ficar no DNA de algumas pessoas.” As empresas brasileiras, segundo Mantovani, não estavam preparadas para lidar com a liberdade de expressão que existe hoje. “A internet possibilitou que muitos jovens com boas ideias se autossustentassem”, diz. Pessoas com um perfil criativo começaram a levar a cultura e os hábitos nerds para todo o mundo. Prova disso é que algumas empresas brasileiras começaram a enxergar esse potencial. Em abril de 2012, a Livraria Cultura anunciou o lançamento do Projeto Geek, um espaço destinado aos entusiastas de quadrinhos, filmes, séries, objetos colecionáveis e games. “O ponto de partida foi o crescimento do mercado de games no Brasil, a partir daí tivemos a ideia de desenhar outros produtos e serviços para essas pessoas”, afirma o idealizador Igor Oliveira. Até então, as boas iniciativas estavam nas mãos de pequenos empresários, dentro de nichos que compunham esse universo. Com um investimento inicial de R$ 1 milhão, a Livraria Cultura criou cinco espaços geeks dentro de lojas que já existiam e abriu dois estabelecimentos independentes em São Paulo e no Recife. “Vimos a oportunidade de unir a modernidade do mundo dos games com o caráter retrô dos quadrinhos”, diz ele. Nos Estados Unidos, meca dos nerds, tanto grandes lojas varejistas quanto estabelecimentos menores e tradicionais abastecem esse mercado. Para Oliveira, a tendência é que as grandes livrarias acompanhem cada vez mais a segmentação também no mercado editorial. “Trouxemos de volta um hábito que já estava esquecido, de encontrar um lugar, ler e trocar ideias aos sábados de manhã e depois do expediente.” Outra mudança é que as grandes editoras começaram a investir na chamada literatura fantástica, a preferida da turma. O escritor Eduardo Spohr, 39 anos, foi um dos primeiros a se aventurar nesse estilo no Brasil. Com dificuldades para emplacar sua obra “A Batalha do Apocalipse” nas grandes editoras, Spohr fez uma parceria com os fundadores do programa “Jovem Nerd” para lançar o livro no site. As quatro mil cópias se esgotaram em dois meses. “Somente depois do programa e da parceria grandes editoras se interessaram pelo livro”, diz. Atualmente, o escritor possui quatro obras, sendo uma delas o livro “Protocolo Bluehand: Alienígenas”, lançado em 2011 pela editora Nerdbook, de Alexandre Ottoni e Deive Pazos. “Nesse processo percebi que os leitores ficavam cada vez mais exigentes e queriam conversar diretamente comigo para saber o que estava por vir”, diz Sphor, que planeja lançar o próximo livro em 2015. “O nerd detém muito conhecimento sobre quase tudo, tem a mente mais lúdica e está sempre querendo aprender”, diz. Essa sede de aprendizado coloca hoje esse grupo, que tem muito para ensinar, em uma posição de prestígio na sociedade. São pessoas que, como dizem os filmes de ficção que elas tanto cultuam, voltaram para se vingar e ganhar o mundo. 6#2 BARBÁRIE SEM LIMITES Caso da dona de casa espancada até a morte por vizinhos no litoral paulista não é isolado. A violência vem crescendo assustadoramente e hoje o país registra dois linchamentos por dia Raul Montenegro (raul.montenegro@istoe.com.br) ISTOÉ foi ao Guarujá (SP) para tentar explicar por que cidadãos tomaram parte no brutal linchamento de Fabiane de Jesus. "O horror. O horror.” A frase é de Walter Kurtz, personagem interpretado por Marlon Brando em “Apocalipse Now” – filme sobre a insanidade da Guerra do Vietnã –, mas passou pela cabeça de milhares de pessoas que viram os vídeos em que Fabiane Maria de Jesus, 33 anos, aparece sendo linchada no Guarujá, litoral sul de São Paulo, no sábado 3. Nas gravações feitas por celulares de pessoas que testemunharam a barbárie, ela, já desacordada, é chutada e arrastada pelas ruas de terra do bairro de Morrinhos, na periferia do município. Um homem é flagrado dando pauladas no crânio da vítima e outro passa com uma bicicleta sobre sua cabeça. Dezenas de pessoas participaram da ação, incluindo crianças e adolescentes. Elas haviam sido insufladas por um boato falso difundido na internet pela página noticiosa do Facebook “Guarujá Alerta”, que possui cerca de 50 mil seguidores. Por causa disso, confundiram Fabiane com uma sequestradora de crianças que, segundo as autoridades, não existe. VÍTIMA - Acima, o porteiro Jaílson das Neves, marido de Fabiane Maria de Jesus, e as filhas do casal. Confundida com um retrato falado de 2012, feito no Rio (abaixo), a dona de casa foi massacrada em praça pública por dezenas de pessoas Casos bárbaros como esse infelizmente não faltam no País. Um dos maiores especialistas no assunto, o sociólogo aposentado da Universidade de São Paulo José de Souza Martins diz que hoje há uma média de dois linchamentos, ou tentativas, por dia. Os casos estão aumentando. Há um ano, eram quatro por semana. De acordo com ele, ao menos um milhão de brasileiros participaram de linchamentos nos últimos 60 anos. Em Foz do Iguaçu (PR), outro episódio recheou essa estatística macabra na terça-feira 6, um dia após a morte no Guarujá. Duas meninas, de 15 e 18 anos, quase foram linchadas após assassinarem a pedradas uma adolescente de 13 anos. De acordo com a polícia, o crime aconteceu porque a vítima, Taís Cristina Martins, ficou com o namorado de uma das agressoras. Com a notícia do crime, a população do bairro tentou linchar as duas jovens – cerca de 20 pessoas já as tinham atacado com socos e pontapés quando um policial chegou à residência onde elas estavam para levá-las à delegacia. Pouco depois, cerca de 300 pessoas se reuniram ao redor da casa, jogando pedras e fazendo ameaças de morte, e as duas só conseguiram deixar o local após a chegada da Tropa de Choque. Não é de hoje que os linchamentos aterrorizam o País. O fato mais significativo dos últimos casos, porém, é que a barbárie é praticada cada vez mais sem razão, ainda que nada a justifique. “Se as pessoas entendem que as instituições funcionam mal, elas começam a usar seus próprios mecanismos. É aí que a gente vê os casos de justiça com as próprias mãos”, diz o professor da USP José Álvaro Moisés. E as cenas de selvageria sem limite não são de hoje. Casos como o da dentista queimada viva em 2013 em São Bernardo do Campo (SP) ou o do adolescente preso a um poste na região do Flamengo (RG) neste ano mostram que estamos vivendo um estado progressivo de barbárie. O rumor sobre uma mulher que raptava bebês para realizar rituais de magia negra já rondava a comunidade de Morrinhos, no Guarujá, havia alguns anos. Como uma lenda urbana, a história reaparecia de tempos em tempos – o mito, inclusive, já havia circulado por outros Estados. Há cerca de um mês ele voltou a ganhar força na cidade. Centenas de pessoas do município enviaram a falsa informação para a página “Guarujá Alerta”. Ao receber os relatos, o site publicou no dia 25 de abril: “Boatos rolam na região que uma mulher está raptando crianças para realizar magia negra. Se é boato ou não devemos ficar alerta”. Nos comentários, uma usuária postou um retrato falado como sendo da suposta sequestradora. Detalhe: o desenho não tinha nenhuma relação com o Guarujá. Ele havia sido feito pela polícia carioca depois de uma tentativa de rapto malsucedido no Rio, em 2012. Com a popularidade do perfil, o pânico foi aumentando nos dias seguintes. Esse era o clima na manhã do sábado 3 em que a dona de casa Fabiane, mãe de duas meninas, de 1 e 12 anos de idade, saiu de casa na sua bicicleta. O exercício funcionava como uma espécie de terapia quando ela era acometida pelas crises do transtorno bipolar (caracterizado pela alternância de períodos de euforia e de depressão) que a afligiam desde quando ela havia dado à luz a primeira filha. “Ela saía pela rua abraçando as pessoas, falando que amava todo mundo, mas nunca fez mal a ninguém”, diz Aline Barbosa, 24 anos, amiga da vítima. Após passar na colônia de férias onde o marido é porteiro, na Praia das Astúrias, e realizar uma série de atividades, entre elas recuperar a “Bíblia” que havia esquecido numa igreja, a mulher fez compras num mercado e, ao sair, brincou com uma criança e lhe ofereceu uma fruta. Nesse momento, segundo testemunhas, a mãe começou a gritar “é a sequestradora, é a bruxa” e a confusão começou. O primeiro a atingir Fabiane teria sido um homem ligado ao tráfico de drogas. Depois, uma multidão se revezou nos ataques à dona de casa, confundindo a “Bíblia” que ela levava com um livro de magia negra. O linchamento durou 20 minutos. A dona de casa morreu na segunda-feira 5. SELVAGERIA - Taís Cristina Martins, 13 anos, morta a pedradas por duas adolescentes que sofreram tentativa de linchamento em Foz do Iguaçu “Ela não teve direito de defesa. Eu não sei como foram confundir minha mulher com aquela da foto”, diz o marido Jaílson das Neves, 40 anos. Ele se refere ao retrato falado publicado no “Guarujá Alerta” que serviu de estopim para a tragédia. O site surgiu em 2012, depois que seu administrador, que não quer revelar nome e idade, mas aparenta ter cerca de 30 anos, foi assaltado na praia. “Criei a página para desabafar e para as pessoas relatarem onde elas estavam sofrendo crimes. Daí começou a crescer”, afirma. Ele então passou a escrever sobre delitos no município e a postar fotos de pessoas e cães desaparecidos. Em 26 de fevereiro deste ano, cerca de dois meses antes do linchamento, o “Guarujá Alerta” publicou uma mensagem dizendo ter firmado uma parceria com o 21º Batalhão da Polícia Militar da cidade. Um e-mail ao qual ISTOÉ teve acesso mostra que o 1º Tenente da PM Marcos Rovina Capovilla sugeriu a aproximação por causa da “credibilidade” do site. De acordo com a instituição, o 21º Batalhão não mantém nem manteve qualquer espécie de parceria com o responsável pelo perfil – a página apenas recebia os releases destinados à imprensa. “Lamentamos que o ‘Guarujá Alerta’ esteja tentando associar o nome da Polícia Militar de São Paulo aos seus atos irresponsáveis”, completa o órgão, em nota. No fim de abril, apenas alguns dias antes da execução pública de Fabiane, a página fez um mea-culpa afirmando que a história da sequestradora não passava de um boato. O estrago, porém, já estava feito. “A internet aumenta a dimensão de algo que teria impacto local. Em 30 anos de linchamentos, são poucos os registros em vídeo. Agora as pessoas filmam tudo”, afirma Ariadne Lima Natal, do Núcleo de Estudos da Violência da USP. Thiago Bottino, professor da Fundação Getulio Vargas Direito Rio, afirma que não é possível responsabilizar o administrador do site na esfera penal. “Ele precisaria conscientemente instigar alguém a causar o crime”, diz. Em relação à responsabilidade civil, a história é diferente. Como nesse caso o tribunal analisa o efeito de uma atitude, e não só sua motivação, o autor da postagem pode ser obrigado a pagar indenização, apesar de ainda não haver ação para isso. “O juiz precisaria decidir se a mensagem tem vinculação suficiente com o que aconteceu depois ou não”, afirma Luiz Fernando Moncau, também da FGV. Já os quatro suspeitos de linchar Fabiane, que foram presos pela polícia até agora, Valmir Dias Barbosa, 48 anos, Lucas Rogério Fabrício Lopes, 19, Carlos Alex Oliveira de Jesus, 22, e Jair Batista dos Santos, 35, podem ser indiciados por homicídio. Na opinião de estudiosos, apesar de a internet amplificar a repercussão de rumores, a falta de confiança nas instituições é o principal combustível do fenômeno. Como indício do descrédito, Moisés, da USP, aponta que 77% dos brasileiros acham que a lei não trata a todos igualmente e que 81% não se sentem representados por nenhum partido político. A opinião pública foi unânime na condenação do achaque a Fabiane porque ela não sequestrou criança alguma, mas uma parcela considerável da sociedade continua defendendo episódios de justiça feita com as próprias mãos (leia quadro nesta página). “Os linchadores são criminosos, seja a vítima inocente ou não”, afirma Ariadne, da USP. “As pessoas muitas vezes não conseguem ver que a justiça com as próprias mãos é na verdade uma grande injustiça que pode se voltar contra elas. E você também tem comentaristas irresponsáveis na mídia que podem exacerbar a intolerância e a violência”, diz Moisés. Nildo Neves, 42 anos, cunhado da vítima, que sentiu o peso da barbárie na pele, professa: “Olhando para as crianças presentes no vídeo da morte de Fabiane eu me preocupo com o que será daqui a 10, 15 anos.” 6#3 DERROTA DAS ESTRELAS Câmara dá importante passo em prol da liberdade de expressão ao aprovar projeto que permite a publicação de biografias não autorizadas, contrariando o desejo de medalhões da MPB Paula Rocha (paularocha@istoe.com.br) Após três anos de tramitação e muita discussão, a Câmara dos Deputados aprovou, na semana passada, projeto de lei que permite a publicação de biografias não autorizadas. A decisão contraria as vontades de figurões da classe artística brasileira, como Caetano Veloso, Chico Buarque e Djavan, que, no fim de 2013, vieram a público defender a manutenção das regras atuais que regulam esse tipo de obra. De acordo com o Código Civil brasileiro, é possível vetar livros escritos sem autorização prévia dos biografados ou de seus herdeiros. A decisão da Câmara sinaliza um avanço na busca pela liberdade de expressão e pelo acesso à informação no Brasil e foi comemorada por escritores e pelo mercado editorial. “Estamos muito satisfeitos com essa aprovação. O atual artigo do Código Civil é inconstitucional e precisa ser revisto”, disse Sônia Machado Jardim, presidente do Sindicato Nacional de Editores de Livros (SNEL). A proposta, de autoria do deputado Newton Lima (PT-SP), defende que não é necessária autorização prévia para publicar biografias de pessoas cuja trajetória pessoal, artística ou profissional tenha dimensão pública ou esteja inserida em acontecimentos de interesse da coletividade. Caso das personalidades que se posicionaram contra as obras não autorizadas. Reunidos no grupo Procure Saber, criado pela empresária e ex-mulher de Caetano, Paula Lavigne, em 2013, músicos como Chico Buarque, Djavan, Milton Nascimento, Gilberto Gil, Roberto Carlos e o próprio Caetano causaram polêmica ao declarar que o respeito ao direito à privacidade e à intimidade é mais importante que a livre circulação de informações. Tachados de defensores da censura, e frente à enxurrada de críticas, o grupo voltou atrás e suavizou o discurso. “Não negamos que essa vontade de evitar a exposição da intimidade, da nossa dor, ou da dor dos que nos são caros, em dado momento nos tenha levado a assumir uma posição mais radical”, disse Roberto Carlos em vídeo divulgado pelo grupo, que ele abandonou meses depois. VETO - Roberto Carlos censurou uma biografia sua em 2007. Pelo texto aprovado na Câmara, isso não será mais possível A polêmica sobre as biografias não autorizadas no Brasil começou justamente por conta de uma ação do próprio Roberto Carlos. Em 2007 foi tirada de circulação a obra “Roberto Carlos em Detalhes”, de autoria de Paulo Cesar de Araújo. Por não concordar com a publicação, Roberto entrou na Justiça ameaçando multar a editora Planeta em R$ 3 milhões, caso ela não suspendesse e recolhesse o livro. Um acordo foi feito entre as partes, mas o autor Araújo diz que continua brigando para poder liberar a obra. “Havia uma aberração jurídica no caso das biografias não autorizadas no País e eu estou muito otimista com essa decisão da Câmara dos Deputados”, disse o escritor. “Agora vou esperar que o Roberto Carlos se manifeste.” O advogado de Roberto, Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, declarou que a aprovação do projeto de lei não muda nada no caso desse livro, mas diz ver a medida como algo positivo “É claro que o direito à informação é importante, mas desde que sejam informações verdadeiras e não injuriosas. E esse direito deve estar no mesmo patamar do direito à intimidade”, opina Kakay. "Pensei que o Roberto Carlos tivesse o direito de preservar sua vida pessoal. Parece que não" - Chico Buarque Após a decisão da Câmara, o projeto de lei agora segue para análise no Senado e, se for aprovado, irá à sanção da presidenta Dilma Rousseff. Enquanto isso, uma ação movida pela Associação Nacional dos Editores de Livros (Anel) também tramita no Superior Tribunal Federal (STF) desde 2012 e aguarda o parecer da ministra Cármem Lúcia. Caso o projeto vire lei antes da decisão do STF, a ação vai perder seu objeto, mas não deixará de ser celebrada pelas associações de editores. “Nenhuma grande democracia ocidental cerceia tanto a liberdade de expressão de autores quanto o Brasil”, diz Gustavo Binenbojm, advogado da Anel. “Precisamos avançar nesse território e a suspensão da autorização prévia para a publicação de biografias já é um grande passo”, disse. Resta saber como as estrelas da música brasileira vão encarar essa derrota. "Editores e biógrafos ganham fortunas enquanto aos biografados resta o ônus do sofrimento e da indignação" - Djavan "Sou a favor de biografias não autorizadas de Sarney ou Roberto Marinho. Mas as delicadezas do sofrimento de Gloria Perez e o perigo de proliferação de escândalos são tópicos sobre os quais o leitor deve refletir" - Caetano Veloso 6#4 A NOVA FAMÍLIA SCOLARI Mais jovem do que o time de 2002, e igualmente disciplinado, o grupo escalado para a Copa reflete a personalidade do treinador da Seleção, que faz escolhas baseadas não só nas características técnicas dos atletas, como também na sua personalidade Há quem diga que o jeito “paizão” de Luiz Felipe Scolari, o técnico Felipão, seja um recurso usado por ele para transferir, de forma sutil, ainda mais responsabilidade aos 23 “filhos” – os atletas que vão disputar a Copa do Mundo, a partir de 12 de junho, no Brasil. Seja como for, a “família Scolari” não foge aos padrões de formação. O predileto do chefe do clã seria Neymar (Barcelona), o garoto prodígio da turma. Os filhinhos de papai são Bernard (Shakhtar Donetsk), o mais jovem dos convocados, com 21 anos, e Henrique (Napoli), homem de confiança do treinador desde os tempos de Palmeiras. Rebeldes, Ramires (Chelsea) e Jô (Atlético-MG) se contrapõem aos doces e prendados Hernanes (Inter de Milão) e Oscar (Chelsea). Willian (Chelsea) e Dante (Bayern de Munique), especialistas em roubar a bola dos adversários, conquistaram a admiração do patriarca pela disciplina e discrição. Os mais velhos e experientes, como sempre, são os mais cobrados da “prole” – caso de Thiago Silva, do Paris Saint-German (PSG), Fred (Fluminense) e do contestado Júlio César (goleiro do Toronto, Canadá), que servem como referência, além de ajudar a tomar conta da garotada. O paizão Felipão chamou um grupo homogêneo, sobre o qual tem ascendência. Já havia feito assim na vitoriosa campanha do penta Puxando os “irmãos”, os volantes Luiz Gustavo (Wolfsburg), Paulinho (Tottenham) e Fernandinho (Manchester City) fazem o chamado trabalho pesado: combatem e desarmam o adversário para que a família brilhe. Outro membro da linhagem, o atacante Hulk (Zenit) é, segundo especialistas, uma espécie de faz tudo dentro da “casa” – aceita as orientações táticas e obedece fielmente ao treinador fielmente. E todos sabem como esse elemento é importante para equilibrar o grupo. Scolari também aprecia quem, como ele, não tem medo de cara feia. Se a situação apertar em campo, o técnico pode recorrer ao lateral Maicon (Roma) para o enfrentamento mais aguerrido. Porém, entre a força e a razão, o titular do coração de Scolari para a posição é Daniel Alves (Barcelona), quase um filósofo do futebol por causa da demonstração de bom senso, inteligência e habilidade no amplamente divulgado episódio da banana, em que o atleta comeu a fruta jogada por um torcedor que queria ofendê-lo comparando-o a um macaco. Se algum dos “filhos” preocupa Felipão, com certeza não são os goleiros Jefferson (Botafogo) e Victor (Atlético Mineiro), que, ao lado de Maxwell (Paris Saint-Germain), são considerados os mais obedientes. Para o colunista Gilmar Ferreira, do “Jornal Extra”, do Rio de Janeiro, apesar de usar critérios técnicos na hora de recrutar os jogadores, o treinador valoriza muito a questão emocional, especialmente em relação ao convívio dos atletas com a comissão técnica. “A exemplo de 2002, ele chamou um grupo homogêneo, sobre o qual tem ascendência”, diz Ferreira. Como poucas vezes se viu em uma convocação de seleção, a família Scolari foi aprovada pelos cerca de 200 milhões de treinadores brasileiros. Mas para o comentarista Paulo Vinicius Coelho, o PVC, da ESPN Brasil, o que torna unânime a relação de convocados é, infelizmente, a falta de concorrência. “Não existe muita contestação porque não temos uma geração de craques, mas apenas de bons jogadores”, afirma. Renato Maurício Prado, da Fox Sports, concorda. “Estamos vivendo um momento de pobreza técnica tão grande que você não tem muito para onde fugir.” 6#5 SUA MAJESTADE, JAIR RODRIGUES Morte do cantor silencia uma das vozes mais versáteis e amadas da música popular brasileira Ana Weiss (ana.weiss@istoe.com.br) Jair Rodrigues tinha um pique invejável. Questionado certa vez sobre o segredo de tanta vitalidade, ele disse que sauna todo dia ajudava a manter o alto nível de energia aos 75 anos de idade, com shows marcados o ano todo. O corpo de Jair Rodrigues foi encontrado na manhã da quinta-feira 8 justamente na sauna de sua casa, em São Paulo. Infarto do miocárdio, segundo a assessoria JRC Produções, sua empresa, teria sido a causa da morte repentina. Dois dias antes, em um hotel na cidade de São Lourenço, em Minas Gerais, o precursor do rap no Brasil plantou bananeira, pulou e atendeu os pedidos de bis da plateia. Emocionou-se ao cantar “Romaria”, eternizada pela voz de sua mais lembrada parceira, Elis Regina. Segundo os produtores, teria ainda brincado de conversar com a colega, morta em 1982. “Olha, ‘Pimentinha’, manda um abraço para São Pedro porque eu não estou com pressa.” GÁS - Aos 75 anos de idade, o músico tinha agenda de shows e energia de fazer inveja aos artistas das novas gerações Paulista de Igarapava, Jair Rodrigues de Oliveira começou a cantar nos bares noturnos da cidade de São Carlos nos anos 1950. Mas considera o início da sua carreira 1962, ano em que gravou o primeiro disco, “um 78 rotações” com músicas de torcida para o Brasil na Copa do Mundo do Chile. A coroação, porém, veio com a vitória de “Disparada” no Festival de Música Popular Brasileira de 1966, primeiro lugar dividido com “A Banda”, de Chico Buarque, apresentada por Nara Leão. A partir daí, o cantor se firmou como uma das vozes – e presenças de palco – mais versáteis da música popular brasileira. Em 1971, gravou o samba-enredo “Festa para um Rei Negro”, da Acadêmicos do Salgueiro, do Rio. Saltava do samba para o baião, tendo passado com grande dignidade pelo sertanejo – com enorme sucesso na gravação de “Sua Majestade, o Sabiá” – e inaugurado o nosso rap. "Sua interpretação de 'Disparada', passados 40 anos da apresentação, muito me emociona" - Dilma Rousseff, em nota Uma de suas últimas aparições públicas em São Paulo ocorreu na estreia de “Elis, a Musical”, em cartaz no Teatro Alpha. O pai de Jair Oliveira Mello e Luciana Mello parou o espetáculo para aplaudir de pé o ator Ícaro Silva, que interpreta o cantor nos tempos dos festivais, comovendo a plateia com o mesmo sorriso largo que conquistou o público na interpretação do sertanejo da canção de Geraldo Vandré e Theo de Barros. O sertanejo que “aprendeu a ver a morte sem chorar”.  CORUJA - O cantor era uma presença recorrente dos shows dos filhos e também cantores Luciana Mello e Jair Oliveira 7# MEDICINA E BEM-ESTAR 14.5.14 7#1 FREIOS NO ENVELHECIMENTO 7#2 UMA ARMA DO FUNDO DO MAR CONTRA A AIDS 7#1 FREIOS NO ENVELHECIMENTO Diversas estratégias que acabam de ser divulgadas mostram ótima eficácia para aumentar a longevidade e evitar os danos ao organismo associados à passagem do tempo Cilene Pereira (cilene@istoe.com.br) Na última semana, a ciência apresentou ao mundo alguns dos mais promissores recursos contra os efeitos do envelhecimento. Todos são resultado de extensas pesquisas e configuram mais um passo importante para atenuar os prejuízos que o processo provoca para o funcionamento do organismo. A primeira boa novidade foi apresentada por pesquisadores da Northwestern Medicine (EUA). Depois de três anos estudando a molécula TM5441, eles verificaram que a substância estendeu em até quatro vezes mais o tempo de vida de cobaias programadas para passar por um processo acelerado de envelhecimento. A droga ainda impediu o envelhecimento dos vasos sanguíneos dos animais. Em experimentos anteriores, o mesmo grupo havia constatado que, em cobaias, ela tem potencial para auxiliar na prevenção da aterosclerose (pode levar ao infarto) e da hipertensão. “Este é o primeiro composto que apresenta resultados tão robustos em nossos estudos”, afirmou à ISTOÉ o cientista Douglas Vaughan, líder do trabalho. De fato, o potencial da droga é tão atraente que ela é uma das poucas selecionadas para teste pelo órgão americano National Institute on Aging – um dos mais atuantes do mundo na busca por recursos antienvelhecimento. A próxima etapa da pesquisa será estudar a eficácia do composto em cobaias programadas para um envelhecimento normal. Depois, vêm os testes em humanos. “Pretendemos iniciá-los em dois anos”, informou Vaughan à ISTOÉ. Na Universidade da Califórnia (EUA), os cientistas testaram a eficácia de uma substância recém-identificada que atua sobre o metabolismo e parece retardar o envelhecimento pelos mesmos caminhos fisiológicos pelos quais atua a restrição calórica – estratégia eficaz para prolongar a longevidade. O metabólito estendeu em 50% o tempo de vida das cobaias. O alvo dos pesquisadores da Universidade do Colorado (EUA) foi impedir o envelhecimento das artérias. Eles fizeram isso por meio da administração em cobaias, durante um mês, de um composto chamado MitoQ. Ao final, os animais, com idade equivalente à de humanos com 70, 80 anos, apresentavam vasos sanguíneos com saúde equivalente à de uma pessoa com 25 a 35 anos. “O MitoQ restaurou completamente a função do endotélio, camada que reveste os vasos sanguíneos”, explicou a cientista Rachel Gioscia-Ryan, responsável pelo experimento. A infusão de plasma (parte líquida do sangue) extraído de cobaias jovens em animais mais velhos, por sua vez, atenuou a degeneração cerebral. Os doadores foram cobaias de três meses. Os receptores tinham 18 meses de idade. Em comparação a um grupo que não recebeu as infusões, eles apresentaram melhores resultados em testes de memória. “Há fatores no sangue dos ratos mais jovens que reativam o cérebro dos mais velhos. Assim, ele funciona de forma mais parecida com a de um cérebro mais novo”, afirmou Tony Wyss-Coray, da Stanford University (EUA), coordenador da pesquisa. 7#2 UMA ARMA DO FUNDO DO MAR CONTRA A AIDS Cientistas extraem de corais australianos proteínas capazes de impedir que o vírus da Aids se multiplique no organismo Cilene Pereira (cilene@istoe.com.br) Uma nova arma contra o HIV, o vírus causador da Aids, pode vir do fundo do mar. Pesquisadores do National Cancer Institute, dos Estados Unidos, identificaram em corais localizados na costa norte australiana um grupo de proteínas que mostrou uma impressionante potência contra o micro-organismo. Os cientistas já planejam utilizá-las inclusive em géis e lubrificantes íntimos usados por mulheres para ajudar na prevenção da infecção pelo HIV. PODER - As moléculas retiradas dos corais tiveram efeito mesmo em pequenas concentrações As proteínas foram descobertas quando os cientistas faziam uma ampla avaliação do potencial dos produtos extraídos do mar e armazenados nas instalações do instituto americano. “É sempre empolgante quando descobrimos um novo tipo de proteína que ninguém havia visto antes”, disse à ISTOÉ o coordenador do trabalho, pesquisador Barry O’Keefe. Em testes realizados em laboratório, constatou-se que as substâncias – três, da classe das cnidarinas – conseguem impedir que o HIV invada suas células-alvo, as células T (uma das que compõem o sistema de defesa do organismo), mesmo em concentrações extremamente pequenas. “Elas se ligam ao vírus, evitando que ele penetre a membrana das células T”, explicou Koreen Ramessar, participante do estudo. “Isso é completamente diferente do que havíamos visto até agora com outras proteínas. Elas têm um mecanismo único de ação.” O objetivo dos cientistas agora é conseguir produzir as substâncias em larga escala. Eles sabem que não podem continuar a extraí-las dos corais, por uma questão de preservação ambiental. “Não queremos produzir nenhum dano aos corais”, assegurou o cientista O’Keefe. 8# ECONOMIA E NEGÓCIOS 14.5.14 8#1 A REINVENÇÃO DAS REDES DE LIVRARIAS 8#2 COMO FAZER A PORTABILIDADE DE CRÉDITO 8#1 A REINVENÇÃO DAS REDES DE LIVRARIAS Pressionadas pela concorrência da internet e dos livros digitais, as megalojas se associam a grifes de restaurantes e apostam em espaços públicos como o metrô para voltar a ganhar dinheiro no Brasil Luisa Purchio (luisapurchio@istoe.com.br) O comércio eletrônico desencadeou mudanças em diversos setores da economia, mas alguns deles resistiram bravamente aos novos tempos. Apesar do avanço de empresas como a Amazon, que passou a oferecer obras do mundo inteiro a preços acessíveis, e do aparecimento dos livros digitais, as grandes redes de livrarias continuaram fazendo um bom dinheiro no Brasil. A fartura, porém, parece estar com os dias contados. Balanços recentes divulgados pelas líderes do mercado brasileiro apresentaram resultados pouco animadores. As vendas da francesa Fnac caíram 1% no Brasil em 2013. Também no ano passado a Saraiva amargou prejuízo de R$ 16 milhões, depois de um longo ciclo de números positivos. Na Livraria Cultura, a velocidade de expansão caiu pela metade quando comparada a 2012. O fenômeno se repete em outros países. Nos Estados Unidos, a Amazon foi a principal responsável pelo fechamento da Borders, a criadora do conceito de megalivrarias, e agora a Barnes & Noble, uma das líderes do mercado americano, também enfrenta dificuldades. “A digitalização dos produtos mudou o papel das lojas físicas”, diz Maurício Morgado, professor de administração de empresas da Fundação Getulio Vargas. “ As marcas precisam se reinventar para não serem extintas.” NO METRÔ - Jacques Brault, diretor-geral da Fnac no Brasil: "Nossa empresa quer estar no caminho das pessoas" Apostas Se a chave do sucesso for a inovação, as grandes redes que dominam o mercado brasileiro estão no caminho certo. A Livraria Cultura aposta na gastronomia para alavancar as vendas. A unidade do Shopping Iguatemi terá, a partir do ano que vem, uma área destinada ao restaurante Maní Manioca, de Helena Rizzo, que há alguns dias recebeu o prêmio Veuve Clicquot de melhor chef do mundo. Além disso, a livraria terá um espaço reservado para o lazer de crianças. “O desafio do varejo hoje é contextualizar o produto vendido”, afirma Sergio Herz, presidente da Livraria Cultura e neto da fundadora Eva Herz. “Queremos oferecer experiências culturais nas lojas, onde a compra acaba sendo uma consequência.”A estratégia começa a dar resultados. Nos principais endereços da rede, a comercialização de livros foi potencializada por cursos oferecidos nas próprias lojas. Especializada no universo nerd, a marca Geek.Etc.Br, criada pela família Herz e que funciona em espaços anexos à livraria tradicional, triplicou a venda de quadrinhos. Investir em espaços físicos, porém, não é suficiente para suprir as demandas de um novo tipo de consumidor, cada vez mais conectado e ávido por adquirir produtos em rápida velocidade. O bom desempenho acontece quando as vendas virtuais e presenciais conseguem trabalhar juntas. “É importante que o cliente conheça o livro na loja e possa, quando está em casa, comprá-lo pela internet”, diz Amnon Armoni, professor especialista em varejo da Faap. A eficiência desse processo exige um investimento pesado em tecnologia e logística. A Livraria Saraiva detectou essa tendência e injetou no ano passado 20 milhões de reais em um centro de logística em Cajamar, para atender às encomendas das lojas e do site. “Os consumidores compram fortemente nos dois canais. Queremos entregar para o cliente o conteúdo a qualquer hora”, diz Pierre Berenstein, vice-presidente de Operações da Saraiva. Os resultados da rede em 2013 mostraram que o investimento no mercado online é essencial. A receita líquida nas lojas físicas cresceu apenas 6,7%, enquanto a do varejo eletrônico aumentou 11%. INOVAÇÃO - A Livraria Cultura, sob o comando de Sergio Herz, aposta em espaços personalizados para alavancar as vendas Aeroportos Já consolidado no mercado internacional, outro nicho começa a aparecer com mais intensidade no Brasil: a instalação de lojas em aeroportos. Até o fim do ano, a Saraiva pretende inaugurar cinco novas unidades, quatro delas no aeroporto de Viracopos, em Campinas, e uma no aeroporto Afonso Pena, em Curitiba. Apesar do alto custo pago pelo espaço, o potencial das vendas por metro quadrado compensa o investimento. A Fnac, que acaba de inaugurar uma loja no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, quer ir mais longe. A maior varejista mundial de cultura, informação e tecnologia analisa a criação de lojas “de conexão”, que, a exemplo da França, ficarão em pontos com alto fluxo de passageiros. No Brasil, está em estudo a instalação em estações de metrô e terminais rodoviários. “Nossa empresa quer estar no caminho das pessoas”, disse à ISTOÉ Jacques Brault, diretor-geral da Fnac no Brasil. Para aqueles que não resistem ao manuseio de livros nas prateleiras e à imersão cultural que as megalojas oferecem, essa é uma grande notícia. 8#2 COMO FAZER A PORTABILIDADE DE CRÉDITO Novas regras permitem transferir dívidas de um banco para outro com menos burocracia e em condições financeiras melhores para o consumidor Luisa Purchio (luisapurchio@istoe.com.br) O consumidor que está insatisfeito com os altos juros pagos em seus financiamentos bancários tem agora uma carta na manga para negociar com as instituições. Na segunda-feira 5 entraram em vigor as novas regras de portabilidade de crédito estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central. Na prática, está mais fácil migrar a dívida de uma instituição financeira para outra. A partir deste mês, a transferência da dívida deverá ser feita em até cinco dias úteis e os bancos se tornam os responsáveis por todo o processo, o que deve diminuir a burocracia. “A medida aumenta a eficiência e a concorrência no sistema financeiro”, afirma Anselmo Pereira Araújo Netto, consultor do Departamento de Normas do Banco Central. Uma das principais vantagens da regulamentação é a regra que estabelece que o novo saldo e o prazo de pagamento não podem ser maiores que os originais, o que evitará fraudes e processos pouco transparentes. “Muitas instituições renegociavam a dívida, mas as pessoas acabavam pagando mais”, diz Ione Amorim, economista do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). Com as novas regras, isso não vai mais acontecer. 9# MUNDO 14.5.14 MACONHA ESTATAL O presidente José Mujica formaliza a legalização da erva no Uruguai e coloca o país na vanguarda da política pública de combate às drogas Mariana Queiroz Barboza (mariana.barboza@istoe.com.br) Na semana passada, um “experimento”, palavra usada pelo próprio presidente José Mujica, foi colocado em prática no Uruguai. Desde a terça-feira 6, todas as etapas da venda de maconha, droga mais consumida no mundo, tornaram-se legais assim que Mujica reconheceu a legislação aprovada pelo Parlamento em dezembro do ano passado. Com isso, o Uruguai passou a ser o primeiro país a regular a erva por meio de um sistema estatal. Embora os cidadãos possam cultivar em casa para consumo pessoal, eles também terão de se registrar e seguir as regras definidas pelo governo, que incluem um limite de produção de até 480 gramas por ano ou seis mudas por residência – independentemente de quantas pessoas vivam lá. Já as vendas em farmácias, de até dez gramas semanais, que devem começar nos próximos seis meses, estarão restritas a quem estiver disposto a cadastrar suas impressões digitais. “A venda nem sequer vai ser mediante assinatura”, disse Mujica em entrevista à rede britânica BBC. “Vai ser com o polegar.” CRÍTICA - Para José Mujica, presidente uruguaio, a política repressiva só aumenta o consumo Os pacotes de maconha, cujas informações genéticas serão aprovadas e arquivadas pelo recém-estabelecido Instituto de Regulação e Controle da Cannabis, terão códigos de barras. Quem vai abastecer os pontos de venda é o próprio governo, que mediará a produção – prevista entre 18 e 22 toneladas anuais – em áreas protegidas pelo Ministério da Defesa em Montevidéu e nas províncias do sul do país. Apesar de orgulhoso pelo título de país mais liberal da América do Sul, onde a prostituição, o jogo, o aborto e o casamento gay também são legalizados, o Uruguai evita relativizar os efeitos da maconha para a população. A propaganda de produtos relacionados à droga foi proibida, assim como o fumo em escolas, locais públicos fechados e táxis. Além disso, motoristas flagrados sob o efeito da maconha podem perder sua licença para dirigir e funcionários de empresas podem ser suspensos se pegos fumando no local de trabalho. “A regulação permite maior controle das famílias sobre o consumo recreativo, que atrai tantos adolescentes, à medida que abre espaço para um diálogo aberto e reduz o poder dos traficantes”, disse à ISTOÉ Jacqueline Ponzo, médica e presidente da Sociedade Uruguaia de Medicina Familiar e Comunitária. “Também será positiva do ponto de vista da pesquisa científica, porque muita informação é limitada pela condição de ilegalidade da maconha.” Para Jacqueline, a possibilidade do uso medicinal abre ainda um novo mercado para a capacitação de profissionais da área. POPULAR - Jovem apoia a nova lei em marcha pela maconha em Montevidéu. Usuários agora poderão plantar a erva em casa O que a iniciativa uruguaia expõe, a seu modo, é a falência da guerra às drogas. Em um artigo publicado na semana passada no “Financial Times”, o megainvestidor George Soros disse que a política de repressão fez mais mal do que bem, resultando, nas últimas quatro décadas, em um fracasso de US$ 1 trilhão aos governos do mundo inteiro. Segundo o presidente Mujica, há 25 anos o Uruguai tinha entre mil e 1,5 mil consumidores de maconha e, depois de tanto tempo de “política repressiva”, o número só cresceu. O governo estima que hoje existam cerca de 150 mil usuários e que ao menos um terço dos presos esteja encarcerado por situações relacionadas ao narcotráfico. Na semana passada, segundo a imprensa local, um jovem que havia sido detido por portar 20 gramas foi liberado de acordo com a nova lei. Agora, quem violar a legislação estará sujeito ao pagamento de multas de até dois mil pesos uruguaios (o equivalente a quase R$ 200) e à expulsão do registro nacional da maconha. 10# CULTURA 14.5.14 10#1 LIVROS - MULHERES DOS IMPERADORES DE ROMA 10#2 MÚSICA - O SOM QUE VAI ANIMAR O BRASIL 10#3 CINEMA DO SERIADO PARA GODZILLA 10#4 EM CARTAZ – CINEMA - DE FORTALEZA A BERLIM 10#5 EM CARTAZ – LIVROS - A HISTÓRIA NUM LAPSO 10#6 EM CARTAZ – TEATRO - UM NOVO CIRCO MÍSTICO 10#7 EM CARTAZ – FOTOGRAFIA - TANQUES NAS RUAS 10#8 EM CARTAZ – MÚSICA - DISCOTECA SUECA 10#9 EM CARTAZ – AGENDA - PIZZARELLI/VIDAS PRIVADAS/CACILDA 64 10#1 LIVROS - MULHERES DOS IMPERADORES DE ROMA Traidoras, ninfomaníacas, manipuladoras, assassinas - assim eram as primeiras-damas do império romano apresentadas em novo livro que cobre cinco séculos de história Ivan Claudio (ivanclaudio@istoe.com.br) "Ouso do nome Messalina como sinônimo de mulher pérfida e viciada em sexo é o exemplo mais óbvio de como a imagem das imperatrizes romanas eternizada nos textos históricos pode estar impregnada de cores fortes – para não dizer, de estereótipos. Não se sabe com exatidão, por fontes primárias, o verda deiro perfil dessas consortes, embora o temperamento traiçoeiro tenha prevalecido em seus retratos. Um exemplo recente é lembrado pela historiadora inglesa Annelise Freisenbruch, autora de “As Primeiras-Damas de Roma” (Record). Na série “Roma”, do canal HBO, o personagem mais cruel na galeria de déspotas e assassinos é Ácia, sobrinha de Julio César. Pelo pouco que se conhece, era mãe devotada e correta para o filho Otaviano. No seriado, contudo, ela foi apresentada como figura sagaz e sedutora, totalmente amoral. SANGUE E BELEZA - Cena do seriado "Roma", que retrata o poder feminino na Cidade Eterna O propósito de Annelise é justamente iluminar com análise contemporânea essa imensa galeria feminina para, na impossibilidade de desfazer equívocos, pelo menos dar subsídios sociais e antropológicos para uma justa avaliação. Projeto difícil, sabe-se. Como amenizar as cores usadas para descrever, por exemplo, a citada Messalina, mulher de Claudio, chamada pelo satírico Juvenal de “Meretrix Augusta” (sua alteza, a meretriz)? Figura principal do capítulo “As Bruxas do Tibre”, ela é apresentada como “um prodígio carnal que nenhum trunfo ou título era capaz de transformar numa matrona respeitável”. Para saciar o seu desejo, esperava o marido dormir, punha um capuz sobre a peruca loira e se dirigia a um prostíbulo onde tinha cubículo privado. “Então, lá ficava, nua e à venda, com os mamilos dourados, sob o pseudônimo de Loba”, escreve Juvenal. Outras fontes a mostram como incentivadora do adultério, conclamando mulheres nobres a fazer o mesmo. Teria até desafiado uma prostituta em maratona sexual, saindo vencedora depois de satisfazer o 25º amante. Segundo a autora, que se alinha num esforço historiográfico iniciado nos anos 1970, a identidade das primeiras-damas de Roma foi vítima de escritos feitos a partir da história e da reputação política dos imperadores, assim como pela reação crítica aos seus governos. Entre os arquétipos recorrentes, as mulheres dos césares são ora madrastas conspiradoras, caso de Agripina, mãe de Nero, ora esposas sofridas, a exemplo de Claudia Otávia, primeira mulher do mesmo governante, que se divertia matando estranhos nas vielas da Cidade Eterna. A LOBA - Messalina, na Tela de Hans Makart: traição ao marido, Claudio, em um prostíbulo onde tinha cabine privada Cobrindo cinco séculos, desfilam pelas páginas do livro beldades como Julia, a filha de Augusto que se embebedava no fórum e promovia orgias na tribuna, ou Popeia, a segunda mulher de Nero, que o levou a matar a mãe, Agripina, para ser aceita na corte. A viúva negra Agripina, aliás, fazia parte do “trio perigoso” que incluía Messalina e Lívia, apelidada de “Ulisses de saia” pelo seu bisneto Calígula. Primeira imperatriz, companheira de Augusto, Lívia abre o relato de atrocidades: teria eliminado com indiferença inumana todos os adversários do filho Tibério. Também no seu caso as versões contrastantes se multiplicam. O historiador Tácito a apresenta como uma tirana ingovernável; para o poeta Ovídio, ela era mãe casta, com beleza de Vênus; fortaleza estoica em face do luto para o filósofo Sêneca. Mestrada em poções, cai-lhe bem a advertência de um contemporâneo: “Abastados órfãos sem pai, eu os alerto – temam por suas vidas e não confiem em um único prato. A fumaça escura que sai daquelas massas é o veneno.” 10#2 MÚSICA - O SOM QUE VAI ANIMAR O BRASIL O CD com as músicas que serão ouvidas nos estádios reúne um time enxuto de artistas nacionais e torna-se alvo de críticas pela escolha dos selecionados Wilson Aquino (waquino@istoe.com.br) Saiu a lista das músicas que serão ouvidas sem parar nos próximos meses. Nas lojas a partir da segunda-feira 12, o CD “One Love, One Rhythm: Álbum Oficial da Copa do Mundo da Fifa 2014” reúne 17 faixas com as canções escolhidas pela gravadora Sony Music e pela organizadora do evento. Apenas oito artistas brasileiros foram selecionados: Alexandre Pires, Arlindo Cruz, Bebel Gilberto, Carlinhos Brown, Preta Gil, Psirico, Rodrigo Alexey e Sérgio Mendes. Eles dividem microfones com astros latinos como Rick Martin, Jennifer Lopez, Pitbull e Shakira, além do lendário guitarrista mexicano Carlos Santana. No clima “não vai ter Copa”, o álbum chega como alvo de críticas. “Então, Zeca Pagodinho e Ivete Sangalo, que teriam uma qualidade melhor, não estão no disco porque pertencem à gravadora rival Universal?”, reclama o crítico Mauro Ferreira. O pesquisador Ricardo Cravo Albin engrossa o coro, diz que faltou brasilidade: “É um disco mundial, mas eles foram ingratos em não contemplar mais o país do futebol e do samba. É descartável demais.” TITULARES - O rapper Pitbull e Claudia Leitte (acima) vão cantar "We Are One" na abertura da Copa. Ricky Martin participa pela segunda vez de um CD da FIFA com "Vida" Com seu grande potencial de divulgação dos cantores, o CD bem que poderia ter investido mais no time canarinho. Segundo o cantor e compositor Carlinhos Brown, que participa com uma parceria com Sérgio Mendes (“One Nation”), o lobby nacional foi fraco. “A Fifa é quem toma as decisões. Não questiono. Falta é mais interlocução para a gente aproveitar melhor nossas oportunidades”, diz ele. Do lado da Fifa, o elenco é um verdadeiro dream team. “Os fãs de futebol e de música de todo o mundo vão adorar a grande combinação entre as melhores estrelas internacionais e os fantásticos artistas brasileiros”, afirma Thierry Weil, diretor de marketing da federação. “O álbum vai oferecer um ritmo contagiante ao futebol que veremos no Brasil.” O time titular não reclama. Nem tem como, caso de Márcio Victor, da banda Psirico. “Quem escolheu o repertório está atento ao que acontece no Brasil. O ‘Lepo Lepo’ é a música mais cantada nos estádios”, diz. SUVENIR SONORO - O CD tem uma tiragem inicial de 50 mil cópias e sai em versão standard e em versão limitada com livro de fotos de 24 páginas. Só artistas da Sony Music foram convidados Lançado com a tiragem inicial de 50 mil cópias, o CD tem dois formatos: o standard (R$ 24,90) e a versão limitada (R$ 49,90) para colecionador, que sai com livro em capa dura de 24 páginas, fotos e informações das cidades-sede. Ambas as versões trazem instruções para que as pessoas acessem o aplicativo do mascote Fuleco, através de smartphones e tablets – o seu tema é interpretado por Arlindo Cruz. Com trechos em português, espanhol e inglês, a música “We Are One” (somos um) foi escolhida como tema oficial da Copa e será cantada na cerimônia de abertura pelo rapper Pitbull, Jennifer Lopez e Claudia Leitte. “Dar um Jeito” (We Will Find A Way), com Carlos Santana, Wyclef, Alexandre Pires e o DJ Avicii, é a música da cerimônia de encerramento. O álbum traz ainda a faixa “Vida”, vencedora do concurso SuperSong, decidido pelos fãs. Seu intérprete, Ricky Martin, aparece mais uma vez entre os selecionados de um disco da Copa – o ex-Menudo emplacou “The Cup of Life”, no Mundial de 1998, na França. Para o consultor de marketing e gestão esportiva Amir Somoggi, esse tipo de disco é um item menor na megaoperação da grande festa esportiva. “Os projetos de marketing, como música tema, camarotes padronizados e venda de produtos licenciados existem mais para fortalecer a marca Fifa”, afirma Somoggi. O historiador carioca Carlos Eduardo Lima, colaborador da revista “Rolling Stone”, concorda que o CD “não é uma obra que a pessoa consuma pelo valor artístico”, mas reconhece a importância do lançamento. “A pessoa compra porque quer que a Copa faça parte da vida dela. É mais uma lembrancinha do evento. Quando acabar a Copa, ninguém ouve mais.” 10#3 CINEMA - DO SERIADO PARA GODZILLA Ator atual mais bem pago, Bryan Cranston alavanca a nova versão do filme de monstros, fazendo o caminho oposto da tevê para o cinema Ivan Claudio (ivanclaudio@istoe.com.br) A migração de astros do cinema para a tevê abriu caminho para a via oposta, com atores que estouraram em séries sendo contratados a altos salários para as superproduções de Hollywood. O nome mais recente é o de Bryan Cranston, que, após ganhar projeção em “Breaking Bad”, tem o talento testado em blockbusters com “Godzilla”, em cartaz na quinta-feira 15. MONSTROS EM AÇÃO - O ator Bryan Cranston e a criatura japonesa: primeiro papel depois dos recordes de "Breaking Bad" O astro que ganhou fama aos 58 anos leva para o remake do famoso filme de monstros a sua base de fãs – o episódio final de seu seriado, exibido no ano passado, foi visto por dez milhões de pessoas só nos EUA. Sua escalação para o elenco de “Godzilla” leva a crer, portanto, que cinema e tevê atualmente se retroalimentam, ao contrário do que se imagina. “São experiências diferentes, e isso é proveitoso para todos”, diz a produtora Vânia Catani. Não é necessário ir longe para comprovar a tese: longas brasileiros com artistas globais dificilmente vão mal em bilheteria. Ator mais bem pago do mundo, segundo a lista da revista americana “People”, Cranston faturou US$ 82 milhões desde abril de 2013, soma considerável levando-se em conta que seu cachê inicial (por episódio) em “Breaking Bad” era de US$ 225 mil. Ele aceitou atuar em “Godzilla”, após cinco anos interpretando Walter White, porque acreditava que não havia como comparar o papel atual com o do professor de química vítima de câncer terminal, que decide entrar no ramo das drogas para manter a família. Na verdade, é difícil não fazer associações, já que na superprodução Cranston tem apenas um upgrade profissional – é agora um físico nuclear que trabalha na usina japonesa onde acontece um acidente relacionado ao aparecimento da gigantesca criatura. Passa também por um drama familiar. Cranston responde, assim, pelo lado humano da história contra o investimento em tecnologia dos blockbusters que têm em “Godzilla”, com seu orçamento de US$ 160 milhões, mais um exemplar de peso. 10#4 EM CARTAZ – CINEMA - DE FORTALEZA A BERLIM A possibilidade de reinvenção da vida, a partir do zero e em outra realidade cultural, é o mote do filme "Praia do Futuro" por Ivan Claudio (ivanclaudio@istoe.com.br) A possibilidade de reinvenção da vida, a partir do zero e em outra realidade cultural, é o mote do filme “Praia do Futuro”, em cartaz na quinta-feira 15. Na história de Karim Aïnouz, Wagner Moura interpreta um salva-vidas que trabalha nas praias de Fortaleza e se envolve com um soldado alemão (Clemens Schick), cujo parceiro de viagem morreu por afogamento. Ele muda-se para Berlim com o novo amigo, ex-combatente no Afeganistão e mecânico de motos, perdendo o contato com os familiares. Após oito anos, é levado a refletir sobre o passado com a chegada de seu irmão caçula (Jesuíta Barbosa) à cidade. A trama rarefeita, repleta de elipses, deixa em aberto as motivações dos personagens, mas é conduzida com segurança e precisão. + 5 obras de Karim Aïnouz MADAME SATÃ Filme que revelou Lázaro Ramos. Ele faz o malandro e transformista conhecido da vida boêmia da Lapa, no Rio de Janeiro. O CÉU DE SUELY Hermila Guedes é a mulher que rifa seu corpo para conseguir comprar passagens e ir embora de Iguatu, no Ceará. VIAJO PORQUE PRECISO, VOLTO PORQUE TE AMO Um geólogo (Irandhir Santos) tece comentários existenciais e amorosos durante uma viagem. ABISMO PRATEADO A canção “Olhos nos Olhos”, de Chico Buarque, serviu de inspiração para o drama de uma mulher abandonada pelo marido. ALICE Série televisiva sobre uma jovem de Palmas (TO) que decide viver em São Paulo. 10#5 EM CARTAZ – LIVROS - A HISTÓRIA NUM LAPSO por Ivan Claudio (ivanclaudio@istoe.com.br) A mesma cadência veloz que embala sem descanso o leitor em “O Filho Eterno” marca as páginas de “O Professor” (Record), novo romance de Cristovão Tezza. Na reconstituição de sua vida, o protagonista Heliseu passa por momentos-chave, como a Campanha das Diretas Já, em 1984, ou o Golpe que levou o País à ditadura, em 1964. Tudo isso num lapso de tempo que precede um discurso para o qual ele deveria estar pronto, mas que sua vida em retrospectiva mostra que talvez não. 10#6 EM CARTAZ – TEATRO - UM NOVO CIRCO MÍSTICO por Ivan Claudio (ivanclaudio@istoe.com.br) Sucesso nos anos 1980, o musical “O Grande Circo Místico”, de Chico Buarque e Edu Lobo, volta à cena no Rio de Janeiro com novos personagens, situações e conflitos. O espetáculo, inspirado no poema “A Túnica Inconsútil”, do poeta alagoano Jorge de Lima, centra-se no amor de um aristocrata por uma acrobata circense e faz parte das celebrações dos 70 anos de Chico, que serão completados em 19 de junho. Uma guerra que muda o rumo de toda a história está entre as novidades da montagem, submetidas e aprovadas pelos dois autores. O musical fica em cartaz no Teatro Net, em Copacabana, até julho, quando deve seguir para São Paulo. 10#7 EM CARTAZ – FOTOGRAFIA - TANQUES NAS RUAS por Ivan Claudio (ivanclaudio@istoe.com.br) Uma seleção de 75 das 250 imagens feitas pelo fotógrafo Josef Koudelka nos primeiros sete dias da invasão de Praga pelas tropas soviéticas, em agosto de 1968, pode ser vista no evento “Maio Fotografia” (Museu da Imagem e do Som, São Paulo, até 22/6). Estão lá flagrantes antológicos dos tanques nas ruas e do povo indignado, além do mais conhecido deles, o relógio de pulso mostrando a hora da ocupação. Divulgadas em 1969 pela Agência Magnum como de autoria de P.P. (Prague Photographer) – uma forma de proteger a identidade de Koudelka –, as fotos correram o mundo e lhe valeram o prêmio Robert Capa, tornando-se símbolo da resistência e um clássico do fotojornalismo – embora o fotógrafo, que ficou conhecido pela documentação de ciganos, recuse enquadrar seu trabalho nesse tipo de registro. 10#8 EM CARTAZ – MÚSICA - DISCOTECA SUECA Abba é um grupo com uma história ímpar, que compunha em diferentes idiomas e ainda hoje, 30 anos após a sua dissolução, faz qualquer pista de dança levantar por Ivan Claudio (ivanclaudio@istoe.com.br) Abba é um grupo com uma história ímpar, que compunha em diferentes idiomas e ainda hoje, 30 anos após a sua dissolução, faz qualquer pista de dança levantar. “Waterloo”, música título do álbum que volta às lojas em edição comemorativa, foi um hit obrigatório desde o seu lançamento, há quatro décadas. “Honey, Honey” e “Hasta Mañana” são outros sucessos dançantes apresentados em várias versões: espanhol, francês, inglês e, por que não, sueco. O álbum duplo traz também um DVD com apresentações ao vivo do quarteto, como o show da BBC que colocou “Waterloo” em todas as rádios, em abril de 1964. 10#9 EM CARTAZ – AGENDA - PIZZARELLI/VIDAS PRIVADAS/CACILDA 64 Confira os destaques da semana por Ivan Claudio (ivanclaudio@istoe.com.br) JOHN PIZZARELlI (Rio de Janeiro, Natal, Recife e Porto Alegre, de 15/5 a 22/5) – O guitarrista e cantor americano de jazz apresenta o repertório de seus recentes trabalhos acompanhado de baixo, piano e bateria. VIDAS PRIVADAS (Teatro Jaraguá, São Paulo, até 3/8) – Peça de Noël Coward sobre um casal divorciado que se reencontra durante a lua de mel com seus novos parceiros. Direção de José Possi Neto. WALMOR Y CACILDA 64 (Teatro Oficina, São Paulo, até 1º/6) – Também chamado“Robogolpe”, o musical do grupo Oficina trata da repressão sofrida pelo teatro paulistano durante a ditadura. 11# A SEMANA 14.5.14 por Antonio Carlos Prado e Elaine Ortiz "DEVOLVAM AS NOSSAS MENINAS" “Eu capturei suas meninas, Alá diz que devo vendê-las, elas são propriedades dele e seguirei suas instruções.” Foi assim que o líder do grupo extremista islâmico Boko Haram reivindicou em vídeo a autoria do sequestro de mais de 200 estudantes de Chibok, na Nigéria. Elas foram capturadas do colégio em que estudavam há 3 semanas, mas somente depois de revelada a autoria do crime e da fuga de uma delas é que uma reação do governo nigeriano se tornou clamor internacional. Milhares de nigerianos foram às ruas protestar contra as autoridades e, pela internet, outros milhares engrossaram o coro na campanha #BringBackOurGirls. Até a primeira-dama dos EUA manifestou-se. EUA, Reino Unido, China e França ofereceram assistência ao presidente Goodluck Jonathan. Nenhuma ação, porém, trouxe resultados. Pelo contrário, enquanto o governo nigeriano expõe sua fraqueza, os extremistas mostram sua força: na segunda-feira 5 executaram um novo atentado em um vilarejo, deixando mortas mais de 300 pessoas. "A PRIMEIRA E ÚLTIMA VEZ DE PORTINARI NA EUROPA" Nenhuma obra de arte expressou com tanta clareza o horror da guerra e a beleza da paz quanto a criada pelo mestre brasileiro Candido Portinari no início da década de 1950. “Guerra e Paz”, doada pelo governo brasileiro para a Organização das Nações Unidas. É com tamanha responsabilidade que os painéis saíram de Nova York e estão expostos pela primeira vez ao público europeu no Grand Palais, em Paris – é também a primeira vez que o salão nobre recebe uma pintura brasileira. Três aviões cargueiros transportaram as placas que compõem a obra de 14 metros de altura e operários alpinistas foram contratados para a montagem. O projeto, coordenado pelo filho de Portinari, João Candido, demorou cinco anos para se tornar realidade, custou R$ 8,5 milhões e estima-se que cerca de 300 mil pessoas visitem a mostra até 9 de junho, nessa que provavelmente será a última vez que o público europeu verá “Guerra e Paz” fora da sede da ONU. "CRIANÇAS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA, ADULTOS DEPENDENTES DO ÁLCOOL" Pessoas que sofreram algum tipo de violência durante a infância ou a adolescência têm quase três vezes mais chances de se tornarem dependentes químicos na idade adulta. Essa é a conclusão do segundo Levantamento Nacional de Álcool e Drogas da Universidade Federal de São Paulo, divulgado na semana passada. Entre as principais agressões apontadas pelo estudo estão empurrões, arranhões e beliscões, com 12,4%, e batidas que deixam marcas, com 11,9%. Ameaças com facas ou outras armas e queimaduras surgem na sequência, com 1,7% e 0,7%, respectivamente. 45,7% dos alcoólatras afirmam ter sofrido algum tipo de violência na infância. 52% dos usuários de cocaína dizem ter sido vítimas de abuso. "UM TESOURO DE US$ 1,3 MILHÃO NO FUNDO DO MAR" Passados 150 anos do acidente que resultou no naufrágio do SS Central America, no Oceano Atlântico, mais de mil onças de ouro (31,1 kg), equivalentes a US$ 1,3 milhão, foram retiradas dos destroços do navio pela empresa Odyssey Marine Exploration. O resgate do tesouro aumenta as especulações de que ainda exista uma fortuna submersa, já que a embarcação levava 425 passageiros e um grande carregamento de ouro que abasteceria os bancos nova-iorquinos naquele ano de 1857. Os destroços foram descobertos apenas em 1988, a 2.200 metros de profundidade, pelo especialista Thomas Thompson, que efetuou as primeiras operações de retirada do ouro – cerca de 50 milhões de dólares. "TORTURA E QUEDA DA POPULARIDADE DE MADURO" A ONG Human Rights Watch divulgou relatório em que denuncia violações de direitos humanos praticadas pelo governo venezuelano de Nicolás Maduro. Ao menos 41 pessoas morreram nos protestos desde fevereiro e 45 casos de abusos, como uso de munição letal, prisões arbitrárias e tortura, foram registrados. Outra pesquisa divulgada no mesmo dia dá conta da queda da popularidade do presidente: sua rejeição subiu de 44,6% em novembro para 59,2% em abril. "2 MIL" lixões a céu aberto estão em funcionamento no Brasil. De acordo com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, em vigor desde 2010, o País tem até o dia 3 de agosto para extinguir as atividades desse tipo de equipamento. Porto Velho, Belém e Distrito Federal são algumas das capitais que não cumpriram a meta. Os dados são da Confederação Nacional de Municípios. O ARREPENDIMENTO DE LEWINSKY, HOLLANDE E SHINAWATRA" “Sim, vai e diz, diz assim, que eu chorei, que eu morri de arrependimento, que o meu desalento já não tem mais fim”. Foi Chico Buarque quem escreveu os versos acima, mas eles transmitem bem o sentimento da americana Monica Lewinsky, do francês François Hollande e da tailandesa Yingluck Shinawatra. Na semana passada, todos vieram a público demonstrar os motivos de suas lamentações. Monica, a ex-estagiária da Casa Branca e escritora, quebrou os dez anos de silêncio e, em depoimento à revista “Vanity Fair”, declarou estar profundamente arrependida de seu envolvimento com o presidente Bill Clinton em 1998. O presidente francês, François Hollande, o mais impopular do país em décadas, assumiu que se arrepende de “algumas coisas” e compreende as dúvidas dos eleitores em relação a seu governo. Já a primeira-ministra da Tailândia, Yingluck Shinawatra, arrependeu-se por colocar um parente em um alto cargo do governo – foi destituída por abuso de poder. "TRÊS BRASILEIRAS FERIDAS EM ESPETÁCULO DE CIRCO" Em vez de risadas e aplausos, o que se ouviu na noite do domingo 4, durante a apresentação do circo Ringling Bros. and Barnum & Bailey na cidade americana de Providence, foi o choro de uma plateia perplexa. Oito acrobatas, que executavam o número conhecido como candelabro humano,no qual é utilizada a força capilar para manter presas as artistas a uma estrutura de ferro, desabaram de uma altura de 12 metros. Entre as vítimas, três brasileiras: Stefany Neves, 19 anos, Widney Neves e Dayana Costa, ambas de 25 anos. Até a noite da quinta-feira 8, apenas uma das oito bailarinas havia recebido alta, a americana Samantha Pitard. Segundo o boletim médico, nenhuma corre risco de morte. As circunstâncias do acidente ainda estão sendo investigadas. "eBAY PARA BRASILEIROS" O número de brasileiros que adquirem produtos pela internet triplicou em quatro anos. É por causa de dados como esse que o gigante americano eBay lançou na semana passada um site em português disponibilizando mais de 250 milhões de itens internacionais com a promessa de entregar os produtos em no máximo sete dias. Também outro gigante do e-commerce, a empresa chinesa Alibaba, entrou oficialmente com o pedido de abertura de capital nos EUA – estima-se que irá arrecadar US$ 20 bilhões na operação, o que poderá ser a maior oferta de ações da história americana. A Receita Federal no Brasil, no entanto, já fala em alterar a cobrança de impostos sobre produtos comprados de sites internacionais e entregues pelos Correios. Em 2013 chegaram aos Correios cerca de 21 milhões de encomendas, 44% a mais que no ano anterior. "OMS DÁ "ALERTA GLOBAL" CONTRA A POLIOMIELITE " A OMS é extremamente comedida e cautelosa em seus anúncios sobre riscos de epidemias globais. Por isso preocupa o fato de ela ter decretado “emergência sanitária” em relação ao retorno da poliomielite – doença causada por vírus que pode levar à paralisia e à morte crianças ou adultos não imunizados (ocorre transmissão entre humanos). Os focos principais são: Camarões, Paquistão e Síria. Essa é a segunda vez, em toda a sua história, que a OMS decreta estado de emergência mundial. "DNA DE MONALISA" Já é praticamente consenso entre historiadores de arte que a nobre Lisa Gherardini foi a modelo que inspirou Leonardo da Vinci na pintura de Monalisa. O que se quer confirmar agora, por meio de exames de DNA, é se os restos mortais de uma mulher que também viveu no século XVI são os de Lisa – eles estão sendo estudados por antropólogos italianos. O material genético desses ossos será comparado com o DNA de parentes de Lisa que estão sepultados na basílica da Santíssima Anunciação de Florença. "3.821" opositores políticos em cuba foram encarcerados no país a mando de Raul Castro nos primeiros quatro meses deste ano. O próprio governo, por meio da Comissão de Reconciliação Nacional, admite que é o início de ano mais repressivo desde 2000. No ano passado, no mesmo período, foram presas 1.588 pessoas que lutam pela democratização da ilha. "PRESO TORCEDOR QUE MATOU COM VASO SANITÁRIO" Está preso em Recife Everton Filipe Santiago Santana, acusado de homicídio. Não há na história do futebol nem na história da criminologia em todo o mundo o registro de alguém que tenha matado valendo-se de um vaso sanitário. É disso que, segundo a polícia, Everton é culpado. Integrante da torcida organizada Inferno Coral, do time do Santa Cruz, ele retirou a peça do banheiro feminino do estádio do Arruda, arremessado-a sobre um grupo de torcedores do Paraná. Dessa forma, matou um deles. Everton confessou o crime e declarou que teve ajuda de dois comparsas no ato de selvageria. A polícia o localizou graças ao serviço de disque-denúncia. Há imagens nas quais ele aparece espancando torcedores em outras partidas. Na quinta-feira (8) mais um suspeito de envolvimento no crime foi preso.