MINHA LINDA SEREIA The mermaid wife Rebecca Winters Sabrina edição de férias nº 26 Andrew Cordell, governador de um Estado americano, estava de férias nas Bahamas. Em um de seus mergulhos pelos majestosos recifes, deparou-se, para seu espanto, com uma belíssima sereia de cabelos dourados! Atingido pelo feitiço daquele olhar, tentou segui-la, mas ela fugiu com a agilidade de uma verdadeira criatura do mar. Quem seria ela? De onde viera? Ele tinha de descobrir! Pelo bem de seu próprio coração, agora completamente apaixonado... Querida leitora, Espero que você aprecie esse romance entre um governador e uma sereia. Existe algo nessas criaturas fantásticas que habitam os oceanos que sempre nos fascina, não é mesmo? Embora Lindsay não seja uma sereia de verdade, ela guarda consigo o conhecimento dos segredos do mar e, como uma sereia, consegue encantar e conquistar para sempre o coração de seu homem. Brincar de Amar é um romance bem-humorado, leve, gostoso, com uma heroína completamente maluca - no bom sentido, claro! Esses dois romances foram escolhidos a dedo, para que suas férias sejam ótimas... na nossa companhia! Janice Florido Editora Copyright © 1994 by Rebecca Winters Originalmente publicado em 1994 pela Silhouette Books, divisão da Harieqüin Enterprises Limited. Título original: The mermaid wife Tradução: Márcia do Carmo Felismino Copyright © 1994 by Ellen James Originalmente publicado em 1994 pela Silhouette Books, divisão da Harlequin Enterprises Limited. Título original: The engagement Tradução: Adelídia Chiarelli Todos os direitos reservados, inclusive o direito de reprodução total ou parcial, sob qualquer forma. Esta edição é publicada através de contrato com a Harlequin Enterprises Limited, Toronto, Canadá. Silhouette, Silhouette Desire e colofão são marcas registradas da Harieqüin Enterprises B.V. Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas terá sido mera coincidência. Copyright para a língua portuguesa: 1994 CIRCULO DO LIVRO LTDA. EDITORA NOVA CULTURAL LTDA. uma divisão do Círculo do Livro Ltda. Alameda Ministro Rocha Azevedo, 346 - 9- andar CEP: 01410-901 - São Paulo - Brasil Fotocomposição: Círculo do Livro Impressão e acabamento: Gráfica Círculo CAPÍTULO I — Ótimo, meninos. Hora de parar! Se continuarem assim, derrotarão o Clube West Hollywood, no próximo sábado. Sem dúvida, temos os melhores nadadores do Estado da Califórnia! Trinta e cinco meninos e meninas entre seis e dezessete anos soltaram exclamações animadas. Lindsay Marshall estava de pé, em um dos lados da piscina olímpica. Jogou os longos cabelos loiros sobre o ombro direito, apoiando-se sobre um joelho para falar com eles. — Estarei nas Bahamas nas próximas três semanas, mas voltarei a tempo de assistir o campeonato de natação. Enquanto isso, Bethany continuará a treiná-los, portanto, façam tudo que ela mandar, ok? Alguma pergunta, antes que as mães comecem a chegar? — Sim — disseram dois adolescentes. — Podemos ir com você? Os demais começaram a rir. Lindsay também sorriu com simpatia. — Gostaria de poder levar todos vocês, mas receio que a equipe de comerciais não iria gostar da idéia. Vou viajar a trabalho. — Será perigoso? — indagou a pequena Cindy Lou. — Eu teria medo dos tubarões. Cindy era uma dos doze alunos especiais do grupo. Lindsay tratava-os com mais individualidade, já que cada um deles tinha problemas específicos que exigiam o uso de terapia. — Tubarões só reagem se forem perturbados, Cindy. Meu maior medo, porém, é que eu sinta vontade de espirrar quando estiver sob a água e minha roupa acabe rasgando com o esforço. — Não seria nada mal — comentou Kyle Roberts, o adolescente mais velho da equipe, fazendo os outros rirem. — Espertinho! — Lindsay sorriu para ele, ficando de pé. — Ok, pessoal. A aula de hoje terminou. — Olhou para o relógio. — Opa, já passamos alguns minutos do horário. Enquanto todos saíam da piscina, Lindsay calçou as sandálias, vestiu a camiseta com o nome Clube Bel Air escrito nas costas e se dirigiu ao escritório para devolver o cronômetro e o apito. — Oi, Nate — ela cumprimentou o salva-vidas que estava no escritório. — Oi, Lindsay. Ele olhou-a de alto a baixo de uma maneira que a deixou irritada. Muitas outras mulheres do clube não se sentiam nem um pouco ofendidas com o comportamento de Nate. De fato, algumas até já haviam saído com ele, desde que ele entrara para a equipe, em janeiro. — Atendi três telefonemas para você — avisou ele. — Dois eram de homens. Quando é que vai ceder e dar um pouco de atenção a mim, Lindsay? Ela conteve a resposta malcriada que se formou em sua mente. No momento esse era seu único emprego e não podia se dar ao luxo de dizer tudo que pensava. Trabalhar em um clube frequentado por estrelas de Hollywood e seus filhos exigia certa dose de paciência. Principalmente para suportar seus colegas de trabalho, fossem eles profissionais do golfe e do tênis, ou mesmo salva-vidas com complexo de Mister Universo, cujos bíceps eram tão grandes quanto seus egos. — Quantos anos tem, Nate? Vinte e um, vinte e dois? O sorriso desapareceu do rosto dele. — Tenho vinte e quatro e você sabe disso. — Bem, farei vinte e sete no próximo aniversário e só saio com homens mais velhos, e que não sejam atléticos. Em outras palavras, não saio com homens que trabalham aqui. Era mesmo verdade. Os indivíduos que trabalhavam no clube passavam tanto tempo admirando a si mesmos, na esperança de serem descobertos por Hollywood, que nenhuma mulher poderia competir com isso. — Obrigada pelo convite e por ter anotado os recados para mim. Te vejo no final do mês. Fingindo ignorar o olhar furioso que recebeu, Lindsay pegou a bolsa e saiu. Acenou para duas mães que a cumprimentaram enquanto se dirigia ao estacionamento. Seu jetta continuava lá, um tanto antiquado em meio às ferraris, mercedes, jaguares e porschers. Leu o primeiro recado e viu o nome de Roger Bragg escrito logo abaixo. Ele era gerente de uma rede de apartamentos. Haviam saído juntos uma noite, mas Lindsay logo descobriu que cometera um grande erro. Roger mal havia acabado de se divorciar e logo na primeira noite já falara de casamento. O segundo recado era do agente de viagens que providenciara suas acomodações em Nassau. Ele ligara para dizer que tudo estava confirmado e que sua passagem estaria no balcão do aeroporto pela manhã. Claro que o último recado só poderia ser de seus pais. Lindsay suspirou, determinada a não aceitar outra discussão sobre o risco que eles achavam que ela estava correndo ao aceitar a proposta. Melhor seria se despedir por telefone, antes de embarcar no vôo. Ansiosa para arrumar as malas e partir, Lindsay ligou o carro e pegou a estrada para Santa Monica. A idéia de nadar sob o sol intenso das Bahamas parecia até um sonho. Sentia-se imensamente grata à amiga de sua mãe, que lhe apresentara a um agente de Hollywood. De imediato, ele a contratara para estrelar os comerciais de uma nova linha de cosméticos. Assinara um contrato de cinquenta mil dólares com a agência de propaganda. Esse dinheiro, unido às economias que ela vinha fazendo a algum tempo, possibilitariam seu ingresso no Instituto Scripp's, em San Diego, como estudante em período integral. Se conseguisse juntar uma boa soma em dinheiro, não teria que se preocupar com seu sustento até receber seu diploma de pós-graduação. A Universidade da Califórnia, em San Diego, possuía uma das melhores escolas oceanográficas do mundo, a Scripp's. Um dia, Lindsay pretendia desenvolver projetos importantes que a levariam a várias partes do globo. Desde que aceitara fazer o comercial e assinara o contrato, já lera tudo que encontrara sobre nado e mergulho naquela parte do mundo. Também conversara com inúmeros mergulhadores que já haviam conhecido a região. Todos concordavam que aquelas águas rasas, também conhecidas como baja mer, ofereciam mergulhos magníficos. Lindsay mal podia esperar para explorar os locais de mergulho das Bahamas, considerados uns dos mais belos do mundo. Teria uma semana para se divertir antes do início das filmagens. Já ensaiara os movimentos de mergulho com o diretor e o coreógrafo, no estúdio. Quando não estivesse ocupada, pretendia aproveitar cada minuto de seu tempo livre. Queria mergulhar em um lugar conhecido como "A Bóia", onde mergulhadores profissionais jogavam iscas na água para atrair tubarões. Assim, poderia chegar bem perto das fascinantes criaturas. Sabia que seria difícil voltar para a Califórnia depois de tal experiência. Somente a promessa de sua futura carreira, que lhe daria a independência que ela tanto almejava, faria o retorno à Santa Monica algo desejável. Andrew Cordell entrou no quarto de Randy e deu um assobio quando viu o filho de dezoito anos vestido com o novo traje de mergulho. Randy o comprara pensando nas férias que passariam nas Bahamas. — Pegue esse, papai. Randy jogou um embrulho na direção do pai, que o agarrou com um súbito movimento. — Você pediu que eu comprasse o equipamento necessário, então resolvi comprar trajes idênticos para nós dois. São perfeitos para a temperatura das águas das Bahamas. Vista o seu para vermos como fica. Andrew torceu o nariz. — Confio em seu golpe de vista. Por isso, deixarei para provar o traje amanhã, quando estivermos em Nassau. — Hei, papai, não precisa ficar embaraçado. Para um homem de trinta e sete anos, você ainda está muito em forma. Surpreso, Andrew arqueou as sobrancelhas aloiradas. — Será que ouvi direito? Meu primeiro e único herdeiro me fez mesmo um elogio? — Claro. Na verdade, Linda, a instrutora de mergulho, tem uma queda por você. — Linda? Não lembro dela. — Ainda bem que ela não o ouviu dizer isso — Randy riu. — Vive me pedindo informações a respeito do meu famoso pai todas as vezes em que aparece para me dar aula. Disse que você lembra um Robert Redford mais jovem e bonito. Juro que foi isso que ela disse! — ele ergueu as mãos. — Tia Alex disse quase a mesma coisa na frente de tio Zack quando estávamos a caminho de Hidden Lake, no ano passado. Coitado, ele quase saiu da estrada. — É mesmo? — Andrew riu, divertindo-se ao lembrar do cunhado, Zackery Quinn. Zack fora o solteirão mais cobiçado de Nevada, até Alexandria Duncan aparecer e fazer dele um homem casado. Zack era tão apaixonado que mal podia suportar a idéia de ver sua linda esposa grávida falar sobre outro homem. Randy também riu, adquirindo aquela expressão tão parecida com a da mãe. Andrew sentiu a familiar dor da perda que ainda o afligia em momentos como esse, embora sua esposa estivesse morta há três anos. — E quanto às suas malas? — indagou Randy. — Ao menos começou a arrumá-las? Andrew lançou um olhar maroto para o filho. — Pensei que fosse se oferecer para me ajudar — disse. — Receio que... — Já sei, receia que a reunião com a chefia de departamentos acabe demorando mais que o esperado. Tem muitos problemas para resolver, pois ficará fora duas semanas. Randy tirou as palavras da boca do pai, mas proferiu-as num tom de divertimento. Andrew sorriu para o rapaz de cabelos escuros, somente um pouco mais baixo do que seu um metro e oitenta de altura. Sentia-se orgulhoso de ter um filho como Randy. O rapaz arrumara emprego depois da escola, em uma loja de artigos para mergulho. À noite, tomava aulas de mergulho, às quais pagava com seu próprio dinheiro. Incentivado pelo filho, Andrew também tivera algumas aulas de mergulho durante a primavera. Não fazia idéia de que acabaria gostando tanto do esporte. O que mais o encantava era a sensação de leveza que se tinha no mar. Agora que Randy se formara no colégio, Andrew estava tão empolgado quanto ele para participar de um verdadeiro mergulho nas Bahamas. A viagem fora o presente que ele oferecera ao filho pela formatura. É claro que iria acompanhá-lo. Estava precisando mesmo tirar alguns dias de folga e deixar os problemas do escritório e da política para trás. — Mal posso esperar por essa viagem! — exclamou com sinceridade. — Sim, eu também — Randy anuiu. — Será muito bom viajarmos para fora do país, caso contrário seu trabalho iria interferir, por mais que você tentasse ignorá-lo. — Tirou o traje e vestiu camiseta e short. — É verdade o que todos dizem a seu respeito, sabia? Seguiu o pai até o quarto principal, no último andar da mansão do governador, em Carson City. — Você trabalha demais — Randy prosseguiu. — Está mais que no tempo de tirar umas férias que não tenham de ser acompanhadas de negócios. — Concordo plenamente — respondeu Andrew. Sabia que o comentário de Randy era verdadeiro, mas a verdade doía. Fazia-o lembrar de como dedicara pouco tempo ao filho, desde que se tornara governador do Estado de Nevada. E a morte de Wendie tornara as coisas ainda piores. Sua própria dor fora forte demais para conseguir lhe dar forças para ajudar Randy a superar a perda da mãe. Em consequência, Randy tivera sérios problemas, fato que a mídia explorara sem piedade. Fora preciso que Randy fugisse com Troy Duncan, um rapaz também de dezoito anos, irmão de Alexandria, para que Andrew se desse conta de que estava falhando no papel de pai. Randy conhecera Troy no verão anterior e ambos acabaram envolvidos com um negócio desonesto. Venderam quadros de Alex sem que ela soubesse. Zack, sempre leal, escondera a falta dos rapazes e conseguira abafar o caso para que não chegasse à imprensa, enquanto Andrew se encontrava fora do país em uma viagem diplomática. Na volta, porém, Andrew se vira forçado a encarar a dolorosa verdade. De certa forma, havia sido responsável pela infelicidade do filho, desde a morte de Wendie. A frase favorita de seu sogro ecoou em sua mente: "Nenhum sucesso compensa a falha no lar". Claro que Andrew desejava ser bem-sucedido, porém, o que mais o preocupava era o desejo de honrar as promessas de sua campanha. Por isso dedicara tanto tempo ao trabalho e acabara esquecendo-se da família. Tornara-se um estranho para seu filho, relegando seus deveres de pai. Todavia, desde aquela noite, há onze meses, quando Randy confessara seu envolvimento em negócios ilícitos e pedira o perdão do pai, Andrew tornara-se um homem diferente. Em vez de perdoar Randy, ele foi quem se viu no dever de pedir perdão ao filho. Daquele momento em diante, ambos tornaram-se mais amigos, passando mais tempo juntos. Juraram colocar o relacionamento acima de qualquer outra coisa. — Randy, por acaso contei o que Jim arrumou para nós? — inquiriu, separando um terno cinza-claro para a viagem. — Além de nos deixar usar a casa dele? — Ele me ligou de Sacramento, há dois dias, e disse que um hidroavião estará esperando para nos conduzir de Miami até o porto de Nassau. Parece divertido, não? Faremos uma viagenzinha sobre o mar. — Puxa, será incrível! — exclamou Randy. — Você e o governador Stevens devem ser muito amigos mesmo! — Fizemos uma boa amizade quando participamos daquela viagem no último verão. Ele e Mary têm duas filhas, uma com dezessete e outra com dezenove anos. Convidei a família para ficar aqui durante alguns dias em julho. Randy olhou para o pai com mais interesse: — Conheceu as filhas dele? — Não — Andrew riu. — Mas vi fotos e as duas são muito atraentes. Conto com você e Troy para mostrar a cidade a elas, apresentá-las a seus amigos, levá-las para cavalgar... Acha que conseguirão dar conta de tudo isso? — Claro — Randy sorriu. — Papai, se não precisar mais da minha ajuda, tenho algo importante a fazer. — Oh, sim, está dispensado. Boa noite, filho. Não esqueça de acertar o despertador. — Quem precisará de um? Estou tão ansioso por essa viagem que com certeza não conseguirei dormir. Oh, a propósito, tio Zack ligou e disse que ele e a família estarão aqui às seis e meia da manhã para nos acompanhar até o aeroporto. — Ótimo. Agora vá descansar um pouco. — Vou tentar, mas não prometo nada. Boa noite, papai. Ainda sorrindo, Andrew deu alguns telefonemas de última hora, antes de terminar de arrumar as malas. Quando finalmente deitou e virou-se para apagar o abajur, deparou-se com a foto de Wendie sobre a mesinha-de-cabeceira. Pela primeira vez, desde a morte dela, esquecera de colocar a foto junto com suas coisas. Parte de seu ser sentiu como se a houvesse traído de alguma maneira. Outra parte, porém, deu-se conta de que ele parara de lamentar a morte dela. Não soube ao certo quando acontecera, mas a verdade era que finalmente se conformara com a morte de Wendie. — Beth, eu não deveria ter deixado que me trouxesse ao aeroporto. Sei o quanto você gosta de dormir. Contudo, agradeço sua gentileza. Foi muito bom conversar. Meus pais estão impossíveis quanto a essa viagem. A melhor amiga de Lindsay parou o carro diante do terminal e voltou-se para ela; — Agirão assim até se acostumarem com a idéia, Lindsay. Mas enquanto esse dia não chega, minha amiga, meu conselho é que viaje para Nassau e se divirta o máximo que puder. Pense nas noites enluaradas, aquelas praias fabulosas com lindos homens bronzeados loucos para conhecer alguém como você! Lindsay arqueou as sobrancelhas. — Já vejo boa parte disso naquele clube, Beth. Vou viajar a trabalho, lembra? Saiu do conversível de Bethany, tirando a mala do banco de trás. Em seguida, deu a volta pelo carro e abraçou a amiga. — Obrigada por tudo. Não sei como conseguiria chegar até aqui sem sua ajuda. — É o que vivo lhe dizendo, menina — Beth brincou. — Três semanas é muito tempo. Ligue para mim ou ficarei maluca de preocupação. — Pode deixar, mas aposto que você estará fora com Doug. Talvez seja melhor você me ligar, pois tenho certeza de que estarei no quarto do hotel todas as noites, depois do trabalho. — Quer apostar? — Beth desafiou-a. — Ouça o que estou-dizendo, Lindsay Marshall. Você será como o sol em uma montanha gelada. Você sabe que pode conseguir o que quiser dos homens. Assim que os comerciais chegarem à tevê, você será chamada de "Esther Williams dos anos noventa", pode acreditar! Receberá muitas outras propostas de contrato. Os homens se jogarão aos seus pés e eu nunca mais a verei. Oh, Deus! Lindsay riu alto. — Oh, Beth, quanto exagero! Você, mais que ninguém, sabe que o mundo das estrelas não me interessa nem um pouco. Farei esse comercial só pelo dinheiro. Quero terminar meus estudos, só isso. Não tenho tempo para homens agora. — Essa sua última frase não me convenceu nem um pouco. Agora ande logo, senão chegará atrasada. Após abraçar a amiga mais uma vez, Beth entrou no carro e partiu. Lindsay ficou acenando até o veículo desaparecer de vista. Só então se encaminhou para o local de embarque para verificar se tudo estava correto com sua passagem. Assim que o avião decolou, pegou o romance que começara a ler. Entretanto, o problema não resolvido com seus pais impediu-a de se concentrar na leitura. Deixou o livro de lado e ficou olhando através da janela. Seus pais haviam telefonado todos os dias na última semana, implorando para que ela não aceitasse o trabalho. Na noite anterior, seu pai dissera que sua mãe estava de cama; uma maneira de pressioná-la a desistir da idéia. Todavia, nem mesmo as chantagens que eles utilizaram há dois anos, impediram-na de sair de casa. Portanto, não era agora que tal estratégia surtiria algum efeito. Por mais que os amasse e se sentisse amada por eles, não era justo que quisessem sufocá-la com cuidados extremos. Pela centésima fez, flagrou-se desejando que seus pais houvessem tido mais filhos, talvez assim a preocupação que tinham com ela não fosse tão exagerada. Até a idade de onze anos, Lindsay levara uma vida normal. Então surgira sua primeira oportunidade de sair com um grupo de meninas. O ônibus no qual elas viajavam colidiu contra uma montanha, juntamente com um trailer que vinha logo atrás. Várias crianças ficaram feridas. Lindsay sofreu fratura na espinha dorsal. Fora preciso várias operações e anos de terapia para fazê-la andar novamente. Durante muito tempo, teve que receber aulas em casa. Não fosse a companhia de Beth e da mãe dela, Lindsay teria se sentido a menina mais solitária do mundo. Seus pais, uma dupla de bem-sucedidos roteiristas, trabalhavam em casa. Por isso, estavam sempre por perto para encorajar a filha. Quando o médico recomendou a natação como uma ótima forma de terapia, seus pais mandaram construir uma piscina. Contrataram uma professora de natação e uma terapeuta para ajudar na recuperação de Lindsay. Claro que a dedicação e o amor de seus pais eram inquestionáveis, mas fora depois daquele acidente que eles começaram a superprotegê-la. Na época em que entrou para a faculdade, Lindsay já conseguia andar normalmente, restando-lhe apenas algumas cicatrizes nas costas. Sentia-se muito bem, mas os pais continuavam a tratá-la como uma criança inválida. Não queriam que a filha ficasse longe deles e insistiram para que ela estudasse em uma faculdade próxima de casa. Ciente de que seus pais haviam perdido anos de dedicação a ela, Lindsay sempre atendeu os desejos de ambos. Muitas vezes, chegou a reunir amigos em casa, só para não ficar longe dos pais e causar-lhes preocupação. Entretanto, somente quando Greg Porter apareceu em sua vida, no primeiro ano da faculdade, foi que Lindsay se deu conta da realidade da situação. Greg convidou-a para passar alguns dias com ele e a família em uma casa de praia, em La Jolla. Os pais de Lindsay foram irredutíveis na recusa de deixá-la ir. Disseram que, a menos que ela e Greg ficassem noivos, o pedido estava recusado. Nem mesmo os pais de Greg conseguiram persuadi-los a mudar de idéia. Longe de desobedecer os pais, coisa que Lindsay nunca tivera coragem de fazer, ela preferira recusar o convite de Greg. O fato, porém, gerou uma situação desagradável que perdurou até Lindsay terminar a faculdade de biologia. Durante esse período, teve uma série de relacionamentos frustrados. Acabou notando que o problema principal era a constante interferência de seus pais, embora Helen e Ned Marshall nunca tenham visto a situação dessa maneira. Quando eles se recusaram a permitir que ela fosse morar fora para realizar um curso de biologia marinha, Lindsay confiou seu futuro a sua melhor amiga. Beth estava realizando terapia para conseguir lidar com o quarto casamento de sua mãe, uma famosa atriz de Hollywood. Segundo Beth, toda a família Marshall estava precisando de tratamento. A princípio, Lindsay não aceitou a idéia e sentiu-se até magoada com o comentário de Beth. Porém, com o passar do tempo, percebeu que sua amiga tinha razão. Foi então que Lindsay arrumou um emprego de professora de natação por meio período, a fim de pagar as consultas de um bom psiquiatra. Quatro meses de terapia mudaram completamente sua visão de mundo. Embora não tenha podido fazer nada pelos pais, fez muito por si mesma. Utilizando a estratégia sugerida pelo psiquiatra, Lindsay finalmente conseguiu dar seu grito de independência. Mudou-se para um apartamento em Santa Monica, próximo à praia, onde podia nadar todas as manhãs. O local era perfeito; distante de casa, mas não o suficiente para seus pais acharem que haviam sido abandonados pela filha. Cortaram todo o dinheiro que davam a ela, imaginando que Lindsay voltaria para casa quando as coisas ficassem difíceis. Todavia, Lindsay sentia-se cada vez melhor com sua independência. Seus planos para o curso de pós-graduação tiveram de ser adiados durante algum tempo. Nessa época, passou a dar aulas de natação em período integral para se sustentar e conseguir juntar algum dinheiro. Aos poucos, sua reputação como terapeuta de crianças com problemas físicos foi se tornando cada vez melhor. Recebeu convites para aulas extras, detalhe que ajudou a aumentar suas economias. O melhor de tudo era que estava tendo oportunidade de tomar suas próprias decisões. Quando Helen e Ned notaram que suas táticas não estavam surtindo efeito, tornaram-se ainda mais manipuladores, tentando imbuir sentimentos de culpa em Lindsay. O telefonema de seu pai na noite anterior fora típico. Contudo, Lindsay já estava sozinha há muito tempo para se deixar influenciar. Nenhum argumento a faria desistir dessa viagem ao Caribe. Só o que podia fazer era continuar amando-os, mantendo contato sempre que possível. Talvez algum dia os dois superassem aquele medo obsessivo. Lindsay riu consigo, lembrando-se do comentário de Beth sobre os homens do Caribe. Arrumar um marido era a última coisa que se passava por sua mente no momento. Nem tão cedo queria se ver novamente sendo controlada pela vontade de outra pessoa. A liberdade significava muito para ela. CAPÍTULO II — Ei, papai! Que tal mais um mergulho antes de voltarmos? Quero ver se consigo filmar aquele lindo peixe que vimos há dois dias. Seria o terceiro mergulho do dia. Já haviam visitado até o local onde vários filmes de James Bond haviam sido filmados. Todavia, Randy estava sempre querendo conhecer mais coisas e, na verdade, Andrew também. A cada mergulho conheciam lugares mais lindos e exóticos, com jardins de corais e canais sinuosos que proporcionavam visões espetaculares dos peixes tropicais e das grandes garoupas de Nassau. Andrew virou-se no assento da lancha e assentiu para o robusto mergulhador, Pokey Albright, e sua tripulação. Nativos da região, todos haviam sido contratados antes da chegada de Randy e Andrew a Nassau. Desde então, passaram a acompanhá-los em todos os mergulhos, servindo de guias turísticos. — Vamos lá, Pokey. Ao ouvir as palavras de Andrew, o jovial homem ruivo deu instruções ao condutor da lancha. Partiram a toda velocidade para o local indicado pelo mergulhador. Enquanto deslizavam sobre as águas brilhantes, Andrew olhou para Skip e Larry, seus dois guarda-costas. Os coitados deviam estar cansados de tantos andar de um lado para outro. Desejou que o fato de ser governador não exigisse a presença constante de seguranças a seu lado. Mantinham até uma vigília do lado de fora de seu quarto durante a noite! Infelizmente, o aumento da criminalidade na última década exigia que homens como ele fossem muito bem protegidos. Após cinco anos, Andrew até já se acostumara com suas sombras; aprendera a conviver com eles. E Randy também. Para a viagem, Andrew levara seis guarda-costas. Um deles permanecera na doca enquanto os outros três vigiavam os arredores da casa. Mesmo cercado de seguranças, Andrew já tivera problemas com a imprensa. Um fotógrafo chegara perto o suficiente para tirar uma foto dele e de Randy pouco depois de haverem chegado no aeroporto, em Reno. E, apesar do esquema de segurança, depois que o hidroavião deixara-os no porto de Nassau, um homem vestido como piloto de avião logo aparecera com uma máquina fotográfica. As duas fotos apareceram nos jornais americanos no dia seguinte, informando ao mundo que o governador de Nevada e o filho estavam de férias no Caribe. Uma vez que era impossível saber o que algum "louco" poderia fazer ao saber de uma notícia dessa, Andrew vira-se obrigado a redobrar as precauções. Entretanto, ao menos quando estavam mergulhando, ele e Randy podiam deixar todos os receios para trás, desfrutando por completo as incríveis belezas do mar. Quando a lancha finalmente parou, Andrew avistou apenas um outro barco a certa distância. As cinco da tarde, parecia que a maioria das pessoas da região já havia terminado as horas de mergulho do dia. Teriam o lugar apenas para eles mesmos o que daria uma folga para Skip e Larry. Andrew notou o brilho de desafio nos olhos de Randy quando ambos começaram a se vestir. Era uma espécie de jogo entre eles, para ver quem cairia na água primeiro. Determinado a vencer ao menos uma vez, para provar que não estava tão fora de forma assim, Andrew vestiu a roupa de mergulho em questão de segundos. Verificou a pressão do ar, para ter certeza de que seu tanque estava cheio. Em seguida, ajustou a máscara e pegou a câmera de vídeo. Para seu divertimento, Randy ainda lutava para ajustar a roupa, o que lhe deu tempo de mergulhar na frente. Fez um sinal para Pokey e pulou na água. Todas as vezes em que entrava no mar, Andrew experimentava uma onda de excitação quando uma rajada de adrenalina atravessava seu corpo. Tinha de lembrar a si mesmo de que precisava manter-se calmo e respirar normalmente quando iniciava a descida. Em uma das primeiras lições de mergulho, ele esquecera-se da regra de não prender a respiração, erro que, em último caso, resultava em morte. Felizmente, nunca mais voltara a cometer o erro. Quando alcançou uma boa profundidade conseguiu manter-se no mesmo nível, equilibrando a respiração. Virou-se para filmar a descida de Randy e Pokey. Os dois mergulharam devagar, passando pelas bolhas das máscaras e pequenos resíduos de areia. Cada curva entre as passagens estreitas revelava novas visões espetaculares dos peixes tropicais descansando ou se alimentando nas reentrâncias dos recifes. Pokey fez um sinal com a mão. Nos dez minutos seguintes, Andrew e Randy seguiram-no através das passagens; algumas tão estreitas que eles tinham que tomar cuidado para não tocar nos frágeis corais. A certa altura, surgiu uma grande raia leopardo, movendo-se com destreza, próxima a eles. Andrew filmou Randy e Pokey nadando próximos à raia, até ela pousar sobre a areia, antes de sair nadando novamente com mais velocidade. Pokey fez outro sinal para que os dois o seguissem. Nadando em fila, os três atravessaram mais alguns canais estreitos, mantendo-se próximos por questões de segurança. De repente, Andrew distinguiu algo grande aproximando-se pelo seu lado esquerdo. Parou subitamente, imaginando que se tratasse de alguma garoupa gigante. Esse recife era famoso pela quantidade de garoupas e Andrew teve quase certeza de ter visto uma. Seu pulso se acelerou quando posicionou a câmera e virou para o lado esquerdo. Porém, o que viu através da lente contestava toda lógica, fazendo-o imaginar que estava tendo alucinações. Uma sereia! Uma belíssima sereia com um delicado rosto oval e longos cabelos dourados flutuando em tomo dos ombros e braços. O corpo voluptuoso movia-se com extrema graciosidade, fazendo o coração de Andrew bater forte contra o peito, diante da bela visão. A aparição durou apenas alguns segundos. A luz da câmera pareceu assustá-la e a linda sereia se afastou com incrível velocidade. Impelido por um desejo acima de seu controle, Andrew desligou a luz da câmera e saiu nadando atrás dela, ansioso para alcançá-la. Queria tocá-la, descobrir se toda aquela beleza era mesmo real. Não havia nadado muito quando sentiu alguém tocar seu tanque de oxigênio. Desorientando, olhou em volta e viu Pokey mostrando o relógio e apontando o polegar para cima, indicando que estava na hora de subirem. Oh, Deus. Por alguns segundos, Andrew esquecera-se completamente de Randy e Pokey, ou mesmo o que fazia e onde se encontrava. A visão da sereia eliminara qualquer outro pensamento de sua mente. Talvez houvesse mergulhado demais por um dia e estivesse nos últimos estágios de consciência antes de um possível desmaio. Quando subiram e alcançaram quinze pés de profundidade, Pokey estendeu a mão, sinal de que deveriam parar. Escreveu em uma pequena lousa pendurada em seu cinto: "Já subi com Randy. O senhor ficou mais tempo do que devia. Teremos que esperar aqui mais três minutos para a descompressão. Faça um sinal de ok se me entendeu". Andrew já se sentira um idiota muitas vezes na vida, mas, sem dúvida, essa estava sendo a pior delas. Enrubescido, fez o sinal de ok, imaginando o quanto Pokey não deveria estar decepcionado. Depois dessa experiência, não ficaria surpreso se o mergulhador se recusasse a levá-lo em outros mergulhos. Também sabia que a essa altura Randy já deveria estar preocupado com a demora dos dois. Pokey escreveu outra mensagem: "O senhor está bem?" Andrew fez que sim. Se tentasse explicar que vira uma sereia, por certo Pokey pensaria que ele enlouquecera. Talvez essa fosse mesmo a verdade... O que acontecera, afinal? Não contaria nada sobre o incidente até chegar em casa e ver a fita no vídeo. Contudo, achando-se no dever de dar alguma explicação, pegou a lousa e escreveu; "Comecei a filmar e esqueci do tempo. Desculpe e obrigado por me ajudar". Depois de ler a mensagem, Pokey escreveu: "O mesmo aconteceu comigo quando mergulhei pela primeira vez. Esqueça, não foi nada". "Esquecer?!", pensou Andrew. Impossível! Ainda estava trêmulo com o que acabara de ver lá embaixo! Sentia-se cada vez mais impaciente para assistir aquele vídeo. Se não aparecesse nada, além de peixes tropicais e corais, consultaria um especialista em medicina de mergulho para descobrir o que lhe causara aquela alucinação. Não lembrava de seu instrutor haver mencionado algum sintoma desse tipo. Ao fim dos três minutos, os dois emergiram. Andrew percebeu a expressão de alívio que surgiu no rosto de Randy quando ele os viu. Skip e Larry pareciam igualmente preocupados. — O que aconteceu, papai? Você está bem? Andrew tirou a máscara e colocou o equipamento no chão do barco. — Estou bem, Randy. Passou o braço pelos ombros do filho, assegurando-o de que dizia a verdade. Pokey sorriu para os dois: — Seu pai ficou apenas um pouco empolgado com a vista lá embaixo e esqueceu de parar de filmar. “Empolgado” não era a palavra mais apropriada, Andrew concluiu. Alguma coisa lhe acontecera quando estava lá embaixo, algo que nem ele mesmo sabia explicar. Notou que seu filho continuava apreensivo. — Pensei que você houvesse tido um ataque cardíaco ou algo do gênero — Randy admitiu num tom surpreendentemente calmo. Andrew sentiu-se ainda pior. Poderia mesmo ter morrido, e por pura negligência de sua parte. Depois de perder a mãe, Randy não merecia outra tragédia na vida. — Sei que trinta e sete parece muita idade para você, mas antes de viajarmos fiz muita ginástica e o médico me disse que estou em forma— declarou tirando a roupa de mergulho. — Desculpe se o assustei, Randy. Prometo que não agirei como um idiota novamente. — Promete? Randy falava como se estivesse recuperado, mas seu rosto continuava pálido. — Eu juro — Andrew afagou o ombro do filho. — Então está bem. Um sorriso insinuou-se nos lábios do rapaz. Andrew respirou fundo e dirigiu-se a Pokey: — Vamos para casa. Estou faminto. Qual é o melhor restaurante de Nassau? Acho que eu e Randy estamos com ânimo para cometer uma extravagância. — O Graycliff é muito bom — Pokey recomendou. — Especialmente para quem gosta de frutos do mar. — Que tal, Randy? — Para mim está bom — respondeu ele, sem o costumeiro entusiasmo. Andrew precisava tranquilizar o filho. Teria uma conversa com ele quando estivessem a sós. Porém, enquanto não tivesse uma resposta racional para o que vira, melhor seria manter-se em silêncio. — Encontrou o peixe que estava procurando? — o condutor perguntou a Randy, enquanto conduzia a lancha. — Não — Pokey respondeu por ele. — Vimos algo melhor, não foi? Sorriu para Randy, antes de descrever a raia leopardo. Quando chegaram ao porto, o segurança de Andrew já os esperava na limusine. Andrew agradeceu à equipe, avisando que telefonaria pela manhã, assim que ele e Randy decidissem o que fariam. No momento, só conseguia pensar em assistir aquele vídeo. No trajeto de volta para Lyford Gay, Andrew não largou a câmera um instante sequer. O trajeto foi rápido e, quando chegaram, foram recebidos pelos outros seguranças. Assim que entraram em casa, Randy anunciou que ia tomar um banho. Aliviado por ficar sozinho, Andrew foi direto ao quarto principal, equipado com tevê e vídeo cassete. Voltou a fita um pouco e sentou-se em uma cadeira diante da tevê. As imagens estavam realmente muito boas, mas Andrew acelerou o andamento da fita. Voltou à velocidade normal quando a imagem de Randy nadando próximo à raia apareceu na tela. Enquanto esperava, gotas de suor apareceram em sua testa e seu coração se acelerou. De súbito, lá estava ela! Ele ficou de pé no mesmo instante. — Sim! — exclamou com tanta ênfase que dois seguranças apareceram à porta, pensando que ele estivesse com problemas. — Desculpe, rapazes, estou apenas assistindo o vídeo do mergulho de hoje. Sorriu com espontaneidade, deixando os guarda-costas ainda mais confusos, embora tranquilos. Assim que eles fecharam a porta, Andrew ajoelhou-se diante da tevê e voltou o filme, congelando a imagem em um close. Deus, ela era linda... Uma deusa do mar, com aqueles cabelos dourados flutuando em torno do rosto, como uma nuvem. Sem dúvida, sua presença a assustara. Os olhos de um exótico tom de ametista estavam muito abertos e as sobrancelhas arqueadas com expressão de espanto. A boca bem-feita formava um pequeno O, deixando escapar uma bolha de ar. O olhar de Andrew moveu-se para os seios arredondados, parcialmente cobertos por um biquíni cor-de-rosa: Em seguida, a cintura delgada e uma parte encoberta dos quadris. Se houvesse conseguido alcançá-la, teria tocado aquela pele alva, macia... Andrew pestanejou. Estaria ficando louco? Nunca sentira-se assim por nenhuma mulher. Nem mesmo quando conhecera Wendie sentira-se tão atraído quanto agora. Após respirar fundo várias vezes, liberou a imagem. A misteriosa sereia voltou a se mover. Andrew observou as curvas dos quadris e das pernas, envoltas por uma cauda de sereia que terminava na altura da cintura. Se pudesse, atravessaria a mão na tela só para tocar aqueles quadris e depois... — Papai? Você ainda nem tomou banho? A voz de Randy trouxe Andrew de volta à realidade. Corado, ele ficou de pé, tentando acalmar as batidas de seu coração. Desligou o vídeo, levando algum tempo para se recuperar. — Mal pude esperar para ver a fita que filmamos hoje. Randy se aproximou. — Ficou boa? — Melhor que isso — respondeu Andrew, voltando-se para olhá-lo. — Papai? Você está bem? — Claro. Por que não estaria? — Não sei. Desde que voltou do último mergulho, você está... diferente. Um leve sorriso insinuou-se nos lábios de Andrew. — Filho, você acredita em sereias? Randy riu alto, jogando a cabeça para trás. — Sereias?! — Você sabe o que quero dizer. Aquelas criaturas fantásticas, metade mulher, metade peixe, que enfeitiçam os navegantes. — Sim — Randy sorriu. — São lindas demais para serem reais. Andrew cruzou os braços diante do peito. — Quer apostar? Randy franziu o cenho, confuso. — Papai, não estou entendendo. — Talvez isso esclareça as coisas para você. Fique bem aí onde está. Andrew voltou um pouco a fita e apertou o play. Randy emitiu exclamações animadas ao ver ele próprio e Pokey nadando com a raia. Porém, no momento em que a sereia apareceu na tela, um silêncio invadiu o aposento, enquanto Randy mantinha os olhos presos na imagem, como que hipnotizado. — Minha nossa... Quando ela desapareceu, Andrew parou a fita e olhou para o filho. Os dois se entreolharam em silêncio. — Não acredito no que acabei de ver — Randy sussurrou. — Papai, ela é mais do que bonita, ela é... — Moveu as mãos, tentando encontrar a palavra certa. Andrew assentiu com um sorriso. — Eu sei. Agora talvez entenda o que me prendeu lá embaixo. Pensei que estivesse tendo alucinações. — Deixe-me ver novamente! Randy adiantou-se e voltou a fita. Como Andrew, ele congelou a imagem no close do rosto dela. Soltou um assobio de admiração. — Não é de admirar que você tenha demorado tanto. Se eu estivesse no seu lugar, provavelmente teria parado de respirar e estaria morto a essa altura. Andrew posicionou-se atrás de Randy, também olhando para a tela. — Não quis contar a verdade a você e Pokey antes de ver o filme. Tive receio de que não acreditassem em mim. Para ser sincero, cheguei até a acreditar que houvesse algo de errado comigo. — O que eu não daria para ainda estar no negócio de vendas. Com um pôster dela, Troy e eu ficaríamos milionários! Espere só até ele dar uma olhada nisso! Andrew riu. — Papai, quem você acha que ela é? E o que estava fazendo lá, vestida desse jeito e sem equipamento de mergulho? — Não sei — Andrew respondeu, pensativo. — Mas pretendo descobrir. Randy fitou o rosto do pai, estreitando o olhar. — Mesmo? — Mesmo — Andrew imitou o filho. — Acha que tenho culpa em querer saber quem ela é? — Longe de mim pensar uma coisa dessas! Para dizer a verdade, gostaria de ter sido o primeiro a tê-la visto. — Bem, mas não foi, portanto, caia fora — Andrew avisou. — Interessante escolha de palavras, papai — Randy brincou. — Meu Deus, o velho ainda está muito vivo! O que pretende fazer? Andrew riu. — Ora, encontrei-a no fundo do mar, livre e desimpedida. Creio que levá-la embora não será nenhum atentado contra a natureza. Além do mais, ela deve valer uma fortuna. Pensarei no quê fazer depois de examiná-la melhor. — Papai... — Randy olhou para Andrew com novos olhos. — Você está louquinho por ela! Não acredito. Meu próprio pai! Andrew cruzou os braços. — Como acha que foi concebido, menino? — Se esse é seu método paterno de me dar uma aula sobre educação sexual, está atrasado pelo menos uns cinco anos. E então? O que fará para descobrir quem é ela? — Pokey conhece tudo que acontece nessas águas. Vou telefonar para ele depois que voltarmos do jantar. Só espero que ele esteja em casa, caso contrário, terei de esperar até amanhã de manhã. — O que significa que passará a noite em claro, e não estará bem para mergulhar amanhã — disse Randy. — Por que não ficamos em casa para que possa conversar com Pokey? Posso pedir uma pizza e escolher um filme no vídeo. Também estou cansado; prefiro ficar por aqui mesmo. — Sei que está mentindo, seu espertinho, mas sob as atuais circunstâncias, aceito sua sugestão. Randy riu, balançando a cabeça. — Agora sei por que fiquei maluco quando vi aqueles quadros de tia Alex pela primeira vez. Pensei: "Eles devem valer uma fortuna!" E você sabe o que dizem: "Tal pai, tal filho". — Parece que a vocação para negócios corre no sangue da família. — Sim, e tio Zack é o pior de todos. Sabe que ele guardou todos aqueles quadros no quarto dele, depois que tia Alex os tirou de mim? Eles não os destruiu, como pensamos. — Está brincando! — Andrew riu. — Tem certeza? — A governanta deles me contou. Yolanda viu os quadros quando estava limpando o quarto. Talvez esteja pensando em ganhar algum dinheiro com eles. Aliás, essa sua mulher misteriosa também pode se tornar uma ótima fonte de lucros. Já posso até ver as manchetes: "Governador Transforma Sereia Em Primeira Dama". — Caia fora, Randy, e não volte sem uma grande pizza para mim. Quero de tudo, menos anchovas. Assobiando baixinho, Andrew procurou o telefone de Pokey na agenda. Informaram-lhe que o mergulhador ainda não chegara, mas deveria aparecer a qualquer minuto. Andrew deixou um recado para Pokey telefonar para ele assim que possível. Andrew não tinha idéia de quanto teria de esperar, por isso deixou a porta do banheiro aberta e tomou um banho rápido. Estava se enxugando quando o telefone tocou. Enrolou a toalha na cintura e foi atender a ligação. Era Pokey. — Bryan me deu o recado, governador. Alguma dúvida quanto ao mergulho de amanhã? — Não. Preciso de sua ajuda em um outro assunto, Pokey. Sem rodeios, Andrew explicou sobre a sereia e perguntou se o mergulhador sabia de alguma coisa a respeito. — Muitas equipes de filmagem vêm realizar filmes e comerciais nessa região — Pokey explicou. — Sei que uma delas chegará na próxima segunda-feira. Filmarão cenas subaquáticas durante uma semana, aproximadamente, para um comercial de tevê. Depois passarão mais uma semana no Recife Thunderball. Eles avisam os dias de filmagem com antecedência para que os mergulhadores fiquem o mais distante possível da região. Talvez a mulher que o senhor viu esteja ensaiando alguma cena. Avistei um outro barco se afastando quando subi com Randy. — Será que era um dos seus barcos? — Não, mas posso descobrir de quem era e lhe dar a informação dentro de uma ou duas horas, senhor. — Ótimo. Se conseguir o nome e o endereço daquela mulher, receberá uma boa recompensa, Pokey. — Farei o possível, governador. Ficará em casa ou sairá logo mais? — Eu e Randy vamos jantar aqui mesmo. Pode ligar quando quiser. E Pokey... lembre-se de que esse pedido é estritamente confidencial. — Sim, senhor. Não se preocupe. Nesse negócio, aprendemos sempre a manter segredo. — Obrigado — Andrew agradeceu. Ao desligar, voltou para o banheiro e vestiu um robe. Em seguida, assistiu o filme do começo ao fim. Mais uma vez, encantou-se com a imagem da bela sereia. Voltou um pouco a fita e observou a imagem mais uma vez, intrigado com seus próprios sentimentos. Não se tratava apenas de atração; era algo além disso. — Aha! Peguei-o no flagra! — exclamou Randy. — No caso de ainda ter algum outro interesse na vida, além dessa sereia, eu já trouxe as pizzas. — Depositou os embrulhos e as bebidas sobre a mesinha, próxima à tevê. — Os filmes não estavam muito convidativos, mas escolhi um que você vai adorar. — Se for O Tubarão novamente, desisto. — Não é, mas está esquentando. — O mesmo serve para O Destino do Poseidon. — Esquentou mais — Randy sorriu. — Vinte Mil Léguas Submarinas! Mas nós vimos esse filme antes de chegarmos a Nassau! — Andrew protestou. — Nada disso. Garanto que esse você nunca viu esse antes. Agora sente-se para assisti-lo. Randy tirou a outra fita e colocou o filme que alugara. Puxou uma cadeira para perto de Andrew e ambos começaram a comer. Quando Andrew viu o título do filme começou a rir com divertimento. Randy também riu, olhando-o de soslaio. — Se não contar para ninguém — disse ao pai —, assisti A Pequena Sereia com Steve, quando ele estava cuidando da irmãzinha. Para um desenho, é realmente genial. Na hora seguinte, Andrew permaneceu diante da tevê, sem a menor dificuldade para entender o desejo do príncipe de encontrar a encantadora sereia que o enfeitiçara. De fato, foi até meio embaraçoso perceber o quanto sua reação fora parecida com a do personagem quando vira a sereia. O telefone tocou quando o príncipe estava sendo incentivado a "Beijar a Garota". Era Pokey. — Está com sorte, governador. Don, um dos mergulhadores da parte oeste da ilha, passou boa parte da semana com sua sereia. O nome dela é Lindsay Marshall. Tem vinte e seis anos, é solteira e mora em Santa Monica, Califórnia. Será a estrela do comercial sobre o qual lhe falei. Trata-se de uma nova linha de cosméticos feitos à base de produtos do mar. — Onde ela está hospedada? — indagou Andrew, tentando controlar a ansiedade. — Toda a equipe ligada ao comercial está hospedada no Hotel Marina. Ela tem praticado mergulho livre no Recife Thunderball, às seis e meia da manhã e novamente às cinco da tarde, quando o mergulhador a leva para o local onde estávamos essa tarde. Segundo ele, ela é uma ótima mergulhadora. — Ele sabe qual é a agenda dela para amanhã? — Sim. Se o tempo estiver bom, ela irá com um grupo até A Bóia, nesse caso, não estará em Thunderball. Andrew franziu o cenho. — A Bóia não vive cheia de tubarões? Estremeceu ao imaginar o que uma simples abocanhada de um tubarão poderia fazer a sua sereia. — Sim, mas a área está segura no momento. Ninguém foi atacado até agora. Num impulso, Andrew perguntou: — Será que eu poderia mergulhar com eles? Pokey hesitou. — Não me interprete mal, governador, mas o senhor ainda não tem muita experiência de mergulho. E preciso pelo menos um ano de experiência para tentar um mergulho como esse. — Tem razão. Então, o que sugere para nosso passeio de amanhã? — Iremos a Porpoise Pens. É um bonito local de mergulho com corais negros e enormes esponjas. Vocês irão gostar. — Ótimo. Por volta das cinco, eu e Randy gostaríamos de voltar ao local onde mergulhamos hoje. — Claro — respondeu Pokey, bem-humorado. — Como conseguiu as informações sem citar meu interesse? — Não foi difícil. Desde meu divórcio, tenho saído com muitas mulheres e Don sabe disso. Ele deduziu que vi a moça em algum lugar e estava interessado nela, caso contrário, não teria dito sequer uma palavra. Ele também tem muita ética no trabalho. Todavia, trocamos algumas informações de vez em quando. — Muito obrigado, Pokey. Prestou-me um grande favor e não vou esquecer disso. — Foi um prazer, governador. Estarei na doca às nove, como de costume. — Sim, até amanhã. Andrew desligou. Então sua sereia agora tinha um nome e um endereço quase completo na Califórnia! Só que ele queria saber mais. Esse era um serviço para seu detetive particular. Bud Atkins. Arriscou um olhar para Randy. Notando que ele continuava entretido com o desenho, tirou o telefone do gancho e discou o número de Bud. CAPÍTULO III Meio deitada no chão da lancha, com o sol da tarde brilhando em seu rosto, Lindsay tentava vestir a roupa de sereia. A calça justa ajudava o traje de lycra a deslizar melhor por suas pernas e quadris até alcançar a cintura. Prendendo a respiração, Lindsay fechou o discreto zíper lateral. — Ser uma sereia não é tão bom quanto parece — resmungou quando viu Don e Ken sorrindo para ela. — Gostaria de vê-los no meu lugar. Os dois eram irmãos e dirigiam uma das lojas de mergulho da ilha. — Não, não — respondeu Don. — Estamos muito bem assim, olhando-a daqui, não é, Ken? — Voltou a olhá-la: — Avise quando estiver pronta para sair do barco. — Só preciso soltar os cabelos. — Lindsay tirou a presilha que os prendia, fazendo as longas mechas douradas caírem até sua cintura. — Sinto terem que me carregar de um lado para outro, feito um peixe morto. Sinto-me tão idiota e incapaz! — Isso não é jeito de uma sereia falar! — protestou Ken com uma piscadela. Ele dirigia o barco e era uns dois anos mais jovem que o irmão. — Não perderíamos essa oportunidade por nada nesse mundo, não é, Don? — Pode apostar — Don concordou, pegando Lindsay nos braços como se ela não pesasse nada. — Temos um pedação de meia-mulher aqui. — Oh, não diga bobagens! — Lindsay riu. Seu sorriso desapareceu quando ela avistou um outro barco a certa distância. — Don, aquele não é o mesmo barco que estava aqui ontem? — Dessa distância, todos são parecidos. O que acha, Ken? — Estranho. O mergulhador que a filmou ontem perturbou-a de alguma maneira? — perguntou a Lindsay. — Não. — ela balançou a cabeça. — Pode parecer bobagem, mas senti como se minha privacidade houvesse sido invadida. Os dois homens começaram a rir. — Querida — disse Don — logo sua imagem estará nas televisões de todo o país. Precisa se acostumar com isso. — Eu sei, mas... — Lindsay deu de ombros. — Ainda estou apenas praticando... acho que foi o susto que me afetou. Pensei que estava sozinha até ele aparecer de repente. Além do mais, fiquei embaraçada. A roupa que vou usar no comercial é muito menos reveladora do que essa. — Bem, qual o problema em provocar um ataque cardíaco no mergulhador? — Ken brincou. Soltou na água um tubo de ar preso a um compressor. Era longo o suficiente para chegar ao fundo do mar, assim Lindsay poderia facilmente utilizá-lo quando precisasse de ar. — Ele veio em busca de fortes emoções e você lhe deu uma — Ken prosseguiu. — Aposto que vai mostrar o filme para todos os amigos quando voltar para casa. Só que quando a vir no comercial de tevê, vai perceber que a existência de sereias continua sendo apenas uma lenda. — Será bom para nossos negócios — Don salientou. — Muito em breve, teremos mergulhadores de todas as partes do mundo vindo olhar nossa exótica sereia. — Vocês dois são mesmo impossíveis! — Lindsay sorriu. — Ok, estou pronta. — Lembre-se de nadar apenas entre as flâmulas coloridas. Quero que suba a cada seis minutos sem falhar, ok? Volte para cá quando se sentir cansada. — Pode deixar. Quando Don a colocou em posição de mergulho, Lindsay respirou fundo e caiu na água. Utilizando o nado de golfinho, logo alcançou uma boa profundidade. Começou a realizar os longos movimentos de rotação que o coreógrafo lhe ensinara, fazendo seus cabelos flutuarem como um leque, lembrando uma verdadeira sereia. A manobra estava se tornando cada vez mais fácil com a prática, mas Lindsay ainda tinha problemas quando os canais do recife se estreitavam, por isso procurava se manter nos mais largos. As flâmulas coloridas ajudavam-na a localizar os limites onde poderia ficar. Já estava conseguindo saber a hora de respirar no tubo de oxigênio sem ter que olhar no relógio. Após recuperar o oxigênio, começou a praticar a técnica de deslizamento, subindo rapidamente em um gracioso arco. Passou algum tempo trabalhando os movimentos das mãos, sincronizando-os com os do corpo. Durante toda a exaustiva demonstração, ela teria de sorrir e manter os olhos abertos. A princípio, achou difícil se concentrar, com tantos peixes tropicais disputando o espaço com ela. Por fim, acabou se acostumando com eles. Passados cinco minutos e meio, Lindsay subiu à superfície. Acenou para Don e desceu novamente. Porém, ao executar outra manobra circular, avistou um mergulhador observando-a de uma certa distância. Não tinha nenhuma câmera, mas a altura, o corpo atlético e os cabelos loiros pareciam familiares, assim como a roupa de mergulho. O coração de Lindsay se acelerou. Era o mesmo homem que a filmara no dia anterior! Nadou até o tubo de oxigênio e poderia jurar que ele a seguira, mantendo uma discreta distância. Assim que inspirou ar suficiente, entrou por um canal estreito, imaginando que ele desistiria, mas uma olhada para trás revelou que ele continuava a segui-la. Não conseguia ver o rosto dele, encoberto pela máscara. De certa forma, isso o tornava ainda mais sinistro. Lindsay sentiu como se ele a estivesse espreitando, como os tubarões que ela vira pela manhã. O que será que ele queria? Já ouvira muitas histórias, no clube, de admiradores fanáticos que não deixavam os ídolos em paz. Utilizando o nado de golfinho, pensou em nadar para a superfície, afastando-se dele. Porém, para seu terror, ela não conseguiu se mover! Olhando para baixo, viu que sua cauda prendera-se em alguma coisa e uma onda de pânico apossou-se de seu ser. Dentro de quarenta e cinco segundos, precisaria de mais ar. Olhou para cima e não avistou o casco da lancha. Só então se deu conta de que, na ânsia de fugir do estranho, afastara-se do local demarcado pelas flâmulas. Movida pelo instinto de sobrevivência, levou a mão ao zíper da roupa, mas ele estava preso ao tecido da calça e simplesmente não abriu. Como tantas histórias que já ouvira sobre afogamentos quase fatais, Lindsay começou a rever sua vida em questão de segundos. Tentava abrir o zíper, mas não conseguia. Quando pensou que seu momento final havia chegado, sentiu mãos fortes rasgarem sua roupa, livrando suas pernas. Nadou direto para o alto,à procura de ar. Assim que seu rosto saiu da água, puxou o ar com força, engasgando e tossindo devido ao esforço. A lancha apareceu quase imediatamente a seu lado. Don puxou-a para cima. — O que aconteceu? — Enrolou uma toalha no corpo trêmulo de Lindsay. — Onde está sua roupa? Por que nadou além das flâmulas? — Direi... assim que... recuperar o fôlego. Por favor — olhou para Ken —, não quero ficar aqui. Levem-me para o hotel agora. — Claro. Enquanto a lancha se afastava, Lindsay não ousou olhar para trás. Apesar de haver salvo sua vida, aquele mergulhador tivera uma atitude muito estranha. Não queria vê-lo nunca mais. — Já pode falar? — inquiriu Don com gentileza. Lindsay respirou fundo e contou tudo que acontecera lá embaixo. — Parece que o homem salvou sua vida. Lindsay enfureceu-se: — Se ele não estivesse lá embaixo me seguindo, eu nunca teria entrado naquele canal. — Lamento se ele a assustou, Lindsay — disse Don —, mas nem sempre percebemos quando entramos em um canal assim. Não foi culpa dele nem sua o fato de sua roupa haver ficado presa. Dê graças por ele haver estado lá, caso contrário você teria tido um sério problema, antes que eu houvesse conseguido alcançá-la. — Assim que a deixarmos no hotel, voltaremos para pegar sua roupa — Ken avisou. — Talvez consiga recuperá-la para o exercício de amanhã. — Obrigada, Ken. Até começarem as filmagens, na segunda-feira, não quero voltar àquele lugar. Prefiro me exercitar em Thunderball. Ao contrário do que eu disse antes, prefiro que vocês dois me acompanhem nos mergulhos, para evitar a presença de mais psicopatas. — Claro — Don anuiu. — Mas será que o termo "psicopata" não é um pouco forte demais? Talvez ele estivesse apenas admirando-a. É uma mulher muito bonita, Lindsay. Um homem teria que ser cego para não se interessar por você. — Obrigada pelo elogio, mas esse homem tem algo que me intriga. Suas atitudes pareciam... premeditadas, se é que isso faz sentido. Oh, não sei! Não gosto da idéia de ele ter minha imagem gravada em vídeo-tape. A mãe da minha melhor amiga é atriz e já foi perseguida por um fã amalucado. Foi terrível para ela e a família. — Irei para a água com você amanhã — Don anunciou. — Se eu ou Ken virmos qualquer homem que pareça com a descrição que você nos forneceu, avisaremos a polícia para que ele seja preso e interrogado. Por isso, não se preocupe. Lindsay suspirou, aliviada. — Obrigada, Don. Já estou me sentindo bem melhor. — É bom alertar a segurança do hotel também — Ken sugeriu. — Pretendo fazer isso assim que trocar de roupa — respondeu Lindsay. — Ótimo, não queremos que comece a ter pesadelos antes mesmo de se tornar uma estrela — brincou ele. Lindsay sorriu para os dois, agradecida. — Obrigada por tudo, rapazes. — Ora, estamos apenas cumprindo nossa obrigação: proteger lindas donzelas em perigo. Lindsay balançou a cabeça, sorrindo. — Vocês são mesmo impossíveis. Após tomar um banho e lavar os cabelos, Lindsay sentiu-se bem mais relaxada. Tomou uma lata de refrigerante gelado e telefonou para a recepção, avisando que queria falar com a pessoa encarregada da segurança do hotel. Quando ela explicou o motivo do telefonema, o chefe da segurança sugeriu que ela fosse até seu escritório para assinar uma declaração e fornecer uma descrição do indivíduo. Mais aliviada, Lindsay vestiu uma blusa lilás que acentuava o azul intenso de seus olhos. Uma saia florida e um par italiano de sandálias brancas completavam o visual. Aplicou uma leve camada de batom cor-de-rosa e nenhuma, outra maquiagem. Secou e escovou os cabelos até ficarem brilhantes, caindo sobre seus ombros como uma sedosa cortina dourada. Desde a adolescência, ao menos uma vez por ano, era impelida por uma imensa vontade de cortar os cabelos, devido ao trabalho que tinha para mantê-los sempre bonitos e saudáveis. Entretanto, algo sempre a detinha, provavelmente o fato de saber que eles a deixavam com uma aparência muito mais feminina. Agora sentia-se grata por não haver cedido ao impulso de cortá-los, caso contrário não teria sido escolhida para o comercial. Assim que terminou de se arrumar, pegou a bolsa e se encaminhou para a porta. Estava prestes a sair quando o telefone começou a tocar. Voltou para atendê-lo. — Alô? — Srta. Marshall? Aqui é Leanne, recepcionista do hotel. Desculpe incomodá-la, mas há um cavalheiro querendo vê-la. Ele disse que tem algo que lhe pertence. Lindsay conteve a respiração. — S-será que você poderia descrevê-lo sem que ele perceba? — pediu com voz trêmula. — Certo. — A recepcionista demorou algum tempo para voltar a falar: — É um dos homens mais bonitos que já vi — sussurrou. — Lembra Robert Redford e deve ter uns trinta e poucos anos. Mais ou menos um metro e oitenta, loiro, olhos castanho-claros... Está vestido com um terno cinza-claro, sem gravata, com o colarinho aberto. Lindsay umedeceu os lábios. — Ele disse quem era? — Não. Quando perguntei, ele sorriu e disse que seu nome não era importante, mas que a senhorita saberia de quem se tratava. A essa altura, já havia um brilho de suor na testa de Lindsay. Como aquele homem descobrira onde ela estava hospedada? Segurou o telefone com mais força. — Leanne, preste atenção. Não sei o motivo, mas esse homem está me seguindo. Já alertei a segurança do hotel a respeito dele, e estou a caminho do escritório, para falar com o chefe da segurança. Quando desligar o telefone, aja naturalmente e diga a ele que descerei logo. Faça qualquer coisa para detê-lo. Ah... peça a ele que me espere no bar do hotel. Seguiu-se um longo silêncio. — Está bem. — Outra pausa. — Acha que ele é perigoso? — Não sei. Isso é o que espero que o pessoal da segurança descubra. Acha que conseguirá agir normalmente quando desligar? Estou dependendo de você para não levantar suspeitas por parte dele. Quero deter logo esse homem, antes que algo mais grave possa acontecer. — Farei o possível, mas estou nervosa. — Também estou, Leanne. Lembre-se que tudo ficará por conta da segurança do hotel. Assim que se despediram, Lindsay ligou para o número que o segurança lhe dera e contou o que estava acontecendo. Ele a instruiu para encontrá-lo no escritório imediatamente. Lindsay desligou e saiu do quarto, utilizando a escada para chegar ao escritório. — Entre, Srta. Marshall. O Sr. Herrera cumprimentou-a com um aperto de mão e um olhar de admiração, convidando-a a sentar. Lindsay obedeceu, procurando manter-se calma. — Trata-se de uma questão de polícia, por isso tomei a liberdade de pedir a um dos garçons para informá-lo de que a senhorita demoraria alguns minutos. Isso nos dará tempo para que os policiais cheguem até aqui. — Mas e se ele for embora antes? — Irei até o bar, ficar de olho nele. Porém, não posso detê-lo por mera suspeita. Quando a polícia chegar, irei apontá-lo para que eles possam prendê-lo. Em seguida, será levado ao escritório atrás da recepção, para que possam interrogá-lo. Não levará muito tempo para descobrirem se existe algo de suspeito a respeito dele. Lindsay ficou de pé, nervosa demais para permanecer sentada. — Detestarei se ele for embora antes que isso aconteça — afirmou. — Uma atriz, mãe da minha melhor amiga, nunca conseguiu pegar o homem que a perseguiu. — Pedi à polícia que viesse logo. E provável que o homem queira apenas vê-la. É uma linda mulher, Srta. Marshall. Todavia, não podemos descartar a possibilidade de ele ter problemas emocionais. Agora vou descer para ver como está a situação. Não deixe a sala até eu voltar. — Está bem — ela assentiu. — Obrigada pela ajuda. — Essa é minha função. Ele saiu, fechando a porta atrás de si. Lindsay voltou a sentar e preencheu o questionário que o chefe da segurança deixara sobre a mesa. Talvez o mergulhador fosse algum aspirante de ator, como Nate, salva-vidas do Clube Bel Air. Quem sabe não estivesse apenas querendo se aproximar amigavelmente para ser apresentado ao diretor do comercial. Afinal, a própria recepcionista dissera que ele se parecia com Robert Redford. Meia hora se passou. Depois outra. Lindsay preenchera o questionário há muito tempo e, por várias vezes, pensara em ligar para a recepcionista perguntando se ela sabia de alguma coisa. Seus nervos estavam à flor da pele. Finalmente a porta se abriu, dando passagem ao Sr. Herrera. No mesmo instante, Lindsay notou a diferença em sua expressão. Os olhos escuros, antes apreensivos, agora exibiam um brilho de animação. Ela ficou de pé, intrigada com a situação. — O que aconteceu? — Muito mais do que imaginávamos. — Ele sorriu com gentileza, como se houvesse dito uma piada. — Desculpe, se estou sendo enigmático, Srta. Marshall. Pelo visto, tivemos apenas um grande mal-entendido. Entretanto, asseguro-lhe de que não há nada para se preocupar. Se me acompanhar até a recepção, o investigador de polícia responderá todas suas perguntas. Traga o questionário consigo. O alívio de saber que havia uma explicação racional para o caso deixou Lindsay bem mais segura para segui-lo. As três pessoas da recepção, incluindo Leanne, sorriram para ela com o mesmo ar de riso que o Sr. Herrera havia demonstrado. Lindsay franziu o cenho. Estariam se divertindo às suas custas? O segurança abriu uma porta próxima à recepção. — Entre, Srta. Marshall. Lindsay obedeceu, deparando-se com cinco homens, dois deles vestidos com uniformes policiais. Todos voltaram-se para ela, mas sua atenção concentrou-se no homem loiro, que a fitava com olhar penetrante. Ao se dar conta de que retribuía o olhar com a mesma intensidade, Lindsay desviou a vista, embaraçada. Sem dúvida, tratava-se do homem que a seguira. Estranho, mas aquele rosto lhe parecia familiar. E tal impressão não tinha nada a ver com o fato de ele ser parecido com Robert Redford. Atraente era uma boa palavra para descrevê-lo, porém, insuficiente. O homem emanava charme e masculinidade por todos os poros! O rosto bonito apresentava traços clássicos, marcantes, acentuados pelo corte impecável dos cabelos loiros. Enquanto os outros permaneciam na sala, ele encostou-se contra uma parede, mantendo os braços cruzados diante do peito, numa atitude despreocupada. — Srta. Marshall — disse um dos policiais —, sou o oficial Ortiz. Esse é meu parceiro, oficial Henderson. Posso ler seu questionário, por favor? Lindsay entregou o papel a ele. O policial estudou-o por alguns segundos e levantou a cabeça. — Diz que ficou com medo desse homem que a seguiu intencionalmente essa tarde. Desconfiou que ele estivesse com alguma intenção suspeita com relação à sua pessoa. E, segundo escreveu aqui, acusa-o pelo acidente que lhe ocorreu no fundo do mar. Ficou presa na saída de um canal quando tentava fugir dele. Correto? Dito daquela maneira, parecia até que seu receio não tivera fundamento. Lindsay evitou olhar para o mergulhador. Respirou fundo ao responder: — Sim. Cheguei a essas conclusões depois que ele me viu nadando e filmou minha imagem ontem. O mergulhador ficou ereto, acentuando a imponência de seu um metro e oitenta de altura. Lindsay distinguiu um sorriso irônico nos lábios dele. Irritou-se ainda mais. — Ainda assim, admite que quando sua... cauda de sereia ficou presa, esse homem ajudou-a a se livrar da roupa para que a senhorita pudesse voltar à superfície? — Sim. Admito que ele me ajudou. O problema é que eu nunca teria corrido aquele risco se ele tivesse escolhido outro local de mergulho para... satisfazer seus interesses. Lançou um olhar indignado para o mergulhador, que lhe retribuiu com o mesmo sorriso sardônico. — Mas ele não sabia que a senhorita estava se exercitando naquele local e as águas dessa região são livres para todos. — Pode ser, porém, quando ele me viu começou a me seguir, em vez de se afastar. Precisam entender o que se passou na minha mente naquele momento. Tudo indicava que ele pretendia me atacar. Talvez tenha sido precipitação da minha parte imaginar o pior, mas, naquelas circunstâncias, senti-me totalmente desprotegida! Os mergulhadores não sabiam que eu estava com problemas e meu ar começou a acabar. Os outros dois homens, vestidos com camisa e bermuda, como o Sr. Herrera, tentavam conter o riso e aquilo deixou Lindsay ainda mais irritada. Perguntou-se o que eles teriam a ver com a investigação. Talvez fossem agentes disfarçados trabalhando para a polícia. — Pode até ser impossível que vocês acreditem — disse ela —, mas nem todas as mulheres gostam de serem abordadas por homens estranhos. Se há alguma explicação para o que ele fez, por favor, queiram me dizer. Imaginei que ele estivesse querendo ser apresentado ao diretor do comercial. Se for esse o caso, ele começou da maneira errada. Não tenho nenhuma influência sobre a equipe. Os lábios de todos curvaram-se, disfarçando sorrisos. O oficial Ortiz voltou a falar: — Srta. Marshall, nós vamos esperar do lado de fora, enquanto o governador Cordell explica sua versão da história. Lindsay pestanejou. Cordell... Cordell... Aquele nome não lhe parecia estranho. Deus, será que ele era Andrew Cordell, governador de Nevada? Seus olhos encontraram os dele. Só então Lindsay entendeu por que tivera a impressão de conhecê-lo de algum lugar. De repente, foi como se o chão houvesse desaparecido sob seus pés. Apoiou-se no canto da mesa, prevendo algum desmaio súbito. CAPÍTULO IV — Não acha melhor nos sentarmos? — disse ele, tornando-se sério. — Prefiro ficar de pé, se não se importa — respondeu Lindsay. Pouco importava quem fosse aquele homem, a verdade era que ele tinha o poder de deixá-la apreensiva. Queria ouvir o que ele tinha a dizer e sair logo dali. Ele não fez menção de sentar. Em silêncio, observou-a por um longo tempo. — Sua intuição estava certa quanto a mim, Srta. Marshall. Eu realmente a segui. A declaração sobressaltou-a, fazendo seu coração readquirir aquele ritmo absurdo. — Pior, menti para o policial — ele confessou. Lindsay estreitou o olhar. — Está querendo dizer que sabia que eu estaria naquele lugar novamente, para me exercitar? — Sim. Fiz algumas perguntas e programei meu horário para que coincidisse com o seu. Lindsay conteve a respiração. Teria sido melhor ouvir uma mentira do que essa terrível confirmação. — Deixe-me adivinhar o motivo — disse a ele —, é muito difícil espionar alguém quando se é governador, por isso resolveu tentar embaixo da água? O riso espontâneo que surgiu no rosto dele, deixou-o ainda mais atraente, desarmando-a por completo. Até mesmo Lindsay teve que conter uma súbita vontade de rir. — Desculpe — disse ela. — O Sr. Herrera me garantiu que não preciso ter medo de você, só que ainda não ouvi sua explicação. O sorriso desapareceu do rosto dele. O modo como ele a olhou sugeria uma intimidade que fez Lindsay sentir vontade de sair correndo. — O problema é justamente esse. — salientou ele. — Não tenho uma explicação. Lindsay olhou para o chão, incapaz de sustentar aquele olhar. — Por favor, não brinque comigo — pediu. — Não estou brincando, Srta. Marshall. A verdade é que me deparei com uma sereia ontem e ela... ela me encantou. Lindsay levantou a vista para ele. — Fiquei tão enfeitiçado que a segui, na esperança de tocá-la, ver se ela era real. Sempre ouvi dizer que sereias não existem, mas eu tinha a imagem dela gravada em vídeo para provar o contrário. — Ele sorriu para Lindsay. — Voltei ao mesmo lugar hoje para reavivar o encantamento. Não imaginei que minha presença fosse assustar a linda sereia. Porém, quando a vi lutando para se livrar da cauda, o encantamento cedeu lugar a um sentimento de puro terror. Fiz o que estava ao meu alcance para libertá-la e fazê-la subir à superfície. Só que, no desespero, estraguei a roupa dela, que teve de ser deixada para trás. Uma vez que sei o quanto uma sereia necessita de sua cauda, eu trouxe o que restou dela, na esperança de que essa sereia não se zangasse com o simples mortal que ousou invadir seu mundo e, ainda que por um breve momento, realizou sua fantasia particular. — Srta. Marshall? — O oficial Ortiz abriu a porta. — Temos que atender outro chamado. Se já conseguiu resolver o problema, darei o caso por encerrado. Caso contrário, o Sr. Herrera continuará com vocês até que possamos voltar. Lindsay olhou de um para o outro. A confissão sincera do governador Cordell conseguira surpreendê-la. Já não sabia o que pensar sobre ele e o incidente. — Eu... eu já recebi uma explicação — respondeu. — Obrigada por ter vindo, oficial. Estou muito agradecida. — Foi um prazer, senhorita. Governador. — Despediu-se com um gesto de cabeça. — Tenham uma boa estadia em Nassau. Quando a porta foi fechada, o aposento tomou-se claustrofóbico para Lindsay. A presença dominadora do governador despertou-lhe algo estranho, que nem mesmo ela sabia definir. — Ainda está com medo de mim — afirmou ele, como que lendo seus pensamentos. — Por que deduziu tão rapidamente que havia algo de sinistro no fato de eu querer observá-la? Ouvi a explicação que deu aos policiais, mas gostaria de saber o motivo que existe por detrás disso. A habilidade que ele tinha de ir direto ao âmago do problema deixou Lindsay espantada mais uma vez. Levou alguns segundos para falar: — Já assistiu algum filme com Victoria Harris? Ele assentiu. O fato de olhar para os lábios de Lindsay enquanto ela falava, deixou-a desconsertada. — Beth, a filha dela, é minha amiga desde os tempos de jardim-de-infância — Lindsay prosseguia. — Nossas famílias eram vizinhas e nós duas crescemos como irmãs. Vicky é como uma tia para mim e, apesar de seus casamentos não haverem dado certo, ela é uma pessoa maravilhosa. Devo muito a ela, inclusive a oportunidade de filmar esse comercial. Vicky sempre foi uma pessoa muito carismática e uma mulher lindíssima também. Cerca de dez anos atrás, ela estava participando de um espetáculo para arrecadar fundos para ajudar crianças carentes quando um homem da platéia conseguiu entrar nos bastidores e tirar uma foto de Vicky. Algum tempo depois, enviou uma cópia para a casa dela juntamente com uma carta apaixonada. Vicky ficou espantada, pois não conseguiu entender como ele descobrira seu endereço. As coisas pessoais que ele revelava na carta deixaram-na apreensiva. Na época, ela estava casada com Pat, um alcoólatra que aconselhou-a a esquecer o assunto. Um mês depois, o homem enviou um envelope com fotos de todos os lugares onde Vicky havia estado. O que significava que ele a estava seguindo o tempo todo. Vicky ficou desesperada e entrou em contato com a polícia. Contratou seguranças que acompanhavam ela e Beth para todos os lugares. Foi por isso que pensei... — Não precisa explicar mais — Andrew a interrompeu. — A polícia conseguiu prender o tal sujeito? — Não — Lindsay balançou a cabeça. — O pesadelo continuou por mais um ano. Até que um dia as cartas e fotos pararam de ser enviadas. — De repente, vendo-se impelida por uma necessidade de escapar daquela perturbadora proximidade, ela disse: — Desculpe por eu haver transformado tudo isso num incidente desagradável. Don, um dos mergulhadores que me acompanha, disse que se não fosse por você eu poderia ter morrido. Agradeço por sua ajuda. Seu raciocínio rápido salvou minha vida. — Você teve razão em me acusar — Andrew salientou. — Minha presença a deixou assustada, fazendo-a desconcentrar-se. Depois do que me contou, não a culparia se atirasse no primeiro homem de atitude suspeita que se aproximasse de você. Reconheço minha culpa pelo acidente. Mesmo querendo utilizar a desculpa de que estava agindo sob o feitiço de uma sereia, não posso fazer isso. Lindsay notou que o governador estava sendo sincero. O comentário unido ao irresistível charme que ele emanava, tiveram o poder de derrubar suas defesas, fazendo-a sorrir com espontaneidade. — Não acredito que eu esteja dizendo isso, mas acho que estou lisonjeada com o elogio — disse. — Creio que meu comercial será bem convincente, afinal. Tem idéia do quanto é difícil imitar um peixe? — Acho que sim — respondeu Andrew. — Quando levei sua roupa de sereia para casa, ou o que restou dela, Randy e eu não conseguimos imaginar nem como você podia entrar nela, quanto mais realizar todas aquelas manobras. Ficou claro que é uma exímia nadadora. — Digamos que tenho muita prática — Lindsay sorriu, grata por ele haver se preocupado em recuperar a roupa. — Randy é algum mergulhador? Os lábios dele curvaram-se num sorriso. — Randy é meu filho de dezoito anos, que, aliás, está morrendo de vontade de conhecê-la pessoalmente. — Oh, então está de férias com a família? — Sim, de certa forma. Essa é a primeira viagem que eu e Randy fazemos desde que minha esposa morreu, há três anos. Lindsay lembrou de haver lido algo nos jornais a respeito do assunto. — Deve ter sido muito doloroso para você — comentou. — Estou me sentindo ainda pior por haver chamado a polícia e perturbado suas férias. Andrew arqueou uma sobrancelha. — Bem, admito que não me senti o mais feliz dos homens quando aqueles dois policiais me abordaram. Surpreenderam a mim e a meus guarda-costas. Fiquei ainda mais atônito quando me mandaram para a sala próxima à recepção, para me interrogarem sobre uma certa sereia. Lindsay tentou manter-se séria, mas acabou deixado escapar uma risada. — Acho que a situação se tornará ainda pior — Andrew salientou. — Algum repórter deve ter sabido da notícia através de um dos seguranças do hotel, porque fui iluminado por um flash quando atravessei o saguão carregando sua roupa de sereia. Estava quase totalmente coberta, exceto pela cauda. — Está brincando! — Lindsay espantou-se. — Não, não estou. E aposto que os jornais transformarão isso no maior escândalo da minha vida — acrescentou com um sorriso despreocupado. — Aliás, mandei que a roupa fosse entregue em seu quarto. Lindsay abaixou a vista, sabendo melhor que ninguém que um homem de vida pública, como o governador, tinha que viver lidando com as distorções e sensacionalismos provocados pela mídia. Se ela fosse mesmo sua inimiga, não poderia ter escolhido uma maneira melhor de prejudicá-lo, não apenas diante de seus colegas, mas também dos eleitores. — Oh, eu sinto tanto! — Não se preocupe — Andrew tranquilizou-a. — Fui eu mesmo quem criou essa situação. E com você que estou preocupado, ainda mais agora que conheço seus temores. Enquanto eu esperava que o Sr. Herrera a trouxesse até aqui, instruí meu pessoal a tomar as providências necessárias para que seu nome não fosse publicado. Todavia, não posso lhe garantir nada. — Obrigada mesmo assim — murmurou Lindsay, pensando melhor na situação. Se seus pais soubessem dessa história... — Para sua maior proteção contra algum outro mortal curioso que sucumbir ao seu encantamento, sairá dessa sala acompanhada por dois homens armados. Eles a protegerão dia e noite durante o resto de sua estadia em Nassau e a acompanharão na volta para a Califórnia. — Oh, mas não será preciso! — Receio que será, sim. Assim que o incidente se tornar público, e creio que isso ocorrerá dentro de algumas horas, muitos espiões da imprensa aparecerão por aqui, querendo dar uma olhada em você, ou pior. E quando isso acontecer, você dará graças pela proteção. Lindsay acreditou nele, sentindo-se meio tola. — Isso significa que ficará sem guarda-costas? — perguntou a ele. — Não. Sempre viajo com uma equipe de seguranças. Não haverá problema em liberar dois deles para protegê-la. Porém, o serviço deles será pago por mim, não se preocupe. Ele realmente tinha o poder de ler seus pensamentos, pensou Lindsay, enrubescendo. Também notou que ele sabia coisas a seu respeito que ela não dissera. — Como descobriu que eu moro na Califórnia? O sorriso maroto fez ele parecer mais jovem e bonito. — Estava torcendo para você não perguntar. Posso ter muitos defeitos, mas mentir não é um deles. Admito que paguei uma pessoa para descobrir isso para mim. Pokey é o mergulhador que está me acompanhando; ele e Don são muito amigos. Lindsay lembrou das várias conversas que tivera com Don e Ken. O que mais será que eles haviam contado a ele a seu respeito? E por que Don nunca lhe dissera sequer uma palavra sobre o assunto? — Antes que fique brava com Don, asseguro-lhe que ele não sabia que Pokey estava fazendo essa investigação para mim. Deixou que Don pensasse que o interesse era dele mesmo. — Andrew observou a reação dela. — Sei que fui inescrupuloso e que meus oponentes políticos e eleitores não esquecerão esse detalhe quando minha campanha começar. Lindsay estava tão envolvida pela inteligência e a personalidade carismática de Andrew, que esquecera tudo mais, até mesmo sua indignação inicial. Quando olhou para o relógio, notou que já passava das nove. Céus, estavam conversando há mais de uma hora! — Desculpe, mas está ficando tarde. — Entendo — Andrew assentiu. — Eu também já deveria ter saído há um bom tempo, para levar Randy para jantar. Espere cinco minutos até que eu saia do hotel, depois sinta-se livre para fazer o que quiser. Com um pouco de sorte, talvez minha saída desvie a atenção de você. — Obrigada — Lindsay sussurrou, sensibilizada com a preocupação dele. Por outro lado, experimentou uma estranha decepção ao imaginar que não o veria novamente. — Só mais uma coisa, Srta. Marshall — Andrew voltou-se para ela, antes de sair. — Se quiser a fita que gravei com sua imagem, posso mandar que a entreguem em seu quarto. Lindsay afastou uma mecha de cabelos do rosto. Ele tentava fazer todo o possível para eliminar seus temores e ela o admirou ainda mais por isso. — Não será necessário — respondeu. — Confio em sua discrição. Além disso, a maioria dos vídeos termina em uma prateleira na estante ou em uma gaveta e nunca mais são vistos novamente. — Não conte com isso — avisou Andrew, estreitando o olhar. Saiu sem dizer mais nada. Lindsay permaneceu onde estava, ciente de que algo vital saíra do aposento e, provavelmente, de sua vida. Passados os cinco minutos, ela deixou a sala e foi abordada pelo chefe da segurança do hotel e dois homens altos com trinta e poucos anos. — Tudo bem com a senhorita? — Sim, obrigada, Sr. Herrera. Estou muito agradecida pelo que fez para me ajudar. Sinto ter causado problemas sem motivo. — Ainda bem que o caso não foi sério. Espero que aproveite sua estadia, senhorita. Esses são o Sr. Garvey e Sr. Arce, os homens que o governador Cordell designou para protegê-la. — Pode nos chamar de Jake e Fernando. Os homens vestidos como típicos turistas americanos cumprimentaram-na com um aperto de mão. Apesar da cordialidade, Lindsay ainda sentia-se meio incrédula diante da situação. — O governador disse que a senhorita não ficou muito satisfeita com o fato de precisar de proteção — disse Fernando —, todavia, qualquer notícia que sair nos jornais colocará sua vida em risco. Não se sabe qual será a reação do público. — Isso mesmo — Jake acrescentou. —. O governador está muito preocupado com sua segurança. Não deixe que ele saiba que nós lhe contamos, mas em sua mansão o governador é conhecido como "o desesperado". A esposa dele costumava chamá-lo assim e o apelido acabou pegando. Lindsay riu ao saber esse novo detalhe da personalidade do governador. Entretanto, não conseguia imaginar um homem que estivesse mais longe de agir como um desesperado do que ele. — Por medida de segurança, o governador providenciou sua mudança para a principal suíte do hotel. O elevador particular sai direto da garagem para o apartamento. Ficaremos no quarto ao lado, para garantir sua privacidade e segurança. O governador agira com espantosa rapidez. Porém, ela não poderia aceitar aquele gesto. — Por favor, transmitam meu agradecimento ao governador, mas prefiro ficar no mesmo quarto onde estava. — Receio que seja tarde demais, Srta. Marshall. Suas coisas já foram transferidas para a suíte e seu antigo quarto alugado para outro hóspede. Podemos ir? — Vou levá-la ao elevador privativo — ofereceu-se o Sr. Herrera. Aturdida com a súbita mudança das circunstâncias, Lindsay apenas seguiu-o pelo corredor, ignorando os olhares curiosos lançados em sua direção. Fernando ficava mais perto dela enquanto Jake sondava a área. Nunca imaginaria que o mergulhador sinistro que a abordara se tornaria seu protetor, em vez de perseguidor. Bastara uma ordem dele para transformar sua vida. A primeira coisa que Lindsay percebeu quando o elevador se abriu no apartamento foi um pequeno corredor com portas de ambos os lados. A sala de estar ficava mais adiante, toda decorada em tons de cinza e branco. Viu a roupa de sereia deixada sobre um dos sofás. Alguns quadros de arte moderna também faziam parte da decoração, assim como um piano e um fabuloso biombo chinês. Este último encobria parcialmente uma mesa de jantar. Fernando mostrou-lhe o resto do apartamento. — Está tudo em ordem, Srta. Marshall. Avise-nos, se precisar sair do hotel. — Não vou sair. Pretendo apenas jantar e ir dormir. Estarei pronta para ir ao porto às seis e quinze, amanhã. Ele assentiu. — Já entramos em contato com o mergulhador que a acompanha e o informamos sobre a nova situação. O governador pediu seu jantar antes de sair; tudo que tenho de fazer é ligar para a cozinha. Quando trouxerem, mandarei que o deixem sobre a mesa de jantar. Precisa de mais alguma coisa? Lindsay olhou em volta. — Não, obrigada. Tudo está perfeito. Puxa, estão me fazendo sentir como uma princesa. Ele sorriu. — O governador nos disse para tratá-la assim. E acredite-me, não está sendo nem um pouco difícil. Perdoe-me, se eu não estiver sendo profissional, mas nunca vi cabelos mais bonitos que os seus. — Não imagina o trabalho que eles dão, mas mesmo assim obrigada pelo elogio, Fernando. Ele sorriu. — Depois de servir seu jantar, ficarei em um dos quartos na entrada do apartamento, Jake ficará no outro. Se precisar nos chamar é só discar um, zero ou um, um. — Não acredito que será necessário, mas obrigada mesmo assim. — Atenderemos todas as ligações. Se forem normais, passaremos as chamadas para a senhorita. Sinta-se à vontade para ligar para onde quiser. Mas não esqueça de que todas as ligações estarão sendo gravadas. Nós lhe entregaremos a fita quando a senhorita voltar para a Califórnia. Um arrepio involuntário percorreu a espinha de Lindsay. Como será que pessoas como o governador suportavam levar esse tipo de vida? Ela própria não aguentaria. Lembrou-se dos últimos anos que vivera com os pais superprotetores. Estavam sempre querendo saber sobre todos seus passos, com medo de que algo pudesse lhe acontecer. Tentando evitar o sentimento claustrofóbico que a lembrança lhe provocava, apressou-se em esquecê-la e se preparar para dormir. Mal havia acabado de vestir a camisola e o robe quando o telefone tocou. Imaginou que fosse Jake ou Fernando avisando-a de que o jantar havia chegado. — Alô? — Srta. Marshall? A voz profunda e familiar lhe causou um arrepio pelo corpo. — Sim, governador? — Pode me chamar de Andrew. Ajuda-me a esquecer um pouco as responsabilidades. Lindsay segurou o fio do telefone junto ao peito. — Não está preocupado com o que seus eleitores pensarão se ouvirem isso? — provocou-o. O riso suave contagiou-a. — Se Jake e Fernando estiverem cumprindo seus trabalhos, não preciso me preocupar. — Oh, eles estão sendo muito gentis comigo. — Lindsay respirou fundo, acalmando as batidas do coração. — Obrigada por sua generosidade. Mas, por favor, não faça mais nada. Eu... eu sei que está arrependido pelo que aconteceu. Também gostaria de poder reparar o engano que cometi, porém, não tenho como fazê-lo. Então, por favor, não me faça sentir ainda mais arrependida. — Então que tal reparar seu engano jantando comigo e Randy amanhã à noite? Venha até a casa onde estamos hospedados, depois que terminar seus exercícios. Filmamos todos os nossos mergulhos e você poderá dar boas risadas vendo dois novatos perdidos em meio aos recifes. Também gostará de ver a parte em que a filmei. Isto é, se puder vir, claro... O convite pegou-a completamente de surpresa, deixando-a apreensiva. Se passasse muito tempo na companhia desse homem, sabia que acabaria se envolvendo mais do que devia. — E então? Não está curiosa para ver como sobrevive a última das sereias? — ele brincou. — É uma imagem que todos deviam ter o privilégio de ver ao menos uma vez, antes que ela volte para o mar e desapareça para sempre. Seria uma maneira indireta de dizer a ela que esse seria apenas um flerte passageiro? A idéia deixou-a triste e confusa ao mesmo tempo. Meio séria, ela respondeu: — Talvez ela desapareça por não ser uma sereia de verdade. — Recuso-me a acreditar nisso — respondeu ele com uma intensidade que chegou a surpreendê-la. — Eu e Randy estaremos esperando-a às sete e meia. — Pretendo me exercitar até as sete, por isso não prometo que estarei pronta na hora certa. — Por mim pode terminar até à meia-noite, se quiser, desde que venha. Jake e Fernando conhecem o caminho. Ah, só mais uma coisa: se não quiser se aborrecer, não leia os jornais de amanhã. Certo? — Certo. Obrigada por tudo, incluindo o convite para jantar. Boa noite, gov... Andrew. Suas mãos estavam trêmulas quando ela colocou o telefone de volta no gancho. No caminho para a sala de jantar, parou para examinar a roupa de sereia. Alguém havia costurado a lateral e consertado o zíper. Como ele conseguira encontrar uma costureira assim tão rápido? Tudo que Andrew queria parecia estar ao seu alcance em questão de minutos! Era justamente isso que mais a amedrontava. CAPÍTULO V A visão da casa onde o governador estava hospedado fez Lindsay lembrar de alguns cartões-postais que vira das ilhas gregas. Sob a luz do crepúsculo, as árvores que cercavam a suntuosa construção atribuíam-lhe um encantador ar de mistério. Quando a limusine circundou a casa em direção à entrada principal, Lindsay quase disse ao motorista para levá-la de volta ao hotel. Passara todo o dia antecipando o momento em que voltaria a revê-lo, mas agora estava envolvida por tantas emoções conflitantes que já não tinha certeza se gostaria de reencontrá-lo. Enquanto se arrumava, antes de sair do hotel, mudara várias vezes de visual, imaginando qual deles agradaria a Andrew. Por fim, decidira-se por um vestido inteiriço de cetim azul-mar com detalhes prateados de pinturas orientais, gola redonda, mangas japonesas e duas sensuais aberturas laterais na longa saia justa. Sapatos prateados de meio-salto completavam o visual. Repousados sobre o ombro direito, os longos cabelos dourados deixavam à mostra um dos delicados brincos de safira, destacando a cor do vestido e de seus olhos. Jake ficara no hotel e Fernando vinha sentado a seu lado, na limusine. Quando o carro finalmente parou, Fernando, sempre alerta, saiu primeiro e olhou em volta, antes de ajudá-la a sair. A porta de entrada abriu-se de repente, revelando a atraente silhueta de Andrew Cordell. Estava bonito demais, para maior desespero de Lindsay. Trajava um elegante summer cor de marfim. Apesar da aparência relaxada, sua aparência irradiava uma vitalidade impossível de não ser notada. Lindsay sentiu a energia mesmo a distância. Para seu próprio espanto, conseguiu andar até ele com firmeza, apesar das pernas trêmulas. — Menti quando disse que não me importaria com o horário — disse Andrew. — Já passa das oito e eu já estava prestes a ir buscá-la pessoalmente. — Eu não queria me atrasar, mas Ken teve problemas para ligar a lancha depois que terminei de me exercitar. — Tentarei perdoá-lo por isso — comentou ele, segurando-a pelo cotovelo. Lindsay deixou que ele a conduzisse para dentro, muito ciente daquele toque em seu braço. Passaram por uma suntuosa sala de estar decorada com arcos em estilo mediterrâneo e janelas com vista para o mar. À esquerda, distinguiu uma formal sala de jantar decorada no mesmo estilo. — Meu filho está nos esperando no escritório — Andrew avisou, guiando-a por um corredor. Quando entraram no aposento, um belo jovem de cabelos escuros ficou de pé e ajeitou o blazer, exibindo um sorriso simpático. — Oi — cumprimentou-a. — Randy, quero que conheça a última das sereias — Andrew disse a ele, ainda segurando-a de um modo possessivo. — Acredita que ela se chama Lindsay Marshall? Divertindo-se com o comentário, ela sorriu, cumprimentando Randy com um aperto de mão. — Olá, Randy. Espero que me chame de Lindsay. — Isso também serve para mim? — indagou Andrew. — Claro — ela respondeu. Andrew fizera a pergunta num tom sério. — Estamos contentes que tenha vindo, Lindsay — comentou Randy, quebrando a tensão. — Quando papai me mostrou sua imagem no vídeo, entendi por que ele a confundiu com uma verdadeira sereia. Ficou demais! Espere só até assistir a fita! — Confesso que estou quase com medo de assistir. No início eu precisava tomar muito ar e meu corpo teimava em flutuar enquanto eu tentava nadar em um nível plano. Eu movia os braços de uma forma muito desajeitada. — Pois saiba que nenhum de nós notou sua dificuldade — Andrew admitiu soltando o braço dela com delicadeza. — Gostaria de tomar algo antes do jantar? — Acho que não. Para ser honesta, sempre fico faminta depois de nadar. — Ora, podemos cuidar disso rapidamente. Enquanto Andrew falava, fitava os lábios dela com uma intensidade que enviou arrepios pelo corpo de Lindsay. — Vou dizer à cozinheira que estamos prontos. — Obrigado, Randy — Andrew agradeceu. — Iremos daqui a pouco. — É um rapaz muito bonito — Lindsay asseverou depois que Randy saiu. — Exceto pelos cabelos mais escuros, ele se parece muito com você. — Obrigado. Contudo, creio que o comportamento educado foi herança da mãe. — Tem outros filhos? — Não. Tivemos sorte em ter Randy. Minha esposa sofria de uma rara doença no sangue, herdada da mãe. Ambas morreram muito jovens. Lindsay fitou-o com uma expressão de lamentação. — Sua perda deve ter sido muito dolorosa. Porém, é provável que lidar com o assédio da imprensa tenha sido pior. Andrew contraiu o maxilar. — Foi um verdadeiro inferno, principalmente para Randy. Eu não podia dar muita atenção a ele, por isso foi obrigado a lidar sozinho com grande parte de sua dor. Estou tentando corrigir esse meu erro agora. — Desculpe, se eu soubesse não teria... — Não lamente nada — Andrew interrompeu-a. — Eu estava determinado a encontrá-la. O problema é que a maneira como nosso encontro aconteceu não foi bem como eu esperava. Sermos apresentados sob os olhares de policiais armados não contribuiu muito para amenizar a situação. Confesso que preferia meu plano original para nosso primeiro encontro, algo menos público. — Plano original? — Sim. Eu ia esperar até que você terminasse de se exercitar. Pokey e seu pessoal estavam instruídos para aproximarem nosso barco do seu. Então ele pediria a Don para nos apresentar e isso me daria a oportunidade de pedir desculpas por haver invadido seu território no dia anterior. Se fosse receptiva, eu pretendia convidá-la para jantar e lhe oferecer o vídeo, se você quisesse. — Fitou-a nos olhos: — Teria aceitado meu convite? Lindsay não soube ao certo, o que responder. Pensativa, apenas olhou-o por um instante. — O jantar está pronto, papai. A interrupção não poderia ter sido mais oportuna. Sem tirar os olhos dela, Andrew respondeu: — Já estamos indo. Novamente, Lindsay sentiu o calor da mão dele em seu corpo. Dessa vez em sua cintura, impelindo-a a seguir em frente. Antes de chegarem à sala de jantar, Andrew sussurrou junto a seu ouvido: — Creio que sua presença aqui, essa noite, é uma indicação de que sua resposta teria sido sim. Lindsay corou, mas continuou andando. Surpreendeu-se ao notar que jantariam em um terraço cercado de plantas que garantiam a privacidade do ambiente. A mesa circular continha um lindo arranjo de orquídeas iluminadas por candelabros. Envolta pela inebriante fragrância da noite e o brilho prateado da lua, Lindsay quase não acreditava que tudo aquilo estivesse realmente acontecendo. De repente, lembrou da conversa que tivera com Beth, no aeroporto. — Como é possível que ainda não tenha aparecido em nenhum filme? — inquiriu Randy enquanto se servia com uma das apetitosas iguarias sobre a mesa. Lindsay provou o vinho branco e depositou o copo sobre a mesa. — Não sou atriz, Randy. — Mas é tão linda que com certeza deve ser modelo! Sua maneira direta de falar era muito semelhante à do pai. Lindsay meneou a cabeça, sorrindo. — Obrigada pelo simpático elogio, mas errou de novo. Estou trabalhando no comercial para conseguir dinheiro suficiente para pagar meu curso de pós-graduação. Passei no teste por ser uma boa nadadora e ter cabelos longos. — Não resta dúvida de que esses não foram os únicos motivos — Andrew acrescentou com um brilho diferente no olhar. — O que pretende estudar e onde? — Quero cursar pós-graduação em biologia marinha no Instituto Scripp's, em La Jolla. — Já ouvi falar desse instituto! — exclamou Randy. — Alguns amigos meus fizeram uma estadia lá, no último verão. — Muitos dos meus amigos fizeram a mesma coisa quando estavam no primeiro ano da faculdade. Pretendo estudar o comportamento dos tubarões. — Está brincando! Isso é fantástico! Viu muitos tubarões durante seu mergulho de ontem? Eu e papai queríamos acompanhá-la, mas ainda não temos muita experiência em mergulho. Pelo visto, esses dois sabiam tudo a respeito de sua rotina, pensou Lindsay. E graças a Don, aquele linguarudo! — Sem dúvida, o tubarão é o mais perigoso dos animais marinhos — disse Andrew. — Por que escolheu uma profissão que a maioria das pessoas considera tão perigosa? Lindsay pousou o garfo sobre o prato antes de responder: — O risco não é tão grande quando se sabe muito a respeito do comportamento dos tubarões. Agora quero lhe fazer uma outra pergunta: — O que o fez entrar na política, uma carreira muito mais arriscada, não apenas para sua família, mas também para sua saúde física e emocional? O olhar de ambos se encontrou. — Está usando a analogia errada. Se os tubarões me pegarem, politicamente falando, tenho sempre a opção de voltar a ser um prefeito. Mas que escolha você tem se um tubarão branco resolver devorá-la? Lindsay tomou outro gole de vinho. — É verdade que em raras ocasiões já houve casos de ataques de tubarões brancos, mas eles não são os únicos no oceano. Cabeças-de-martelo também fornecem estudos fascinantes para os cientistas. Além disso, eles não têm uma boca muito grande. — Então só mordem, em vez de comerem você de uma só vez? Lindsay riu. — Qualquer criatura se torna defensiva quando se sente acuada ou ferida. Tubarões não são diferentes nesse aspecto. Se estudá-los fosse tão perigoso assim, ninguém viveria para contar as descobertas a respeito deles. — Puxa, isso parece algo que eu adoraria fazer! — Randy se animou. — Felizmente você ainda tem quatro anos de faculdade, durante os quais mudará de idéia pelos menos uma dúzia de vezes — Andrew replicou. — Bem, se já terminaram, que tal comermos a sobremesa na sala de tevê, enquanto Lindsay se vê no vídeo? — Não sei se estou pronta para isso — admitiu ela quando Andrew ficou de pé, impelindo-a a ficar também. Sentiu o clima tenso e imaginou se o interesse de Randy por mergulho ia além da diversão. Talvez por isso Andrew resolvera interromper o assunto. A perda da esposa deve tê-lo tornado muito protetor com relação ao filho. Ninguém entendia isso melhor do que ela. Não esquecia das muitas conversas que tivera com o psiquiatra sobre pais como os seus, que sufocavam os filhos devido a um excesso de proteção. Pelo visto, Andrew Cordell se enquadrava na descrição. E se sua suspeita estivesse correta, seria lamentável tanto para o pai quanto para o filho. Randy adiantou-se e arrumou cadeiras na frente da tevê. Andrew conduziu-a até o aposento, mantendo a mão em sua cintura. Nervosa com aquele toque, Lindsay tentou disfarçar com uma pergunta: — Antes de olhar minhas imagens, eu gostaria de ver as outras fitas que vocês filmaram desde que chegaram às Bahamas. Talvez assim eu consiga aguentar melhor meu desajeitado desempenho. Além de poder manter os olhos longe de Andrew Cordell sem revelar a forte atração que sentia por ele, pensou ela. A hora seguinte passou muito rapidamente, tanto para Lindsay quanto para os dois. — Para uma dupla de amadores, vocês são ótimos mergulhadores. Esses vídeos estão incríveis! Como aprenderam a lidar tão bem com a câmera? Estou com inveja de todos os mergulhos que já fizeram! — Meu amigo, Troy, uma espécie de parente, é especialista em câmeras — Randy explicou. — É provável que termine como fotógrafo da National Geografic ou de alguma revista famosa. De qualquer forma, foi ele quem nos ensinou a utilizar a câmera. — Estou impressionada, Randy. Ele também é mergulhador? — Não. Ele quebrou a perna seriamente quando jogava futebol, há dois anos, e não praticou nenhum esporte desde então. — Oh, isso é muito ruim — lamentou ela. — Nadar seria uma excelente terapia para ele. Randy voltou-se para ela: — Acha mesmo? — Tenho certeza. — Lindsay sorriu, ciente do olhar de Andrew sobre si. — Sou professora de natação e alguns de meus estudantes são pessoas deficientes, recuperando-se de acidentes, como Troy. Para muitas delas, nadar é uma terapia essencial para a recuperação. — Acha que ele também poderia se tornar mergulhador? — Claro. — Papai, você ouviu isso? — Sim, Randy. Quando voltarmos para casa, diremos a Troy o que Lindsay nos falou. Talvez ele fique bom a tempo de nos acompanhar até as ilhas Caimã, em agosto. — Já ouvi dizer que esse é o sonho de todo fotógrafo — salientou Lindsay sem tirar os olhos das fascinantes imagens da tevê. Randy ajeitou-se melhor na cadeira. — Ok, estamos quase chegando lá — avisou. O coração de Lindsay começou a bater mais rápido quando ela distinguiu o brilho de uma cauda em meio aos corais. A princípio, a aparição parecia quase fantasmagórica. Entretanto, quando Lindsay se viu com mais nitidez, até mesmo ela se questionou quanto à veracidade das imagens. Ela realmente parecia uma sereia! Randy congelou a imagem. — Não acredito... — murmurou, surpresa. — Talvez agora entenda meu encantamento um pouco melhor — Andrew replicou. Randy olhou-a por cima do ombro: — Seu comercial poderá vender tudo, até prendedores de roupa, Lindsay. — Obrigada pelo voto de confiança — ela forçou um sorriso, ficando de pé. Lindsay percebeu que estava se envolvendo demais com Andrew e Randy. Aúltima coisa que desejava era dizer adeus, mas seria obrigada a fazê-lo enquanto ainda tinha domínio sobre sua vontade. — Desculpem, mas tenho um mergulho marcado para amanhã logo cedo. Preciso voltar para o hotel antes que fique tarde. Seguiu-se um estranho silêncio enquanto Andrew acendia as luzes. — Amanhã é domingo, seu último dia de folga antes do início das filmagens — disse a Lindsay. — Que tal passar parte dele mergulhando conosco, na ilha Balmoral? Lindsay abaixou a vista, receosa de revelar a alegria que o convite lhe provocou. Contudo, por mais que quisesse aceitar, ela não suportaria nem mais um dia sequer a companhia de Andrew. Depois seria muito difícil lidar com as consequências emocionais. — Não precisa decidir agora — disse Andrew. — Se decidir nos acompanhar, é só me ligar amanhã, antes das dez horas. — N-não. — balbuciou ela — Posso dar a resposta agora. Eu gostaria de ir, mas toda a equipe chegará amanhã e terei de fazer testes com a roupa e a maquiagem. Não sei quando estarei livre, por isso não tenho como dar uma resposta definitiva. — Você está falando como papai, quando eu ligo para ele no escritório — declarou Randy, desapontado. Lindsay conteve a respiração, esperando que Andrew dissesse alguma coisa, mas ele permaneceu em silêncio. Tomando a iniciativa, ela falou: — Não vou esquecer essa noite agradável. Obrigada pelo jantar e a companhia de vocês. — O prazer foi nosso — foi a resposta polida de ambos. Enquanto ajudava Lindsay a entrar na limusine, Andrew sussurrou-lhe ao ouvido: — Boa noite, linda sereia... Quando o carro se afastou, Lindsay tornou-se pensativa. Algo muito significativo acabara de acontecer em sua vida. A idéia de voltar para a Califórnia e se distanciar de Andrew e Randy causou-lhe uma profunda desolação. Não fazia sentido sentir-se assim por pessoas que mal acabara de conhecer! Ainda mais estando satisfeita com a vida que levava. Pelo menos era o que pensava até o dia anterior... CAPÍTULO VI Desperta e inquieta demais para conseguir dormir, Lindsay permanecia na sacada do apartamento, com as mãos apoiadas no gradil. Olhava a lua com uma expressão sonhadora. Afastar Andrew de seus pensamentos estava sendo mais difícil do que imaginara. — Lindsay? Ela sobressaltou-se ao ouvir aquela voz profunda. Virou-se no mesmo instante. Haviam se despedido há menos de uma hora e ali estava Andrew, bem à sua frente. A intensa alegria de revê-lo chegou a deixá-la assustada. Andrew ainda vestia a mesma roupa que usara durante o jantar. Todavia, estava muito sério. Lindsay conteve a respiração. — Jake disse que você estava aqui. Eu não viria incomodá-la se o assunto não fosse importante. Inúmeras possibilidades passaram-se pela mente de Lindsay, fazendo seu pulso se acelerar. — Aconteceu alguma coisa? — indagou, preocupada. — Randy está bem? — Não, não está. Nem eu tampouco — respondeu ele. Lindsay franziu o cenho, mordendo o lábio. — Por favor, não me mantenha em suspense. O que houve? Andrew aproximou-se mais, observando o rosto e os cabelos dela como se quisesse guardar a imagem na mente. — Recebi um telefonema avisando que houve uma emergência em Nevada. Preciso voltar imediatamente. Randy já está a caminho do aeroporto. Lindsay gemeu por dentro. Desviou o olhar com medo de revelar o quanto a notícia a deixara desapontada. — Pobre Randy — conseguiu dizer. — Não deve estar sendo fácil para vocês, principalmente depois de haverem passado tanto tempo sem tirar férias. — Já estou acostumado a interrupções desse tipo, mas tenho que admitir que fiquei profundamente desapontado quando Clint me telefonou de Carson City e me relatou a situação. Lindsay voltou a fitá-lo nos olhos: — É algum caso de vida ou morte? — O rio Truckee está bloqueado e o Reno está enfrentando uma terrível escassez de água. Terei que sobrevoar a área de helicóptero e reunir minha equipe para decidirmos as providências que deverão ser tomadas. A conclusão de que o bem-estar de Nevada dependia das decisões desse homem trouxe a Lindsay a lembrança do quanto ele era importante. E, ainda assim, encontrara tempo para se despedir dela. — Eu teria compreendido se você tivesse deixado um recado com Jake ou Fernando. — Em vez de vir me despedir pessoalmente? Talvez seja o que você preferisse, mas eu costumo agir com sinceridade. — O que está querendo dizer? — Não finja que desconhece a atração que sentimos um pelo outro, Lindsay. É disso que estou falando. Sei que você também sente, só que, por alguma razão, tem receio de admiti-la. Talvez por medo de mim. — Is-isso não é verdade — Lindsay balbuciou. — Você salvou minha vida, depois fez todo o possível para me poupar e proteger. Não seria honesto da minha parte negar a gratidão que sinto pela sua generosidade. — Então foi apenas por isso que aceitou meu convite para jantar? É isso que está insinuando? — Sim. Isso e a necessidade de me retratar por haver criado um problema para você. Houve um longo silêncio. — Boa sorte com seu comercial, Srta. Marshall. Jake e Fernando têm instruções para não deixar que ninguém a perturbe enquanto estiver em Nassau. Adeus. — Ok, meninos, é isso aí! Sei que já perdemos algumas competições, mas o time do Culver City não é tão forte assim. Poderemos derrotá-los facilmente. Agora sigam em frente e mostrem a eles do que são capazes! Enquanto os outros saíam do ônibus e corriam na frente para vestir as roupas de banho, a pequena Cindy Lou ficou um pouco para trás. Lindsay notou com satisfação que a perna da menina melhorara muito desde o início da terapia. — Estou contente que tenha voltado sem nenhuma mordida de tubarão — disse ela, apertando a mão de Lindsay com mais força. A menção da palavra tubarão trouxe de volta lembranças de uma noite que Lindsay lutava para esquecer. — Prometi que estaria de volta para esse campeonato. Acha que eu perderia a oportunidade de vê-la competir? — acrescentou Lindsay, contente com a confiança que conseguira transmitir às crianças com necessidades especiais, a ponto de elas aceitarem se exibir diante do público. — Agora acompanhe os outros, senão chegará atrasada. — Está bem. Lindsay agradeceu ao motorista do ônibus e saiu. Flagrou-se mais uma vez desejando poder esquecer Andrew Cordell e o doloroso momento em que ele se despedira dela, na sacada do apartamento. Dezesseis longos dias haviam-se passado desde então. No fundo, aguardava um telefonema, só que ele nunca aconteceu. E por que deveria quando ela fora tão desonesta com Andrew? Ele era um homem ocupado demais para dar importância a jogos sentimentais. Claro que não fora apenas um jogo para ela, só que Andrew não sabia disso. Gostaria de poder revê-lo e se explicar, mas o momento para explicações já se fora. — Hei, Lindsay, você não vem? — O chamado de Kyle interrompeu seus pensamentos. — Eles já estão prontos para começar. Embaraçada por ter sido flagrada em devaneio, ela apressou-se em acompanhá-lo, determinada a dedicar toda sua atenção às crianças. — Boa sorte hoje, Kyle. Ele gemeu. — Puxa, vamos precisar. — Não creio. Assisti o treinamento hoje pela manhã e todos estão nadando muito bem. Lindsay entrou com ele no clube. Posicionou-se diante de sua equipe, já vestida com as roupas de banho. A equipe do Culver City sentou do outro lado da piscina. Depois de conferidas todas as etapas e regulamentos, prepararam-se para o início da competição, com os nadadores até oito anos de idade. A pequena Cindy Lou deu o melhor de si, mas não conseguiu vencer, chegando em terceiro lugar. Assim que saiu da piscina, correu até Lindsay e começou a chorar, escondendo o rostinho em seu colo. — Não há nenhum motivo para chorar, Cindy Lou — Lindsay admoestou. — No mês passado, você estava chegando em último. Hoje você só perdeu para dois meninos do outro time que não têm nenhum problema na perna! Tem idéia do quanto estou orgulhosa de você por ter vindo até aqui enfrentá-los? — Abraçou a menina com força. — Ouça só, todo nosso time está gritando seu nome! Cindy Lou levantou a cabeça, ouvindo os gritos animados dos colegas. Um sorriso de alegria surgiu no rostinho molhado. Foi então que ambas ouviram uma voz masculina dizer: — Poderiam olhar para cá, por favor? As duas viraram ao mesmo tempo e Lindsay avistou um homem alto e loiro, vestido com bermuda e camiseta. Estava a certa distância e as olhava através da lente de uma câmera de vídeo. Quando Lindsay percebeu quem era, sobressaltou-se e Cindy Lou perguntou qual era o problema. — N-não é nada, querida — respondeu Lindsay sem desviar os olhos dele. A essa altura, vários pais dos nadadores já o haviam reconhecido. Sua presença causou um certo alvoroço entre os presentes, principalmente quando ele se aproximou, sentando-se ao lado de Lindsay. Pousou um intenso olhar sobre o rosto dela, como que faminto pela imagem. — Andrew... — ela sussurrou com voz trêmula. A alegria de revê-lo ofuscou a presença de todos os demais. Lindsay não sabia o que dizer ou pensar. Cindy Lou, que estivera chorando até poucos minutos, olhava-o com uma expressão de encantamento. — Por que estava nos filmando? — indagou a menina. O sorriso que ele deu em resposta tirou o fôlego de Lindsay. — Porque Troy, o melhor amigo do meu filho, quebrou a perna durante um jogo de futebol e agora está com medo de praticar qualquer tipo de esporte. Quando eu mostrar a ele como você nada bem, ele morrerá de inveja. — Minha perna caiu do céu. — E seu rostinho também — ele disse com tanta sinceridade que fez a menina sorrir. — Qual é seu nome? — Cindy Lou Markham. E o seu? — Andrew Cordell. — Por que veio sentar ao lado da minha professora? O olhar risonho de Andrew encontrou o de Lindsay. — Porque ela é minha amiga. — Nunca vi você antes. — Eu não moro aqui na cidade — Andrew explicou. — Então como pode ser amigo de Lindsay? — Eu e ela nos conhecemos nas Bahamas. A menina arregalou os olhos: — Você é o homem do jornal! Rasgou a cauda de Lindsay para que ela não morresse! — Isso mesmo — Andrew confirmou sem desviar os olhos dos de Lindsay. — E nenhum tubarão mordeu você? — Não. — ele riu. — Mas uma sereia roubou algo de mim. O comentário fez os olhos de Lindsay se encherem de lágrimas. Desviou a vista no mesmo instante. — Cindy Lou, a próxima etapa já vai começar. Agora vá sentar com seu grupo, está bem? — Sim. Tchau, Andrew. Acenou para os dois e foi se juntar aos colegas. — Desculpe se atrapalhei você — sussurrou ele. — Ignore-me até que a competição termine. Claro que isso seria impossível, e não apenas devido à proximidade entre os dois. De onde estava, ela podia ver os seguranças distribuídos em pontos estratégicos do clube. Também sabia que havia outros do lado de fora. — Quanto tempo pode ficar? — perguntou a Andrew. — Terei que participar de um almoço de caridade dentro de duas horas. — Em Los Angeles? — Não. Carson City. Lindsay fechou os olhos um instante. Por que ele estava fazendo isso com ela? Se não poderia ficar, melhor seria nem ter aparecido. — Qual são seus planos para depois da competição, Lindsay? — Não tenho nada importante — ela respondeu rápido. — Então me acompanhe até o aeroporto na limusine. Precisamos conversar. Lindsay passou as mãos pelos braços, experimentando uma nervosa antecipação. — Randy não veio com você? Enquanto conversavam, ela fingia interesse na competição, mas, na verdade, nem sabia quem estava vencendo ou perdendo. — Ele queria vir, mas teve que trabalhar na loja de mergulho hoje. Desde que voltamos, ele não para de falar de você; já mostrou o vídeo para todos os amigos. Acredite-me, você já tem até um fã-clube em Nevada. Lindsay sorriu. — É bom ouvir isso. Quando voltar, diga a ele que gostei muito de conhecê-lo. Como soube onde me encontrar? — Tenho minhas fontes. Mas Atkins, um detetive particular que é um velho amigo meu, trabalha com muita eficiência. — Isso significa que você também sabe a marca da minha pasta de dente? — Informações desse tipo eu prefiro descobrir por mim mesmo. Lindsay não tivera intenção de ser provocante. Andrew pegou-a totalmente de surpresa, confundindo-a a ponto de ela não saber o que responder. — Terei que levar as crianças de volta para o clube no ônibus. — Vou segui-los. Lindsay estava atônita. Mal acreditava que Andrew Cordell voara de Carson City só para vê-la. Logo ela, que pensara que nunca mais iria revê-lo! O campeonato de natação parecia não ter mais fim. Apesar da alegria de ver sua equipe conquistar muitos primeiros lugares, Lindsay não via a hora de tudo aquilo terminar. Cada minuto passado no clube era um a menos do tempo precioso ao lado de Andrew. Precisava explicar o motivo de seu comportamento naquela última noite. Assim que as crianças saíram da piscina e foram se trocar, Lindsay ficou de pé, ciente do olhar de Andrew sobre seu corpo. Vestia um short e uma decente camiseta, mas sob aquele exame atento, sentiu-se exposta e vulnerável. — Nos veremos no Bel Air em vinte minutos — ela avisou. — Apresse-se, por favor. Algo no modo como Andrew dissera aquilo fez Lindsay correr na frente de todos, alcançando o ônibus antes mesmo das crianças. Notou os olhares e comentários dos pais. Antes do fim do dia, todo mundo do Culver City e do Bel Air estaria sabendo que o governador Cordell fizera uma visita a Lindsay Marshall. A meia hora seguinte transformou-se em um grande acontecimento. Pelo menos para as crianças, que se amontoaram no fundo do ônibus só para ver as duas limusines pretas que os seguiam pelas ruas. Quando chegaram ao clube e cada uma das crianças já havia sido entregue aos pais, Lindsay correu ao banheiro para se olhar ao espelho. Escovou os cabelos e renovou a camada de batom. Andrew estava encostado em uma das limusines, conversando com um dos seguranças, mas quando a viu interrompeu o que dizia. Abriu a porta para ela. — Finalmente — murmurou deslizando a mão pelo braço dela, antes de dar a volta e entrar pelo outro lado. Andrew deu algumas ordens aos homens, antes de saírem. Ao final de um longo silêncio, durante o qual os dois apenas se olharam, Lindsay foi a primeira a falar: — Por que não telefonou? — Porque queria ver sua reação quando me visse. Eu não desejava sair de Nassau e sei que você também não queria que eu partisse. Lindsay mordeu o lábio, imaginando o que poderia dizer. — É verdade — admitiu. — Mas sua vida é comandada por seu trabalho e você escolheu essa carreira porque a ama. Certo? Voltou a olhá-lo, porém ficou surpresa com a seriedade estampada no rosto dele. — Minha profissão a aborrece tanto assim, Lindsay? Ela inclinou a cabeça. — Admiro o que você faz. É a falta de privacidade e anonimato que me apavora. Assim como as restrições impostas à sua família. Andrew olhou-a durante algum tempo. — Você só conheceu o lado público da minha vida, Lindsay — declarou. — E existe alguma diferença na mansão do governador? — questionou com mais ironia do que tencionava. — Gostaria de descobrir? — O que está querendo dizer? — Lindsay espantou-se. — Estou convidando-a para ir a Carson City passar alguns dias de julho na minha casa. Um convite desses era última coisa que ela esperava ouvir. — No caso de estar preocupada com o que as pessoas poderão falar, o governador Stevens, a esposa e as filhas também estarão lá. Estou providenciando um período de folga para descansar e ficar em casa com Randy. Nossos únicos passeios serão cavalgar no rancho do meu cunhado e acampar em Hidden Lake, meu lugar favorito. Aposto que você também iria adorá-lo. "Sem dúvida!", pensou Lindsay. Entretanto, algo lhe dizia que aceitar seria uma atitude precipitada. — É muita gentileza sua, Andrew, mas não acho que seja uma boa idéia. — Sei que não sente indiferença com relação a mim — salientou ele. — Tive certeza quando a encontrei na piscina. Também sei que não existe nenhum outro homem em sua vida. Portanto, deve ser o fato de eu ser governador que a assusta de alguma maneira. Porém, não se esqueça de que sou um homem, Lindsay, e que tenho uma vida particular, desvinculada da pública. — Mas você nunca anda sem seus guarda-costas. — Quanta ironia — ele suspirou. — A maioria das mulheres que conheço considerariam isso irresistível. Só que esqueci que você é uma sereia. Lindsay empertigou-se no assento, embaraçada. — Eu sabia sobre a doença de Wendie quando me casei com ela — Andrew prosseguiu. — Jurei que se me tornasse governador ela nunca sofreria por causa disso. Segundo ela mesma me dizia, Wendie tinha toda a privacidade que desejava e nunca teve motivo para reclamar quanto a isso. — Andrew, fico muito comovida por estar me confiando lembranças tão íntimas e dolorosas, mas você não está entendendo o que quero dizer. — Então me ajude a entender. Lindsay respirou fundo. — Tem razão sobre a atração que sinto por você. Realmente fiquei feliz em revê-lo. Entretanto por mais que eu deseje aceitar seu convite, sinto que não devo fazê-lo. Minha carreira como bióloga marinha não vai se encaixar com o meio em que você vive. Por isso, é impossível termos um relacionamento mais sério. Além do mais, não quero magoar Randy. É melhor não começarmos algo que não terá futuro. Seguiu-se um longo silêncio repleto de tensão. — Não acredito que a diferença entre nossas profissões seja a única razão pela qual está me rejeitando — Andrew declarou. — Mas já que não pode, ou não quer, me contar toda a verdade, creio que não temos mais nada a dizer um ao outro. Chegamos no aeroporto. Pode ficar tranquila, quando eu sair desse carro nunca mais vou incomodá-la. — Andrew, você está zangado comigo. — Desculpe, mas não sei disfarçar meus sentimentos. Lindsay estremeceu. Não queria que as coisas tomassem esse rumo. Apaixonara-se por Andrew, viu-se forçada a admitir, mas não suportaria levar esse tipo de vida. Mal notou quando a limusine parou na entrada do aeroporto. Antes que pudesse se dar conta do que acontecia, Andrew já havia saído do carro e se preparava para partir. Inclinou-se, olhando-a através da janela do carro. — A natureza humana é mesmo estranha — disse. — Eu poderia jurar que havia acontecido algo extraordinário quando conheci uma certa sereia. Mas agora vejo que minha sereia não passava de uma fantasia. — Espere! Andrew... Lindsay tentou falar, mas ele se afastou, sempre cercado pelos seguranças. Com os olhos marejados de lágrimas, Lindsay ficou olhando o homem por quem se apaixonara se afastar cada vez mais do carro, e de sua vida. Deus, o que faria agora? CAPÍTULO VII Lindsay recebeu a visita de Beth quando se preparava para deixar o Bel Air, após um exaustivo dia de trabalho. — Oh, Beth! — Ela abraçou a amiga. — Não imagina o quanto estou feliz em vê-la! — Minha mãe ficou sabendo que Andrew Cordell visitou-a ontem, no clube Culver City. Seus pais também souberam da notícia e ligaram para ela. Estavam ansiosos por que não confiam na reputação de Andrew e não tinham como entrar em contato com você. Minha mãe disse que eu falaria com você antes de darmos qualquer notícia a eles. — Desculpe o incômodo, Beth, mas é que eu não quis enfrentá-los antes de resolver os problemas na minha própria cabeça. — Foi o que imaginei. — Oh, Beth... — Lindsay afastou os cabelos do rosto com uma expressão melancólica. — Quer me acompanhar até em casa? — Claro. Foi para isso que vim. Precisamos conversar. Assim que chegaram no apartamento de Lindsay, em Santa Monica, as duas serviram-se com refrescos gelados e sentaram no sofá para conversar sobre tudo que acontecera. Lindsay começou descrevendo o aparecimento de Andrew no clube e terminou com a desastrosa despedida no aeroporto. — Ele deve estar me odiando agora — disse, contendo as lágrimas. — Talvez não esteja conseguindo, apesar de querer — Beth replicou, pensativa. — Não é todo dia que um homem importante como Andrew Cordell deixa tudo para trás só para dar atenção a uma mulher, e ainda por cima leva um fora. Por outro lado, ele não sabia com que tipo de mulher estava lidando, certo? Lindsay franziu o cenho. — O que está querendo dizer? — Ele não sabe nada sobre o problema com seus pais, não é? E que você fez terapia? Não contou nada disso a ele? Lindsay hesitou e, por fim, balançou a cabeça. — Não, não contei. Não pude, Beth. Não nos conhecemos direito. Lindsay ficou de pé e se dirigiu ao banheiro para tomar uma aspirina, sua cabeça parecia prestes a explodir. Beth seguiu-a. — Bem, mas não está sendo por falta de tentativas da parte dele — disse ela. Lindsay apoiou as mãos nos lados da pia, olhando Beth através do espelho. — Você acredita que até para usar um banheiro público ele deixa um segurança do lado de fora? — E o que isso tem a ver com seus sentimentos com relação a ele?— Beth retrucou. — Ou será que ele já a pediu em casamento e você está escondendo o jogo de mim? Lindsay tomou a aspirina e voltou para a sala. Porém, estava agitada demais para conseguir sentar. — Ele nem chegou a me beijar, Beth — confessou em voz baixa. — Mas você gostaria que isso tivesse acontecido? — Beth estreitou o olhar. — Qual o problema, então? Tem medo de virar uma abóbora se ele a tocar? Lindsay sorriu em meio às lágrimas. — Tenho receio de querer que ele não pare nunca mais. Que tal minha sinceridade? — Já é um bom começo — Beth aprovou. — Especialmente quando nunca a vi agir assim antes com nenhum outro homem. E não esqueça que nos conhecemos a muito, muito tempo. O sorriso de Lindsay desapareceu. — Nunca esqueço disso, Beth. E nem da época em que você e sua mãe tiveram que andar cercadas por seguranças. — Lindsay! — Beth inclinou a cabeça. — Você está tentando igualar duas situações completamente diferentes! Minha mãe estava sendo perseguida por um lunático. Estávamos com medo do pior. Só que Andrew Cordell não vive com medo. Os seguranças são apenas uma medida de prevenção. — Não sei, Beth. Não se pode fazer nada espontaneamente! Tudo tem que ser planejado com antecedência. — Como mergulhar para brincar com tubarões quando você não estiver de bom humor? Lindsay olhou para a amiga: — O que os tubarões têm a ver com isso? — Não sei. Talvez você mesma possa me responder. Por acaso já lhe ocorreu a idéia de que escolher uma carreira que coloca sua vida em risco é sinal de revolta contra o que seus pais lhe fizeram? Será que não está punindo Andrew inconscientemente pelos erros de seus pais? Lindsay desviou o olhar. — Você está falando feito um psiquiatra, Beth. — Não é preciso um diploma de medicina para deduzir o que está acontecendo na sua mente — disse Beth, ficando de pé. — Se eu fosse você, daria uma boa e longa olhada para mim mesma. Os medos de seus pais afastaram todos seus namorados. Só que agora você é uma mulher adulta, responsável por sua própria vida. Será lamentável se permitir que as ações de seus pais voltem a manipulá-la. Acabará perdendo Andrew. Lindsay fechou os olhos. — Ele nunca foi meu para que eu tenha a possibilidade de perdê-lo, Beth. — Não importa o que você pensa, posso apostar minha vida na hipótese de que ainda não é tarde para corrigir o erro. Com certeza ele não deixou assuntos importantes e voou para a Califórnia por algumas horas só porque sente "admiração" por você. O homem se expôs para chegar até você, ontem, Lindsay, e ainda assim foi rejeitado. — Não diga mais nada — Lindsay pediu com voz trêmula. — Estou me sentindo pior a cada palavra. — Ótimo. Talvez assim você resolva agir de alguma maneira. Vamos lá, Lindsay! Dê uma chance a Andrew! Muito tempo depois que Beth havia ido embora, as palavras ainda ecoavam na mente de Lindsay. Pensou em ligar para o número de informações e pedir o telefone da casa do governador, em Carson City. Porém, o medo da rejeição foi mais forte. Não sabia se Andrew aceitaria atendê-la depois do que ela fizera. Só lhe restava uma alternativa: ir pessoalmente à casa dele. Afinal, Andrew não cometera a mesma loucura vindo procurá-la na Califórnia? Estaria de folga no dia seguinte e depois seria quatro de julho, feriado americano. Dois dias para ir e voltar de carro. Será que Andrew estaria na cidade? Sabia que ele passava todo o tempo livre no rancho do cunhado com Randy. Talvez a mãe de Beth conseguisse o endereço com algum de seus contatos em Nevada... — Ei, papai! A guarda de honra e a banda já começaram a marchar. Nós seremos os próximos! Ao ouvir o aviso do filho, Andrew interrompeu sua conversa com um dos legisladores que participavam de sua campanha política. Acenou para a escolta da polícia e entrou na carruagem coberta, onde Randy e Troy já o esperavam. Ajeitou melhor o chapéu em estilo country, protegendo os olhos da luz do sol. Os cavalos árabes de Zack eram mesmo belíssimos, pensou consigo. Agitou as rédeas, fazendo-os seguir em frente. Os elegantes cavalos negros começaram a trotar ao longo da avenida principal. — Acho que toda a população de Carson City veio assistir à parada — comentou Troy, enquanto ele e Randy sorriam e acenavam para as moças bonitas. Andrew sorriu. Agora que Troy fazia parte da família e aparecia para visitas frequentes, a mansão tornara-se mais alegre. Andrew simpatizava muito com o irmão de Alex. O rapaz ligara-se muito a eles, principalmente agora que estava passando alguns dias na mansão, enquanto a irmã não saía do hospital. Alex dera à luz o primeiro filho, Zackery Sean Quinn IV. — Hei, vocês dois, o que acham de passarmos no hospital para ver o pequeno Sean, antes de fazermos o piquenique à tarde? — Andrew inquiriu. — Oh, ele está ótimo! — Troy sorriu. — Zack acha que ele parece com o vovô Quinn e Alex jura que ele é a cara de nosso pai. — E você, o que acha? — Andrew riu. — Eu o acho engraçado com aqueles cabelos espetados e o rosto rechonchudo. — Todos os bebês são parecidos quando nascem. Se acha Sean engraçado, você precisava ver Randy — Andrew brincou. Randy, porém, estava compenetrado, olhando algo em meio às pessoas. — Papai... O tom sério alertou Andrew no mesmo instante. — O que foi, Randy? — Puxa, acho que é Lindsay... Olhe à esquerda, perto daquele mastro com flores. Troy assobiou baixinho. — Só pode ser a sereia. Nenhuma outra mulher tem cabelos como os dela. Andrew percorreu os olhos pela multidão até avistar a massa de cabelos dourados, parcialmente encoberta por um chapéu à moda country, em estilo feminino. Vestida com calça e camisa jeans, além das botas de cowboy, Lindsay estava mais linda que nunca. O coração de Andrew se acelerou. — E você que pensou que tudo havia terminado — Randy sussurrou. — Preciso falar com ela antes que resolva fugir. Sigam em frente, eu e Lindsay os alcançaremos. Esquecendo-se de onde estava e do que as pessoas poderiam dizer, sem contar o trabalho que daria aos seguranças, Andrew entregou as rédeas a Randy. — Ela não vai fugir de você, papai. Não depois de ter vindo de tão longe. — Bem, prefiro não arriscar — Andrew replicou. Com um movimento preciso, desceu da carruagem. No mesmo instante, os guarda-costas fizeram um círculo em torno dele. — Governador, o que está acontecendo? — Skip exasperou-se. Andrew continuou andando. — Lindsay Marshall está mais ali adiante. — Por que não deixa que os outros seguranças a tragam até o senhor? Seria muito mais seguro. Andrew não ouviu sequer uma palavra. Seus olhos estavam fixos no rosto de Lindsay. O intenso encontro de olhares deixou-os como que hipnotizados. O azul profundo daqueles olhos fez Andrew lembrar das águas brilhantes do Caribe. — Andrew... — sussurrou Lindsay quando ele se aproximou. — Eu não queria criar problemas. Pensei em seguir sua carruagem até o final da parada para só então falar com você. — Felizmente, Randy avistou você logo. Dessa forma, não teremos que perder nem mais um segundo. Dizendo isso, segurou a mão dela. — Para onde está me levando? — Primeiro para a carruagem coberta, onde terminaremos a parada. Depois, darei um jeito de levá-la para um lugar onde poderemos ficar um pouco a sós. Não me diga quanto tempo poderá ficar. Não quero estragar o encantamento desse encontro. — Lindsay! — Randy acenou assim que a viu. — Oi, Randy! Ela também acenou. Andrew segurou-a pela cintura, como há muito desejava fazer, ajudando-a a subir na carruagem. — Por que não disse que viria? Isso é fantástico! — exclamou Randy, animado. — Foi uma decisão de última hora — Lindsay explicou. — Bem, você iluminou nosso dia — comentou Randy expressando exatamente o que Andrew sentia. — Deixe-me apresentá-la a Troy. Não sei bem qual é nosso grau de parentesco, mas a irmã dele se tornou minha tia quando casou com meu tio Zack. — Olá, Troy. — Oi. — O sorriso do rapaz foi tão generoso quanto o de Randy. — Há muito que eu desejava conhecer a famosa sereia. Quando teremos o prazer de vê-la na tevê? — Os comerciais começam a ser exibidos em agosto. Ao sentir a mão de Andrew sobre a sua, Lindsay voltou-se para olhá-lo. — Estamos atrasando a parada — explicou ele. — Vamos nos ajeitar para que eu possa conduzir essa coisa. — Oh, desculpe — murmurou ela enquanto Andrew trocava de lugar com Randy. Haviam percorrido alguns metros quando Randy voltou a falar: — Quanto tempo poderá ficar conosco, Lindsay? Ela sentiu o olhar de Andrew sobre si. — Vim dirigindo, por isso terei de voltar lá pelas seis da tarde de hoje. O time de natação começa o treinamento amanhã, às oito e meia em ponto. — Então terá tempo de nos acompanhar até o rancho, depois da parada. Iremos cavalgar e haverá um churrasco com tio Zack e seu amigo Miguel. — Talvez também reste algum tempo para você nadar conosco e ensinar alguns exercícios para minha perna — disse Troy. — Andrew me mostrou o filme daquela menininha e pensei... — Oh, será um prazer ajudá-lo! — Lindsay animou-se. — Calma, rapazes — Andrew ralhou. — Dêem um tempo para Lindsay respirar! — Talvez o conselho também sirva para você, papai — insinuou Randy, fazendo Lindsay corar. O local onde a mão de Andrew repousava em sua cintura parecia em chamas. Lindsay não via a hora de ficar a sós com ele. Para disfarçar o embaraço, dirigiu-se a Randy: — É melhor que saiba que nunca cavalguei antes. — Está brincando! — os dois rapazes exclamaram ao mesmo tempo. Lindsay percebeu o riso de Andrew pelo canto do olho. — Creio que conheço mais sobre peixes do que cavalos — ela brincou. — Por isso, não riam de mim, se eu cair assim que o cavalo der o primeiro passo. — Garanto que não vai cair — Troy assegurou-a. — Além disso, qualquer um que nade com tubarões tem de ter uma boa coordenação motora. Ao ouvir a menção da palavra "tubarão", Lindsay sentiu a mão de Andrew estremecer. Lembrou do quanto ele era sensível quando ao assunto. Estava claro que não queria ver o filho envolvido com assuntos de biologia marinha. Quando chegaram à praça que marcava o final da parada, seu desejo por Andrew já se tornara quase uma dor física. Nem ousou encará-lo quando ele ajudou-a a descer da carruagem. A única coisa de que se tornou muito consciente foi do toque dele em seu braço, ao conduzi-la até a limusine. Todavia, assim que os quatro se acomodaram no veículo, Andrew não voltou a tocá-la e nem mesmo sentou perto dela. Lindsay sabia bem o motivo. As emoções de Andrew eram tão intensas quanto as dela. Precisavam manter certa distância um do outro, pelo menos na frente dos rapazes. — Onde seu carro está estacionado? — indagou Andrew. — Em um estacionamento privado. — Precisa pegar algo nele? — Não. Ele voltou-se para Randy e Troy: — Precisam pegar alguma coisa na mansão? Os dois balançaram a cabeça que não. — Se Lindsay vai conhecer o rancho, é melhor não perdermos tempo. — Poderemos ir ao hospital à noite, depois que ela partir — Troy sugeriu. — Hospital? Lindsay lançou um olhar indagador para Andrew, mas ele estava dando instruções ao motorista. — Minha irmã teve um bebê ontem de manhã — Troy explicou. — Deve estar sendo emocionante para você. — Sim. É meio engraçado me imaginar como tio. Durante o restante do percurso até o pequeno aeroporto, os rapazes lideraram a conversa, para alívio de Lindsay. E, provavelmente, de Andrew também. Ambos estavam muito conscientes da energia que os impelia um para o outro. Apesar de sorrir e admirar a paisagem, Lindsay tinha todos seus sentidos voltados para o homem que tornara-se dono do seu coração. E da sua vida. CAPÍTULO VIII — Parece que Pete e os rapazes já saíram para o local do churrasco — disse Troy quando os quatro saíram do furgão e entraram no estábulo, a poucos quilômetros do campo de pouso. — Vou pegar Algodão Doce para você, Lindsay. Zack disse que ela é a égua mais mansa do rancho. Perfeita para a primeira montaria. — Obrigada, Troy. — Já que vai demorar um tempinho para Lindsay se acostumar a montar, por que vocês dois não pegam seus cavalos e vão na frente? — Andrew sugeriu. — Vou apresentá-la a Algodão Doce e os alcançaremos daqui a pouco. Lindsay percebeu a comunicação silenciosa entre Andrew e Randy. — Ok, papai. Nos veremos depois. Vamos, Troy. Depois que os dois haviam se afastado o suficiente, Andrew voltou-se para Lindsay, o rosto parcialmente encoberto pela aba do chapéu. — Espere um pouco aqui — disse ele. — Vou pegar uma sela. — Está bem — respondeu Lindsay. Respirou fundo, inalando o cheiro de estábulo e feno. Desde o momento em que chegara ao rancho, observara que tudo que havia na propriedade havia sido feito com muito carinho pelo proprietário. Sem dúvida, ele se orgulhava de ser o dono daquelas terras. Suspirou, dando graças por haver conseguido encontrar Andrew naquela parada. Graças a Beth, que telefonara para a mansão do governador, Lindsay descobrira que Andrew participaria das comemorações de quatro de julho. Assim que soube onde poderia encontrá-lo, não pensou duas vezes para viajar a Nevada. Porém, agora que estava ali, ao lado dele, sentia-se nervosa, insegura. O som dos cavalos do lado de fora do estábulo chamou sua atenção. Foi até a porta para observar a partida dos rapazes. Exceto por saber que Zack Quinn criava cavalos árabes, Lindsay não entendia mais nada sobre esses animais. Todavia, não pôde deixar de reconhecer a beleza daqueles cavalos negros, enquanto se afastavam levando Randy e Troy. De súbito, uma mão passou sobre seu ombro e fechou a porta. Lindsay virou-se no mesmo instante, deparando-se com o rosto de Andrew bem próximo ao seu. Ele tirara o chapéu. Apoiou as mãos na porta, aprisionando-a entre seus braços. Lindsay conteve a respiração. Um súbito calor percorreu seu corpo de alto a baixo. Seria essa a chama do desejo? Provavelmente. Encostou-se contra a porta, receosa de que suas pernas fraquejassem. Andrew acompanhou o movimento, colando seu corpo ao dela. — Andrew! — sussurrou Lindsay, ofegante. — Por acaso tem idéia do quanto tive que me controlar para ficar longe de você na frente dos garotos? As palavras deixaram-na lisonjeada. Significavam que os sentimentos de Andrew continuavam os mesmos. — Um homem não consegue aguentar muito. Espero que tenha vindo a Carson City para isso, caso contrário, agora já é tarde demais. Inclinou a cabeça devagar, cobrindo os lábios dela com os seus, num beijo urgente, devorador. A chama do desejo se intensificou em Lindsay, desanuviando suas inibições. Era como se, após um longo tempo se afogando, ela finalmente houvesse chegado à superfície e estivesse respirando. Nesse instante, Andrew poderia conduzi-la para onde quisesse, ela iria com prazer. Deixando-se levar pelo êxtase sensual, segurou-o pela cintura, puxando-o para si com mais intimidade. Esperara tanto por esse momento! De fato, desde o dia em que ambos haviam sido apresentados, naquele hotel de Nassau. Perdeu a noção do tempo, entregando-se às ondas de sensações provocadas pelas caricias da boca sedenta que devorava a sua. Pouco se importou quando seu chapéu caiu no chão. — Você é tão linda, Lindsay. Mal acredito que finalmente eu a tenho em meus braços... Trocaram longos beijos. Para Lindsay, cada um deles parecia natural, inevitável. Esqueceu-se de que um dia sentira apreensão com relação a Andrew. Seu corpo moldava-se com perfeição ao dele, fazendo-a desejar mais, mais... — Eu te quero muito, Lindsay... — Andrew sussurrou-lhe ao ouvido. — Também te quero — ela confessou. Ouviu o leve gemido de Andrew antes que ele afastasse os lábios dos dela. Abraçou-a com força, acariciando-lhe as costas com gestos sensuais. — Se eu a beijar mais uma vez, não conseguirei parar. Acabaremos sobre o feno, que é o último lugar que tenho em mente para nós. Lindsay balançou a cabeça, como que tentando clarear os pensamentos. Não conseguiu dizer nada, ainda sob o efeito do desejo que Andrew lhe despertara. Precisou de todas as forças para recuperar o controle. Andrew a balançou com gentileza, fazendo os cabelos dourados ondularem sobre suas costas. — Você me faz sentir como um adolescente apaixonado, atingido pelos primeiros acessos de paixão. Contudo, sou um homem com trinta e sete anos, e já passei dessa fase há muito tempo. Tenho um filho crescido, a quem amo muito, e responsabilidades das quais não posso abrir mão. Ainda assim... — segurou o rosto dela entre as mãos, fitando-a nos olhos — ...nesse momento não consigo pensar em outra coisa a não ser me perder em você. — Andrew falava como um homem à beira de um colapso. — Entende o que estou dizendo e sentindo, Lindsay? — Sim — ela sustentou o olhar. — Tem idéia de que será impossível eu me comportar direito quando estiver perto de você? Não estou com a mínima vontade de ir a esse churrasco. Não gostaria de dividi-la com ninguém. Lindsay emitiu um leve gemido, sabendo exatamente o que Andrew queria dizer. Desde a viagem às Bahamas, ele tornara-se o foco de seu mundo; nada mais tinha importância. — Talvez eu não devesse ter vindo — disse a ele. — Só sei viver interferindo em sua vida. Com delicadeza, desvencilhou-se dos braços dele. Fez menção de pegar o chapéu, mas Andrew a deteve, voltando a segurá-la junto de si. — Você interferiu na minha vida, sim, mas apenas para enchê-la de luz e alegria — murmurou. — Deus, como conseguirei passar as horas seguintes agindo e falando normalmente com minha família e amigos, se todo meu corpo está clamando para fazer amor com você? Não estou me referindo a uma simples troca de beijos furtivos. Refiro-me a amá-la na privacidade do meu quarto, sem preocupações com o tempo e responsabilidades. — Estava me fazendo a mesma pergunta. Porém, não podemos ter um caso, Andrew, por mais que eu queira ficar com você. Andrew tornou-se sério. — Se fosse essa minha intenção, eu a teria levado a um motel quando fui visitá-la em Culver City. Sei que teria conseguido persuadi-la. Lindsay levantou a vista para ele. — É provável — admitiu. Engolindo seco, acrescentou: — Pelo visto, não tenho nenhum controle das minhas emoções quando estou perto de você. Durante a parada... — interrompeu-se, decidindo que seria melhor não dizer nada. — Só há uma solução racional — Andrew sussurrou com os lábios junto aos dela. — Melhor não nos vermos nunca mais. A expressão horrorizada de Lindsay revelou a Andrew o que ele desejava saber. Emitiu um pequeno grito de triunfo, abraçando-a com mais força enquanto aspirava o delicioso perfume de seus cabelos dourados. — Não percebeu que eu só disse isso por que precisava ter certeza do que você sente por mim, antes de pedi-la em casamento? Lindsay sobressaltou-se, levantando a cabeça para fitá-lo. Não tinha certeza do que acabara de ouvir. — Por que o espanto? — Andrew arqueou as sobrancelhas. — Acha que fui até a Califórnia por que não tinha outra coisa para fazer? — Andrew, nós mal nos conhecemos... — Lindsay disse num fio de voz. Ele pousou as mãos sobre os ombros dela, beijando-lhe a ponta do nariz. — Está enganada. Nós nos amamos; isso é o mais importante. Sei que me ama, caso contrário não teria vindo de tão longe para me ver. E eu também te amo, minha linda sereia. Você me encantou e quero torná-la minha esposa o quanto antes. Teremos muitos anos para conhecermos um ao outro. Nesse meio tempo, porém, quero tê-la na minha cama todas as noites. Desejo ter mais, filhos. Quero viver, Lindsay, mas só com você. — Andrew... — a voz dela saiu suave, dominada pela emoção. — Shh... Andrew silenciou-a com outro beijo, dessa vez suave, quase etéreo. — Vamos cavalgar até o local do churrasco. Depois de algum tempo, daremos um jeito de voltar para Carson City. Quero que passe a noite na mansão comigo e Randy. Terá oportunidade de ver como é nossa vida. — Mas... — Amanhã logo cedo eu a deixarei no avião. Um de meus seguranças guiará seu carro de volta à Califórnia e o deixará no aeroporto a tempo de você chegar no clube às oito e meia. — Fitou-a nos olhos: — Não diga não, Lindsay. Quero que conheça a vida que levo aqui. Essa será uma ótima chance de nos conhecermos melhor. Ele tinha razão. Lindsay assentiu devagar. Assim, nos braços de Andrew, era fácil concordar com qualquer coisa. Gostaria de ficar ali para sempre, esquecida do resto do mundo. Andrew aproximou-se devagar, beijando-a com uma sensualidade que a deixou zonza. Num gesto instintivo, enlaçou os braços em torno do pescoço dele. Andrew gemeu baixinho, encostando seu quadril ao dela num gesto maisíntimo. Lindsay suspirou, sentindo a evidência do desejo de Andrew. Quase se desequilibrou quando ele se afastou de repente. — Mais um segundo — começou Andrew, ofegante —, e não conseguirei dar mais um passo, quanto mais montar no meu cavalo. Lindsay sabia o que ele queria dizer. Seu próprio corpo também estava lânguido de desejo. — Não... não imaginei que fosse assim — confessou a ele. Quando Andrew traçou o contorno de seus lábios com a ponta do dedo, ela não teve como disfarçar um estremecimento. Os olhos de Andrew refletiam o brilho de seu próprio desejo. — Compartilhamos algo muito precioso e raro, Lindsay. Poucas pessoas sentem isso com essa mesma profundidade. Ela sabia que Andrew dizia a verdade. Mesmo tendo que reunir todas as forças que lhe restavam, conseguiu se afastar dos braços dele, equilibrando-se sobre as pernas trêmulas. Fingindo uma firmeza que estava longe de sentir, recolocou o chapéu, ajustando-o com charme. — Estou pronta para cavalgar — anunciou. — Só peço que não ria de mim. É fácil ser graciosa na água, mas andar a cavalo é algo bem diferente. — Bem, pelo menos você não estará usando a roupa de sereia; garanto que ajudará um bocado — ele brincou. — Agora vamos sair daqui antes que eu acabe mudando de idéia. Caminharam ate o outro lado do estabulo, onde dois cavalos selados já os esperavam. Lindsay estava prestes a pedir a Andrew que a ajudasse a montar quando notou a presença de dois homens, também montados, a certa distância. Os seguranças de Andrew. De súbito, sua alegria se foi. Por um momento, chegara a esquecer deles, envolvida pelas carícias de Andrew. Entretanto, ele sabia que eles se encontravam do lado de fora e que poderiam invadir a privacidade deles a qualquer instante. A vida de Andrew não pertencia a ele. — Esqueça que eles estão aqui. — Como sempre, Andrew leu seus pensamentos. — A menos que nossas vidas estivessem sob perigo, eles nunca nos incomodariam sem permissão — acrescentou, ajudando-a a subir na sela. Entregou as rédeas a ela e ajustou os estribos. Em seguida, montou em seu garanhão. Após colocar o chapéu, Andrew voltou-se para ela: — Antes que essa sua imaginação fértil cometa alguma outra confusão, vamos deixar algo bem claro: você é muito importante para mim, Lindsay. Não vou fazer amor com você no primeiro lugar disponível. Ainda me restam alguns escrúpulos. Quero me casar com você antes de tocá-la, embora eu esteja ardendo por dentro. Mas pode ter certeza de que quando nos casarmos faremos amor quando bem quisermos, sem ter que nos preocupar com o resto do mundo. As palavras causaram um indisfarçável rubor no rosto de Lindsay. — Para fazer Algodão Doce andar é só dar uma leve batida com as pernas em suas ancas — ele avisou. — Segure as rédeas com firmeza para que ela saiba que você está no comando, mas dê espaço suficiente para ela mover a cabeça. Grata por ter que se concentrar em outra coisa além da proposta de Andrew, Lindsay seguiu todas as instruções. Deixou escapar um gritinho de entusiasmo quando o dócil animal começou a andar. — Está indo muito bem — Andrew elogiou-a. — Agora dê a volta pelo cercado para se acostumar com ela. Puxe a rédea quando quiser mudar de direção e ela seguirá seu comando. Depois de circundar o cercado, Lindsay já sentia-se bem mais segura. Andrew presenteou-a com um irresistível sorriso, provocando-lhe um novo arrepio pelo corpo. Por fim, puseram-se a caminho, cavalgando lado a lado. Seguiram por uma agradável trilha arborizada, enquanto Andrew falava sobre o rio Walker, que atravessava a propriedade. Fascinada com as histórias sobre os nativos que um dia haviam ocupado a região, Lindsay ignorou a leve dor que começara a sentir no traseiro pouco depois que montara Algodão Doce. Deduziu que seu desconforto se devia ao fato de ela nunca haver montado antes, por isso não disse nada a Andrew. — Estamos quase chegando — ele avisou. — Acho que minha sereia já está com prática suficiente para um curto galope. Quer tentar? Andrew parecia tão animado quanto um garoto e, apesar da dor estar mais intensa, Lindsay não queria desapontá-lo. — O que devo fazer? — Bata as pernas com um pouco mais de força e me siga. Segure as rédeas com mais firmeza, mas continue dando espaço para ela mover a cabeça. Se quiser parar, é só puxar as rédeas. Lindsay assentiu, esperando que Andrew não notasse sua dificuldade em permanecer ereta na sela. — Vamos! Ele impeliu o garanhão para frente. Com uma elegância natural, começou a galopar, ganhando distância. Ansiosa para agradar Andrew, que fazia de tudo para tornar essa tarde memorável, Lindsay decidiu seguir em frente, ignorando a dor. Cerrou os dentes e seguiu a primeira instrução de Andrew. Foi então que sentiu uma pontada lancinante na base dos quadris que logo espalhou-se pelas pernas. Seu grito assustou a égua, que disparou feito uma flecha. A dor de Lindsay se intensificava a cada vez que seu quadril tocava a sela. Andrew parou mais adiante e virou-se para olhar como ela estava se saindo. Quando percebeu que Algodão Doce disparara, gritou o nome de Lindsay, dizendo a ela que puxasse as rédeas. Porém, a dor intensa enfraqueceu o corpo de Lindsay e as rédeas escaparam de suas mãos. Ela tentava se ajeitar na sela, mas não estava conseguindo sentir as pernas. Com uma desagradável sensação de déjà vu, Lindsay lembrou do dia em que sofrerá o acidente e saíra do ônibus sem sentir as pernas. — Oh, não... — sussurrou, exasperada. — Não! Notou vagamente que Andrew se aproximara e segurava as rédeas. — Lindsay! O que foi? Ele pulou da sela no mesmo instante. — Andrew! — Lindsay gritou, aterrorizada, no momento em que ele tirava seu corpo rígido da sela. — Andrew... — chamou-o mais uma vez antes de desmaiar. CAPÍTULO IX — Papai? Ao ouvir a voz preocupada do filho, Andrew levantou a cabeça e olhou-o com ar inexpressivo. A atmosfera da sala de emergência não contribuía em nada para melhorar seu ânimo. Skip ficara do lado de fora, a fim de afastar algum curioso que se aproximasse. — Tio Zack e Troy vieram comigo. Estão esperando do lado de fora. O que aconteceu com Lindsay? Andrew ficou de pé e abraçou o filho. — Estou feliz que esteja aqui. Vai demorar um pouco para sabermos o que houve. Ela ainda está na sala de raio X. — Tudo o que tio Zack disse foi que ela desmaiou e que você a estava trazendo para o hospital de helicóptero. Andrew massageou a nuca, contendo a tensão. — Receio que o problema seja bem mais sério, Randy. Lindsay se machucou enquanto cavalgava e suas pernas ficaram paralisadas. — Então é grave? — Randy franziu o cenho. — Deus, espero que não. — Chefe? Andrew olhou para a porta. — Sim, Skip? Ela voltou a si? — Sim. O médico disse que o senhor pode vê-la agora. — Boa sorte, papai. Estaremos esperando. Andrew encontrou Lindsay deitada na cama de hospital. Estava um pouco mais corada. Os cabelos dourados espalhados em torno do rosto faziam-na parecer uma princesa de conto-de-fadas. — Andrew... Ele aproximou-se no mesmo instante, segurando a mão dela com delicadeza. — Ainda está sentindo dor? — Não. Eles me deram algo para aliviá-la. — De repente, os olhos de Lindsay ficavam marejados de lágrimas. — Perdoe-me por lhe causar tantos problemas. Agora afastei-o de sua família e arrasei sua folga. Andrew inclinou-se e beijou-a na testa. — Não há nada a ser perdoado. Eu te amo, Lindsay. Tudo que desejo agora é que fique boa. Ela desviou a vista. — Você tem sido maravilhoso para mim — disse. — Eu não queria estragar tudo. Pobre Algodão Doce. Meu grito deve tê-la assustado. Andrew respirou fundo. — Lindsay, por que não me contou sobre o acidente que sofreu quando era criança? Ela olhou-o no mesmo instante. — Como soube disso? Ah, claro, o detetive particular. Ele deve ser muito bom mesmo. — Não foi o detetive — Andrew corrigiu. — Seus pais me contaram. Lindsay empalideceu. — Você falou com meus pais? — Claro. Telefonei para eles assim que você foi levada para a sala de emergência. — Por quê? — O tom de Lindsay denotou angústia. — Porque eles são sua família. Têm o direito de saber que a filha está no hospital. Prometi a eles que voltaria a telefonar assim que soubesse mais detalhes sobre seu estado. Lindsay gemeu. — Não deveria ter feito isso. Não tinha direito! Sou uma mulher de vinte e sete anos e não preciso que você nem ninguém se preocupe comigo ou tome decisões por mim! Há muito que não sou mais uma criança! Andrew sentiu como se houvesse levado uma bofetada. Todavia, as palavras de Lindsay lhe deram uma certa idéia sobre o que se passava na mente dela. — Acha que é isso que estou fazendo? Tentando controlá-la? — Sim. Fez isso quando mandou seus guarda-costas cuidarem de mim e me mudou de quarto sem me consultar. Também faz isso com Rand... — interrompeu-se. — Sim? — Andrew franziu o cenho, intrigado. — Qual o problema com meu filho? — Eu não deveria ter dito nada. Não é da minha conta. Ela fechou os olhos, virando a cabeça para o outro lado. — Fale, Lindsay, por favor. O que faço com Randy? Talvez assim eu consiga entender o que se passa dentro de você. Lágrimas rolaram pelo rosto dela, caindo sobre o lençol. — Quando Randy ficou sabendo que eu pretendia estudar o comportamento dos tubarões, ele se animou e disse que era algo que também gostaria de fazer. Você mudou de assunto no mesmo instante. — É verdade. Tubarões são perigosos e a idéia do que eles podem fazer a um ser humano não é nada agradável. Lindsay voltou a olhá-lo. — Mas se Randy quiser se formar em biologia marinha, você não tem o direito de interferir na escolha dele, Andrew. — Eu sei. E, se ele quisesse estudar tubarões, eu não interferiria. Só que Randy ainda não sabe o que quer da vida, Lindsay. Antes de aprender a mergulhar, trabalhava no ramo de vendas. Porém, desde que voltamos das Bahamas, ele e Troy estão pensando em se tornar rancheiros. Dois meses na faculdade e, provavelmente, ele aparecerá com a idéia de tocar algum instrumento na sinfônica. Andrew pensou que conseguiria obter um sorriso dela, mas Lindsay continuou séria. — Meus pais costumavam fazer o mesmo, dizendo que eu não sabia o que queria da vida. Mudavam de assunto exatamente como você quando eu tentava conversar. Andrew passou a mão pelos cabelos, angustiado. — Não me compare a seus pais, Lindsay. Pela maneira como fala, está claro que eles precisam da ajuda de um especialista. Porém, agora não é a melhor hora para falarmos disso. Por que não tenta dormir um pouco? Deixe o sedativo fazer efeito. — Não quero dormir — replicou ela. — Por mais que você tente negar, o resultado final é sempre o mesmo. Em Nassau, resolveu me proteger do perigo tomando as decisões que você achava melhores. Não pensou sequer em discuti-las comigo! — A situação exigia uma atitude rápida — Andrew justificou-se. — Não se preocuparia comigo se eu estivesse correndo perigo? — Eu ficaria apavorada — Lindsay confessou. — A possibilidade de... de assassinato é sempre constante, e isso me apavora. Mas eu não pediria a você para desistir de sua carreira por causa disso. Não tentaria mudar sua maneira de pensar nem tomaria decisões por você! Andrew estava prestes a responder quando o médico que a examinara entrou no quarto. Ele cumprimentou Andrew, que preferiu não se dirigir mais a Lindsay. — Qual o resultado do exame, doutor? — Andrew foi direto ao assunto, ainda afetado pela discussão com Lindsay. — Boas notícias, governador. — O médico aproximou-se da cama e sorriu para a paciente. — Não há risco de nada mais grave. Na minha opinião, isso aconteceu porque você nunca andou a cavalo antes. Forçou muitos músculos que nunca usou dessa maneira e eles sofreram espasmos assim que o cavalo começou a galopar. — Não senti as pernas só por essa razão? — Lindsay indagou, incrédula. — Sim. Apenas uma sensação temporária. Está sentindo-as agora, não está? Ele levantou o lençol e mexeu nas solas dos pés de Lindsay, fazendo-a movê-los um gesto reflexivo. Uma expressão indagadora surgiu no rosto dela enquanto se esforçava para sentar. Seus olhos encontraram-se com os de Andrew, antes de voltarem a fitar o médico: — Não consigo acreditar. Pensei... — A injeção que lhe aplicamos relaxou seus músculos — ele explicou. — Devido ao seu trauma, o medo deixou-a apavorada e isso contribuiu para intensificar a dor. Vou liberá-la e prescrever um relaxante muscular e um medicamento anti-inflamatório. Descanse doze horas antes de retomar suas atividades. Um banho quente e cama ajudarão na recuperação. "Doze horas para alcançar Lindsay e fazê-la entender", pensou Andrew. Quando o médico se retirou, Andrew pensou em pegá-la no colo, mas algo lhe disse que Lindsay não aceitaria o gesto. Não depois do que dissera a ele. — Quer que eu chame uma enfermeira para ajudá-la a se vestir? Lindsay manteve o lençol em torno do corpo, num gesto defensivo. — Sim, por favor. — Quando estiver pronta, a limusine estará esperando-a próxima à entrada de emergência. — Obrigada por tudo — Lindsay agradeceu sem encará-lo. — Sinto-me uma verdadeira idiota. — Não imagina o quanto estou aliviado em vê-la sair daqui andando com suas lindas pernas. — Andrew... — Agora não, Lindsay. Ele interrompeu-a com firmeza e se retirou. — Papai? Deixe Lindsay no quarto ao lado do meu. Se ela precisar de alguma coisa durante a noite, poderei ouvi-la. — Prometo que não incomodarei ninguém — murmurou Lindsay. Andrew encostou os lábios junto aos cabelos dela. Carregara Lindsay nos braços até o segundo andar da mansão. Os longos cabelos dela caíam sobre seu braço como uma sedosa cascata dourada. Embora seu desejo fosse levá-la para seu quarto, Andrew foi obrigado a se conter. Porém, logo ela estaria dormindo na sua cama. Apesar dos receios de Lindsay, Andrew estava determinado a torná-la sua esposa. — Já que não poderá voltar a tempo de treinar o time de natação, amanhã, por que não aproveita para tirar uma licença e fica mais algum tempo conosco? — Randy sugeriu com animação. — Temos uma piscina aqui na mansão, onde você poderá se exercitar todos os dias. Poderá ajudar Troy ao mesmo tempo. — É uma idéia muito gentil de sua parte, Randy. Fico feliz que confie em mim para ajudar Troy. Contudo, receio que o dono do clube não gostará nem um pouco se eu pedir mais dias de folga. Logo o dono do clube teria que dar folga permanente para Lindsay, pensou Andrew. Muito mais rápido do que ela poderia imaginar. Todavia, manteve-se em silêncio, aplaudindo o filho pelo incentivo que estava lhe dando para manter Lindsay por perto. — Papai me disse que convidou-a para passar alguns dias aqui quando o governador Stevens e a família vierem nos visitar. Uma semana a mais não faria mal algum. Não imagina os divertimentos que estamos planejando. Andrew levou-a para o quarto ao lado do de Randy. Deitou-a sobre a cama, esperando uma resposta da parte dela. Embora ele continuasse em silêncio, a mente de Andrew fervilhava de ansiedade. — Por mais que a idéia soe maravilhosa, tenho outros compromissos, Randy. Mesmo assim, fico lisonjeada que tenham me incluído em seus planos. Andrew tinha algo a dizer a esse respeito, mas faria isso depois, quando os dois estivessem sozinhos. Randy colocou a mala dela no chão. — Está com fome, Lindsay? — ele inquiriu. — Não. Mas estou com sede. — Quer um suco ou refrigerante? — Um refrigerante está ótimo, obrigada. — É para já! Randy dirigiu-se à porta, trocando alguns sinais discretos com o pai antes de sair. Assim que ficaram sozinhos, Lindsay começou a falar. Porém, antecipando mais rejeição, Andrew interrompeu-a: — O médico disse que um banho seria bom para você. — Encaminhou-se para a porta. — Vou abrir as torneiras da banheira e pedir a Maud, a governanta, que venha ajudá-la — disse por cima do ombro. Andrew encontrou Randy no corredor. Pegou o refrigerante da mão dele. — Obrigado, filho. Diga a Maud para vir até aqui, sim? Randy assentiu e foi chamar a governanta. Quando a banheira estava cheia, Andrew saiu do banheiro. Randy e Maud terminavam de subir a escada. Entregou os remédios de Lindsay à governanta. — Dê os comprimidos a ela antes do banho — avisou. — Quando houverem terminado, vá até meu escritório e me avise. Se ela quiser jantar mais tarde, eu mesmo providenciarei alguma coisa. Maud assentiu. — É bom ter uma presença feminina em casa novamente, senhor. — Concordo plenamente. Trocaram um sorriso de cumplicidade, conquistado após cinco anos de convivência. Andrew e Randy se dirigiram ao quarto principal. — O que pretende fazer para conquistá-la, papai? Lindsay não está cooperando muito. — Então você notou? — Andrew resmungou. — Vou tentar mantê-la aqui até conseguir convencê-la de que os receios que tem a meu respeito são infundados. — Está evidente que ela o ama. Não será difícil encontrar uma maneira de convencê-la. Andrew deu um tapinha no ombro do filho. — Tenho mesmo sorte de ter um filho como você. Agora caia fora daqui e vá se divertir. — Pode deixar. Troy e eu marcamos um encontro com duas lindas modelos. — Interessante. Lembre-se da nossa regra de não chegar tarde demais. — Ok. De qualquer maneira, preciso estar no trabalho amanhã às oito. — Sorriu para o pai: — Comporte-se também. O comentário provocou um leve riso em Andrew. Depois de um banho rápido, desceu até a cozinha. Preparou um sanduíche e levou-o para o escritório. Cerca de meia hora depois, Maud anunciou que Lindsay estava na cama, descansando. Andrew agradeceu e saiu do escritório. Subiu a escada galgando dois degraus de cada vez. Maud havia deixado a porta apenas encostada. Andrew entrou no quarto envolto por uma agradável penumbra e se aproximou da cama com cuidado. Lindsay estava deitada de costas para ele, o lençol puxado até a cintura. Ela adormecera. Era natural, depois de tudo que acontecera. Todavia, uma parte de seu ser desejou que Lindsay estivesse acordada, pronta a recebê-lo. Engolindo seu desapontamento, virou-se para sair. — Andrew? Ele parou no mesmo instante, o coração acelerado. — É você? — Lindsay insistiu com voz sonolenta, virando-se para olhá-lo. Andrew voltou a se aproximar. — Não quis acordá-la. Só vim ver se você estava bem e dizer boa noite. — Eu estava esperando — disse, sonolenta. — Precisamos conversar. — Não essa noite, Lindsay. Deixe o remédio fazer efeito. Amanhã teremos muito tempo. — Não. Você não está entendendo... Não posso ficar. — Não irá a lugar nenhum enquanto não ficar completamente recuperada. — Mas eu... — ela interrompeu-se, fazendo uma leve careta de dor. Andrew ajoelhou-se ao lado da cama no mesmo instante. Virou-a de barriga para baixo lentamente e afastou o lençol. — Onde está doendo? Aqui? Começou a massagear a cintura e a área lombar de Lindsay. — Oh... que alívio... — ela murmurou, fechando os olhos. — Ainda bem — Andrew sorriu. Incapaz de se conter, afastou os cabelos dela para o lado e passou a massagear-lhe as costas. Quando deu por si, seus lábios roçavam a área sensível da nuca de Lindsay. Com as mãos, acariciou a pele macia, no local onde as duas peças do pijama haviam se separado. Lindsay gemeu baixinho. O som irresistível levou Andrew a tocar seus lábios nos dela. — Lindsay... — a voz dele saiu trêmula de desejo. Num impulso, ela virou-se para ele, oferecendo os lábios completamente. Beijaram-se por um longo tempo. Um beijo lânguido, sensual... Andrew sonhara com um momento como esse desde a primeira vez em que a vira. Entretanto, fazer amor com Lindsay sob o efeito de remédios e ainda com dores seria pura insensatez. Além do mais, os dois ainda precisavam conversar, planejar como seria o futuro. Reunindo o que lhe restava de forças, conseguiu se afastar dela e ficar de pé. Ao ouvir o gemido de protesto de Lindsay, quase abandonou seus princípios e deitou na cama com ela. Deu um passo atrás enquanto ainda estava podendo se conter. No caminho até a porta, esperou que ela ao menos sussurrasse seu nome. Bastaria isso para fazê-lo abrir mão de todo o resto e passar a noite com ela. Porém, seguiu-se apenas o silêncio. CAPÍTULO X Por volta das três e meia da manhã, Lindsay despertou de um pesadelo. Suava frio e o travesseiro estava molhado de lágrimas. Sentou-se na cama, afastando os cabelos do rosto. Sonhara com Andrew. Haviam tido uma terrível discussão e ele lhe dera um ultimato que resultara na completa separação dos dois. Os detalhes do sonho eram vagos, mas a imagem e a voz eram de seu pai, em vez de Andrew. A dolorosa certeza surgiu mais uma vez: seu casamento com Andrew nunca daria certo. Precisava se afastar dele, antes que a dor da separação se tornasse ainda pior. Suas costas ainda estavam doloridas, mas não o suficiente para impedi-la de se mover. Isso significava que ela poderia deixar a mansão sem problemas. Segundo a governanta, Andrew pegara a chave do carro em sua bolsa e mandara um dos seguranças a Carson City para trazer seu carro de volta. Será que ele devolvera suas chaves? Alcançou a bolsa, em uma cadeira próxima à cama, e começou a procurar as chaves. De repente, seus dedos tocaram o metal frio. Emitiu uma leve exclamação de triunfo. Imaginara que Andrew poderia estar com as chaves, para impedi-la de dirigir enquanto não estivesse recuperada o suficiente. Na mesma situação, seu pai não teria pensado duas vezes para escondê-las, com a desculpa de que sabia o que era melhor para ela. Lindsay não tinha idéia de quando começava o dia de Andrew, mas concluiu que nem mesmo ele estaria acordado a essa hora. Aprendera o suficiente sobre os seguranças para saber que eles notariam seus movimentos, mas não a impediriam de sair. O único problema seria convencê-los a dizer algo a Andrew até que ela partisse. Após arrumar a cama, foi até o banheiro terminar de se vestir e tomar o anti-inflamatório. Dez minutos depois estava pronta, trajando uma blusa e um jeans. Prendera os cabelos em uma trança. Antes de sair do quarto, sentou-se diante da penteadeira e escreveu um bilhete para Andrew. Vez por outra, enxugava as lágrimas que teimavam em rolar por seu rosto. Somente a resolução de deixar a mansão antes que ele descobrisse sua ausência evitou que ela sucumbisse ao choro. Agradeceu a generosidade e hospitalidade de Andrew, desculpando-se pelo problema que causara. Com a mão trêmula, reiterou a idéia de que um casamento entre eles nunca daria certo. E que seria melhor se separarem agora, antes que acontecesse algo que os dois acabassem lamentando. Não queria magoar Randy e pediu a Andrew que se despedisse dele por ela. Ao terminar, dobrou o papel e escreveu o nome dele em cima. Deixou o papel preso ao espelho, onde ele não poderia ser ignorado. Talvez fosse covardia de sua parte, mas Lindsay sabia que não conseguiria voltar a encará-lo. Não confiava em si mesma, não depois da maneira como correspondera aos beijos de Andrew. Quando ele a tocara, ela simplesmente esquecera todo o resto! Esse era o problema. Não conseguia ficar perto de Andrew sem terminar nos braços dele. Lançou um último olhar para o quarto, antes de pegar o chapéu e a bolsa. Saiu na ponta dos pés, apurando a visão em meio à penumbra da casa. A única luz que iluminava a escada era a de duas luminárias presas à parede. Ao passar pelo quarto de Randy, avistou um segurança sentado em uma cadeira próxima ao topo da escada, lendo um livro. Era loiro e forte. Lindsay deu um passo â frente, mas sobressaltou-se ao ver quem era. — Então minha intuição estava correta, afinal — disse ele. Quando levantou a vista para ela, Lindsay mal reconheceu o Andrew que tinha diante de si. Ele a fitava com um olhar frio, calculista. Jogou o livro no chão, não se importando com o barulho. O gesto tornou sua aparência ainda mais sombria. Um som vindo de trás, fez Lindsay se virar. Randy apareceu no corredor, vestido com um pijama. — O que está acontecendo? — perguntou ele. Lindsay não soube o que dizer. — Ainda bem que está acordado — disse Andrew num tom irônico. — Nossa sereia estava prestes a ir embora. Randy pestanejou, confuso. — Por quê, Lindsay? Estamos no meio da noite. — Certo, filho. Mas nós a perdoamos porque ela é uma criatura marinha. Prefere se mover pela penumbra, onde tem menos chance de ser encontrada pelos humanos. Lindsay levou a mão ao peito. Nunca vira Andrew tão magoado. — Ainda está em tempo de se despedir, Randy, antes que ela desapareça para sempre. Não entendo por quê, mas ela prefere a companhia dos tubarões. Eles não a amam nem odeiam, porém deixam as sereias em paz e nunca lhes fazem nenhuma exigência, exceto quando estão com fome e não há outra refeição por perto. Lindsay ouvia em silêncio, deixando Andrew destilar sua indignação. Ela matara todo o sentimento que havia nele e agora teria de conviver com as consequências de suas ações. — Eu... eu sinto muito — sussurrou para os dois, balançando a cabeça, exasperada. — Também sinto muito — murmurou Randy com um brilho diferente no olhar. — Papai e eu pensamos que seria fácil capturar uma sereia, mas acho que o que dizem sobre a natureza é verdade. Algumas coisas devem ser deixadas nos lugares aos quais pertencem. Adeus, Lindsay. Veremos você na tevê. Dizendo isso, voltou para o quarto e fechou a porta. O eco daquelas palavras pareceu ressoar no peito de Lindsay. — Dizem que as sereias enfeitiçam os marinheiros. Sempre me perguntei qual seria o fundamento dessa lenda. Mas agora eu sei. Lindsay aproximou-se dele, desesperada para fazer Andrew compreender. — Andrew, ouça-me, por favor. Há algo que você não sabe a meu respeito. Tem a ver com meus pais. e o fato de eles estarem sempre tentando me controlar. Minha vida tornou-se uma prisão e a situação ficou tão ruim que tive de procurar um psiquiatra. Ele me ensinou como devo lidar com eles. Andrew estreitou o olhar. — Meus parabéns para seu psiquiatra. A cura foi cem por cento eficaz! "Basta cortar todos os seus relacionamentos com os seres humanos", deve ter sido o que ele lhe recomendou — acrescentou com sarcasmo. — Qualquer idiota sabe que é impossível transformar uma sereia em uma mulher. Duvidei disso, mas agora tenho cicatrizes que comprovam essa teoria. O feitiço se desfez, minha querida. Volte para o mar, onde poderá se livrar do contato com humanos: Também estará livre do homem que tem o defeito de querer proteger a mulher por quem se apaixonou. Vá de uma vez! Não temos mais nada a dizer um ao outro. — Andrew! — Lindsay quase gritou. — Juro que não queria magoá-lo! — Acredito em você. — A voz dele não denotou nenhuma emoção. — Desde o primeiro dia você fez todo o possível para me afastar do seu caminho. Aprendi a lição. — Dirigiu-se ao segurança que estava na base da escada: — Larry? Por favor, acompanhe a Srta. Marshall até o carro dela, depois traga a limusine para mim. Tenho uma reunião em Las Vegas, às sete em ponto. Pela segunda vez na vida, Lindsay teve a sensação de estar se afogando. Só que dessa vez não havia nenhum mergulhador misterioso para salvá-la. Estava completamente sozinha. — Beth? A bonita morena virou-se em sua cadeira de escritório e olhou para Lindsay. — Bem, duas horas de atraso é melhor do que não aparecer de jeito nenhum — comentou ela. — Meus Deus! Essa é a mesma sereia sobre a qual todos os Estados Unidos estão falando? Sente-se, antes que acabe desmaiando. — Ficou de pé. — Vou pegar algo para você beber. — Não, Beth. Não precisa se incomodar. Eu não sei se conseguiria engolir alguma coisa. Beth fechou a porta para deixá-las com mais privacidade. Voltou a sentar, olhando a amiga com certa ansiedade. — Você teve uma razão para me telefonar hoje cedo. Lindsay, o que está acontecendo? Lindsay abaixou a cabeça. — Eu não deveria ter vindo atrapalhá-la no trabalho. — Ora, não diga bobagens! Quantas vezes também já não corri até sua casa para desabafar sobre os maridos problemáticos da minha mãe? Lindsay, se não fosse por você, acho que eu já teria ficado maluca há muito tempo. Você, por outro lado, nunca me atrapalha. Esse é o problema. — O que está querendo dizer? — Lindsay levantou a cabeça. — Não finja não saber sobre o que estou falando. Sou Beth, lembra? Notou que quase não conversamos desde que você voltou de Carson City, no mês passado? Nenhuma vez você mencionou o que aconteceu entre você e Andrew. Os olhos de Lindsay ficaram marejados de lágrimas. — Não pude — respondeu. — Isso está óbvio. Ah, já assisti seu comercial de tevê. Ficou sensacional! Minha mãe disse que você deveria fazer uma "versão em carne e osso" de A Pequena Sereia. Lindsay sorriu, desconsolada. — Essa era a última coisa que eu gostaria de fazer — confessou. — Infelizmente, meu agente não está me deixando em paz. Falou até com meus pais, para eles me convencerem da idéia. — Hmm, foi um erro fatal — Beth murmurou. — Ele deveria ter vindo até mim; talvez eu conseguisse alguma coisa. — Encostou-se na cadeira giratória e cruzou os braços. — Deixou seu trabalho no clube? — Sim. Ontem foi meu último dia. — E quando partirá para San Diego? Seguiu-se um longo silêncio. — Não quero ir para lá — Lindsay admitiu, por fim. — Aleluia! Quando foi que finalmente se deu conta de que na verdade você nunca quis ser uma bióloga marinha? Lindsay fitou os olhos da amiga. — Quando estava voltando de Carson City. Oh, Beth... — balançou a cabeça — ...você tinha toda razão a meu respeito. Todo o tempo eu estava punindo Andrew por coisas que não tinham nada a ver com ele. Acusei-o de crimes que ele nunca cometeu. Ele não é como meu pai, mas eu estava tão envolvida por meus medos que não quis escutá-lo. Agora é tarde demais. Perdi Andrew para sempre, Beth — terminou com voz trêmula. — Você disse isso antes e estava errada. — Mas dessa vez não estou. — Lindsay ficou de pé, impaciente. — Se acha que agi de maneira imperdoável quando Andrew veio me procurar em Culver City, não acreditaria no modo como tratei ele e Randy no feriado de quatro de julho. — Respirou fundo. — Ele me pediu em casamento, mas ignorei a proposta e... — Espere um pouco — Beth interrompeu-a. — Vou colocar o aviso de "Não Perturbe" na porta e pedir a Janet que atenda meus telefonemas. Quero ouvir essa história desde o início. Assim que Beth voltou a se acomodar, Lindsay contou todos os detalhes de sua visita a Carson City. A conversa que ela e Andrew tiveram no hospital, a noite em que pretendia fugir e se deparou com ele no alto da escada... — Ele me disse coisas que ainda hoje estão doendo, Beth — revelou enxugando as lágrimas. — E aquela expressão de tristeza no rosto de Randy... Nunca conseguirei esquecer. Beth inclinou-se para frente, apoiada sobre a mesa. — Quanto você o ama, Lindsay? — O suficiente para fazer qualquer coisa para ter o amor dele de volta. Agora sei que nada mais importa se eu não puder viver ao lado dele pelo resto da vida. — Olhou a amiga com atenção. — Por isso estou aqui. Tive uma idéia e quero saber sua opinião. — Notando o brilho de interesse nos olhos da amiga, acrescentou: — É meio maluca e, se falhar, aí sim, perderei Andrew para sempre. Isso sem mencionar que serei motivo de risos em todo o Estado de Nevada, ou mesmo no país. Todavia, estou disposta a realizar qualquer sacrifício para fazer Andrew entender o que ele significa para mim. Beth ficou de pé devagar, um sorriso dançando nos lábios. — Essa é a mesma Lindsay que conheço há mais de vinte anos? — Não. Aquela Lindsay morreu no caminho de volta para a Califórnia, no mês passado, por causa de Andrew. Ainda não sei exatamente como é a nova Lindsay Marshall, mas tenho certeza de que ela quer se tornar esposa de Andrew Cordell. — Ótimo! Era isso mesmo que eu esperava ouvir! Agora vamos ver qual é esse seu fantástico plano. — Primeiro preciso falar com Randy. Ele e Andrew são muito unidos. Sei que o magoei quando atingi Andrew. Se ele não puder me perdoar, então não haverá mesmo esperanças. — Ok — respondeu Beth num tom prático. — Vamos supor que ele ficará mais que satisfeito quando souber que você quer se tornar sua madrasta. Agora conte de uma vez seu plano, antes que eu morra de curiosidade! Lindsay começou a falar sem hesitação. Quando terminou, os olhos de Beth brilhavam de contentamento. Pegou o telefone e entregou a Lindsay. — Ligue para o trabalho de Randy agora mesmo — sugeriu. — Pegue-o de surpresa enquanto Andrew não está por perto. Surpresa com a sugestão da amiga, Lindsay ligou para o número de informações de Carson City e pediu o telefone da loja de equipamentos de mergulho onde Randy trabalhava. Foi atendida por uma mulher. — Posso falar com Randy Cordell, por favor? — perguntou quando Beth lhe fez um sinal de que a deixaria sozinha. — Um momento, por gentileza, acho que ele está na piscina. Lindsay sentou-se na cadeira de Beth, segurando o telefone com mais firmeza. — Randy Cordell. Lindsay engoliu seco. — Randy? Ele hesitou. — Lindsay? É você? — Sim. Não desligue, por favor. — Por que eu faria isso? Ela pestanejou. — Pensei que estivesse tão magoado quanto seu pai comigo. — Sobre o que está falando? — Fui injusta com seu pai, Randy. Magoei-o muito, e, sem razão. — Sim, eu sei. O comentário confirmou os receios de Lindsay. — Como ele está? — Mais ocupado que nunca. — O governador Stevens e a família fizeram aquela visita? — Sim. Troy e eu nos divertimos muito com as filhas dele. Meu pai e Jim passaram a maior parte do tempo cavalgando e jogando. Lindsay fechou os olhos um instante. — Vocês foram mergulhar nas ilhas Caimã, como pretendiam? — Não. Papai disse que já havia esgotado sua cota de aventuras submarinas. Então resolvemos apenas acampar com tio Zack e Troy. Voltamos ontem, para dizer a verdade. — Randy, ele falou alguma vez de mim? — Não. Nem conseguiu ficar diante da tevê quando exibiram seu comercial pela primeira vez. Estávamos todos no rancho; ele ficou de pé e se retirou. Lindsay sentiu um aperto no coração. — Randy, você sabia que seu pai me pediu em casamento? — Sim. Por que recusou o pedido, Lindsay? — indagou ele num tom magoado. — Porque... porque eu precisava resolver algumas coisas primeiro. — Eu poderia jurar que você o amava. — E amo. Mais do que minha própria vida. — Então qual é o problema? — Agora não há nenhum. — O que disse? — Randy tornou-se visivelmente mais animado. — Quero me casar com Andrew o quanto antes, se ele ainda me quiser, claro. Gostaria que nos tornássemos uma família. — Puxa! Não está brincado, está? — Não, não estou — Lindsay sorriu. — Acha isso bom ou ruim? — É fantástico! — Exceto por um detalhe — Lindsay corrigiu. — Seu pai me disse para voltar do lugar de onde vim e que não tínhamos mais nada a dizer um ao outro. — Sim, eu sei. Mas também sei que ele se apaixonou por você desde o primeiro instante em que a viu. Não conseguiu suportar quando você recusou o pedido de casamento. — Preciso de uma chance para pedir perdão a ele e convencê-lo a me aceitar de volta, Randy. Dessa vez para sempre. Pode me ajudar? — O que acha? — ele riu. — Sou sua fã, Randy Cordell! — Sim, o sentimento de admiração é recíproco. Ambos sorriram. CAPÍTULO XI Quando viu Randy entrar no escritório, Andrew acenou para ele. — Pouco importa o que ele diz, Clint. Quero esse relatório na minha mesa amanhã logo cedo, caso contrário, convocarei uma audiência pública. Pode ter certeza disso! — Ainda bem que tia Alex nos convidou para um jantarzinho em família. Você parece furioso — comentou Randy quando Andrew desligou o telefone. — Aposto que também não almoçou hoje. — Não tive tempo. — Andrew ficou de pé e vestiu o paletó, ciente de que perdera muitos interesses desde que Lindsay saíra de sua vida. — Descobrimos indícios de corrupção no escritório do fundo de aposentadoria. Agora que a imprensa ficou sabendo, preciso agir muito antes dos repórteres. — O assunto parece sério. É por isso que há tantas pessoas na frente do prédio? Tive dificuldade para conseguir entrar. — Não, deve ser algum bando de turistas posando para fotos. Andrew pegou a maleta e guardou os últimos relatórios incriminadores. — Também há uma equipe de tevê lá fora — Randy avisou. Andrew lançou um olhar surpreso para o filho, antes de pressionar o botão do interfone. A secretária apareceu pouco depois. — O que está acontecendo na entrada do prédio, Judith? Randy viu repórteres, incluindo uma equipe de tevê. — Segundo Jake, há alguma celebração do meio televisivo acontecendo na cidade. O senhor foi convocado para ir ouvir o que eles têm a dizer, mas achei que não deveria se expor. Por isso não me incomodei em avisá-lo. Andrew forçou um sorriso. — Obrigado pela tentativa de ajuda, Judith. Sei que a imprensa está me esperando por causa do escândalo da corrupção. Tenho uma idéia do que está acontecendo. — Então enfrente-os de uma vez, papai! Ninguém sabe lidar melhor com eles do que você. — Obrigado pelo voto de confiança, Randy. Judith não pareceu convencida: — Não estou gostando nada dessa idéia. — Diga a Jake para alertar os outros. Quem planejou isso deve estar louco por um escândalo. Bem, estou pronto para o desafio. — Governador, por que não deixa Clint cuidar desse assunto? — Não. Já que vieram à minha procura, serei hospitaleiro — declarou Andrew, sentindo uma onda de adrenalina varrer seu corpo. Adorava desafios desse tipo. Por um momento ajudavam-no a esquecer de que ele era um homem com necessidades e desejos que somente uma mulher poderia realizar. Só que ela se fora da sua vida. Talvez algum dia no futuro ele conseguisse esquecer... — Vamos, Randy? — Claro. Tia Alex ficará furiosa quando descobrir por que nos atrasamos. Andrew seguiu o filho em direção à entrada principal do edifício. Ficou surpreso com o número de pessoas reunidas no saguão. Alguém queria mesmo causar um escândalo. Jake aproximou-se de Andrew: — Estamos prontos, governador. — Ótimo. Siga na frente. As pessoas abriram caminho quando Andrew se aproximou, cercado de seguranças. Porém, qual não foi sua surpresa ao se deparar com uma voluptuosa sereia luxuosamente vestida, sentada no alto dos degraus da entrada do edifício. Sorria e acenava para a multidão reunida em torno dela. Andrew parou de repente, como se houvesse esbarrado em um muro invisível. Segurou o ombro do filho. A luz do sol refletia-se nos cabelos dourados e na cauda de brilho metálico, ofuscando a vista de Andrew. Ela estava de costas para ele, por isso não notou sua presença. Andrew duvidou que alguém na multidão também houvesse notado sua aproximação. Todos só tinham olhos para ela. A roupa inteiriça de sereia grudava-se ao corpo dela como uma segunda pele, moldando cada curva de uma maneira estonteante. O tecido brilhante, de um lindo tom azul-esverdeado, assemelhava-se a escamas de peixe. Como todos os demais, Andrew também não conseguia desviar os olhos dela. — Boa noite, senhoras e senhores que nos assistem — disse uma repórter diante da câmera, posicionando-se ao lado da sereia. — Essa noite temos uma reportagem especial direto do edifício onde trabalham o governador e seus assessores, aqui em Carson City. No último mês de junho, todos devem estar lembrados de que o governador Andrew Cordell saiu nas manchetes de jornais quando foi às Bahamas e viu uma belíssima sereia enquanto praticava mergulho com o filho. Essa noite, uma pessoa que prefere se manter no anonimato nos informou que a misteriosa sereia, agora conhecida, depois de um comercial de tevê, estaria aqui nesse edifício, protestando contra algo que ela mesma nos revelaria. — Inclinou-se para falar com a sereia: — Poderia nos dizer sobre o quê exatamente está protestando? E por quê? — Ei, papai, não aperte tanto meu ombro! — Randy sussurrou entre dentes. Andrew, porém, nem ouviu o protesto do filho. Sua atenção estava totalmente voltada para Lindsay. — Bem, tudo começou quando eu estava nadando tranquilamente no meu mundo e de repente esse.... esse mortal apareceu e recusou-se a me deixar em paz. — Quem? O governador Cordell? — Sim, ele mesmo. A platéia riu com apreciação. Só então alguns se deram conta da presença de Andrew. — Fiquei com medo porque de onde venho é lei nos mantermos longe dos mortais. Meus pais me criaram para ser muito obediente e nunca deixar um mortal chegar perto de mim para me capturar. — Está querendo dizer que o governador capturou-a contra sua vontade? — Fez algo muito pior! Randy cutucou o pai com o cotovelo, mas Andrew permaneceu rígido feito uma estátua de pedra. — Ele salvou minha vida quando eu estava em perigo. — Isso parece realmente algo que nosso governador faria — disse a repórter. — Ele é um grande defensor dos direitos das mulheres. Mas qual o motivo de sua indignação? — Bem, quando uma sereia entra em contato físico com um mortal, seu poder de resistir a ele se desvanece. Ela não ouve mais os pais e vive procurando oportunidades para revê-lo. Até que seja tarde demais. — Tarde demais? Poderia explicar melhor? — Claro. O maior medo de uma sereia é tornar-se escrava de um mortal, sucumbir ao seu poder. Quando isso acontece, ela não consegue mais se satisfazer com a vida submarina. — E foi isso que lhe aconteceu? — Sim. Quando esse mortal me pediu para viver com ele para sempre e nunca retornar para meu próprio mundo, entrei em pânico! Vi tudo que meus pais ensinaram se transformar em realidade! — Ele usou de força com você? — Oh, não! Ele fez algo muito mais poderoso. — O quê? — Disse que estava apaixonado por mim. Ouviram-se murmúrios entre as pessoas, mas o estado de Andrew não lhe permitiu distinguir o que diziam. — Fiquei com tanto medo que comecei a nadar para longe. E foi então que ele me feriu. — O governador a feriu? O que ele fez? — Ficou furioso. Eu não fazia idéia de que ele reagiria daquela maneira, pois sempre foi muito gentil e atencioso comigo. Andrew sentiu o gelo em seu coração começar a derreter. — Ele disse que eu deveria voltar para o lugar de onde vim e que não tínhamos mais nada a dizer um ao outro. — Mas não era isso que você queria? Ser livre? — Oh, não! Eu pensei que queria ser livre, porque durante toda minha vida fui ensinada a me manter longe dos mortais. Só que quando retornei para o mar, fiquei desolada e chorava o tempo todo. Descobri que não queria mais ficar sozinha, tendo que me proteger de tubarões e outras criaturas marinhas. — Ela levantou a cabeça e olhou diretamente para a câmera: — Quero deixar de ser sereia e ser mortal como ele. Quero viver com esse mortal para sempre, mas também ser útil para os outros de alguma maneira. O problema é que já sou sereia há tanto tempo que só sei fazer uma coisa. Porém, tenho um plano. — E qual é seu plano? — Bem, sereias também trabalham, sabe. Eu, por exemplo, ensinava jovens sereias a nadar. Algumas nasceram com pequenos defeitos na cauda. Quando isso acontece, é preciso um tratamento especial para que elas consigam se recuperar e nadar tão bem quanto as outras sereiazinhas. Se eu me tomar uma mortal com pernas, o único talento que me restará será esse. O mortal por quem me apaixonei tem uma grande piscina. Pensei em utilizar o mesmo processo com crianças mortais, ajudando-as a se recuperar de suas deficiências. Assim, eu e ele poderemos ficar juntos, trabalhar e sermos felizes. — Tenho certeza de que ele concordará com seu plano. — Oh, espero que sim. Sabe, sempre sonhei em ter um bebê-sereia para ensinar. Agora estou pensando como seria ter um filho de um mortal. Contudo, acho que isso nunca será possível. — Por quê? O governador não a quer mais? É isso que quer dizer? — Sim. Há muito que estou esperando por ele, mas não fui procurada — disse com a voz embargada. — Por isso estou aqui. Tentei subir ao escritório dele, mas perdi todos os meus poderes de sereia e acabei desistindo quando alcancei esse degrau mais alto. A menos que ele venha me buscar, nunca conseguirei me transformar em uma mulher com pernas. — Então terá de ficar como está? — Sim. Incapaz de voltar para o mar e de andar. Será a punição mais cruel que já vi. — Tem todo o direito de protestar. — Isso mesmo! — concordou Randy deixando Andrew para trás e aproximando-se da sereia. Andrew fechou os olhos por um momento. Seu filho tornara-se aliado de Lindsay! Quando abriu os olhos, conteve a respiração, incrédulo. Troy, Alex e Zack, com o pequeno Sean nos braços, também uniram-se a Lindsay e Randy. Toda sua família estava reunida ali! — Hei, chefe — Jake chamou-o —, vai pegá-la no colo e tirá-la daqui ou prefere que algum de nós faça isso? Os lábios de Andrew curvaram-se num sorriso. — Se encostarem um dedo nela, serão homens mortos! — disse e se aproximou de Lindsay. Os olhos azuis pareciam trazer o brilho do mar com eles, hipnotizando-o. Abaixou-se ao lado dela e foi presenteado com um lindo sorriso de felicidade. — Ponha seus braços em torno do meu pescoço, meu amor — Andrew sussurrou. Lindsay obedeceu e ele a tomou nos braços, sem desviar os olhos dos dela. — Você conseguiu, minha linda sereia. De agora em diante será uma mortal e viverá comigo pelo resto de nossos dias. Lindsay abraçou-o com mais carinho, ampliando o sorriso que não saía de seus lábios. — Então me leve para algum lugar onde possamos ficar sozinhos e eu possa tirar minha cauda. Eu te amo, Andrew. — Eu também te amo. Dizendo isso, Andrew deixou as pessoas para trás e levou-a para seu escritório particular. Ele mal havia fechado a porta quando a boca de Lindsay cobriu a dele com indisfarçável urgência, como se sua vida dependesse disso. Beijaram-se com ardor, deixando todos os receios para trás. De súbito, alguém bateu à porta, mas Andrew estava envolvido demais para responder. — Hei, papai? Detesto ter que interromper, mas... — Oh, caia fora, Randy. — Não posso. É para seu próprio bem. Além de tio Zack e tia Alex, todos estão querendo falar com Lindsay, incluindo repórteres e fotógrafos. Será embaraçoso se vocês não aparecerem logo. Darei mais um minuto. Enquanto espero, lembre-se de que está devendo uma viagem às ilhas Caimã para mim e Troy. Lá também é um lindo lugar para uma lua-de-mel, sabiam? Beth ajudara Lindsay a trocar o vestido de noiva por um elegante traje de viagem, digno de uma primeira dama. Estava pronta há meia hora e ainda nem sinal de Andrew. Quando sua ansiedade parecia prestes a fazê-la explodir, ela finalmente ouviu a voz profunda do marido chamá-la do lado de fora do quarto. Foi correndo abrir a porta. — Até que enfim! — exclamou, fazendo com que ele entrasse. — Pensei que algo estivesse errado. Andrew segurou o rosto dela entre as mãos, olhando cada detalhe com ar de adoração. — O que poderia sair errado no dia de nosso casamento? — Eu... eu não sei — sussurrou ela, nervosa. — Vi papai chamá-lo de lado depois da cerimônia e fiquei preocupada, desde então. Zack saiu para levar Randy e Troy ao aeroporto há uns vinte minutos. Logo estarão de volta a Carson City. Não chegaremos muito atrasados para nosso vôo? Andrew beijou-a nos lábios. — Não se preocupe, querida. Ainda temos tempo. Seus pais e eu tivemos uma conversa muito esclarecedora. — Como assim? — indagou ela, curiosa. — Helen e Ned queriam me agradecer por eu haver convencido você a realizar o casamento na casa deles. — Mas... — Apenas ouça — ele pousou o dedo sobre os lábios dela. — Eles pensaram que a idéia de incluí-los nos preparativos havia sido minha. Admitiram que o relacionamento entre vocês três não andava bom há muito tempo. De fato, quando telefonou para eles, há um mês, e contou que íamos nos casar, pensaram que haviam perdido você completamente. Chegaram até a reconhecer que erraram ao se apegarem tanto a você. — Reconheceram? — Lindsay arqueou as sobrancelhas, espantada. Andrew assentiu, beijando-lhe as mãos. — Quando contei que a decisão de incluí-los nos preparativos do casamento não havia sido minha, ficaram muito comovidos com sua atitude. Então eu afirmei o quanto você os ama. Prometeram não interferir mais na sua vida porque não querem perder seu amor. Lindsay, é um passo na direção certa. — Sem dúvida — ela concordou. — Oh, Andrew... — enlaçou os braços em torno do pescoço dele, fitando-o nos olhos. — Como pude ter a sorte de me casar com um homem como você? — Engraçado, eu estava pensando a mesma coisa a respeito da minha nova esposa — ele sorriu. — Embora tenha dito em tom de brincadeira, Randy realmente queria que fôssemos junto com ele para nossa lua-de-mel. Ainda bem que ele reconheceu o absurdo da situação e voltou atrás a tempo. — Sim. Não vejo a hora de conhecer as ilhas Caimã. — Tudo bem, mas nem pense em mergulhos — disse Andrew. — Por mais que você goste de nadar, tenho planos muito mais interessantes para nós dessa vez... Lindsay sorriu e beijou-o sem nenhuma inibição. — Mal posso esperar por eles... * * * * REBECCA WINTERS, americana, mãe de quatro filhos, é formada pela Universidade de Utah. Estudou durante algum tempo na Suíça e na França e atualmente leciona espanhol e francês em escolas de segundo grau, mas sempre arruma tempo para exercer sua atividade favorita: escrever romances de amor. Nell