Sinopse Jane terminava de se arrumar e pensava nos beijos que havia trocado com John na noite anterior. O que havia acontecido? Ele era um cavalheiro, e por isso decidira não pressioná-la? Ou ela não conseguia excitá-lo? Depois de experimentar seus beijos, ele havia desistido de tentar seduzi-la? Bem, se o homem não era um santo, e sabia que ele não era, só restavam duas alternativas: ou ele não se sentia atraído... ou era um perfeito cavalheiro. Kasey Michaels AVENTURA DE VERÃO TRADUÇÃO Débora da Silva Guimarães Isidoro Copyright (c) 2003 by Kathryn A. Seidick Originalmente publicado em 2003 pela Kensington Publishing Corp. PUBLICADO SOB ACORDO com KENSINGTON PUBLISHING CORP, NY, NY - USA Todos os direitos reservados. Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas terá sido mera coincidência. Título original: This Must Be Love Tradução: Débora da Silva Guimarães Isidoro Editora e Publisher: Janice Florido Editora: Fernanda Cardoso Editoras de Arte: Ana Suely S. Dobón e Mônica Maldonado Paginação: Dany Editora Ltda. Ilustração de Capa: (c) Lucky in Love/Daeni, Pino via Agentur Schlücl Gmbl EDITORA NOVA CULTURAL LTDA. Rua Paes Leme, 524 - 10º andar CEP 05424-010 - São Paulo - Brasil Copynght para a língua portuguesa: 2004 EDITORA NOVA CULTURAL LTDA. Impressão e acabamento: RR DONNELLEY Tel- (55 11) 4166-1500 5 Capítulo I - Por favor, Janie, estou desesperada. Não tenho mais ninguém - Molly suplicou enquanto seguia a prima até o pequeno escritório. Travas de segurança impediam que a porta batesse. - Não, Molly - Jane Preston respondeu firme. - Definitivamente, não. - Você me deve essa! Além do mais, precisa sair mais... Não, precisa sair! Jane ajeitou os cabelos castanhos claros e lisos atrás da orelha, sentou-se atrás da escrivaninha bem organizada e cravou os olhos cor-de-mel no rosto da prima. Naquela manhã acordara feliz. Os negócios iam bem, as contas estavam pagas, e encontrara um par de tênis na liquidação. Ainda cabia em todas as roupas do verão anterior. Aos vinte e sete anos, estava procurando uma casa para deixar o lar materno e dar o último passo rumo à independência. E de repente... bam! Molly aparecera. A maravilhosa Molly Applegate, que surgia de tempos em tempos para obrigá-la a lembrar tudo que podia estar faltando nessa existência tão perfeita. Sim, muitas coisas faziam falta em sua vida. Mas Molly jamais saberia disso. - Está melhorando, Molly. Levou cinco minutos para usar o golpe do você me deve essa! Mas não vai funcionar. Molly apoiou as mãos na mesa, e Jane suspirou. Era horrível 6 ter de admitir que invejava o tom de pele da prima, seus enormes olhos azuis, sua altura e, acima de tudo, os seios fartos e firmes. Depois da invenção do sutiã com enchimentos, a situação até que havia melhorado um pouco para ela. - Não? Vejamos... Suzanne Hendersen? Esse nome diz alguma coisa? Lembro-me de ter se queixado quando ela a perseguia e zombava do aparelho em seus dentes. Eu a livrei daquela peste, certo? - Ninguém sugeriu que você a espancasse e nos suspendesse da escola por três dias. E eu não quero falar sobre isso. - Ah, não? Então, por que não falamos da noite em que eu assumi toda a culpa quando seu pai nos surpreendeu entrando em casa às três da manhã com uma multa por excesso de velocidade? - A culpa foi sua, Molly! Você me arrastou para a rua à meianoite depois de ter tido aquele sonho com... Ah, nem lembro mais! - Não importa. Estamos perdendo tempo com detalhes. No final, eu assumi a culpa e salvei sua pele. E ainda nem falamos sobre Billy the Bod. - Pelo amor de Deus, eu tinha quinze anos! - Exatamente! Quinze anos e nunca havia sido beijada, até Billy the Bod. E quem arranjou tudo? Quem? - Ele tinha mau hálito. Desista, Molly, já disse que não vou ajudá-la nisso. - Desistir? Agora que eu ia falar sobre Sean, sobre a grande façanha? Jane sabia que acabariam chegando nisso. - Não há nenhuma grande façanha. São apenas um punhado de situações idiotas e sem importância que eu gostaria de esquecer, e isso inclui Sean Gentry. Eu tinha dezoito anos e não passava de uma idiota, e hoje o homem está preso, caso ainda não saiba, por emitir cheques sem fundos e cometer outras fraudes. E você me empurrou para ele. - Eu não a empurrei para nenhum lugar onde não quisesse estar. Sean foi seu garoto mau, Janie. Toda mulher precisa de um. Talvez dois. Um para aprender, outro para manter. - Que desperdício de virgindade! - Jane suspirou. - Bem, 7 agora sou uma mulher adulta e já não me importo mais com essas coisas. Devia experimentar, Molly. - E ser como você? Não, obrigada. Ah, Janie, por favor! Estou implorando porque preciso de sua ajuda! Jane levantou-se e foi até a janela de onde podia ver o playground. Por que estava resistindo? Podia ser divertido, afinal. - Ainda não entendi bem o que quer que eu faça. - vou resumir a situação - Molly anunciou entusiasmada. - O senador Harrison está deixando todo mundo maluco. Ele será candidato à presidência? Não será? Se vai concorrer, quando fará o anúncio? Se não vai, por que não vai? Ele só quer ser cortejado, ou há algum grande escândalo que o homem está tentando esconder? Alguém precisa descobrir. Alguém tem de revelar ao mundo o que ele pretende fazer antes que o senador surpreenda a todos! - Por que acha que tem de expor a vida de uma personalidade pública? Aposto que não pergunta ao seu médico se ele tem amantes ou é fiel à esposa. Só quer saber se ele é competente. E onde é que você entra nessa história? - Onde você entra. Muito bem, vai haver uma festa... um evento daqui a um mês. Uma semana em Cape May, Nova Jersey. Muito sol, mar, areia branca e macia... - Sei onde fica Cape May, Molly. - E estava começando a se animar com a idéia de passar dois ou três dias na praia, convivendo com senadores e outras personalidades de projeção nacional, e sem gastar absolutamente nada! Depois de ter passado meses tentando convencer Mason Furbich de que, mesmo aos quatro anos de idade, ele não podia baixar a calça para mostrar seu "esguicho" aos coleguinhas, seria uma mudança mais do que agradável. - Continue. - Bem, esse é um evento anual que reúne intelectuais e seus convidados. Os participantes são escolhidos pela organização. Às vezes até o presidente em exercício aparece, embora dessa vez ninguém acredite nessa possibilidade. Esses intelectuais se reúnem e discutem Platão, proliferação nuclear, o significado da vida, toda essa bobagem. O senador vai estar lá. Eu tinha de estar lá. Seria minha grande chance. Jane encarou a prima. 8 - Por isso convenceu uma amiga que é dona de uma agência de acompanhantes em Washington a indicá-la para um dos participantes solteiros. Quanta genialidade, Molly! Quem pensaria nesse tipo de coisa? - Eu, é claro.-Ela riu.-Exatamente, tudo estava planejado. Eu iria ao evento como acompanhante do senador, e não teria de fazer nenhum sacrifício, porque se trata de uma ocasião séria, na qual não acontecem envolvimentos clandestinos, romances tórridos ou coisas do tipo. Enfim, eu iria, me tornaria amiga do senador, ele me contaria seus planos, e eu teria um grande furo para salvar meu emprego. O que poderia ser mais fácil? -- Não faço a menor idéia. - O plano era perfeito. Ninguém saberia que sou repórter. - Mas você não é repórter! É só secretária de um dos editores e ainda está em período de experiência. - E corro o risco de não ser efetivada, só porque perdi um recado deixado por um sujeito que estava investigando transportadoras que despejavam lixo hospitalar em locais proibidos! - Molly suspirou. - Se conseguir esse furo, não só salvarei meu emprego, como serei promovida a repórter. Prêmio Pullitzer, aqui vou eu! - Vá em frente. Telefone quando chegar lá. - Janie, acho que ainda não entendeu. O senador Harrison é viúvo, mas não quer levar nenhuma mulher ao evento. E ele também não irá sozinho, como descobri ontem. Ele vai levar o sobrinho, Dillon Holmes. - Sim, eu sei, aquele rapaz com quem você saía logo depois de ter se formado, quando fazia aquele estágio em Washington. Você já disse isso. - Exatamente. E Dillon Holmes me odeia por alguma razão desconhecida. Ele disse que sou inconstante, como se isso fosse uma terrível falha de caráter. Mas eu ainda mando aquelas minhas cartas de Natal, e o computador emite os rótulos com os endereços. Ainda não me lembrei de remover o nome de Dillon da lista, o que significa que ele também recebeu uma carta. Jane suspirou. Odiava as cartas de Natal de Molly. Quem queria saber o que ela havia feito durante o ano? Era muita arrogância! 9 .- Talvez ele não tenha lido a carta - disse. -- Janie, todos lêem minhas cartas! Além do mais, Dillon também me mandou um cartão, o que significa que também tem o meu endereço. E ele sabe que estou tentando entrar nesse jogo da imprensa. - Para você, a vida é um jogo. - Não importa. Mesmo que Dillon não tenha lido minha carta, o homem me odeia! Eu não conseguiria me aproximar do senador Harrison. Mas você pode pôr meu plano em prática. Pode ir no meu lugar, conseguir o furo de reportagem para mim, e em troca eu... eu... Ah, não sei. O que você quer? - Uma declaração assinada e registrada em cartório de que essa é a última vez que me pede alguma coisa. E, é claro, vai ter de cuidar de tudo aqui por mim. Molly empalideceu. Ela olhou em volta como se temesse ser atacada pelos objetos de plástico colorido. Objetos infantis. Do lado de fora, os sons também eram infantis. Crianças gritando. Rindo. Falando. Chorando. Exigindo. Seus traseiros deviam estar molhados, e suas mãos estavam sempre meladas. E ela ainda nem conhecera Furbich Esguicho. Molly sempre havia perguntado por que Jane usara a herança deixada pela avó para comprar uma pré-escola. Em sua opinião, teria sido melhor empregar o dinheiro numa oficina de tatuagem e colocação de piercing. Finalmente, ela falou: - Que tal um pulmão? - Tenho dois... - Não. Se quer minha ajuda, Molly, vai ter de retribuir de alguma forma. Uma retribuição real. E é isso que eu quero. Vai ficar aqui em Fairfax, cuidando da escola infantil Preston. Vamos estar fechados por quase toda a semana, porque teremos o feriado de quatro de julho e eu sempre dou férias aos funcionários nessa semana e na próxima. Você só vai ter de ficar aqui por dois dias. Nem você pode criar problemas num período tão curto. - Quer apostar? - É pegar ou largar. - Eu pego... desde que faça o senador Harrison desnudar a alma para você. 10 Pelo amor de Deus! Já vi algumas fotos do senador, e prefiro que ele não desnude nada na minha frente. Vamos apenas conversar, está bem? - Ah, já está entrando no espírito da coisa! Humor, Janie, querida. Essa é a chave. Manteremos contato pelo celular, e eu formularei todas as perguntas que terá de fazer ao senador. - E depois estaremos quites? Mesmo que o senador não queira falar comigo, mesmo que eu não descubra nada? Nunca mais virá atrás de mim dizendo que eu lhe devo alguma coisa? - Nunca mais. Relaxe, Janie. Nada pode dar errado... A casa lembrava uma coleção de caixas empilhadas de maneira aleatória sobre a colina no subúrbio de Fairfax, Virgínia. O resultado era surpreendente em sua beleza. Janelas no fundo da casa deixavam ver uma paisagem esplêndida, daquelas que valiam milhares de dólares quando alguém ia comprar um imóvel, e por isso era tão estranho que o homem mantivesse sua velha cadeira de couro voltada para uma parede. Mas John Patrick Romanowski, o homem que ocupava aquela cadeira, tinha seus motivos, e o mais importante deles era que precisava de uma parede vazia para poder criar. Se ficasse olhando para a paisagem, em vez de concentrar-se na tela do computador, logo estaria produzindo poemas bobos sobre cervos, coelhos e vistas bucólicas... o que significava que logo não poderia mais manter aquela enorme mansão de madeira e vidro na colina. Já era difícil resistir ao apelo do jogo de paciência que viera instalado em seu computador! Bem, talvez não falisse. Isso seria impossível, a menos que decidisse investir todos os seus milhões em uma empresa virtual para vender palitos de dente on-line. - Não estou ouvindo o barulho do teclado, John Patrick. Rindo, ele girou a cadeira para ver sua tia Marion entrando no escritório com uma grande sacola de papel pardo. - O que é isso? - John Patrick levantou-se para ir ajudá-la. - Não sei. O correio entregou há alguns minutos. O que pode ser? Mais uma daquelas coisas estranhas que tem recebido ultimamente? 11 - Já expliquei a razão de todas essas encomendas esquisitas, tia Marion. - Ele abriu a sacola e encontrou um calção de banho listrado em verde e amarelo e uma jaqueta nas mesmas cores confeccionada com um tecido felpudo e estranho. - Meu Deus! - Marion exclamou horrorizada. - Seu tio Fred usou uma coisa dessas em mil novecentos e cinqüenta e seis! John, não pode estar pensando em vestir isso em público! - Horrível, não é? - O calção de banho cobria suas pernas até os joelhos e poderia servir de pára-quedas, caso ele caísse de um avião. - Horrível? Isso é atroz, ridículo, absurdo e... - Nerd? - Sim, sim, para quem insiste em ser óbvio... Nerd. John pegou a jaqueta, enrolou-a no calção e jogou as duas peças sobre a pilha de roupas que crescia em um canto do escritório. - Perfeitas - disse satisfeito. Marion Romanowski olhou para o sobrinho. Ele era glorioso. com um metro e noventa de altura, ele era musculoso e estava sempre bronzeado. Os olhos azuis, como os de seu querido e falecido Fred, eram irresistíveis. Fred havia sido louro, mas John era moreno como o pecado, resultado da herança cigana que se fazia presente em alguns membros da família de gerações em gerações. com cabelos negros e o corpo recoberto pela quantidade exata de pêlos, ele pretendia esconder toda essa maravilha numa tenda circense verde-e-amarela! - Essa sua idéia é ridícula - Marion insistiu. - Você nunca foi fotografado. Isto é, sei que todos os seus livros trazem aquela fotografia sem foco e escura na contracapa, mas ninguém poderia reconhecê-lo depois de vê-la. Se não soubesse que a falta de qualidade foi exigência sua, acho que processaria o fotógrafo! Para que usar um disfarce, se ninguém conhece seu rosto? E por que um nerdl John abriu a gaveta da mesa e pegou sua mais recente e brilhante aquisição: óculos de armação de plástico preto, à qual ele acrescentou fita adesiva branca na porção que ficaria sobre o nariz. - Porque, tia Marion, ninguém leva a sério os nerds. 12 Marion odiou ver seu belo sobrinho escondido atrás daqueles óculos ridículos. - Use esses óculos com o calção de banho e todas aquelas atrocidades que andou comprando, e nem eu serei capaz de levá-lo a sério. - É esse o ponto. - John removeu os óculos e jogou-os sobre a pilha de roupas. - Não faça isso! Quer quebrar os óculos? - Seria ótimo. Eu poderia usar um clipe no lugar do parafuso de encaixe. Sim, é o que vou fazer, mesmo que eles continuem inteiros. Será minha pièce de résistance. - Não vai ter de fazer nenhum esforço para que as pessoas resistam, pode ter certeza. E ainda acho que não precisa de um disfarce para fazer sua pesquisa. Nunca precisou... embora tenha usado muitos bigodes postiços, lentes de contato coloridas e outras coisas. Só faz isso porque é divertido, porque ainda é um menino nessa embalagem de adulto, e dessa vez vai se disfarçar por causa daquele monstro, o tal Harrison. Mas isso? - Ela abriu os braços. - Isso é demais. John riu e voltou para frente do computador. Havia deixado o catálogo do evento em uma gaveta, e ele a abriu para examinar mais uma vez o impresso. Parte interessante, parte um amontoado de tolices, como havia dito tia Marion, o evento era um segredo bem guardado, graças a uma porção compreensiva da mídia que se dispusera a tudo para ser incluída na lista de convidados. John foi virando as páginas, lendo os títulos das impressionantes relações de workshops e seminários, alguns ao ar livre, na praia, outros no centro de convenções do hotel em Cape May, Nova Jersey. Refeições comunitárias, lugares marcados à mesa. Comida simples, conversa igualmente simples. Sem títulos, sem protocolos, sem vaidades... ou pelo menos era essa a proposta. Uma troca aberta de idéias. Uma chance de recarregar as baterias, ouvir vários pontos de vista, conviver com alguns dos cérebros mais privilegiados do país. Um tesouro de oportunidades para JP Roman, escritor de suspenses 13 de cunho político e número um da lista de best-sellers do New York Times. Felizmente, o convidado era John Patrick Romanowski, professor universitário. Ninguém sabia que John Patrick era JP. Ninguém, exceto tia Marion e Henry, e era assim que queria manter a situação. Adorava o trabalho. O que havia começado como um hobby acabara se transformando em, até o momento, oito best-sellers na lista do New York Times, todos relacionados aos altos e baixos da política nacional, normalmente com um ou dois assassinatos para garantir o progresso e o ritmo da história. Mas agora era pessoal. Pessoal porque se relacionava à pessoa do senador de Nova Jersey, Aubrey Harrison, um sujeito popular, carismático e até solidário desde a morte de sua segunda esposa. Filho favorito de todo cidadão americano, ele era o provável candidato do partido para a próxima eleição à presidência. Pensar nisso afetava diretamente o estômago de John. Ele fechou os olhos e pensou na mãe, morta há quinze anos. A mãe, que o criara sozinha depois que seu pai deixara o escritório em companhia da secretária adolescente para nunca mais voltar. Sua mãe, que havia ido trabalhar para o então novato no cenário político nacional, um jovem senador de Nova Jersey, a fim de pôr comida na mesa e garantir um teto sobre a cabeça de seu filho. Sua mãe, que se apaixonara loucamente por Aubrey Harrison, o homem que lhe havia prometido a lua, e depois a abandonara para casar-se com a filha de um de seus maiores contribuintes. Maryjo Romanowski nunca se recuperara dessa segunda decepção amorosa. Aos dezoito anos, John era um órfão e já havia passado seis anos vendo a mãe definhar, ser hospitalizada e voltar para casa, sempre vivendo em seu mundo atormentado até morrer sozinha. A segunda esposa do senador não tivera mais sorte do que sua antecessora ou Maryjo Romanowski. Havia comentários sobre ela ter se entregado à bebida depois de decepcionar-se muitas vezes com o marido mulherengo. Por isso ela caíra da escada da casa em Georgetown no ano anterior, quebrando o pescoço. As conexões do senador haviam mantido em segredo o alcoolismo 14 da mulher, e a mídia nunca questionara o "trágico acidente", mas JP Roman tinha suas fontes, e bolsos profundos o bastante para comprar informações que de outra forma jamais teriam sido divulgadas. Alguns dólares oferecidos às pessoas certas, algumas conversas oportunas com empregados insatisfeitos, e acabara descobrindo tudo sobre o amor da mulher pela bebida, as discussões e as brigas violentas que, não raras vezes, culminavam em agressões físicas entre marido e mulher. Se trabalhasse para um jornal, jamais poderia publicar o que sabia. Podia criar um personagem como Harrison e usá-lo em uma de suas tramas, mas isso não seria suficiente para derrubar o influente político, nem mesmo com duas esposas mortas para completar o interessante conjunto de personagens. Tudo que conseguiria seria um processo, caso Harrison se sentisse injustiçado ou ofendido pelas semelhanças. O que queria, queria muito, era pegar Harrison envolvido em algum escândalo, alguma coisa que a mídia não pudesse ignorar e que os eleitores jamais perdoassem. Estava certo de que só uma mulher conseguiria tal feito. Ah, sim, as mulheres, John sabia tudo sobre as mulheres na vida de Harrison. Todas lindas, jovens e substituíveis. Descobrira tudo sobre Harrison, o Feliz, como a imprensa costumava chamá-lo. Mas a imprensa nem sempre era a entidade verdadeira e franca que gostava de apregoar ser. Não quando o senador Harrison e a mídia mantinham relações tão amistosas e próximas. O senador até possuía uma unidade em um condomínio da Flórida cujo proprietário era seu maior contribuinte, também o maior patrocinador do programa de entrevistas de maior audiência na tevê nas manhãs de domingo. Harrison era apenas um dos dez ou doze condôminos no edifício também ocupado, entre outros, pelo presidente de uma das maiores redes de comunicação do país, pelos dois âncoras do programa político de maior prestígio da tevê e pelo diretor de jornalismo da maior rede de notícias da tevê a cabo. Eram todos como uma grande família, cada um vivendo dos bolsos dos outros... e cobrindo os traseiros dos outros. 15 John havia examinado as escrituras dos apartamentos, documentos registrados em nome de corporações fantasmas ou de cunhados idiotas, e encontrara os preços de venda variando entre cinqüenta mil e duzentos mil dólares, sendo que cada unidade valia mais ou menos um milhão de dólares. Mas não estava se importando com isso. Não nesse momento; esse tipo de situação era mais apropriada para ambientar os enredos de seus livros. O último, Shallow Ground, se desenrolava em torno do assassinato de uma congressista fictícia em um condomínio também fictício na Flórida. Esse havia sido o máximo que conseguira se aproximar sem ser detido por Henry. O que queria, o que realmente queria, era se aproximar do senador Harrison e depois encontrar uma maneira de destruí-lo. Por Maryjo, e talvez pelo menino que John Patrick Romanowski havia sido um dia. Aubrey Harrison, presidente dos Estados Unidos? Não. Não se JP Roman pudesse evitar. O evento em Cape May era a ocasião perfeita, uma chance que caíra em seu colo e que não pretendia desperdiçar. Todos os presentes seriam convidados. Harrison se sentiria seguro, e por isso não estaria prevenido. E então John atacaria, encontraria o ponto fraco do homem e, de alguma maneira, impossibilitaria sua candidatura à presidência. Se estivesse escrevendo um de seus livros, saberia que esse enredo era tênue, frágil, o que tornava pequena a chance de sucesso. Esperava que o conjunto de personagens, até então apenas um esboço, pudesse proporcionar mais ação. Pensando nos personagens... John deixou o convite sobre a mesa e pegou a ficha de arquivo que estivera examinando uma hora antes. Ali estavam os dados de sua acompanhante para a semana. - Jane Preston - disse em voz alta, repetindo o nome que anotara a lápis depois de riscar o de Molly Applegate. A agência o convencera a aceitar a srta. Applegate, mas esperava que a substituta fosse igualmente apropriada. Precisava de beleza. Precisava de desenvoltura. Não precisava 16 de muita inteligência. Mas era imprescindível que a mulher em questão tivesse padrões morais flexíveis. Precisava de uma isca atraente para despertar a atenção do senador mulherengo, porque então poderia pegá-lo em momento de vulnerabilidade. - Jane Preston - ele repetiu. - Espero que ela não seja uma mulher comum e sem graça, ou terei de recorrer ao plano B... Mesmo porque, não existe nenhum plano B. 17 Capítulo II Jane pôs fim à briga entre os dois meninos de quatro anos de idade e, satisfeita, sorriu para a prima. - Espero que tenha prestado atenção à técnica. - Eu? - Molly reagiu assustada. - Por que preciso saber esse tipo de coisa? vou substituir você no escritório... certo? com a porta trancada e as paredes à prova de som. - Molly, ou leva isso a sério, ou não vai mais haver nenhum acordo entre nós. - Tudo bem, tudo bem - Molly concordou apressada. - Prometo que vou ser perfeita. Mas não hoje, está bem? Hoje vamos às compras. - Compras? Para quê? - Precisa de mais estilo, Jane. - O que há de errado com o meu estilo, Molly? - É sem graça. Não pode ir ao encontro vestida desse jeito. Precisa provocar um... impacto, ou o senador Harrison nunca irá notá-la. - Escute aqui, estamos falando de um evento para intelectuais, não de um episódio do Barco do Amor. - É claro. Vai fascinar o homem com sua habilidade intelectual. Sei... - Por que não? Tenho um bom nível de conhecimento e posso conversar sobre qualquer assunto. 18 - É claro. Mas, antes de conversar com Harrison, tem de se fazer notar. O senador precisa saber que você existe. Ou Dillon... - Dillon Holmes? Aquele que a odeia? - Sim, o sobrinho do senador. E ele é um deus grego, caso eu ainda não tenha mencionado. Olhos verdes, cabelos louros, um físico de fazer sonhar... - Cale a boca, Molly. vou a esse encontro para conseguir uma história para você e um bronzeado para mim. Não vou admitir que me trate como uma... uma... Não. Esqueça. - Não seja boba. Já estive dando uma olhada nas lojas e encontrei tudo que queria. Um biquíni, algumas calças e tops, sandálias... Ah, e você tem hora marcada com Angel. - Angel? Quem é ela? - Ele, querida. Angel é um dos melhores cabeleireiros em Fairfax. É claro que podemos ir a Washington, se preferir, mas Rafael, meu estilista capilar, garantiu que Angel é maravilhoso. - Molly, não posso sair daqui. Estou trabalhando. Preciso redigir instruções, entrar em contato com alguns pais e receber um novo cliente. - Não confia nos seus funcionários? - É claro que sim. Mas faço questão de conversar com os pais pessoalmente. E nesse caso, a situação é ainda mais difícil, porque não será o pai ou a mãe da criança, mas uma tia, e o aluno só freqüentará a escola por duas semanas, enquanto os pais estão num cruzeiro. Preciso deixar tudo encaminhado por aqui, ou não poderei partir para Cape May em três dias. - Não mesmo. Não com essa aparência. - Molly pegou a bolsa de Jane, segurou-a pelo braço e arrastou-a para a porta. - O que é aquilo? John sorriu para a tia e jogou as chaves do carro sobre a mesa do hall. - Estava espiando pela janela, tia Marion? - Estava. Que coisa ridícula é aquela estacionada lá fora? -Um Volkswagen conversível. Amarelo. Trata-se de uma verdadeira antigüidade, um carro de 1984 totalmente reformado e pintado, uma... 19 Já entendi, John Patrick, e continuo gostando mais da Ferrari, apesar do vermelho ser brilhante demais. Prefiro até a motocicleta. Pretende ir a Nova Jersey dirigindo aquela... coisa? - É claro que sim, e com grande economia de combustível. O carro tem duzentos e quarenta mil quilômetros, o banco do passageiro está escorado com um tijolo, mas é seguro. Eu o peguei emprestado de um aluno. - Quer dizer... que emprestou sua Ferrari a um daqueles garotos? John sorriu. - Eu bem que tentei, mas ele não quis. Disse que era muito... clássico. Bruce é um bom rapaz, mas é muito metódico. Por isso pedi seu carro. É perfeito para um nerd. - Humph! - Marion passou por ele a caminho do escritório. - Sua bagagem chegou enquanto você estava fora. Malas listradas, John Patrick. Francamente! Ele a seguiu e sorriu ao ver as malas num canto da sala. - São melhores do que eu esperava! - Você está doente, John Patrick Romanowski. Outras peças haviam chegado, e ela apontou para a pilha sobre uma cadeira. Um paletó de tweed marrom com reforços de couro nos cotovelos, quatro calças de pregas, todas marrons e com barras estreitas, várias camisas brancas de colarinhos e punhos engomados, dois pares de mocassins, sandálias de praia com solas grossas de borracha preta que lembravam tiras de pneus, um par de tênis barato. E meias brancas com listras nas barras. E seis gravatas-borboleta. Seis. - Eu não atravessaria a rua com alguém vestido desse jeito, John. E marrom não combina com sua cor. Vai parecer um boneco de barro. - Intelectual, tia Marion. Sério. Inofensivo. E nerd. - Estou começando a odiar essa palavra. E você cometeu um erro, meu caro sobrinho. Um nerd é sempre compulsivo quanto à limpeza e à arrumação de suas coisas, especialmente das roupas, bom as suas estão amarrotadas. - Isso quer dizer que preciso de sua ajuda. 20 - Eu sabia. Mas, se eu passar suas roupas, vai pendurá-las quando chegar no hotel? - No armário? Acha que sou capaz disso? - Não. Acho que estaria melhor em um chiqueiro. Mas, se está mesmo levando a sério esse disfarce de nerd, é melhor se esforçar, porque vai ter de ser limpo e organizado por uma semana inteira - Prometo que vou me esforçar. Jane saiu da loja certa de que jamais usaria as roupas que Molly havia escolhido e pago. Os biquínis eram minúsculos, todos com enchimento nos sutiãs, as saias eram curtas demais, as calças, muito justas, e os tops mais revelavam do que escondiam. Felizmente havia também uma jaqueta com capuz e um suéter para amarrar sobre os ombros, porque, de acordo com Molly, ninguém vestia suéteres. E os shorts? Melhor nem pensar neles. Vestidos de noite, sandálias e sapatos... Jane adorava sapatos. De qualquer maneira, sentia-se como a virgem que era preparada para receber o sheik, exceto que não era uma virgem e há muito desistira de encontrar um sheik, um príncipe ou qualquer outro similar de conto-de-fadas. Mas estava entrando no espírito da coisa. Meia hora mais tarde, as duas eram recebidas no salão de beleza por um rapaz de aparência latina com uma camiseta muito justa, preta e transparente e um estômago plano como Jane nunca havia visto antes. - Molly, querida! - ele exclamou entusiasmado. - Rafael telefonou recomendando atendimento especial. Chegou bem na hora! - E como eu poderia me atrasar para uma sessão de massagem com Rose? Todos dizem que ela é esplêndida. Essa era Molly. Ela morava em Washington, mas cinco minutos em qualquer outra cidade eram suficientes para que ela conhecesse todos os lugares. Os melhores salões, as melhores butiques... E todos a adoravam. Todos queriam agradá-la. Devia ser um dom natural. Jane tinha o dom de lidar com crianças, 21 filhos que nem eram dela, e nesse momento a situação parecia injusta. Tentando esquecer as circunstâncias atuais, ela se deixou levar para o interior do salão. Felizmente, Molly estava pagando por tudo, ou teria de vender a escola para arcar com os custos da transformação a que se submetia. - Srta. Applegate, Rose a está esperando - disse a recepcionista. - A srta. Preston pode vir comigo, por favor. Angel vai cuidar dela. Jane sentou-se na cadeira e viu um rosto assustado refletido no espelho. - Você tem sorte, querida - disse Angel enquanto examinava seus cabelos. - Fios saudáveis, inteiros... Vamos adotar um corte simples e prático, mas temos de pensar em mais alguma coisa. Temos de realçar seu estilo. - Como? - Textura, meu bem. Luzes. Sim, é isso. Uma pequena animação. - Animação? Ah, eu não sei... -Olhe para mim, meu bem. Acha que meu cabelo é dessa cor? Jane examinou as mechas negras e notou uma certa luminosidade vermelha entre elas. - Imagino que não. Usou tinta... vermelha? - Exatamente. No seu caso, podemos escolher uma tonalidade mais adequada aqui no painel. - Ele apontou para um quadro na parede. Centenas de nuances diferentes podiam ser vistas alinhadas naquele quadro, um verdadeiro arco-íris de cabelos. - Já entendi. Quer que eu faça uma tintura. - Pelo amor de Deus, não diga essa palavra! Você vai fazer uma... coloração. - Ah, sim... Se você diz... Que tinta... cor acha que devo usar? - De qual você gosta? Procure escolher entre os tons compreendidos nesse trecho. - Ele apontou para uma parte do cartaz. - São os mais apropriados para cabelos castanhos como os seus. - As tonalidades iam do marrom-claro ao louro e compreendiam duas dúzias de cores diferentes. - Escolha dois tons. Quanto mais 22 sombras usarmos, mais natural será o resultado E prefira as nuances mais claras. São mais próprias para o verão. Jane olhou para as amostras - Gosto desta - disse, tocando uma mecha em particular - E desta - Caramelo e creme! Oh, meu Deus, você tem uma personalidade marcante! Quem precisa de sutileza? Vamos fazer mechas! - Mechas? Caramelo e creme? Afinal, iam pintar seus cabelos ou preparar um doce? - Sim, sim, mechas! Nada de reflexos sutis! Lampejos de cor! Marcantes! Já posso até ver o resultado! Dramático! - Dramático? - Jane suspirou - Ah, bem se você diz Marion Romanowski estava molhando as flores no canteiro quando seu sobrinho saiu de casa carregando três das cinco malas novas - Oh meu Deus John Patrick deixou as malas no chão e deu uma volta para exibir-se Sabia qual era sua aparência: um metro e noventa e cinco do mais puro nerd Vestia uma calça marrom curta demais e uma camisa listrada em branco e rosa de mangas curtas e abotoada até o colarinho. O cinto era preto e tinha uma fivela em forma de ferradura. Os sapatos eram mocassins marrons e as meias eram brancas. Ele usava os óculos de plástico com um pedaço de fita adesiva na altura do nariz e penteara os cabelos para trás com um produto gorduroso que encontrara no banheiro da tia, complementando o estilo com uma risca lateral A gravata borboleta estava no bolso da calça, caso decidisse usá-la - Olá, senhora - ele disse sorrindo - Sou o professor Romanowski. Estou aqui para a Sexta Reunião Anual dos Intelectuais. Reservei uma suíte. Aposentos para não-fumantes, evidentemente E espero que tenham sabonete neutro. Sou alérgico, sabe? Trouxe meu inalador, mas o sabonete perfumado sempre aumenta minha produção de muco. 23 Marion fechou a mangueira e cobriu a boca com a mão. - Não pode estar pensando em dizer essas coisas! Inalador? Produção de muco? John, francamente! - Acha que é exagero? - Essa roupa é um exagero! Não precisa nem abrir a boca para dizer esse amontoado de tolices! E por que acha que o senador Harrison vai reconhecê-lo ou ligá-lo a Maryjo? E por que acha que vai convencer nesse disfarce de nerdl Já olhou para os músculos dos seus braços? Nerds não se exercitam! Ninguém ganha músculos trabalhando em um computador ou movendo peças de xadrez! Sua farsa será desmascarada assim que você aparecer usando aquele ridículo calção de banho. - Acha mesmo que exagerei, tia Marion? - Certamente. Já se divertiu, e eu não interferi, porque toda essa brincadeira serviu para distraí-lo por algum tempo do senador Harrison e de Maryjo, mas agora chega. - Estou fazendo isso por um país que não merece um bastardo como Harrison. Minha atitude não tem nada a ver com Maryjo. - Minta para você mesmo, se quiser, mas não vai me enganar. E lembre-se de que vai a esse evento disfarçado, não fantasiado. Imagino que seja capaz de apresentar-se como uma pessoa inofensiva e sem graça sem se transformar em um palhaço. - Não tenho muito tempo, tia Marion. Preciso sair daqui a vinte minutos. Minha acompanhante vai me encontrar às onze em Washington. - Se não quer que ela saia correndo e gritando, é melhor voltar e mudar algumas coisas nesse seu disfarce. - Sabe de uma coisa, tia Marion? Você é uma desmanchaprazeres. - Alguém precisa contê-lo, John. 24 Capítulo III Jane acenou para Molly e respirou fundo. Sua prima a deixara na Taylor's Escorts e partira, e de repente era difícil conter o nervosismo. Imogene, a proprietária da agência de acompanhantes, havia desaparecido para cuidar de algum detalhe no escritório. Era sábado, dia da abertura do encontro em Nova Jersey. Em dois dias, Molly assumiria o comando da escola e ficaria por lá até terça-feira, quando fechariam para duas semanas de férias. Quarenta e oito horas. O que alguém podia fazer em um período tão curto para destruir seis anos de trabalho duro? Jane estava nervosa. Bem, pelo menos tinha confiança em sua aparência. Vestia uma saia curta e estampada e uma blusa verde que mal cobria seu estômago. As sandálias eram altas, mas o couro era macio, e três correntes de ouro adornavam seu pescoço, um pulso e um tornozelo. Um toque de requinte, como dissera Molly. Até seu relógio havia sido confiscado. A peça feita em plástico colorido e à prova de água fora trocada por outra em ouro quatorze quilates. Mas era o cabelo que a obrigava a olhar para todos os espelhos pelos quais passava. Adorava a maneira como os fios acompanhavam cada movimento de cabeça, voltando sempre ao mesmo lugar. E adorava as cores. Caramelo e creme. Faixas nas duas tonalidade se misturavam à cor natural, criando um conjunto novo e luminoso que dava ao rosto uma aparência diferente, mais leve e radiante. A maquiagem também era impressionante. Yvette, uma colega 25 de Angel, havia escolhido os tons mais apropriados para sua pele e ensinara como usar os produtos que agora estavam em sua bolsa, numa delicada e elegante nécessaire. Era surpreendente a quantidade de cosméticos de que uma mulher precisava para parecer natural. Mas Jane praticara com os produtos, e tinha de admitir que o esforço era mais do que recompensado pelo resultado. Preparada para a batalha, agora iria ao encontro do grande e poderoso senador Harrison. O objetivo era voltar para casa com o troféu Eu Sei O Que O Grande Homem Vai Fazer. Devia estar nervosa com a missão, mas não estava. Afinal, só precisava tentar cumprir sua parte no acordo com Molly. Era John Romanowski que a assustava. Molly e Imogene haviam explicado que Romanowski só queria uma companhia feminina porque todos os outros iriam acompanhados, como na Arca de Noé. Ele não esperava nada além de sua presença. Ficariam em quartos separados e manteriam uma relação simplesmente comercial. Então, por que continuava tão nervosa? Por acaso não havia desistido de sonhar com o príncipe encantado? Estaria esperando que a semana fosse mágica de alguma forma? Não. Sabia que o professor Romanowski era apenas um homem como qualquer outro. E como qualquer outro homem, ele estava atrasado. Jane aproximou-se do vidro ao ver um carro parar em local proibido na frente da agência. Tivera um automóvel muito parecido com aquele aos dezoito anos, quando tirara sua carteira de habilitação. Um Volkswagen conversível. Não via um daqueles há anos! A capota erguida fazia com que o carro lembrasse uma abelha gigante. Não conseguia ver o motorista, mas devia ser um adolescente. Quem mais dirigiria aquilo? De repente o motorista abriu a porta e saiu do automóvel. Não. Definitivamente, não era um adolescente. Aquele corpo pertencia a um adulto. Um adulto estranho, certamente. Por que alguém se vestia daquela maneira? Sapatos sem meia, calça preta de pregas na cintura, 26 camisa listrada em verde e azul e abotoada até o colarinho... Ele não parecia estar confortável. Os vincos na calça e as marcas de ferro de passar na camisa sugeriam um estilo formal, compenetrado... incongruente com a pessoa que usava aquelas roupas. Mas foi o rosto que mais a impressionou. Um belo rosto. Pena que ele usasse aqueles horríveis óculos de plástico preto. E os cabelos negros? Por que ele os engomava para trás? Sua aparência sugeria pouco mais de trinta anos, uma idade em que as pessoas já não dirigiam velhos Volkswagens conversíveis. E os braços? Musculosos, peludos... Os ombros eram largos, e o estômago era tão plano quanto o de Angel. Não era seu tipo. Preferia os louros. E gostava de homens um pouco mais baixos, com físicos menos atléticos. E menos peludos. Menos ostensivos em sua masculinidade, embora esse homem em particular fosse um nerd. O homem voltou para dentro do carro e ela respirou aliviada. Por um momento havia imaginado que ele podia ser o professor Romanowski. Ele tentava baixar a capota, mas o mecanismo parecia estar emperrado. Sua capota também emperrava, como aquela. O desconhecido saltou do veículo e, irritado, começou a puxar a capota com as próprias mãos. - Ei, não faça isso! Vai acabar de quebrar o mecanismo! - Jane batia na janela, mas ele não a ouvia. Então, ela pegou a bolsa e saiu, deixando a bagagem no interior da agência. - Não faça isso! - repetiu ao pisar na calçada. Ele nem se virou. - Por que não? vou arrancar essa droga de capota e jogá-la no meio da rua! - Muito bem! Destrua um belo Volkswagen 1984. - Por que não? Nesse momento ele se virou para encará-la. - Conhece esse carro? - perguntou surpreso. - É claro que sim. Talvez tenha sido uma de suas donas, se o comprou em Fairfax. O mecanismo pode ser o mesmo, a julgar 27 pelo que acabei de ver. Afaste-se, por favor. Talvez eu possa ajudá-lo. O desconhecido olhou para a porta da agência e arregalou os olhos. Jane virou-se a tempo de ver Imogene apontando para ela e sorrindo. - Seu nome é John Romanowski? - E o seu é Jane Preston? As perguntas serviam também de respostas, e por um instante os dois ficaram em silêncio. - bom. Muito bom - Romanowski disse finalmente. Mau. Muito mau, Jane pensou, embora sorrisse com aparente entusiasmo. "Queria um príncipe e vou ter de passar a semana com um sapo. Ou melhor, com um macaco peludo e grandalhão. Mim Jane, você Tarzã. Oh, meu Deus! Em que estava pensando quando concordei com essa loucura?" - Vamos viajar nessa... coisa? - ela perguntou desanimada. - Sim, e espero que saiba como abaixar essa maldita capota. - Oh, céus... - Jane suspirou resignada. - Tudo bem, eu cuido disso. Talvez não funcione como funcionava com o meu, mas não custa tentar. - Ela entrou no carro pela porta do motorista e deu três socos no painel. A capota deslizou silenciosa para baixo. - Impressionante! - John comentou ao vê-la sair do veículo. - Bobagem. Qualquer pessoa pode fazer o mesmo. - Imagino que sim. - Bem, vou buscar minha bagagem. E, se fosse esperta, convenceria Imogene a ajudá-la a escapar pela porta dos fundos. Mas a dona da agência nem se dispôs a discutir a possibilidade de uma fuga. Em vez disso, ela colocou alguns papéis sobre o balcão e pediu sua assinatura neles. - O que é isso? - Jane perguntou intrigada. - São contratos. Apenas um conjunto de regras para garantir a contratada, no caso você, e a agência, se o professor Romanowski decidir que você não se adapta às suas necessidades. - Necessidades... dele? Quais, por exemplo? - Um rosto bonito e sorridente, conversa interessante, uma 28 boa dançarina... e sigilo absoluto. Precisa assinar esse acordo garantindo que não revelará a ninguém nada do que ouvir ou presenciar no encontro. O outro contrato é da agência. - Deixe-me ver esses documentos. Jane leu o contrato da agência e decidiu assiná-lo, porque conheceu nele apenas algumas cláusulas comuns, se é que pod chamar de comum esse negócio de vender-se como acompanhante para um desconhecido. Mas o segundo conjunto de papéis, os documentos impressos em folhas com o logotipo de um famoso escritório de advogado em Fairfax, a deixou preocupada. Em resumo, estaria correndo risco de ser processada, caso contasse a alguém qualquer coisa que pudesse ocorrer durante o encontro. Não podia lucrar usando informações que eventualmente obtivesse, não podia revelar segredos que eventualmente descobrisse e não podia fotografar nem confiscar nenhuma outra evidência para provar que estivera no encontro. O sujeito era maluco? O que Molly teria feito? Seu objetivo era obter uma história nesse encontro e lucrar a partir dessa história. Ela teria assinado o acordo? Sem nenhuma hesitação. Para Molly, conseqüência era só una palavra que ocupava espaço no dicionário. Mas Jane pensava diferente. - Não vou assinar esse documento. - Por quê? - John perguntou atrás dela. - Está pensando em vender informações para algum tablóide? - Não seja ridículo. Ou confia em mim, professor Romanowski, ou não iremos a nenhum lugar juntos. - Para dar ênfase ao que acabara de dizer, ela rasgou o contrato. E entrou em pânico. De repente compreendia que queria aquela semana em Cape May. Queria o sol e o mar, os dias de descanso longe das crianças, um belo bronzeado... - Muito bem, srta. Preston. Imagino que seja uma pessoa honesta, e estou desesperado, infelizmente. Vou acreditar em sua palavra. 29 - Vai? Ah, quero dizer... Bem, é claro que sou honesta, ou os bebês jamais me aceitariam. - O que está dizendo? - Professor, não tive oportunidade de dar muitas informações sobre a srta. Preston - Imogene adiantou-se preocupada. - Disse que ela é prima da srta. Applegate. Presumi que ela morasse aqui na capital, talvez até trabalhasse com ela no senado. - No senado? - Jane riu. - Molly disse que trabalhava no senado? - Sim, era o que constava em sua ficha de informações. Membro de uma equipe do senado, embora ela não tenha revelado seu cargo nem o nome do senador para quem trabalha, o que é admirável, já que mostra discrição. Jane abaixou para pegar as malas. Nada do que fizesse durante a semana poderia levar a Molly ou a suas verdadeiras intenções. Se nem sabiam quem ela era de fato! - Lamento desapontá-lo, professor, mas não trabalho com minha prima. Moro em Fairfax, onde possuo uma escola de educação infantil. A escola estará fechada durante as duas próximas semanas, razão pela qual pude aceitar o pedido de ajuda de Molly. Ela teve um imprevisto e não pôde cumprir com sua obrigação. - Também moro perto de Fairfax. Leciono em alguns cursos da universidade local. - É mesmo? - Era difícil fingir interesse. - O que leciona? - Ciências políticas. Podemos ir? - Sim, é claro. - Enquanto acomodavam a bagagem no porta-malas, ela perguntou: - Como foi convidado para o encontro, professor? - E que malas horríveis eram aquelas? - Não sei. Escrevi alguns artigos para publicações específicas. Talvez tenha sido isso. E, por favor, pode me chamar de John. Uma semana é tempo demais para tanta formalidade. - É claro. Disse que escreveu artigos? Sobre política? - Sim, sobre política. O que me intriga é que não concordo com a atual administração. Talvez tenha sido convidado justamente por isso, já que a semana será ocupada pela livre troca de idéias. O governo espera receber apoio e até alguns elogios por sua postura aberta. 30 - Interessante. - Jane acomodou-se no banco do passageiro. - Tem algum interesse por política? - ele quis saber depois de ligar o motor. Deveria ter? - Era difícil formar uma opinião sobre o sujeito. Era como se ele fosse composto por duas pessoas diferentes, ambas lutando pelo comando da situação. - Provavelmente não. - Ele sorriu. Jane sentiu um calafrio. Como pudera deixar de notar aqueles olhos? Que nome poderia dar àquele tom específico de azul? Nunca vira nada parecido em nenhum outro ser humano. Nem em sua caixa de noventa e seis lápis de cor havia um azul tão profundo e intenso. E por que estava pensando nos olhos do professor? - O presidente vai participar do evento? - Até esse momento não, mas isso pode mudar sem aviso prévio. Gostaria de conhecê-lo? - Não particularmente. - Houve um silêncio prolongado rompido pelo comentário de Jane. - Eu... gostaria de agradecer por não ter me obrigado a assinar aquele documento. - Decidi que posso confiar em você. - Por que está batendo no painel dessa maneira? - Se funcionou com a capota, talvez sirva para fazer o carro andar mais depressa. - Desista. Nada faz um Volkswagen ultrapassar os setenta quilômetros por hora. Já devia saber disso. - Eu nunca havia dirigido um Volkswagen. - Não? O carro não é seu? - Não. - Ele riu. - Meu carro é uma Ferrari. - Ah, sim. E aposto que é vermelha! - Jane também riu. - Cuidado, John. Quem conta mentiras acaba com o nariz comprido. - Ela ligou o rádio, torcendo para preencher as horas que a separavam de Cape May com algo mais proveitoso do que suas perguntas perfeitamente naturais e as respostas engraçadinhas do professor Romanowski. John estava começando a pensar que havia cometido um engano. Ou melhor, vários enganos. Um, a idéia de usar o disfarce de 31 nerd. Não combinava com ele. Não poderia mantê-lo durante uma semana. Dois, levar uma acompanhante. Três, acreditar que poderia ficar de boca fechada, algo que não havia conseguido fazer em trinta e três anos de vida. Quatro, mentir para a professora engraçadinha sentada a seu lado. Cinco e último, também o pior de todos os enganos, embora pudesse ser a solução para todos os outros, pensar em contar a verdade, estacionar o Volkswagen em uma locadora e alugar um automóvel de verdade, passar por uma loja de roupas e finalmente recomeçar do zero. Mas para isso teria de, um, revelar quem era de verdade, o que nunca fazia, e dois, esperar que a discreta e séria srta. Professora do Maternal ainda concordasse em acompanhá-lo. Talvez ela gostasse da idéia de ser uma "assistente de pesquisa" para um autor de best-sellers. Dizer a ela que era JP Roman? Seria capaz disso? Não. Tudo bem, não contaria toda a verdade. Mas podia compor uma mistura de dados verdadeiros e fictícios. Era um escritor de ficção. A tarefa devia ser fácil. John havia acabado de entrar na Atlantic City Expressway quando uma nuvem negra encobriu o sol e se abriu num aguaceiro que parecia ser direcionado unicamente para o conversível. - Está chovendo - Jane comentou ao perceber que ele não tentava levantar a capota do carro. - É mesmo? Eu nem havia notado. - Ele parou no acostamento. - Tenho certeza de que a chuva vai parar logo, mas, se prefere erguer a capota... Ao vê-lo saltar do carro para soltar a lona do encaixe que a mantinha abaixada, Jane preparou-se para apertar o botão no painel. John jogou a capota sobre o banco traseiro e voltou ao assento do motorista. - Pode apertar o botão quando quiser, Jane. - Já apertei. Três vezes. - E não funcionou? Bem, então bata no painel. - Já bati. Nada funciona. - Quanto tempo ainda temos de viagem? 32 Uma hora em um carro normal. Nessa coisa? Duas, no mínimo. Vamos nos afogar aqui dentro. - Não seja pessimista. Estamos em um carro sem capota, o que anula a possibilidade de um afogamento, porque nossas cabeças não ficariam submersas. Já olhou o mapa? Ela amassou o mapa que acabara de retirar do porta-luva e atirou-o em seu rosto. Estava começando a gostar dela. - Espero que consiga conter seu temperamento enquanto estivermos no encontro, Jane - John respondeu contendo o riso. Para disfarçar, amassou ainda mais o mapa e jogou-o no banco de trás. - Estaremos na presença de pessoas muito conservadoras e de comportamento impecável. - Quer calar a boca e dirigir? - Ela cruzou os braços e se encostou com força excessiva no banco. O assento cedeu sob o peso de seu corpo e caiu sobre o banco traseiro, de forma que, repentinamente, ela se viu deitada, com as pernas para cima e o rosto voltado para a chuva. - Não... diga... uma... palavra... - avisou de onde estava. - Eu não ousaria - respondeu John, tentando não sufocar com o próprio riso. - Ótimo. Agora dirija. Apenas... dirija. - Não quer que eu conserte o banco? Só preciso ajustar o tijolo e... - Não! - Acha que é seguro viajar assim? - Estou usando o cinto de segurança. Além do mais, a chuva vai parar e o sol vai voltar. Adoro o arco-íris! - Você me odeia, não é? - Não seja ridículo. Não podia saber que a capota emperraria, ou que o banco quebraria, ou... Ah, sim, poderia! O carro é seu! - Escute, deixe-me ao menos consertar o banco. Não pode ir até Cape May nessa posição. - Se insiste... - Jane soltou o cinto de segurança, levantou-se, abriu a porta e saiu do carro. John achou melhor não demonstrar o espanto diante daquele corpo perfeito revelado pelo suéter molhado. 33 Enquanto ele tentava ajeitar o tijolo que sustentava o banco do passageiro, Jane acomodou-se ao volante e ligou o motor. - O que está fazendo"? - É minha vez de dirigir. Apressado, ele terminou de arrumar o banco e se sentou, agarrando-se ao painel para não cair, uma vez que ainda não havia conseguido encaixar o tijolo como antes. - Mas eu... - Seus óculos estão tortos, professor. Numa reação instintiva, ele soltou o painel para ajeitar os óculos. Jane acelerou fundo e o carro arrancou. John caiu para trás, sobre o banco traseiro, as pernas para o ar e o rosto voltado para a chuva. Havia mesmo um arco-íris no céu, e ele se limitou a observá-lo em silêncio, porque era um homem esperto, e um homem esperto sabia reconhecer uma derrota. 34 Capítulo IV Havia alguma coisa errada com John Romanowski. Ele era como duas pessoas, a primeira um professor nerd e esquisito, mal vestido e tedioso como um livro de latim. A segunda, um bonitão sarcástico e divertido com olhos sedutores e uma risada contagiante. - O que acha de pararmos para abastecer o carro, irmos ao banheiro e comermos alguma coisa? - ela sugeriu ao ver uma placa indicando um posto alguns metros à frente. - Boa idéia. O lugar era limpo, bem iluminado e bastante movimentado. Jane decidiu tirar proveito da atmosfera favorável e tentar uma aproximação. - Não está aborrecido comigo, está? Sei que foi uma brincadeira infantil dizer que seus óculos estavam tortos para fazê-lo largar o painel... - Oh, não! Foi muito divertido! - Mesmo? Não acha que fui inconveniente, ou...? - Não. Na verdade, acho que precisamos conversar, - Conversar? Sobre o quê? - Houve uma mudança de planos. Nos meus planos. Escute o que tenho para dizer, e depois decida se quer continuar ou desistir. - Desistir do quê? - De ir a Cape May. Assim que souber por que estou indo para lá, qual é o meu objetivo nesse encontro, talvez prefira voltar 35 para casa. Mas, se ainda quiser seguir viagem comigo, tudo será muito mais simples. - Não estava dizendo a verdade? É isso? John pediu os sanduíches e levou os pacotes para o carro no estacionamento. - Assim teremos mais privacidade - explicou. - Privacidade para quê? - Será que pode parar de fazer tantas perguntas e me ouvir? - Sim, mas... onde espera que eu me sente? Precisa arrumar o banco do seu carro. John respirou fundo e ajeitou o tijolo sob o banco do passageiro. Depois a convidou a entrar e fez o mesmo. - Esse é um bom começo - decidiu. - O carro. - O que tem ele? - Não é meu. - Não? - Não. Eu o tomei emprestado de um aluno. - Pegou emprestado o carro de um aluno? - Ela deu a primeira mordida no hambúrguer. - Sei. Agora vai dizer que seu carro é uma Ferrari. - É. Vermelha. - O quê? - Eu tenho uma Ferrari vermelha. - com um salário de professor? O momento de inserir algumas mentiras inocentes havia chegado. - Eu... herdei algum dinheiro. - Espere um minuto. Você tem uma Ferrari e decidiu tomar emprestado um Volkswagen amarelo com a capota emperrada e um banco quebrado? E quer que eu acredite nisso? - Vai acreditar em mim depois de ouvir o restante da história. Sei que vai parecer estúpido, porque é estúpido, mas, por favor, escute. - Tudo bem, prometo que não vou interromper, desde que não tente me segurar, caso eu decida ir embora depois de ouvi-lo. - Combinado. 36 - Ótimo, porque você é um homem muito grande, e às vezes acho que posso sentir medo de você. - Medo de mim? Puxa, sabia que esse disfarce de nerd era ridículo, mas nunca pensei que fosse assustador. - Disfarce... de nerd! Quer dizer que se vestiu desse jeito de propósito? - Exatamente. Lamentável, não é?-John removeu os óculos. - Bem, sou mesmo um professor, como já disse, e recebi um convite para o encontro, como tambémjá disse. Decidi comparecer para colher informações para o livro que pretendo escrever... e isso eu não havia dito. - Um livro. Quer escrever um livro. - Jane embrulhou o resto do hambúrguer. - Não é interessante? Hoje em dia todo mundo quer escrever alguma coisa. Que tipo de livro? - Não-ficção. Estou pensando em uma... denúncia política. Foi a vez de Jane rir. - Uma denúncia? Você deve estar brincando! John deu asas à habilidade de criar. - Tolo, não é? Mas tive um aluno que era sobrinho de um funcionário do senado, e ele me contou que o senador Harrison está abafando um escândalo que pode arruiná-lo no cenário político e até na vida pessoal. Desde então tenho investigado o senador Extensivamente. Para escrever um livro. De repente o sorriso desapareceu do rosto de Jane, levando com ele toda a cor. - Senador... Disse senador Harrison? Aubrey Harrison? - Sim, o senador de Nova Jersey. Sabe quem ele é? - Eu? Ah, bem... sim... Não. Quero dizer, sei que ele é senador por Nova Jersey e que talvez concorra à presidência nas próximas eleições. Todos sabem disso, não é? - Imagino que sim. John encarou-a por um instante tomado por uma estranha intuição. Não. A mulher tinha uma escola infantil. O que podia estar escondendo? De uma coisa estava certo. Jane Preston era uma mulher muito sensual. Vê-la comer o sanduíche e lamber o molho dos dedos era quase uma tortura. 37 - Enfim - ele retomou a conversa, tentando ignorar a súbita atração - há muito tempo desejo escrever um livro, esse livro sobre Harrison, para ser mais específico. Quando recebi o convite e soube que ele seria um dos convidados para o encontro, decidi aproveitar a chance para investigá-lo melhor. - Mesmo assim, sua história não faz sentido, John. Por que o disfarce? Não podia dizer que JP Roman podia ser reconhecido. Mais importante ainda, não podia deixá-la perceber que havia uma pequena possibilidade de Harrison reconhecê-lo, embora não o visse desde os doze anos de idade. Como um bom escritor de ficção, John seguiu criando cenários e enredos. - Dillon Holmes, o sobrinho do senador, já esteve comigo em um seminário político realizado em Fairfax há cerca de cinco anos. Ele também estará em Cape May como convidado do senador, e eu... bem, não quero que ele me reconheça, embora a possibilidade seja pequena. Por isso decidi usar um disfarce. - Muito bem... - Jane estava pálida. - Agora temos o senador, o sobrinho dele e seu livro. Já terminou? - Acho que não. - John estava ficando muito preocupado. - Quero pedir desculpas por não ter sido honesto desde o início. Decidi contar toda a verdade porque confio em você, e porque preciso vestir roupas normais e dirigir um carro de verdade, ou vou acabar maluco. Podemos nos divertir muito, Jane, se aceitar me ajudar. - Ajudá-lo em quê? -Quero me aproximar de Harrison, e sei que você pode atraí-lo ou chegar a ele por meio do sobrinho. Terei uma semana para observar o grande homem, registrar detalhes de seu vocabulário e de sua linguagem corporal, enfim, coisas que vão fazer meu livro parecer mais real, dados que podem preencher lacunas deixadas pela pesquisa. Não quero que seja ousada nem que contrarie padrões morais. Só quero que atraia a atenção do senador. Não deve ser tão difícil para uma mulher atraente e linda. - Quer que eu me aproxime do senador para que você consiga informações? - Para o livro. 38 Tudo que tinha de fazer era se manter bem próximo de Harrison. O homem acabaria metendo os pés pelas mãos, e ele tomaria providências para que o poderoso senador fosse flagrado. Adeus aspirações presidenciais. - Por isso queria que eu assinasse um contrato? Para o caso de publicar esse livro? Não quer que ninguém saiba que esteve no encontro de intelectuais usando falsos pretextos? - Exatamente. - Ela que pensasse o que bem entendesse. - E me contratou... contratou Molly... Enfim, queria uma acompanhante para servir de isca? - Confesso que sim. - Mas vai abandonar o disfarce de nerd? - Sim. Se não consegui enganá-la, quem vai acreditar nesse disfarce? - É bom saber que aprecia meu poder intelectual e minha capacidade de dedução. - Também acho que você é linda e encantadora o bastante para ser usada como isca. Isso compensa a ofensa ao seu intelecto? - Adeus, John. Seja feliz e procure um terapeuta. - Ela estendeu a mão para a maçaneta. - Não vai tentar me deter? - Você disse que eu não deveria tocá-la, e quero provar que sou digno da sua confiança. Disse a verdade, pedi sua ajuda, e agora quero acreditar que tem compaixão e compreensão suficientes para não guardar rancor de um pobre homem desesperado. E enquanto me ajuda, ainda pode gozar de férias gratuitas. O que acha da proposta? bom - Molly bom -Jane falava ao celular que a prima havia comprado para ela. John estava escolhendo roupas em uma elegante loja masculina, e ela o esperava no corredor do shopping. - Janie! Já chegou? O que achou do quarto? E do professor? - Cale a boca, Molly. Temos um problema - ela anunciou em voz baixa. - John Romanowski é um professor que pensa ser escritor, e ele está a caminho de Cape May para obter informações para escrever um livro sobre... prepare-se, Molly. Sobre o senador Harrison. Ele quer que eu me aproxime do homem para ajudá-lo a descobrir alguma coisa. Por isso procurou a agência de Imógene. 39 - Ótimo! Tudo que o professor descobrir, você poderá me contar. Agora tenho uma equipe em Cape May. - Será que pode parar de pensar só em você? Preciso de ajuda! Não sei o que fazer! - Não sabe? Pelo amor de Deus, Jane! Isso é melhor do que esperávamos! Preciso de você perto de Harrison! Meu emprego depende do seu sucesso. - Não me pressione, está bem? - vou tentar... De qualquer maneira, esse tal Romanowski também precisa de você perto de Harrison. Popular, esse senador! Meu chefe também mandou um dos repórteres mais eficientes do jornal disfarçado de convidado, só para observá-lo. Aposto que metade das pessoas está nesse encontro só por causa de Harrison, para descobrir o que ele pretende. Não podia ser melhor. Você e seu professor podem trabalhar juntos. - Eu não disse a ele que estou aqui para ajudá-la a manter um emprego estúpido do qual vai acabar se demitindo em menos de um mês. - Não disse? Por que não? - Porque ele não acreditaria em mim, para começar. E porque agora ele confia em mim. O que acha que vai acontecer se eu revelar que estou trabalhando para uma empregada de um grande jornal de Washington? Estou de férias, lembra? Não quero voltar para casa de ônibus e sem meu bronzeado! - Tudo bem, tudo bem, já entendi. Fique calma, está bem? Tem razão, é melhor não dizer nada ao professor. A propósito, como ele é? Nesse momento, o professor em questão saiu da loja carregando quatro enormes sacolas e vestindo roupas completamente diferentes daquelas com que ela o conhecera. Calça caqui, camisa pólo, um suéter amarrado sobre os ombros e cabelos livres daquela horrível gordura. Os óculos haviam desaparecido e bíceps impressionantes podiam ser vistos sob as mangas curtas da camisa. - Oh, meu Deus... - Janie? Janie, o que houve? -O quê? Oh, eu... acho que me distraí. Desculpe. Escute, agora tenho de desligar. Eu ligo novamente assim que chegar em Cape May. 40 - Não, não desligue! Ainda não disse como é esse tal professor Romanowski! - Quer saber como ele é? Muito bem, imagine Hugh Grant, porém mais alto e muito, muito mais forte. Sim, Hugh Grant com anabolizantes. O silêncio se estendeu por quatro segundos antes de Molly gemer: - Huh? - Hugh Grant, Molly. O cabelo, os olhos, o sorriso... Os músculos lembram os de Arnold. - Schwarzenegger? - Quem mais? Oh, sim, e ele é peludo. E bronzeado. E másculo. -Ah, que pena! Não é seutipo. Pensei que viveria um romance em Cape May, mas parece que não deu muita sorte. Quem sabe com Dillon? Ele também está aí. É magro, louro, sofisticado... inofensivo. Exatamente como você gosta. - Não gosto de homens inofensivos! - Ah, não? Pense bem, Janie. com quem saía no ginásio? com o capitão do time de xadrez. E na faculdade? com o orador da turma. Tédio! Devia ter experimentado o capitão do time de futebol, mas prefere os fracotes aos musculosos. - Eu não... Ah, esqueça. Não vou discutir com você. Esteja na escola na segunda-feira às seis e meia, pronta para trabalhar. - Seis e meia... da manhã? - Esteja lá, Molly.-Jane desligou ao ver John acenando para ela. - Olá. - Ele sorriu. - Estava falando ao telefone... Algum problema? - Não, eu... só telefonei para minha mãe para tranqüilizá-la. Eu prometi telefonar quando chegasse em Cape May, e como ainda não chegamos, achei que ela poderia estar preocupada. Você está... muito bem. - Humano outra vez. - Romanowski riu. - E quando puder lavar o que restou do creme de tia Marion, então o mundo voltará a ser perfeito. Só preciso de cinco minutos para comprar malas novas, e então seguiremos para a segunda parte do plano. A locadora de automóveis! 41 Capítulo V Senhor, entenda - pediu a jovem recepcionista. - O hotel possui um número limitado de suítes, e a que deveria ter sido reservada para o presidente não foi excluída da relação. Os que chegaram antes confirmaram suas reservas, mas acabamos de ser informados que o presidente pode vir para o encontro em algum dia dessa semana. A sua suíte era a última disponível, e tivemos de reservá-la para o presidente. Sinto muito, senhor. - Não tem dois quartos simples? - Lamento, professor, mas só há um quarto vago. O banheiro interno é adorável e há duas camas duplas. - Vamos ficar com ele - John anunciou. - Mas...-Jane tentou protestar, mas ele a segurou pelo braço e levou para o fundo do saguão, perto da porta da varanda. - Veja isso, Jane. O mar, o sol, a brisa... Não vai querer desistir agora, vai? - Não vou dividir um quarto com você! - Mas são duas camas! - A culpa é sua! Se não houvesse inventado aquele disfarce ridículo, teríamos chegado a tempo de pegar uma das suítes. A Ferrari, lembra? - Sim, eu sei... Mas agora estamos aqui. Harrison está aqui. Perguntei na recepção e ele chegou há horas. - Como pode estar tão calmo? 42 - Prefere um ataque histérico? - É claro que não! Mas não costumo dividir quartos de hotel com homens desconhecidos. - Escute, você sabe por que estou aqui. Não vim para... ah, você sabe! Afinal, que tipo de homem pensa que eu sou? - Quer mesmo saber? - Agora chega, Jane. Se quer ir embora, vá. Imediatamente. De ônibus. - O quê? Não pode me demitir! Eu... Eu... - Ah, droga! - John segurou seu braço e puxou-a para trás de um pilar. - Lá está Harrison. E daí? Havia sido demitida, não? Não! O que Molly faria nessas circunstâncias? Antes que John pudesse segurá-la novamente, antes que o bom senso a impedisse de agir, Jane saiu de trás do pilar e caminhou para o senador. Rebolando. Muito! Quando estava a cinco ou seis passos dele, ela virou o tornozelo e caiu de joelhos. De propósito. - Ai...! -Deixe-me ajudá-la, meu bem-o senador ofereceu-se, correndo ao seu encontro. - Venha, há uma cadeira logo ali. Sente-se e deixe-me ver esse tornozelo. - Não, não, por favor, não se incomode. Eu estou bem. Não devia usar essas sandálias. Sou tão desajeitada! Sorrindo, ela se sentou, olhou para Harrison e piscou, dizendo a si mesma que podia agir como Molly. - As sandálias são lindas. - Obrigada. Meu nome é Jane Preston, e estou aqui para o encontro. Não que eu seja alguém... Quero dizer, vim com o professor Romanowski. E você? É alguém importante? - Não, ninguém. Meu nome é Aubrey Harrison. Pode me chamar de Aubrey. Até esse momento tudo havia sido muito fácil. Era hora de tentar um golpe definitivo. - Sim, Aubrey, eu... Oh, meu Deus! É o senador Harrison? Professor! - Ela olhou em volta. - Ora, onde ele se meteu? 43 Estava aqui há um minuto! O professor vai ficar encantado em conhecê-lo, senador. Quando vínhamos para cá ele me falava sobre como o admira. - Que bom. - Na verdade, eu nem o conheço direito. Fui contratada para acompanhá-lo porque o pobre homem não tem ninguém. Sabe como são esses intelectuais. Enfim, para mim essa é uma excelente oportunidade de conhecer soltei... ah, pessoas interessantes. Minha prima tinha razão. Estou aqui há dez minutos e já conheci o próximo presidente do nosso glorioso país. - Obrigado, Jane, mas essa é uma decisão que cabe aos eleitores. É uma pena que seu professor não esteja aqui. No entanto, podemos jantar juntos. Eu estava mesmo a caminho do restaurante para reservar minha mesa. Somos apenas eu e meu sobrinho, e posso incluir seu nome e o do professor na reserva. Assim jantaremos juntos durante toda a semana. O que acha? - Oh, seria maravilhoso! Meu nome é Jane Preston, como já disse, e ele é John Romanowski. Professor Romanowski. - Muito bem, vou cuidar das reservas. Tem certeza de que não precisa de ajuda para chegar ao quarto? - Tenho, senador, obrigada. Já estou bem melhor. - Que bom. O jantar será servido às seis em ponto. Será um prazer conhecê-la melhor e falar sobre o lugar onde vivo. Harrison se afastou sorrindo, e John aproximou-se pelo lado oposto com ar carrancudo. - Isso foi repugnante - ele opinou sem rodeios. - Eu sei, mas funcionou. É claro que, agora que fui demitida, não irei ao jantar, e você não irá ao jantar, e... - Você foi readmitida. - John segurou-a pelo braço e levou-a de volta ao saguão do hotel. - Esse homem é impressionante! Ele a estava despindo com os olhos, o bastardo! - Depois de assinar as fichas de registro, ele a conduziu ao elevador. - Estava? Eu nem notei... - Ah, não? Aposto que passa por isso todos os dias. - Eu? Acha que vivo situações como essa todos os dias? - Escute aqui, agora somos parceiros. Não tente flertar comigo, porque não vai dar certo. 44 - Acha... que estou flertando com você? - Acho. Já desisti do meu disfarce de nerd, Jane. Agora você vai desistir dessa encenação de Chapeuzinho Vermelho, e estaremos quites. Jane abriu a boca para protestar, mas não conseguiu dizer nada, tal a intensidade de sua indignação. Furiosa, saiu do elevador e seguiu para o quarto atrás do carregador que levava a bagagem. Quando John abriu a porta, todos entraram no aposento dominado por duas grandes camas cobertas por colchas brancas. John deu uma gorjeta ao carregador, que agradeceu sorridente a caminho da porta. - Espero que o senhor e sua esposa tenham uma boa estadia - disse o rapaz. - Ele pensa que somos casados! - Jane espantou-se. - Porque agimos como pessoas casadas. - Nós? O que quer dizer? - Só as pessoas casadas se comportam como se sentissem ódio uma da outra. -Ah... Bem, de qualquer maneira, eu sei que vamos conseguir. Não entendo por que entrei em pânico. Podemos pendurar um cobertor entre as duas camas e... - Esqueça. Não quero chamar a atenção dos funcionários. Já esqueceu que a camareira virá arrumar o quarto todos os dias? - Bem, então faremos uma escala. Eu tomo banho à noite, você, de manhã. Sim, é isso. Escalas garantem a organização, e gosto muito de organização. - Jane, lamento informar, meu bem, mas você vai odiar isso aqui. John estava no banho há mais de quinze minutos e ainda não conseguira se acalmar. Estava furioso desde que vira o brilho nos olhos de Harrison enquanto Jane flertava com ele. E não estava furioso apenas com Harrison. Era Jane quem o aborrecia de verdade. Tivera a impressão de que ela era uma boa garota, mas poucas pessoas eram imunes ao poder e ao prestígio de homens como Aubrey Harrison. 45 Ou tudo não passara de uma excelente encenação? E quando ela havia encenado? Quando se apresentara como dona de uma escola infantil, ou quando flertara com o senador? - John Patrick, você é um asno. Mentiu como um louco, e agora quer criticar o comportamento da garota? Encare os fatos! Está atraído por essa mulher. Quando saiu do banheiro, John descobriu que ela não estava no quarto. Havia um bilhete rabiscado no bloco ao lado do telefone. Fui comprar puxa-puxa. Volto já. Jane. John encontrou-a na piscina, confortavelmente instalada em uma espreguiçadeira, lendo um livro e comendo puxa-puxa. Ao sentir sua presença, Jane ergueu os olhos do livro. - Está mais calmo? - Eu estava... até descobrir que você havia saído. - Deixei um bilhete, John. Quer puxa-puxa? - Precisamos conversar - ele anunciou enquanto enfiava na boca uma guloseima colorida. - Agora? Não acha melhor interagir com os outros convidados? Se quer mesmo escrever um livro, devia aproveitar para pesquisar. Estive na recepção e consegui uma lista com os nomes de todos os participantes do encontro. Aqui está. Surpreso, ele leu a relação de nomes. - Oh, não... Sabia sobre quase todos os participantes, mas... Brandy Hythe? Não esperava encontrá-la aqui. - A atriz? Por que não? São muitos os representantes do cinema e da tevê nesse encontro. Notou que os títulos e as profissões estão relacionados ao lado dos nomes? Contei quatro outros escritores... que admitem ser escritores. - Acho que gostava mais de você quando não sabia o que estava acontecendo. - Digo o mesmo sobre você. Mas estamos aqui, e eu serei bem paga por essa semana. Temos de tirar proveito máximo dessa oportunidade, John. Ei, está me ouvindo? - Humm? Era difícil desviar os olhos da beleza morena do outro lado da 46 piscina. Alta e magra, mas com curvas perfeitas nos lugares ideais, Brandy Hythe se preparava para mergulhar. - John, sei que a mulher é linda, mas não devia olhar para ela como se estivesse pensando em devorá-la. Não é educado. E se olhou bem para a breve biografia ao lado do nome de Brandy, deve ter notado que ela é formada em ciências políticas pela universidade de Princeton, como você. Não é só mais um rostinho bonito... - Princeton? Aqui em Nova Jersey? - John pegou a lista e fingiu ler novamente as informações, como se já não soubesse tudo sobre Brandy Hythe. - Nativa de Nova Jersey? Talvez Harrison tenha alguma coisa a ver com o fato de ela ter sido convidada. - E isso é mau? Bem, se ele já trouxe alguém, vai precisar de mais que um simples tornozelo torcido e alguns sorrisos melosos para mantê-lo por perto. Mas John não expressou o pensamento em voz alta, porque não era estúpido. - Não, não... - Brandy nadava com movimentos graciosos, movendo as pernas que já haviam estado em torno do pescoço de Harrison diversas vezes, a julgar pelo que sabia. John teve de desviar os pensamentos desse curso para não vomitar. Sua pesquisa não havia comprovado o romance, mas também não provara o contrário. - Enquanto você tomava banho, dei uma volta pelo hotel e fui ao restaurante montado no salão de bailes. As placas com os nomes dos participantes do encontro já foram postas na mesa, e a nossa tem apenas seis integrantes, embora as outras tenham oito. Anotei todos os nomes no meu bloco. Está bem aqui, na minha bolsa. - Ela o pegou. - Aqui está. Somos nós dois, é claro, o senador e seu sobrinho, Dillon Holmes, a srta. Hythe, o que significa que você pode estar certo quanto ao envolvimento do senador e da atriz, e um cavalheiro chamado Henry Brewster. Ele se identificou como editor. Acha que pode ser o proprietário da Brewster Books? Sim, deve ser isso. John, você está bem? Engasgou com o puxapuxa? - Eu... estou bem - ele mentiu, tentando recuperar-se. - Engoli errado, só isso. 47 - Não quer beber alguma coisa? Posso ir buscar água ou... - Jane, vamos sair daqui - ele decidiu, recolhendo os pertences que ela conseguira acumular em tão pouco tempo. - Vamos até a praia. A faixa de areia não estava muito cheia. Havia algumas esteiras no chão, pessoas caminhando pela beira da água e tomando sorvetes, aproveitando o final de tarde... John reconheceu três indivíduos, homens que também estivera investigando: um congressista da Pensilvânia, o presidente de uma importante companhia de petróleo, e um dos amigos de Harrison do condomínio na Flórida, um conhecido jornalista. Eles conversavam compenetrados. O fato de todos os participantes serem da Costa Leste não era surpreendente, pois havia quatro encontros como esse ao longo do ano, um em cada região do país. Mas encontrar tantos partidários e companheiros de Harrison em tão pouco tempo o levava a suspeitar de que acontecia ali algo além de um simples encontro de intelectuais. Pessoas como ele podiam estar sendo usadas como um "disfarce" conveniente para algo muito maior, alguma coisa que Harrison preferia esconder da mídia. Teria de estudar a lista que Jane havia conseguido e comparar os nomes com as anotações em seu computador. - Não vai me contar por que ficou tão nervoso quando mencionei o nome daquele editor? Brewster... Era hora de dar mais um passeio pela Cidade da Mentira. Inseriria algumas poucas verdades inofensivas, alguns dados curiosos, e ela nunca suspeitaria. - Henry Brewster foi o primeiro editor a avaliar meu texto. Eu mandei para ele meu primeiro, e até agora único, manuscrito, logo depois de ter concluído a faculdade. Brewster disse que meu texto não tinha brilho. - Sobre o que escreveu? -Ah, era um livro de ficção. Lembra-se de Lave Story? Foi escrito por um professor. Não sei quem escreveu Brídges ofMadison County, mas não importa. Os dois foram publicados. O meu não. - Você escreveu uma história de amor? - Por que a surpresa? Shakespeare escreveu histórias de amor. - Alguém já disse que você é um cínico? 48 Capítulo VI Jane estava sentada na cama, pronta para ir jantar, quando John saiu do banheiro enrolado em uma toalha. - Desculpe... - ele pediu ao vê-la boquiaberta. - Vista-se. - É o que vou fazer. Esqueci de levar minhas roupas para o banheiro. Como ele havia conseguido aquele corpo perfeito? De onde vieram tantos músculos? E como faria para voltar a respirar? - Já pode abrir os olhos. Ele havia vestido a calça, mas o peito ainda estava nu, glorioso e bronzeado, despertando fantasias que ela jamais imaginara ser capaz de criar. Estaria perdendo o juízo? - vou esperar lá embaixo - ela anunciou apressada. - Termine de se vestir, está bem? Jane já estava no corredor, mas ainda podia ouvir as gargalhadas de John no interior do quarto. Havia uma fila na frente do salão de baile. As pessoas tinham de parar na mesa de identificação, onde eram distribuídos os crachás e os pacotes contendo informações. John aproveitou para olhar em volta, tentando unir os nomes da lista obtida por Jane aos rostos enfileirados. Capitães da indústria, estrelas do cinema, políticos, cientistas, 49 economistas. Alguns conversavam, outros pareciam refletir, e outros, como ele, olhavam em volta estudando os VIPs. Havia mais homens que mulheres, e as representantes do sexo feminino estavam divididas em duas categorias: pensadoras e objetos de decoração. Jane ficaria zangada se soubesse que todos os outros homens do encontro a classificariam como objeto de decoração. Lentamente, foram se aproximando da mesa de identificação, onde ela pegou os crachás e os formulários contendo informações. De acordo com os dados ali contidos, ficariam na mesa dois. Os três homens que John havia visto na praia estavam em outra mesa. Era estranho que os companheiros não se houvessem acomodado de maneira a poderem conversar. Por outro lado, podia ser uma estratégia. - Suponho que Brandy se sente ao lado do senador - Jane comentou ao ver a atriz no centro de uma roda formada por homens. - Sim, e você deverá ficar do outro lado do Harrison, porque são as únicas duas mulheres à mesa. - De jeito nenhum. - Ela se acomodou em uma cadeira à frente daquela onde havia uma placa com o nome de Aubrey Harrison. - vou ficar bem aqui. Se o senador me quiser por perto, vai ter de vir me buscar. Dillon Holmes se aproximava da mesa, e ela ajeitou os cabelos e retocou o batom rapidamente. - O que está fazendo? - John estranhou. - Dillon Holmes vem vindo. Quero estar apresentável. - Devia estar pensando em arrancar informações do homem, não em arrancar suas roupas! - Não seja ridículo! Temos um projeto, não? Uma missão. Como espera que eu consiga ajudá-lo sem me aproximar de todos que realmente contam para o nosso objetivo? - Aproxime-se de Harrison, e já estará me ajudando muito. Esqueça o cara-de-boneca. Jane o encarou. - Qual é o problema com você? John não tinha a menor idéia. 50 - Nenhum. Só quero lembrar que você não está aqui para encontrar... parceiros. Você é um canalha - ela sussurrou. Depois sorriu. - Aí vem ele. Apresente-me a ele, está bem? E lembre-se de dizer que somos apenas amigos. - Agora você foi longe demais. - John enlaçou-a pela cintura e puxou-a de encontro ao corpo com tanta força que quase pôde ouvir o ar sendo expulso de seus pulmões. Depois estendeu a outra mão para o homem que acabava de parar ao lado da mesa. - Você é Dillon Holmes, certo? Assistente e sobrinho do senador Harrison? Creio que nos conhecemos há alguns anos em um seminário em Fairfax. Sou John Romanowski. Leciono ciências políticas na universidade. - É claro. Desculpe se não o reconheci antes, mas são tantas as pessoas que conheço... Como vai, John? - Bem, obrigado. Esta é Jane Preston, minha... acompanhante. Jane possui uma escola de educação infantil em Fairfax. Ela será de grande utilidade para o senador, caso ele queira conhecer a opinião de uma mulher sobre o atendimento pré-escolar no nosso país. Não é verdade, Janie, benzinho? Jane acertou suas costelas com o cotovelo como se estivesse brincando, mas aplicou força suficiente para causar dor. Depois estendeu a mão para Dillon. - É um prazer conhecê-lo, sr. Holmes. - Dillon, por favor. Creio que seremos companheiros de mesa durante a semana. - Sim, de fato. O senador Harrison ajudou minha querida Janie esta tarde e ainda nos convidou para compartilhar de sua mesa. Mal posso esperar para demonstrar minha gratidão. Não suportaria se minha adorável Janie houvesse se machucado de verdade! Por que se comportava dessa maneira? John nem imaginava. Tudo que sabia era que não queria Jane e Holmes trocando olhares melosos durante a semana. - Disse que é professor de ciências políticas, John? - Exatamente. - Por que sentia tanta antipatia por um homem que nem conhecia? 51 - Vai gerenciar a campanha do senador à presidência, Dillon? - Jane perguntou sorrindo. - Isso ainda não foi decidido - ele respondeu com expressão sorridente. - O que não foi decidido? A candidatura, ou seu papel nela? - Ora, ora, não sabia que se interessava por política... - Ah, mas eu não me interesso. John comentou que o senador ia se candidatar à presidência, e então... Não foi isso que disse, Johnny? Johnny? Ia acabar perdendo a paciência com ela. - Não, Janie, eu disse que ele deveria candidatar-se. O país precisa de mais homens como o senador Harrison. - Era o que eu queria ouvir - disse Holmes. - Uma opinião espontânea e inteligente. Isso é muito importante para nós, John, especialmente quando parte de alguém com o seu conhecimento e a sua projeção no meio intelectual. Costuma discutir suas idéias com os alunos? - Oh, sim, sempre! Mas isso não significa que eles concordam comigo. Por exemplo, alguns, quando souberam que eu viria para cá, aproveitaram para expressar suas objeções à candidatura do senador. - É mesmo? Bem, teremos de falar sobre isso outra hora. - Holmes parecia ter perdido o interesse. - Alguém tem de manter um dedo no pulso da jovem América, caso o senador decida mesmo candidatar-se. Ah, aí vêm o senador e a srta. Hythe, finalmente. Os dois estão sempre cercados pelos caçadores de autógrafos. Minutos depois John era apresentado a Aubrey Harrison, o homem que pusera os últimos pregos no que acabaria sendo o esquife do esgotamento mental de Maryjo. Brandy estava ocupada falando ao celular. Era um alívio saber que não precisava mesmo do disfarce de nerd, porque o homem não o reconhecera. - É um prazer conhecê-lo, John. Por favor, me chame de Aubrey. Essa será uma semana informal - o senador sorriu, os olhos fixos em Jane. - Como vai, querida? O tornozelo está melhor? - Sim, senhor, obrigada. Quero que saiba que é uma honra fazer parte de sua mesa. 52 - A honra é toda minha, querida. Assim que Brandy concluir sua ligação, terminaremos as apresentações e pediremos vinho. John e Jane cumprimentaram Brandy Hythe, que parecia muito feliz em conhecê-los, resultado de seu talento de atriz, e John apertou a mão de Henry Brewster, que foi ainda melhor ator e cumprimentou-o como se nunca houvesse escutado seu nome. Henry estava mais velho. E mais gordo. Desde os tempos da faculdade, sua idéia sobre diversão era uma boa mesa num restaurante elegante, um livro aberto diante dos olhos e duas sobremesas. John gostava dele. Sempre havia gostado. Mal podia esperar para encontrá-lo sozinho, enfiá-lo em uma mala e despachá-lo de volta para Manhattan. Os lugares já haviam sido determinados. Jane acabou sentada à esquerda de Harrison, com Brandy à direita do senador. Ao lado dela estava Henry Brewster, depois John, quase que diretamente à frente de Jane, e por último, ao lado dela, Dillon Holmes. Uma grande e feliz família. Harrison assumiu o comando da conversa desde o início, falando sobre Nova Jersey como se não houvesse nenhum outro assunto interessante no mundo. Depois de ouvirem entediados tudo que ele queria enaltecer em seu adorado estado, finalmente chegou a hora da sobremesa e do café. John ainda sorvia o primeiro gole da bebida quando, num ato inesperado, Dillon levantou-se e convidou Jane para dar um passeio pela praia. Mais surpreendente ainda, ela aceitou de imediato. Quando superou a surpresa, John já estava sozinho na mesa, com exceção de Brewster. Harrison e Brandy também se haviam desculpado para irem visitar outras mesas. - Como tem passado, John? - Henry. Ainda não acredito que está mesmo aqui. Como veio parar nesse encontro? - Acreditaria se eu dissesse que aceitei o convite para rever meu velho amigo, colega de faculdade e autor famoso em ação? -Não. - John convidou seu editor para segui-lo até a varanda. - Mas acredito que tenha vindo por minha causa. Para certificar- se 53 de que vou me comportar bem e não vou acabar preso por esmurrar o nariz de Harrison. Foi tia Marion, não foi? - Estava preocupada com suas roupas e com um certo par de óculos de plástico preto. - Desisti do disfarce. Não poderia mesmo mantê-lo. Se Jane percebeu o truque desde o início... 54 Capítulo VII - Onde esteve até agora? Jane quase gritou de susto ao entrar no quarto e acender a luz. - John! O que está fazendo sentado aí no escuro? - Estava pensando. - Ah... Não deixaria que ele a aborrecesse. Não depois de ter passeado pela praia com Dillon e saboreado drinques maravilhosos no Blue Pig Tavern, o bar do hotel. - Eu fiz uma pergunta. - No Blue Pig. - Não. Eu estava no Blue Pig. - Em qual ambiente? - Na varanda, é claro. - Dillon e eu estávamos na parte interna. - Está dizendo que ficou bebendo no escuro... com Dillon? - Exatamente. E você? Estava sozinho na varanda? - Não. Estava com Henry Brewster. E não bebi tanto quanto você, pelo que estou percebendo. - Não estou bêbada, John. Apenas... relaxada. - Ela riu. - Escute, você está aqui para trabalhar. Não vai conseguir me ajudar se continuar bebendo para... relaxar. - Como tem coragem de dizer que não vou ajudá-lo, depois de tudo que fiz esta noite? 55 - O que acha que fez? - O que acho que fiz? Ah, nada muito importante, meu caro professor! Apenas consegui convites para uma pequena festa que o sene... seno... senador vai oferecer amanhã à noite em sua suíte. A suíte que deveria ter sido nossa, não fosse aquele seu plano idiota de usar um disfarce e viajar naquele carro ridículo. Nervosa, ela se dirigiu ao banheiro levando o pijama azul de nuvens brancas e trancou a porta. Precisava acalmar-se. Mas... como? Havia um bonitão seminu sentado lá fora, e teria de dormir com ele no mesmo quarto, embora em camas separadas. Havia bebido demais tentando descobrir os planos do senador, e agora estava tonta e sem seus reflexos normais. E como se não bastasse, estava ali sob falsos pretextos, pondo em prática um plano de Molly, e se John descobrisse nunca a perdoaria. Acalmar-se? Ah, sim, logo depois do surto... Vestida no pijama confortável e discreto, ela saiu do banheiro e encontrou o quarto totalmente iluminado. O algodão de seu pijama era fino, mas não se tornava transparente... a menos que houvesse luminosidade excessiva. - O que está fazendo? - Não se mova, por favor. Estou tentando encontrar minha lente de contacto. - Precisa de ajuda? - Não, obrigado! Já encontrei a lente. - Que bom. Então... por que está tão nervoso? - Por que não pára de fazer perguntas e vai dormir? Jane respirou fundo. Não aceitaria provocações. Não se deixaria intimidar. com passos calmos, ela se encaminhou para a cama, puxou as cobertas e deitou-se. Depois lembrou que não havia telefonado para os pais. - Que horas são, John? - Não sei. Meia-noite, talvez. - Acha que é tarde demais para dar um telefonema? - Como posso saber? Depende de quem vai chamar. - Meus pais. Esqueci de avisar que cheguei bem, e... 56 - Espere um minuto. Quantos anos você tem? Vinte e sete, mas isso não impede meus pais de se preocuparem comigo quando estou fora de casa. Está dizendo... que mora com seus pais? Sim. Por quê? Isso é crime?-Jane se levantou para ir pegar o celular dentro da bolsa. Depois se sentou novamente na cama. John se havia sentado na cama dele. - Se não é, devia ser. Quero dizer... o que está fazendo aqui, afinal? - Eu... Você... Molly... - Ela deixou o telefone sobre a cama. Era melhor deixar a ligação para o dia seguinte, quando estivesse menos confusa. - Será que tem uma hora? É o tempo de que preciso para explicar toda essa história. - Não tenho nenhum compromisso nas próximas dez ou doze horas. - Vai me odiar quando ouvir o que tenho a dizer. - Ela se deitou e puxou as cobertas. - E depois vai me demitir. Ficarei sem minha aventura, sem meu bronzeado, e é isso que mais me incomoda. Porque eu seria muito útil para você, de verdade. Já havia decidido que não ia contar tudo a Molly. - Molly? - Sim, Molly. Ela não trabalha no senado, John. Trabalhava, sim, quando se formou na faculdade, mas desde então ela tem perdido muitos empregos. Muitos mesmo! - O que ela tem a ver com sua presença aqui? - Fui vítima de uma chantagem. - Pelo amor de Deus, seja mais clara. Estou ficando nervoso. Nervoso? Ele parecia calmo, forte e atraente como o pecado. Nunca mais esqueceria a imagem do homem musculoso e peludo sentado sobre a cama usando apenas um short de náilon. Depois de mais um suspiro profundo, Jane contou toda a história sobre Molly e como ela havia ido parar em Cape May. - Acho que ela sempre se comportou mal para atrair a atenção dos pais - comentou a certa altura, resumindo a ocasião em que Molly se trancara no freezer de um frigorífico e exigira que alguém localizasse os pais dela em Bali e solicitasse sua presença. Na 57 época ela tinha apenas sete anos, mas os pais de Molly continuaram viajando muito. Sempre. Sem ela. - Que triste - John comentou. - Sim, é triste. Por isso meus pais sempre a hospedavam em nossa casa. - Como tudo isso levou à chantagem? -Bem, não foi exatamente uma chantagem. Molly adora aventuras. Sem os pais, atualmente mortos, e com um fundo de pensão inesgotável, ela vive sem preocupações. O único detalhe é que os pais dela condicionaram o uso do dinheiro do fundo. Enquanto não se casar, Molly tem de passar pelo menos dez meses ao ano trabalhando em algum emprego remunerado, ou não pode sacar o valor anual do fundo. Eles imaginavam que isso faria dela uma pessoa responsável. Jane então contou que a prima estava em experiência em seu atual emprego e tivera a grande idéia de... - Harrison? - John levantou-se de um salto. - Ela quer que você a ajude a obter um furo de reportagem sobre Harrison? - Irei embora amanhã mesmo. - Fique quieta, está bem? -John andava pelo quarto. - Molly trabalha para o maior jornal de Washington, um periódico que não é simpático a Harrison. Toda informação que você obtiver aqui, ou que eu obtiver, e que for transmitida para ela, acabará divulgada. Impressa. Ei, eu gosto disso! - Gosta? Pensei que quisesse escrever um livro. - Sou um péssimo escritor. - Ele riu. - Ah, não diga isso. Só teve uma má idéia... - Não, não, a verdade é que não tenho talento para escrever. Mas acho que posso descobrir coisas incríveis sobre Harrison. O problema é que nunca venderia esse livro. Além do mais, até cumprir todo o trajeto desde o manuscrito até a livraria, o senador já estaria eleito e empossado. Mas, se contarmos a sua prima Molly tudo que descobrirmos aqui, e se ela passar essas informações para os editores do jornal... Sim, sim, isso pode dar certo! - Vai desistir do livro? - Já desisti. Não gosto de Harrison, Jane. Há algo nele... alguma coisa... 58 - Escorregadia? - Então também percebeu? Ela assentiu, e o movimento sacudiu toda bebida que havia conseguido colocar no estômago, espalhando uma onda de tontura e mal-estar. Vou lhe dizer o que penso, John. Acho que é uma grande coincidência estarmos aqui juntos com o mesmo objetivo. Quero dizer, quais são nossas chances? John sentou-se na cama para encará-la. - Escute, contei seis jornalistas aqui no hotel, todos para o encontro. Acredita mesmo que eles vieram discutir o aquecimento global ou a ética na política? Não. Eles estão aqui porque o atual presidente não pode mais concorrer à reeleição, e o vice já anunciou que vai se retirar para tratar da saúde; isso faz de Harrison uma grande possibilidade... se ele decidir concorrer. - E quanto aos outros partidos? - A oposição está dividida. Todos os partidos anunciaram nomes desconhecidos, o que deixa a imprensa sem uma história interessante por alguns meses, pelo menos até um deles começar a se destacar. Harrison não é só a maior história da cidade neste verão, mas a única. O fato de estarmos aqui com o mesmo objetivo é uma coincidência, mas não é a maior de todas. Metade dos presentes vieram com a intenção de observar o senador Aubrey Harrison por uma ou outra razão. - Até Brandy Hythe? - Talvez. Ela não seria a única atriz com aspirações ao escritório supremo. Lembra-se de Marilyn Monroe? Grace Kelly, Barbra Streisand, Liz Taylor... Brandy Hythe pode estar pensando em ser a primeira-dama. Fama, interesses políticos, poder, dinheiro... Quem sabe? Muitas mulheres sonham ser a próxima Jackie Kennedy ou a próxima Hillary Clinton. Jane massageou a testa. Enquanto sentisse dor de cabeça, não pensaria no enjôo de estômago. - Não entendo muito dessas questões. A política é assim tão complexa? - Não. Tudo é apenas um jogo. Siga o poder, siga o dinheiro. E no momento, siga Aubrey Harrison e veja aonde ele vai nos 59 levar. Dos trezentos inscritos, aposto que três quartos estão aqui só para descobrir qual é a intenção de Harrison. Os outros já sabem. E eu quero descobrir o que eles já sabem. - E depois quer que eu conte tudo para Molly. - Exatamente. Somos uma equipe, Jane, pelo menos enquanto não passar para o lado de Dillon Holmes. - Eu não... Agora está sendo grosseiro. - Desculpe. Só estou dizendo que... Ah, viva sua aventura, mas lembre-se de que Dillon Holmes só está apaixonado por Dillon Holmes. Não alimente esperanças tolas. -Não estou interessada nesse tipo de aventura. Você fala como se eu quisesse ir para a cama com o primeiro homem que encontrar. - Não olhe agora, Jane, mas já está dormindo com um homem. Ela o encarou indignada. Depois se deitou e virou de lado. - Acho que preciso dormir. John apagou todas as luzes e foi para a cama. - Acabei de encontrar Toby Patterson - Dillon disse ao senador quando os dois se encontraram na suíte. - Ele está ficando nervoso. - O rapaz aceitou o uísque preparado por Harrison e sentou-se. - Por quê? - Aubrey serviu-se de uma dose generosa de uísque sem gelo. - Ele quer sua palavra o mais depressa possível. Ontem, se possível. Alguns contribuintes começam a fazer barulho em torno de Claxton, sobre apoiá-lo e convencer Patterson a endossá-lo. Afinal, Claxton é o governante mais popular do estado de Patterson. - Da Pensilvânia? Depressa, Dillon, quero os nomes de todos os presidentes que saíram da Pensilvânia. Posso citar um, porque foi o único que jamais existiu. Buchanan. O velho Jimmy não foi capaz de impedir a Carolina do Sul de apartar-se, e todos sabem o que aconteceu em seguida. - Mesmo assim, Claxton é limpo, e muitas pessoas gostam dele. Eu mesmo sugeriria que o convidasse para ser seu vice-presidente, mas ninguém aceitaria um presidente de Nova Jersey com um vice da Pensilvânia. Você ainda precisa da Califórnia. - Tem certeza de que vou concorrer? 60 - Todos sabem que sim, Aubrey. Devia ter ouvido a adorável srta. Preston recitando elogios esta noite. Na opinião dela, você vai conquistar a nação, e isso inclui Romanowski. Ele ainda me preocupa, porém menos do que antes. Acho que ele só queria encontrá-lo, ver se ia se lembrar dele. Oh, e sugiro que contenha um pouco essa sua relação com Brandy. Queremos a Califórnia, é verdade, mas Orange County, não Hollywood. É melhor evitar qualquer tipo de ligação com Hollywood. - Talvez eu não esteja interessado na sua opinião. - E talvez eu não me importe com o que diz ou pensa a meu respeito. É melhor começar a lembrar quem dá as ordens por aqui, Aubrey. - Você nunca desiste, não é? Sabe que eu não estava falando sério naquela noite. Só queria desabafar. - E a mídia vai acreditar nisso. Por que não convoca uma coletiva e explica tudo que disse naquela noite? Vamos ver o que acontece. Quer ver o impresso? - Ah, pelo amor de Deus! Ainda carrega essa coisa com você? Dillon levantou-se para ir ao quarto. Quando voltou, ele trazia duas páginas impressas. - Aqui está. Sim, eu sempre tenho esses papéis comigo, caso tenha de refrescar sua memória. Mas nunca carrego a fita, tio, como deve saber. - De repente ele sorriu. - Decidi organizar uma pequena festa para amanhã à noite. Será apenas uma reunião sem grandes pretensões, um evento para conhecer e cumprimentar certas pessoas. Manteremos o grupo habitual, mas alguns adicionais, caso alguém esteja interessado demais em nomes. E quero que preste mais atenção a essa Jane Preston, como já havíamos planejado. Ela é perfeita, Aubrey. Melhor do que imaginávamos. É jovem, bonita, ingênua... Um presente dos deuses. - Já entendi. - O senador coçou a nuca. - Vamos convocar os fotógrafos? - É claro que sim. Você e Preston sorrirão para as câmeras. Ela será muito útil para impressionar as mães, lembra? Mas não exagere, Aubrey. Sorria para ela, mas evite expressões insinuantes. Entende o que estou dizendo, não é? Para ser mais claro, quero que fique longe das calcinhas daquela mulher. 61 Capítulo VIII John estava começando a suspeitar de que o destino conspirava contra ele. Mal havia saído do quarto, e a primeira... ou melhor, as primeiras pessoas que encontrava no corredor eram Aubrey Harrison e seu detestável sobrinho, Dillon Holmes. - bom dia, Jane - Aubrey cumprimentou-a sorrindo enquanto apertava o botão do elevador. - bom dia, John. Lindo dia, não? Querem tomar café conosco? - Senador, não precisa... - Será um prazer, senador-John a interrompeu determinado. - Especialmente se Dillon também estiver presente. - Pode contar comigo, John. Era irritante. Não conseguia ficar perto do sujeito sem sentir vontade de agredi-lo. - Senador, devemos nos apressar, ou não chegará a tempo para o encontro com o congressista Patterson-Dillon lembrou quando todos se sentaram à mesa. - Sim, eu sei - respondeu Harrison. Depois se aproximou de Jane. - Ele é tão organizado, que às vezes me deixa irritado. Não prefere ser espontânea, Janie, querida? John conteve o riso ao vê-la corar. - Oh, mas Janie é muito espontânea, senador! Ela estava dizendo que adoraria esquecer os seminários dessa manhã e ir à praia. Acho que vamos construir um castelo de areia. - Vamos? - Jane perguntou espantada. 62 - Vamos. - Era surpreendente como sua alegria o enchia de satisfação. - Não imagina como o invejo, John - o senador confessou com um suspiro. - Não me lembro de quando foi a última vez em que fiz alguma coisa simplesmente por estar com vontade. Adoraria ir à praia, mas tenho um compromisso. Dillon, por que não vai com eles? Não precisa participar da reunião com o congressista. John viu o rosto de Dillon revelar espanto, choque, depois uma intensa raiva contida. - Francamente, senador, estou aqui a trabalho. Já fizemos algumas anotações... - Não, não, não... Estou falando sério. Vá com eles. Política, construir castelos na areia... É tudo muito parecido, não? A única diferença é que a areia não é tão maleável. - Está falando como se a política o houvesse desencantado, senador. - Não, John. Falo como alguém que conhece o processo político. É um caminho difícil, mas é necessário atender ao chamado do país. Jane sentiu a tensão e decidiu interferir. - O que devo usar para a festa desta noite? - Algo bem colorido, por favor - respondeu Dillon. - Algo que fotografe bem. A imprensa estará presente. - Imprensa? - John perguntou. - Pensei que a mídia não estivesse presente ao encontro. - E leciona Ciências Políticas? - Dillon disparou com sarcasmo. - Teremos eleições presidenciais em menos de dois anos, professor. Nenhuma atitude de um candidato em potencial é privada. - O senador disse que ainda não sabia se ia ou não se candidatar. Já tomou uma decisão, senador? - Jane sorria com ar inocente, embora curioso. Dillon riu. -Todos fazem a mesma pergunta. Por mim, meu tio anunciaria sua candidatura hoje mesmo. Mas ainda estamos analisando as pesquisas informais, considerando várias questões. Tudo isso exige tempo, Jane. 63 - E dinheiro - John acrescentou. - Não vamos esquecer o dinheiro. - bom dia a todos - Brewster cumprimentou enquanto se sentava ao lado de Romanowski. - Lindo dia, não? Já tomei café e dei uma caminhada na praia. - E agora está com fome outra vez? - John provocou, rindo. - Sei que não devia comer tanto, mas quem pode resistir? Jane notou que o editor havia deixado um livro sobre a mesa e leu o título na capa. - Shallow Ground? JP Roman? Pensei que tivesse todos os livros escritos por ele. John pensou em enforcar Brewster no poste mais próximo. - Oh, isso? É uma cópia para impressão, Jane. O livro só será posto à venda dentro de dois meses. Li todas as versões, desde o manuscrito, e agora estou relendo o produto final por simples prazer. Gosta de JP? - Oh, sim. Ele é muito bom. Mas só leio as edições populares, o que significa que estou sempre um ano atrasada com relação aos volumes de capa-dura. Tenho um exemplar do último título publicado em minha mala. Não por muito tempo, John decidiu, embora a foto na contracapa pudesse ser de qualquer criatura com dois ombros e uma cabeça. - Bem, estou satisfeito-ele anunciou enquanto se levantava. - Henry, gostaria de construir um castelo de areia? - Não, obrigado. vou participar do seminário sobre direitos autorais. Sei que vai me achar um idiota, mas quero ouvir um representante do governo relacionando todas as razões pelas quais o congresso ainda não aprovou a nova lei de proteção à autoria. - Tem razão, você é um idiota. Dillon, não vem conosco? Não precisa ser um castelo. Podemos tentar uma versão litorânea da Casa Branca, se preferir. - Obrigado, John, mas preciso mesmo discutir com o senador alguns dados sobre essa reunião. Outro dia, talvez? - Certamente. - Feliz, John segurou o braço de Jane e levou-a para a praia. 64 Seis horas depois de terem ido à praia, Jane declarou o castelo completo e aproveitou a presença de um jovem estranho, porém sorridente, para tirar algumas fotos. O rapaz já estivera por ali antes, sempre com suas botas de combate e uma longa capa escura, e ele parecia ser um mendigo, talvez um andarilho. Uma longa barba escondia parte de seu rosto, mas era possível ver os olhos azuis e astutos. Juntos, John e Jane sorriram para a câmera no exato momento em que uma onda mais violenta atacou o castelo. Jane sabia que a foto de John se atirando na frente da parede de areia para protegê-la com o próprio corpo mereceria um prêmio. - O que está lendo? - John perguntou quando saiu do banho e a encontrou deitada com um livro nas mãos. - O enxerto na contracapa deste livro. Shallow Ground deve ser muito interessante. Será que Henry me emprestaria seu exemplar depois de terminar a leitura? Um assassinato no senado! - O enredo parece ser pobre. - E Jane parecia ainda mais linda essa noite. A pele estava mais luminosa, resultado do sol e do dia ao ar livre, e o vestido leve, longo e colorido em diversos tons de azul parecia cobri-la com a alegria do verão. - Pronta para sair? - Não tenho uma escuta eletrônica como alguns personagens de JP Roman, mas podemos ir quando quiser. Só não sei o que fazer quando chegar lá. - Sorria. Converse. Escute. Quero saber com quem Harrison fala, quem tenta agradá-lo, e depois confrontaremos esses dados com as informações que já tenho. Aproxime-se de Brandy Hythe, se puder. Descubra que relação ela tem com o senador. Eu também vou estar atento. - Ainda acha que pode descobrir alguma falha grave do senador que sirva para compor seu livro? - Desisti da idéia de um escândalo político. Tenho muitos dados, é verdade, graças ao meu aluno e às pesquisas que fiz, mas levaria muito tempo para documentar tudo isso e trazer à tona. Pense em Watergate. Foram anos! Enfim, nesse momento estou mais interessado nas associações do senador com as mulheres. Um 65 padrão de comportamento, uma falha de moral que eu possa expor uma brecha através da qual todos possam enxergar o verdadeiro Aubrey Harrison. É isso que estou procurando. - E se Brandy Hythe tiver algum envolvimento com Harrison? - Não é apenas Brandy. É um padrão, o jeito como ele trata as mulheres. - Ele parece gostar delas. -- Escute, não posso denunciar Harrison por ir para a cama com barracudas executivas dispostas a pagar com o corpo por isenção de impostos e legislação favorável. Não tenho provas de suborno ou corrupção, apesar de estar certo de tais práticas na carreira do senador. Mas posso pegá-lo por ir para a cama com mulheres comuns, mulheres que ele engana e ilude. Posso denunciá-lo pela maneira como trata essas mulheres e o que pensa delas. O público devora esse tipo de denúncia, e lá se vai um político hipócrita que passou os últimos trinta anos pregando comportamento moral, caráter e retidão de princípios. - John, o senador nem é casado. Quem se importa com o que ele faz em seus momentos de folga e privacidade? - Ficaria surpresa se soubesse... - Não gosta mesmo dele, não é? Não é apenas uma questão política. É pessoal. Era melhor encerrar o assunto por enquanto. - Venha, vamos embora. Disse a Henry que estaríamos lá às cinco. Ele não gosta de ficar sozinho em situações sociais. - Ele disse isso? Quando? Droga! - Há alguns minutos, quando você estava no banho. Henry ligou para cá. - Ah... Por ora conseguira escapar ileso. Ou quase. Só teria de tomar mais um banho frio quando retornassem da reunião, e tudo ficaria bem. 66 Capítulo IX Molly tentou falar com Jane pelo celular, mas, como estava no meio de uma festa, Jane prometeu ligar mais tarde e desligou o aparelho. - Falando com o papai e a mamãe? - John perguntou atrás dela. Ele carregava um prato com bolinhos de queijo, e Jane serviu-se de um salgadinho. O queijo derretido obrigou-a a usar língua, lábios, dedos e dentes para executar uma tarefa que normalmente teria sido simples. - Não faça mais isso - ele gemeu. - E nem tente me convencer de que não sabe do que estou falando. - Garanto que não estava tentando... eu não queria... Pare de rir de mim! - Ou dou risada, ou posso acabar perdendo a cabeça. Ia dizer que não estava tentando me incendiar? - É claro que não! Por que eu faria isso? - Não sei, mas você faz. Sempre. Mesmo quando não está tentando. - Bem, esse é um problema seu. - Meu? Dormimos no mesmo quarto, lembra? Talvez o problema seja seu, também. Era sua chance de começar a grande aventura, e Jane decidiu agarrá-la. - E se... - Ela respirou fundo. - E se eu disser sim? - Sim... para quê? - Ah, para... para... Você sabe. Aquilo. 67 - Ah, meu Deus! Criei um monstro. Eu só estava brincando, Jane. Foi brincadeira, está bem? Jane não sabia como havia conseguido sorrir, mas estava sorrindo. - Eu também! Estamos empatados! - Ela pegou mais um bolinho e repetiu o malabarismo com o queijo derretido. - Humm... Delicioso! Até mais tarde, John, querido. Jane pretendia buscar um pouco de privacidade no banheiro, mas encontrou Dillon Holmes. - Ah, aí está você, Jane. - Dillon enlaçou-a pela cintura e levou-a para perto do senador, que estava em pé na frente do bar com um copo de limonada na mão. Limonada? Há pouco ela o vira bebendo uísque. Sem gelo. Jane olhou em volta, viu as câmeras de tevê e entendeu tudo. - Aqui está ela, senador. Harrison passou um braço em torno de sua cintura e puxou-a para perto. O primeiro flash explodiu. Luzes intensas a ofuscaram. Jane queria fugir, mas havia um microfone diante de seu rosto. O repórter olhou para a câmera e anunciou o "grande senador Aubrey Harrison, filho pródigo e respeitado governante de Nova Jersey", e depois se dirigiu ao político. - É uma honra tê-lo conosco em Nova Jersey, senador Harrison. - A honra é toda minha, Jim. Jane sentia a mão do senador descendo lentamente e tentava ouvir a entrevista. - Conversei com muitos especialistas ao longo de minha carreira, Jim, sobre muitos assuntos, mas sei que a melhor maneira de conhecer tudo sobre a realidade e o cotidiano do povo é estar em contato direto com o povo. Gente como Jane Preston. Jane mora em Fairfax, Virgínia, e mora com os pais. Estamos falando de uma mulher solteira que cuida de seus idosos queridos e administra uma escola de educação infantil. Pediu financiamento no Bureau de Pequenos Negócios para abrir sua escola, Jane? - Não, e meus pais não são... - Todos nós sabemos sobre os problemas da pré-escola nos dias de hoje - o senador prosseguiu -, mas esse é um conhecimento abstrato, exceto para quem tem filhos nessa faixa etária. 68 Como não tenho nenhuma criança em casa, trouxe Jane Preston para informar-me sobre os reais problemas da educação infantil e da pré-escola, sobre as dificuldades enfrentadas pelos pais e por educadores ligados a crianças nessa idade tão importante para o desenvolvimento da personalidade. Certo, Jane? - Bem, na verdade tenho algumas idéias sobre... - Maravilhoso! - O senador a beliscou. Beliscou! - Jim, Jane não é a única pessoa com quem tenho conversado a fim de estabelecer os objetivos de uma possível campanha presidencial. - Obrigado, senador - Jim agradeceu. Depois olhou para a câmera. - Este foi o senador Aubrey Harrison diretamente de Cape May, Nova Jersey. Jim Waters para o Live at Six. É com você, Suzanne. As luzes se apagaram e Jane afastou-se do senador. - Você me beliscou! - ela murmurou indignada. - Como se atreve? E como ousa me usar dessa maneira? Como sabia sobre meus pais, se eu nunca falei deles? - Ele não está ouvindo, Jane; já se voltou para o próximo assunto em sua agenda. - Dillon segurou seu braço e levou-a para a varanda da suíte. - Como ele sabe que moro com meus pais? - Jane, você está em uma reunião de pessoas muito importantes. Empresários, políticos, acadêmicos... O presidente estará aqui a qualquer momento dessa semana. É evidente que foi investigada. E, como senador da república, meu tio teve acesso aos resultados dessa investigação. É uma alegria dizer que você não tem nenhum registro desfavorável... Ou melhor, apenas um. - Eu? Do que está falando? - Molly Applegate. - Minha prima? O que tem ela? - Um registro policial, para começar. - Ah, pelo amor de Deus! Foi só uma confusão sem importância nos tempos da faculdade. Nem me lembro qual foi o problema. E Molly não foi a única a ser levada para a delegacia. - Mas foi a única a cumprir quinze dias de serviços comunitários em vez de pagar fiança. 69 - Molly tem princípios. - As vezes. E os pais dela se recusaram a pagar a fiança. Dillon sorriu, e de repente Jane sentiu uma enorme vontade de esmurrá-lo. - com exceção de sua prima, Jane, a investigação revelou uma pessoa íntegra e honesta, e isso chamou nossa atenção. O senador tem mesmo a intenção de discutir com você os problemas da educação infantil em nosso país. - Sei. Disse que o Serviço Secreto, ou quem quer que seja, investigou todos os convidados? - Sim, inclusive o estranho que a contratou. O homem com quem está dividindo um quarto... embora eu tenha alterado os registros de forma a provar que está instalada em seu próprio quarto, sozinha, caso alguém pense em investigá-la mais uma vez. O que quer saber? - Eu... nada. Há algo que eu deva saber? - Sobre o homem com quem divide um quarto? Não. Na minha opinião, não devia se expor dessa maneira, mas os tempos são de liberdade, não? Não existem regras, e vocês dois são solteiros e adultos. - Não há nada entre nós. - Ótimo. Continue dizendo o mesmo para quem perguntar. com licença, mas preciso ir impedir que o senador discurse sem que haja alguém fazendo anotações ou tirando fotos. Jane também voltou à suíte para procurar por John. Como pudera pensar que Dillon Holmes era inofensivo ou atraente? - Fomos investigados, John - ela anunciou sem rodeios ao encontrá-lo sozinho em um canto da sala. - Estamos em um encontro de pessoas importantes. O que esperava? - Quer dizer... que não está preocupado? - Não. Os dados são mantidos em sigilo. - Ah, é? Então, como eu soube a respeito deles? - Não sei. Acho que... deduziu? - Não. Dillon Holmes me contou sobre a investigação. Ele sabe tudo sobre mim. Sobre meus pais, sobre Molly... Tudo. - O que ele disse sobre Molly? 70 - Holmes sabe que ela tem um registro policial. - Ah, só isso? Perfeito. Sua prima é a ré. Ele não disse que a conhecia? - Não. E nem precisava dizer. Ele sabe que eu sei que ele sabe... Ah, enfim. Ficou subentendido. Dillon deve pensar que Molly é uma maluca, porém inofensiva. - Ela é maluca? - Sim, mas quem Dillon Holmes pensa que é para criticá-la? Oh, e ele sabe que estamos dormindo no mesmo quarto. - É mesmo? Explicou ao príncipe que temos duas camas? - Não. Ele revelou que alterou os registros para esconder que estamos nos mesmos aposentos, porque o senador quer me usar para fins publicitários. - Humm... O homem parece estar com pressa. - Eu não havia pensado nisso. Acha que já temos algo concreto para dizer a Molly? -Ainda não. Não temos provas, e também não podemos contar com Brandy, porque ela afirma que Harrison é um senhor muito doce. - Ah, é? Esse doce senhor me beliscou! - Beliscou você? Onde? - Na frente das câmeras. - Não, Jane, quero saber... - Oh, isso... Bem, foi... Ah, você sabe. Onde ocorrem todos os beliscões. - Acha que a câmera registrou esse momento de fraqueza? - Duvido. O repórter estava na nossa frente, e nós estávamos de costas para o bar. Não, John, o senador não é um senhor muito doce. Ele é um velho sujo! E sabe de uma coisa? Agora sou eu quem quer pegá-lo. Quero acabar com ele. Você estava certo. Esse homem não merece ser presidente. Não só por causa do beliscão, mas porque ele esteve me usando para parecer bom aos seus eleitores. - Jane se deixou levar para fora da suíte e para os elevadores. Já estavam chegando ao corredor, quando ela se deu conta de que não havia recolhido suas coisas antes de deixar a festa. - Ah, não! Esqueci a pasta com os papéis do registro e os formulários do hotel! 71 - Não faz mal. Pode usar a minha, se quiser. - De jeito nenhum! Escrevi dezenas de cartões-postais, e eles estão naquela pasta. Jane voltou à suíte do senador sozinha e, ao entrar, aproximou-se de uma mesa de canto ao lado do sofá, onde havia deixado sua pasta. - Posso ajudá-la, senhorita? Ela sorriu para a funcionária uniformizada que recolhia copos vazios. A festa estava chegando ao fim, e os empregados do hotel já limpavam e arrumavam a suíte do senador. - Obrigada. Estou procurando minha pasta de registro. Sei que a deixei aqui, mas ela desapareceu. - Era azul? - Sim. Sabe onde ela está? - Alguém derrubou um copo sobre sua pasta, senhorita, e eu a levei ao quarto para impedir que os papéis acabassem molhados. Pensei que os documentos pertencessem a esta suíte, aos cavalheiros que estão hospedados aqui. Pode ir buscá-la, se quiser, mas tome cuidado. O lugar parece uma selva. Jane bateu na porta do quarto indicado pela funcionária e entrou. Não havia ninguém lá dentro, mas o aposento de fato lembrava uma selva de papéis. Havia pastas e documentos empilhados sobre a cama, na mesa, nos cantos do quarto e sobre uma cadeira. Uma guilhotina própria para picotar papéis havia sido posicionada sobre uma lata de lixo que já começava a transbordar. No meio de toda essa confusão, Jane viu o crachá com o nome de Dillon sobre o criado-mudo. E então, quando já pensava em sair e ir pedir a ajuda de Dillon, ela viu a pasta. Alguém a deixara aberta sobre uma pilha de documentos em cima da mesa. - Ah, que maravilha! Não quero passar mais duas horas escrevendo postais. Apressada, ela pegou a pasta e acabou derrubando toda a pilha de papéis. - Droga, droga, droga - resmungou, ajoelhando-se para recolher as folhas e colocá-las novamente sobre a mesa. 72 Jane já estava saindo com sua preciosa pasta de registro, quando Dillon apareceu na porta da suíte. - Procurando alguma coisa? - Oh, olá... Sim, estava... mas já encontrei o que queria. - Ela mostrou a pasta.-Alguém derrubou um drinque sobre a pasta, e uma funcionária a trouxe para cá para secar. Bem, preciso ir... Ele a segurou pelo braço, e Jane teve de fazer um movimento brusco para soltar-se. O sorriso dele era quente, íntimo. Como ele conseguia ligar e desligar aquela expressão e ainda parecer sincero? -Tem certeza de que não pode ficar? Ainda não tivemos tempo para conversar... a sós. - Eu sei, mas John está esperando por mim no elevador. -Bem, então nos veremos no jantar, dentro de alguns minutos. E depois, se não se importar, gostaríamos de tirar algumas fotos suas com o senador na varanda do hotel. Pedi aos funcionários que levassem seus filhos e alguns brinquedos. Acho que o cenário será perfeito. Foi nesse momento que ela percebeu que o sorriso de Dillon não envolvia seus olhos. - É claro - respondeu, lutando contra a sensação de que esse homem, esse homem sorridente, inofensivo e agradável estava furioso com ela por alguma razão. Molly? Seria ela o motivo de sua ira contida? Ele havia descoberto todo o plano? Preferia não pensar nisso agora. Forçando um sorriso, ela se despediu com um aceno rápido e saiu para ir encontrar John no elevador. 73 Capítulo X Jane saiu do elevador e seguiu para a varanda como se nem notasse a presença de John. Ele a seguiu, intrigado e apreensivo. - Jane, o que aconteceu? Aquele... o senador beliscou você novamente? - Não. Eu... só preciso de um pouco de ar. Certo. E ele era a rainha da Inglaterra. - Agora que já respirou, podemos ir jantar? - Não! - Ela reagiu em pânico. - Quero dizer... Temos mesmo de jantar? Comi tanto na festa que nem estou com fome. - Desculpe, mas eu estou faminto. O que acha de trocarmos o restaurante pela barraca de cachorro-quente na praia? - Ótima idéia! Era isso. Jane estava com fome, mas preferia evitar o restaurante e todas as dependências do hotel. Por quê? Teria de esperar para saber. Estavam sentados em uma das mesas montadas ao lado da barraca de cachorro-quente, quando Jane começou a falar: - Estive no quarto de Dillon. Alguém derrubou bebida na minha pasta, e uma funcionária levou os papéis para o quarto pensando que pertencessem aos hóspedes daquela suíte. Fui buscar minha pasta, derrubei uma pilha de documentos, e estava terminando de recolher todos aqueles papéis quando Dillon apareceu. Ele parecia zangado. Quero dizer, ele estava muito zangado. 74 - Invadiu a privacidade do homem? - Não... Ou melhor, sim, se pensar que entrei em seu quarto. E era o quarto dele, porque vi o crachá sobre o criado-mudo. John, o homem não está aqui por diversão. Não imagina a quantidade de papéis e documentos que ele mantém dentro do quarto. - Bem, tudo indica que Harrison vai anunciar sua candidatura ainda essa semana, o que significa que temos de correr, se quisermos fazer alguma coisa. Viu algum papel comprometedor dentro do quarto? - Nada. E não encontraria nada, mesmo que tivesse um dia inteiro para procurar. Só achei minha pasta porque ela é azul e estava no alto de uma pilha. -Dillon disse alguma coisa que possamos usar para incriminar o senador? - Não. Ele só disse que querem me fotografar com Harrison na varanda do hotel depois do jantar. Ele até conseguiu algumas crianças para a foto, o que, na minha opinião, é um golpe muito baixo. - Bem-vinda ao mundo dos políticos. Os dois terminaram de comer e foram caminhar pela praia enquanto conversavam. Sem os sapatos e as meias, com a gravata frouxa e a calça dobrada até os joelhos, John não conseguiu evitar uma imagem estereotipada e até engraçada. - Tenho a sensação de estar invadindo um comercial de tevê - disse. - Uma propaganda de colônia masculina - ela completou. - Só precisamos do cavalo. Sabe cavalgar? - Sim, mas prefiro evitar. Nunca encontrei um cavalo grande o bastante para mim, e até minha motocicleta é desconfortável. Não gosto da sensação de ter os joelhos colados nas orelhas. - Ah, eu acho que seu tamanho é perfeito. - Está brincando, não e? - Não. - Quer me adular. Ainda tem medo de mim. Sim, é isso! - Eu? Medo de você? - Vi sua expressão de pânico no sábado, quando me viu descendo do carro na frente da agência de acompanhantes. 75 - Bem, você tem de reconhecer que é um homem enorme... e peludo. Ele parou para encará-la. - O quê? - Peludo. Vai dizer que nunca percebeu? Deve ser o maior consumidor de lâminas de barbear de todo o país! - Uso barbeador elétrico. E troco as lâminas duas vezes ao ano. E você merece um castigo por isso. - Que castigo? John chutou a água salgada de forma a atingi-la com alguns pingos, mas calculou mal a intensidade do movimento e acabou por ensopá-la. - Sabe que isso vai ter troco, não é? - Jane perguntou encharcada. - Estou esperando. Durante os trinta minutos seguintes, os dois correram pela praia e brincaram na água como crianças despreocupadas. A tristeza e o medo haviam desaparecido dos olhos de Jane, e de repente John sentia vontade de tomá-la nos braços e beijar aquela boca carnuda e tentadora. E foi o que ele fez. - Você... me beijou - ela murmurou ainda em seus braços, os pés longe do chão e as mãos apoiadas em seus ombros. - Eu sei. - E eu gostei. - Eu também. O segundo beijo foi mais demorado e menos inocente. Jane o envolveu com as pernas, e John caminhou para dentro do mar em busca de um mínimo de privacidade. - Ei! Ei, saiam daí! Não podem nadar depois das seis! - Ouviu alguma coisa? - Não, Jane, eu... Uma onda mais alta os derrubou. Rindo, os dois voltaram à praia sem se importar com as roupas ensopadas. - Não estavam usando trajes de banho! - disse o homem que os censurara da areia. - Estão em Cape May, amigo, não na Riviera. 76 - vou me lembrar disso - ele respondeu. - Ei, saia daí! - gritou, notando que um mendigo se aproximava de seu paletó. - Não se atreva a tocar nessas coisas! Não precisa gritar, John. É Kevin. Ele tirou aquelas fotos para nós, lembra? Sim, eu lembro... E sua bolsa está embaixo do meu paletó, lembra? Kevin levantou-se e acenou. Depois se virou e voltou para a estrada, o sobretudo e as botas de combate criando uma imagem irreal no cenário de areia e mar. John e Jane decidiram voltar ao quarto e tomar um banho, e estavam a caminho da entrada do hotel quando ela viu Dillon. Havia uma pequena multidão na varanda. Harrison, câmeras, crianças... - As fotos! Jane sorria. - Parece que eles não sabem como lidar com as crianças - disse, notando que o caos reinava absoluto no pequeno espaço da varanda. - Acha que ainda precisam de mim? - Não sei. Quer perguntar? - Não sou tão corajosa, infelizmente. Venha, vamos correr. Jane segurou a mão dele e correu para o elevador, detendo-se apenas para acenar para Dillon Holmes que, boquiaberto, nem reagiu. Enquanto Jane tomava banho, John pensava no estranho mendigo que parecia estar sempre por perto, especialmente quando deixavam algum objeto na praia. Kevin. Seria mesmo um mendigo, ou alguém contratado para investigá-los? O computador! Se alguém tinha algum interesse nele, só podia ser por causa das investigações realizadas em torno de alguns políticos. Especialmente de Aubrey Harrison e Dillon Holmes. John ligou o laptop, digitou a senha de segurança e verificou a última data de modificação de alguns arquivos. Ali estava a prova. Os três arquivos mais sigilosos haviam sido violados. O cartão de acesso ao quarto havia sido deixado no bolso direito do paletó, mas, antes de entrar, ele o encontrara no bolso esquerdo. 77 Estaria recebendo alguma mensagem? Kevin queria avisar que havia copiado seu cartão magnético? - Droga! Maldição! - John! O que houve? Ele desligou o computador e fechou-o na maleta. -Nada. Estava verificando meu e-mail, mas só encontrei mensagens de publicidade e correntes. Ela usava novamente aquele pijama azul com nuvens brancas, e os pensamentos que invadiram sua mente deviam ser considerados criminosos em pelo menos cinco estados. Como podia pensar em sexo num momento tão difícil? Alguém invadira o quarto! O que mais fora tocado? E como explicaria o fato de revirar todo o quarto em busca de um equipamento de escuta? - Não vai tomar banho? Dane-se a escuta! Ele e Jane haviam começado algo muito interessante na praia, e pretendia dar continuidade ao assunto o mais depressa possível. - Já estou indo. Não devia alimentar ilusões. Jane era o tipo de mulher que esperava compromisso, palavras de amor e fidelidade. E John não sabia se estava preparado para isso. Na verdade, estava preocupado demais para pensar nisso. E se houvessem levado alguma coisa do quarto? Não podia revirar tudo sem chamar a atenção de Jane, e não queria assustá-la. Amanhã. Sim, ela já havia dito que gostaria de participar de um seminário sobre a merenda nas escolas públicas, e ele já havia informado que ficaria no quarto revisando algumas anotações. Até lá... Seria mais uma longa noite. 78 Capítulo XI Na manhã seguinte, Jane terminava de se arrumar e pensava nos beijos que havia trocado com John na noite anterior. O que havia acontecido? Ele era um cavalheiro, e por isso decidira não pressioná-la? Ou ela não conseguia excitá-lo? Depois de experimentar seus beijos, ele havia desistido de tentar seduzi-la? Bem, se o homem não era um santo, e sabia que ele não era, só restavam duas alternativas: ou ele não se sentia atraído... ou era um perfeito cavalheiro. - Ah, finalmente saiu do banheiro - ele disse ao vê-la. - Sente-se. É hora de pensarmos em um plano. - Lamento, mas estou atrasada. Faltam quinze para as nove e... - Está nervosa, Jane? - Estou. - Por causa de ontem à noite? - Bem, foi... - Eu sabia! Não devia ter tirado proveito da situação. Só está aqui por causa de sua prima, e eu meti os pés pelas mãos. O fato de ter dito que queria uma aventura não significa que eu seria essa aventura, embora esteja muito atraído e... - Acha que estou pensando em usá-lo para viver minha aventura? É isso, John? - Não sei, eu... - Por que não tentamos novamente? - Talvez mais tarde, quando eu conseguir entender o que está 79 acontecendo aqui. Sei que vai estranhar meu pedido, mas... quero que se aproxime um pouco mais de Dillon Holmes. - Quer que eu... o quê? - É para isso que estamos aqui, Jane. Para descobrir se Harrison será candidato ou não, para revelar ao mundo que tipo de pessoa ele é. - Não estou acreditando. Quer que eu vá procurar Dillon? Depois de eu ter dito que ele estava furioso comigo ontem à noite? - Ela pegou a bolsa e a pasta azul. - Francamente! - Eu pago mil dólares a mais. Pode usar esse dinheiro para comprar equipamento para o playground, talvez. Ela o encarou como se quisesse matá-lo. - Jane, não olhe assim para mim. Não estou sugerindo que vá para a cama com o homem. Só quero que conquiste sua simpatia. - Está bem, John. - Ela abraçou a pasta. - vou me aproximar dele. vou ser muito simpática e conseguir convites para todos os eventos. Dillon vai me contar seus mais caros segredos. Ah! Como se ele fosse falar! E enquanto eu cuido disso, você vai até a recepção e tenta conseguir outro quarto para seu grande, gordo e estúpido... estúpido... para sua estupidez! - Está zangada. Devia saber que ficaria brava comigo. Sinto muito, Jane. Normalmente sou muito bom com as mulheres. - É mesmo? Confesso que conseguiu me enganar. Ela saiu e bateu a porta, sem dar ouvidos a John que, aflito, pedia para que ela esperasse, pois ainda tinha algo a dizer. Não queria mais ouvi-lo. - Dillon. - O senador ergueu os olhos do jornal. Ele ainda estava de pijama, um conjunto de seda cor-de-vinho com um robe no mesmo tom. - Parece ansioso. - Temos um problema - Dillon anunciou enquanto se servia do café sobre a mesa da saleta. - Eu sei, mas ela não estará mais aqui dentro de alguns minutos. - A hostess da boate onde os dois haviam estado na noite anterior, uma ruiva exuberante e sorridente, saiu do quarto do senador ainda abotoando a blusa. - bom dia, meu bem. - Aubrey, querido, pediu café para nós dois! 80 - Oh, lamento, benzinho, mas tenho uma reunião importante com Dillon e alguns outros colaboradores. Vamos, Dillon, coma antes que eles cheguem. - Harrison levantou-se para levá-la até a porta.-Faço questão de lhe dar o dinheiro para o táxi. Lamento, meu bem, mas prometo recompensá-la esta noite. Às onze, na frente da boate? - Estarei lá, Aubrey - ela prometeu, guardando no sutiã a nota de cinqüenta dólares. - Não se esqueça de guardar segredo sobre nós dois, docinho. Até lá... Dillon jogou sobre a mesa o jornal que fingia ler. - Ainda vai voltar lá? - explodiu irritado assim que ficaram sozinhos. - Uma vez foi mais do que suficiente. Quantos anos tem essa mulher? Vinte e dois? Vinte e três? Se a imprensa souber disso... vou ligar para ela mais tarde dizendo que não poderá comparecer ao encontro. Como é o nome dela? - Nem imagino. Por isso chamo todas elas de benzinho, docinho e coisas assim. É muito mais simples.-O senador sentou-se para comer. - Disse que tínhamos um problema? - Além de sua obsessão por tudo que se esconde sob uma saia? Pelo amor de Deus, tio, pense nas conseqüências. E se uma delas for menor de idade? Além do mais, já deve muito aos amigos da mídia em troca de silêncio. O que pretende oferecer na próxima vez? As chaves do Salão Oval? - É o que eles esperam. Não sabem que você já está de posse dessas chaves, presidente Holmes. Todo o poder, porém sem o título. Afinal, qual é o problema? - Não me provoque, tio. Sabe que não pode fazer nada contra mim. Não com uma simples cópia... - Do que está falando, Dillon? Qual é o problema, afinal? - O relatório! - ele explodiu furioso. - Estava em cima da minha mesa ontem à tarde. Foi onde o deixei depois de ter mostrado os papéis a você. O que fez com ele? - Espere um minuto, Dillon. Está dizendo...? - Exatamente! O relatório desapareceu! - Mas como...? Quem...? - Se não foi você, só pode ter sido Jane Preston. Ela esteve 81 aqui ontem à noite, aparentemente para procurar uma certa pasta contendo seus papéis de registro no hotel. - Pensei que houvesse decidido que Romanowski era inofensivo. Acha que ele a induziu a isso? - Sim. Acho que eles estão trabalhando juntos. O homem está jogando para ganhar. Sabe de uma coisa? Talvez devesse ter dito algo naquela primeira noite. Qualquer coisa para indicar que o reconhecia, que sabia quem ele era. Podia ter se desculpado, lamentado o passado... Qualquer coisa! Imaginei que Romanowski fosse apenas mais um inimigo impotente, mas agora sei que estava enganado. - Humm! O pivete de Maryjo? Perigoso? Ele me escreveu uma carta há anos, quando ainda era adolescente, contando que a mãe havia morrido. Mandei flores, uma cesta repleta de lírios. Quem poderia imaginar que aquele moleque tolo se tornaria JP Roman? - É bom olhar bem em quem está pisando, tio, porque às vezes a vítima cresce e volta para pisar em você. - Está falando de si mesmo? -Estou falando do ser humano em geral. Tenho pensado nesse tal JP Roman desde o mês passado, quando recebemos o relatório e somamos dois mais dois. Ele escreve sobre você há anos, sabe? Ainda não conseguiu nada de concreto, mas nós dois sabemos onde ele pode chegar. E agora, se não me engano, finalmente ele conseguiu a munição que queria. Pode acabar preso, tio. Pode... - Você sabe que eu não... - Eu sei? Como posso saber? - Ora, você sabe porque foi você! - Guarde seus argumentos para o tribunal. Se esse documento for divulgado nós estaremos acabados. Espero que ela não saiba o que tem em mãos. - Não há nomes naquele documento? Dillon estava pálido. - Qualquer pessoa pode escrever os nomes. Pode ser qualquer coisa. Uma cena de um filme, um diálogo de um livro... Ei, podemos dizer que Romanowski escreveu tudo e tentou convencer a imprensa de que nós havíamos protagonizado o trecho. Preciso 82 pensar. Por enquanto, só posso esperar que aquela infeliz tenha pego os papéis por engano e nem saiba que está com eles. Preciso daquela pasta. Ela costuma levá-la a todos os lugares. - Tem razão, Dillon. - Harrison sorriu. - Cancele meu encontro com a ruiva ardente. vou estar muito ocupado seduzindo a srta. Preston. - Depois daquele beliscão ontem à noite? Ela não vai se aproximar de você. Nunca mais. Não, tio, esse assunto é meu. Se me apressar, talvez ainda a encontre antes do primeiro seminário. E preciso conversar com nosso homem. Ele esteve investigando o quarto de Romanowski ontem à tarde. Talvez já tenha alguma coisa para nós. - Dillon, pense bem no que vai fazer. Não estrague tudo, ou juro que serei capaz de matá-lo com minhas mãos. Harrison fechou os olhos e respirou fundo. Qualquer que fosse o desfecho dessa última crise, tinha de livrar-se de Dillon. Não poderia ser o homem mais poderoso do mundo com o sobrinho brandindo aquela maldita fita sob seu nariz cada vez que quisesse alguma coisa... Quando terminou de revistar o quarto, John havia chegado a duas conclusões. A primeira era que nada havia desaparecido ou sido acrescentado. Apenas os arquivos de seu computador haviam sido "modificados" enquanto ele e Jane se beijavam na praia. A segunda era que havia chegado a hora de contar toda a verdade a Jane. Revelaria quem ele era e o que sentia por ela. Sempre havia tomado o cuidado de envolver-se apenas com mulheres liberadas e modernas, aquelas que não exigiam compromissos nem cobravam atitudes duradouras, porque não era exatamente o tipo de homem que acalentava a idéia de ter uma esposa e filhos. Conhecer Jane o levara a mudar antigas regras. Queria essa mulher. Ela era tão importante que havia ido à recepção implorar por outro quarto, só para que ela não fosse embora. E conseguira. Já havia ido conhecer o quarto, e até se conformara com a vista para a rua. Jane ficaria com a vista do mar. Talvez assim ganhasse alguns pontos com ela. 83 O telefone tocou quando ele pensava em começar a arrumar as malas para a mudança. - Alô? - Alô... Quem fala? Oops. - John Romanowski. E você deve ser Molly Applegate, a mulher que desistiu de ser minha acompanhante. - Jane está muito feliz com minha desistência, querido. - Ela riu. - A propósito, o que faz no quarto dela? - Eu... vim buscar um suéter para Jane. Ela está participando de um seminário. Sabe como são esses aparelhos de ar-condicionado... - Sim, eu sei. Escute, cuide bem de minha prima, ouviu? A pobrezinha está precisando se divertir, e acho que ela gostou de você. John riu. - Prometo que vou me esforçar. Quer que eu peça para ela telefonar? - Não, eu... Bem, sim. Estou com um problema aqui na escola. Quero dizer, dois, mas não vamos contar o menino que insiste em tirar a calça. O problema maior é com uma cliente nova. A pessoa que fez a entrevista por Jane pensou que a criança ficaria na escola em agosto, não em julho. E não fui eu, porque nem estava aqui. O fato é que o homem está furioso, porque a escola vai estar fechada no período em que a criança deveria estar aqui. Ele bateu o telefone no meu ouvido e disse que está vindo para cá. Estou pensando em trancar todas as portas. - Lamento, mas não creio que Jane possa chegar aí a tempo de resolver o problema. E já que você está aí... - Sim, eu... Ah, qual é o problema, afinal? É só um homem! É claro que posso lidar com um homem. Não diga a ela que telefonei, está bem? - Combinado. Oh, aí vem ela - John murmurou ao ouvir o ruído do cartão na porta. - Boa sorte, Molly. - E desligou antes que ela entrasse. - Olá, Jane. Ela não respondeu. Séria, caminhou até a cômoda e abriu uma gaveta. 84 - Ainda está zangada comigo? - Não. Eu me atirei sobre você, e você me jogou para longe. Devo ser um peixe muito pequeno. Bem, vai ficar satisfeito em saber que fiz por merecer meu salário esta manhã. Dillon parece ter me perdoado, e combinamos sair para almoçar em um restaurante da orla. Depois iremos nadar. A última coisa que John queria era Jane na companhia de Dillon, especialmente longe de seus olhos. Havia notado sua reação quando o homem aparecera no sábado. Dillon Holmes era "seu tipo", como ela mesma havia demonstrado. Enquanto ele, o grandalhão peludo, não era. Jane pegou o biquíni cor-de-rosa. - Espere aí! Não vai usar essa coisa, vai? - Isto? - Jane mostrou as duas peças. - É claro que vou. E usarei também aquela adorável canga transparente até chegarmos na praia. - De jeito nenhum! Não tem outra coisa para vestir? Algo que a vista de verdade? -- Não seja ridículo. Ela entrou no banheiro e trancou a porta. Como se o julgasse capaz de entrar, mesmo sabendo que ela estava lá dentro, trocando de roupa! Estava ofendido. Não era um animal. Podia passar dias e noites trancado naquele quarto com ela sem ser reduzido a essa lamentável condição. Podia. E era exatamente isso que pretendia fazer. Outro quarto? De jeito nenhum! John guardou o novo cartão magnético na carteira, onde o deixaria até o dia de irem embora. 85 Capítulo XII Durante o passeio na praia, Dillon revelou que ele e o senador já sabiam que Jane estaria naquele encontro. Como proprietária de uma escola de educação infantil e mulher de conduta exemplar, ela havia sido escolhida para apoiar Aubrey Harrison em sua campanha, caso ele decidisse se candidatar à presidência. De acordo com Dillon, seu nome já havia aparecido em todos os jornais da tevê naquela manhã, e sua imagem estava definitivamente associada à do senador, pelo menos para a imprensa. -Quer dizer que o senador leu dezenas de relatórios e escolheu contar com a minha ajuda! Puxa! E eu que pensei que minha prima fosse mestra absoluta em me usar! - Molly Applegate? Ela é uma boa garota, mas pouco estável. Inteligente... Aposto que ela lhe contou que já nos conhecemos. Por isso ela não veio, não é? Molly sabia que eu não permitiria que se aproximasse do senador. - Prefiro não falar sobre isso, Dillon. - Porque é discreta e não quer falar sobre alguém que não está presente. Uma qualidade admirável, Jane. Tanto que vou lhe contar um segredo. Algo extremamente sigiloso. - Por favor, não faça isso! - ela pediu em pânico. - Não faça isso! - Confio em você. - Sei que já descobriu tudo sobre mim, Dillon, mas não quero saber nada sobre você. Nada mesmo. 86 - Não é sobre mim que vou falar, Jane. É sobre o senador. vou lhe dar aquilo que veio buscar. Aquilo que Molly tanto quer saber. - O quê? - Vamos deixar de rodeios. Molly precisa tanto de uma agência de acompanhantes quanto seu amigo Romanowski precisa de mais alguns centímetros. Sei onde Molly está fingindo trabalhar neste momento. Conhecendo sua prima como a conheço, imagino que ela queira ser a primeira a anunciar a candidatura de tio Aubrey à presidência. Para convencê-lo a falar, ela pretendia usar aqueles lindos olhos azuis, aquelas belas pernas... e talvez outras partes do corpo. Jane ficou em silêncio. O que poderia dizer? - Isso mesmo, Jane. Não tente mentir para mim. - Por que não gosta de Molly? - Ela é uma maluca. E também é uma inconseqüente. Vive de um fundo de pensão e não conhece o verdadeiro significado da palavra trabalho. Molly brinca com a vida. Podia dizer que Molly havia passado a infância em colégios internos enquanto os pais viajavam pelo mundo, ou que ela era dona de um coração grande como o oceano, mas Dillon não acreditaria em nada. - Sabe o que é mais engraçado? Estávamos pensando em dar essa história a ela. Nada pode ser melhor do que uma linda ruiva a seu lado no momento de um grande anúncio. Mas ela desistiu e mandou você em seu lugar. E você é ainda mais conveniente para nós do que Molly. - O senador me beliscou. Não posaria com ele nem por todo o chá da China. - Mas não vai desistir de obter o grande furo que sua prima está esperando. Já deixei instruções para que ela obtenha um passe de imprensa para a próxima sexta-feira. Em troca, diga o que gostaria de mudar nas leis que governam a educação infantil. E estou me referindo às leis federais, Jane. - Não pode estar falando sério! - Estou. É assim que funciona. Uma mão lava a outra. Pose para algumas fotos, seja boazinha com o senador durante essa 87 semana, e em troca Molly terá sua exclusiva... e fará o anúncio formal dessa mudança que você vai determinar, dizendo que essa será a primeira lei que o presidente Harrison levará ao congresso no dia vinte de janeiro. Desde que seu pedido seja razoável, é claro. - Então, ele vai mesmo concorrer... - É claro que sim. Mas não vai dizer nada antes da hora, Jane. Não quando temos isto aqui. - Ele tirou algumas fotos do bolso. Ela e John se beijavam na praia. Ambos tinham as roupas molhadas e trocavam um olhar nada platônico. - Ah, o amor é lindo! E os pombinhos têm um ninho romântico bem aqui no hotel. Uma acompanhante contratada e seu bonitão intelectual. Não acha que isso denegriria o elevado padrão moral deste encontro, Jane? E todos pensam que você é uma boa moça. Seus pais podem receber cópias destas fotos. E os jornais de Fairfax, enfim, toda a imprensa nacional, se for necessário. Os pais de seus alunos devem ler os jornais. Jane, minha querida, aprenda uma importante lição: não faça em público aquilo que não quer tornar público. Jane estava chocada. - O senador me beliscou. Posso contar aos repórteres e explicar que esse foi o motivo pelo qual não apareci para a sessão de fotos. - Refere-se aos tablóides? Sim, é claro. Eles adoram um bom escândalo. Mas eles imprimiriam fotos da sua escola ao lado das do senador, e em pouco tempo o mundo a estaria chamando de oportunista e mentirosa. - Tablóides? Não, obrigada. Odeio esse tipo de publicação. Leio todas as manchetes enquanto estou na fila de um caixa no supermercado, mas nunca compro um exemplar. - Lamento, Jane. Sei que teria sido mais fácil seduzi-la para conseguir o que quero, mas você não se mostrou interessada, e eu não tenho tempo a perder. Até mais tarde, meu bem, na hora do jantar. - Ele a beijou no rosto. - Use vermelho ou rosa. É sempre bom para as fotos. - Espere! Ainda há algo... - O que é agora? - Vai ter de atender a mais um pedido, Dillon. Quero saber 88 tudo sobre John Romanowski. Sei que investigaram todos os convidados para o encontro por questões de segurança. Deve ter informações sobre John. - O que quer saber? - Qualquer coisa. Ele leciona ciências políticas. O que mais há para saber? Dillon hesitou. Depois encolheu os ombros. - O que mais há para contar? Professor universitário, solteiro, mora com uma tia, pais falecidos, gosta de carros velozes... É você quem tem de me dizer se ele é bom na cama, embora eu não esteja interessado. Um homem gordo com um cigarro no canto da boca aproximou-se para falar com Dillon. Ele falou sobre uma reunião marcada para aquela tarde, e Jane teve certeza de que já o vira antes. Sozinha, Jane tentou pensar em alguma coisa. O que poderia fazer? Molly! Sim, era isso. Precisava falar com Molly! O telefone tocou seis vezes antes de Molly atender. - Preston Kid Kare. Ela soava ofegante. - É Kiddie Kare, Molly. Onde estava? Pensei que quisesse passar o dia todo trancada no escritório. - Estamos sem energia elétrica. Sem ar-condicionado, sem televisão e vídeo. Estava distraindo os pestinhas com minha aula de sapateado. - Que maravilha! - Jane riu. - Já começou a cadeia? - Pelo amor de Deus, as crianças não são tão ruins! - Cadeia de ligações, Molly. Se está sem luz elétrica, precisa começar a ligar para algumas mães, que ligarão para outras e assim por diante. Normalmente a escola fica aberta até a última criança ser levada pelos pais, mas é comum que todos apareçam mais cedo nessas circunstâncias. Não leu as anotações? - Não tive tempo para isso. - Entendo. Tem tempo para conversar sobre algumas coisas importantes? - É claro que sim. A propósito, parabéns, srta. Estrela da Televisão! 89 - Ah, não... Você já viu? - Se vi? Seus pais gravaram as cenas na segunda vez que elas foram levadas ao ar! Jane Preston ao lado do futuro presidente! Você é um sucesso. E o vestido ficou ótimo. - Molly, a idéia não foi minha. - Eu sei que não. Foi minha. - Não é isso... Escute, estamos sendo vítimas de chantagem. - Jane explicou toda a situação de maneira resumida, fingindo não ouvir os palavrões com que Molly se referia a Dillon. No final, sendo como era, Molly perguntou: - Então a prova é quente? - Ah, pelo amor de Deus! Estou sendo usada aqui! E você está sendo usada aí. A política é uma coisa nojenta e sórdida. Nada disso tem importância? - Janie, Janie, Janie... Vivo em Washington, lembra? Bemvinda ao mundo real. E lembre-se, essa é uma via de mão dupla. Dillon estava falando sério quando prometeu recompensá-la pela ajuda, embora ele não possa garantir que a lei será aprovada pelo congresso. Tudo que ele pode fazer é apresentá-la. Assim, certifique-se de incluir esse assunto no anúncio da candidatura, porque assim Harrison não poderá se esquivar sem parecer desonesto e mentiroso. E, acima de tudo, eu consigo minha história e salvo meu emprego. E você... Bem, nós duas sabemos o que vai ganhar com isso, se é que já não ganhou. Por acaso tem cópias das fotos? Adoraria conhecer o professor Romeu. -É Romanowski, e você não tem graça nenhuma. Adeus, Molly. Você foi uma grande e completa inutilidade! - Por favor, não desligue - Molly pediu rindo. - Não é tão ruim assim. Não é mesmo. - Talvez não para você. De sua parte, o que mais pode querer? Sou eu quem está metida na confusão! - É verdade. Estou indo muito bem por aqui. Escute, vou lhe dizer o que deve fazer. Conte tudo ao professor. Toda a verdade, inclusive sobre a minha participação nessa história. Dillon já descobriu tudo mesmo... Aposto que ele vai entender e até colaborar, porque você mesma disse que ele também tem algum interesse nisso, não é? 90 Mas Molly não sabia tudo. Ouvira apenas uma versão editada, e por isso desconhecia que Jane e John dividiam um quarto de hotel. Não sabia que John já sabia sobre sua participação e já havia se oferecido para ajudá-la, porque também queria saber mais sobre Harrison. Uma denúncia... Francamente! John queria destruir o senador! - Molly, ainda não sei... - Escute, uma das crianças está chorando. Preciso desligar, está bem? Quer um conselho? Tranque sua consciência em uma gaveta qualquer, jogue seus sapatos baixos no mar e divirta-se. Viva, Jane! Você merece. Até logo. Jane olhou para o celular como se não o reconhecesse. Era tudo que precisava! Permissão de Molly para viver um romance, um caso... - Muito obrigada - ela disse. E quando voltou ao saguão, Jane estava sorrindo. - Maldição! - John explodiu quando Jane acabou seu relato. - Dillon e Harrison estão quilômetros na nossa frente! Há semanas eles têm planejado como usá-la, como usar sua prima e pelo menos metade das pessoas que estão neste hotel. Enquanto isso, nós nem desconfiávamos de seus planos. O senador sabia que ele era filho de Maryjo e preferira fingir que não o reconhecia. Até aí, nada tão grave. Mas... o bastardo sabia que ele era JP Roman? Antes de Kevin invadir seu computador? Sim. Por isso Kevin invadira o quarto. Kevin, o mendigo, trabalhava para Harrison, e Harrison queria saber se JP Roman escrevera alguma coisa sobre ele. Ou não? Bem, era uma explicação. - John? Algum problema? - Não, eu... estava pensando. Devo ser muito sem graça, se Harrison não encontrou uma maneira de usar-me. - De acordo com Dillon, a investigação não revelou nada em seu passado que pudesse ser útil ao senador. Solteiro, órfão, professor universitário, vivendo com a tia... É isso. 91 - Estou ofendido - ele brincou, tentando disfarçar a tensão. - vou buscar um refrigerante para mim. Quer alguma coisa? - Uma soda. John conversou com ele mesmo enquanto inseria moedas na máquina de refrigerantes do corredor. Por que Dillon não havia contado a verdade a Jane? Sabia que a investigação revelara o nome de seus pais. James e Maryjo Romanowski. Então, desde a primeira noite tudo havia sido uma encenação. Harrison sabia! Tinha de saber. Dillon mentira para Jane. Mesmo assim, Harrison devia estar preocupado com a possibilidade de John desafiá-lo publicamente com a história de Maryjo. Se havia mesmo descoberto tudo sobre John, tanto sobre sua vida pessoal quanto profissional, então ele devia imaginar que JP Roman estava ali para pesquisar, e isso o levaria a temer o que o escritor poderia publicar em seu próximo livro. O que explicava a invasão em seu computador. - Estive pensando - ele anunciou ao entrar no quarto com os refrigerantes -, estamos encurralados, Jane. Se aquelas fotos forem enviadas para seus pais, também serão mandadas para a universidade onde leciono, junto com as provas de que dividimos um quarto. Fui convidado para o encontro por meio da universidade, e duvido que o reitor Hennessy vá gostar de ver a reputação da escola arruinada por tablóides. - As fotos não são tão comprometedoras assim. - São suficientemente comprometedoras. E aliadas ao fato de estarmos dividindo um quarto... Bem, o que temos de fazer é virar o jogo em cima desses bastardos. Vamos encontrar um jeito de expor Harrison e seu cão de guarda Dillon à imprensa, vamos revelar que eles são a escória da humanidade e, mais importante, vamos contar tudo isso aos eleitores. - Isso é o que você sempre quis. Mas... como? - Jane, tenho algumas informações bem interessantes. Sei que pelo menos três homens presentes neste hotel estão de acordo com Harrison num certo fundo não-lucrativo que ele e Dillon criaram e que, se alguém examinar com atenção, possui diversos aspectos ilegais. É uma boa informação, e posso documentar a maior parte dela. 92 - E daí? O que vamos fazer com uma informação que nem pode ser totalmente documentada? -Tenha calma, sim? Estou começando a formar uma idéia. Vai haver um seminário esta noite. Acha que Harrison estará presente? - Não sei. - Jane levantou-se e foi pegar a pasta que deixara sobre o criado-mudo. Ali estavam todos os papéis com os horários e locais dos seminários e palestras. - Vejamos... Onde está aquela relação de tópicos? Fiz uma bagunça terrível quando derrubei a pasta no quarto de Dillon. Aqui... Aqui... - De repente ela parou e examinou uma folha de papel contida na pasta. - Espere um minuto... John! Oh, John! - O que é? - Será que pode dar uma olhada nisto aqui? 93 Capítulo XIII Jane estava na varanda do hotel. Sua missão nessa tarde de terça-feira era localizar Brandy Hythe e aproximar-se dela. A atriz estava na piscina, e ela decidiu que o momento era tão bom quanto qualquer outro para abordá-la. Determinada, Jane ergueu os ombros e caminhou para as cadeiras na área da piscina, tomando a direção de uma delas em especial, a que permanecia vazia ao lado de outra onde Brandy Hythe acabara de acomodar-se. - A água está muito fria? - ela perguntou ao se sentar. - Olá, Jane - Brandy cumprimentou-a com a simpatia habitual. - Não, a água está ótima. - Notei que estava no seminário sobre aquecimento global hoje de manhã. O que achou da discussão? A atriz ganhou um ânimo inesperado durante os vinte minutos seguintes, quando falou sobre como o aquecimento global poderia ser o mais grave problema da humanidade dentro de poucos anos. - ...e o senador Harrison não vê isso, Jane! - ela concluiu com um suspiro irritado. - Deve ser porque o aquecimento global não usa uma saia curta, não rebola e não contribui para suas campanhas. Ele vive fazendo discursos, mas acha que ele faz alguma coisa? Não. Nada! Quer um conselho, Jane? Não confie em ninguém que sorri enquanto fala. Oh, ele me deixa furiosa! Brandy Hythe não gostava de Aubrey Harrison. 94 - O senador quer que eu dê algumas idéias sobre a educação pré-escolar na América - ela comentou. - Ah, sim, imagino que sim. Não esqueça de usar tênis de corrida quando for ao quarto dele. Oh, e leve uma arma, também. Era hora de dar o próximo passo. - Ele me beliscou, Brandy. Bem na frente de uma câmera de televisão. O homem é um verme! - Verme. Boa palavra para descrever o senador. Escute... - Brandy mudou de posição para encarar Jane e baixou o tom de voz. - Posso lhe contar algumas histórias... - É mesmo? - Como era difícil disfarçar o interesse! - Oh, sim! E estou furiosa o bastante para contá-las. Na verdade, estou tão zangada que quero contar essas histórias ao mundo todo. Tomei minha decisão hoje de manhã. O sem-vergonha, descarado... Sabe por que estou aqui? - Para os seminários? - Ah! Como se alguém aqui estivesse interessado em ouvir a opinião dos especialistas! Sim, eles têm intelectuais de verdade espalhados pelo hotel para dar credibilidade ao encontro. O professor Romanowski, por exemplo, e você... Alguns cientistas corrompidos por falsas promessas... Mas o verdadeiro objetivo dessa semana é lançar a candidatura de Harrison para a presidência. Só isso. Ele está colhendo dinheiro, espalhando falsas promessas, cobrando dívidas de favores, fazendo chantagem, enfim, tudo que é necessário para garantir apoio. E tudo isso está acontecendo aqui, Jane. - E você? - Eu? Sou só uma vitrine. A menina de Nova Jersey que conquistou o mundo. Aluna bolsista em Princeton, estrela de Hollywood, toda essa bobagem. Concluí meus estudos graças ao fundo Mirabelle Flanders Hamson, que conferia bolsas de estudo a alunos exemplares. O nome da primeira esposa de Harrison. Fiquei tão grata que me ofereci como voluntária em sua campanha para o senado. Fiz discursos de grande impacto quando meu nome se tornou conhecido. Mas quando comecei a me dar conta de que o homem não era quem fingia ser e quis me afastar dele, Harrison tomou suas providências para impedir que eu escapasse. Pois bem, agora 95 estou farta disso. Ele que publique as fotos, se quiser. Estou farta de ser um objeto de decoração em seus palanques de campanha! - Brandy, acho melhor irmos conversar em outro lugar Jane sugeriu, certa de que encontrara algo grande ali. Quer beber alguma coisa em um bar da orla? Lá teremos privacidade. John encontrou Henry Brewster no Blue Pig, conforme haviam combinado por telefone. Henry lia mais um manuscrito e fazia anotações. - Você nunca pára de ler? - John perguntou rindo. - Esteve em algum dos seminários? - Eu? Só no primeiro, sobre direitos autorais. Todos falavam e ninguém ouvia. Uma tremenda perda de tempo. Tem idéia de como esse problema é sério? Ninguém respeita os direitos de autoria nesse país. No mundo! A pirataria é uma indústria milionária que alimenta outras vias criminosas, e ninguém se importa com isso! - Está nervoso, Henry. Por que não discute o assunto com Harrison durante o jantar? - Falei com ele ontem, e foi inútil. O assunto não é lucrativo para nosso grande senador, e ainda vai contra os interesses de muitos eleitores. - O senador Harrison não vale os votos que tem. E eu posso destruí-lo, Henry. - De novo essa história sobre a associação de fins supostamente não-lucrativos? - O nome é Sua América, Minha América. Sabe como o esquema funciona, não? Harrison vai à tevê anunciando a defesa de valores patrióticos e familiares, pede a contribuição de todos os eleitores, sendo que o dinheiro deve ser depositado em uma conta bancária cujo número ele anuncia nessas mensagens, e realiza apenas alguns pequenos projetos de cunho social para justificar o uso desse fundo. Essa operação tem nome, Henry. - Eu sei. Estelionato. Ah, os políticos... - Noventa e cinco por cento dos políticos são bons, Henry, homens e mulheres leais que só querem servir ao seu país. Mas 96 Harrison... Harrison é um sujeito sujo e desonesto, e vou desmascará-lo de qualquer jeito. - Então é isso? Vai usar o ângulo financeiro? Tem colaboração? Fontes confiáveis? Quero dizer, conseguiu mais do que já me mostrou? Porque aquilo não era suficiente. Precisa ser algo concreto, John, ou ele vai acabar com você, e com a Brewster Books por extensão. - Na verdade, optei pelo ângulo sexual. Mas não como pode estar imaginando. É sórdido, meio doente, mas simples, fácil para o público entender. Não sei se é verdade, mas tenho tudo documentado, impresso, e sei que isso é suficiente para destruí-lo. E você vai adorar... - Eu? - Henry, preciso de sua ajuda para pôr minha idéia em prática. Ou melhor, nossa idéia. Minha e de Jane. - Você e Jane? John, se corrompeu aquela criatura doce... - A idéia foi dela, John. Quase toda. Passamos boa parte da noite acordados discutindo os detalhes. A mulher tem profundidade, Henry. E sabe ser objetiva. E ela tem sardas. E o jeito como ela come? Amigo, tenho de enfrentar a realidade. Estou maluco por ela! - Você está...? - Henry balançou a cabeça. - É brincadeira, não é? Essa mulher não é seu tipo. - Eu sei. com Jane, um homem tem de ser sério. Por isso estou indo devagar, apesar de querê-la muito. Ela é a primeira mulher que consigo imaginar como mãe dos meus filhos. - Meu Deus... Nunca pensei que viveria para ouvir tudo isso. - E ainda vai ouvir muito mais, meu caro amigo. Mas, por enquanto, vamos falar sobre Harrison e como pretendo destruí-lo. Quer me ajudar? - Quem mais está metido nisso? - Além de mim? Jane, Brandy Hythe, se minha pesquisa estiver correta e se interpretei bem os olhares que ela lança para o senador, a prima de Jane, e mais um indivíduo que vai participar do plano como reforço, mas ainda não tenho certeza de sua participação, por isso vamos deixá-lo de lado nesse primeiro momento. - Disse que tem algo concreto? 97 - Exatamente. - John pegou as páginas dobradas que havia guardado no bolso. - Aqui está. John esperava por Jane no quarto do hotel. Já havia decorado suas anotações e destruído, e deletara do computador todos os dados relativos a Harrison e Dillon, não sem antes tê-los gravado em um disquete que havia deixado com Henry. Essa idéia havia sido de Jane, e como não conseguira pensar em nada melhor, ele a aceitara. Haviam discutido a invasão e concluíram que Kevin, o falso mendigo, poderia voltar para um exame mais minucioso. Mas o resto do plano era dele. A visita à loja de fotocópias no centro da cidade, o pote de geléia de uva e o jornal que retirara de um carrinho de serviço de quarto no corredor, o apelo sorridente para uma das delicadas camareiras para, por favor, substituir algo que ele levara por engano para seus aposentos. Às vezes ficava assustado com o próprio brilhantismo. Ao ouvir o ruído do cartão magnético na fechadura da porta, John sentou-se na cama e ligou a televisão, fingindo não estar ansioso. Jane entrou e sentou-se ao lado dele. Passaram metade da noite sentados daquela maneira, conversando e traçando planos. Dois "camaradas" planejando a queda de um dos mais poderosos homens da América. - Não vai acreditar nisso, John! Brandy Hythe é adorável! - E eu não vou acreditar nisso? - Não vai acreditar no que ela me contou. Pobrezinha... Harrison está fazendo chantagem com ela! - O quê? - Brandy, cujo verdadeiro nome é Helen Sanchez... - Sim, eu sei. Helen Sanchez, de Bayonne. Aluna brilhante, vencedora do concurso Mirabelle Harrison de bolsas de estudo, o que explica sua ligação com o senador, só se envolveu no grupo de teatro do campus no último ano do curso, e assim caiu quase que por acidente na carreira de atriz. Fingi não saber nada sobre ela naquele primeiro dia porque não queria parecer um desses fãs obcecados. 98 - Como descobriu tudo isso? - Fiz algumas pesquisas. Consegui informações com uma antiga secretária de Brandy enquanto tentava confirmar aquela pista fornecida por meu aluno. Mas isso não significa que Brandy e Harrison não tenham sido amantes em algum momento. Não consegui confirmar essa hipótese com a secretária. - O fato é que Brandy deve sua bolsa de estudos a Harrison, e até sua carreira, se levarmos a análise mais a fundo. Mas Harrison queria mais do que simples gratidão. Ele queria uma conexão com Hollywood e escolheu Brandy como seu elo. - É compreensível. Jovem, bonita, nativa de Nova Jersey, limpa, o que é raro hoje em dia... Faz sentido. - Sim, e por algum tempo ela concordou com esse esquema. Mas quando percebeu que o senador não ia defender nenhum dos programas pelos quais ela se interessava, que ele fazia e permitia coisas que ela não podia aceitar, Brandy tentou desligar-se do mundo dos políticos. Foi quando ele a pegou numa armadilha. - Armadilha? -Brandy freqüentava a fazenda de Harrison. Os convites eram sempre gentis e aparentemente desinteressados, uma forma de retribuir a participação dela em suas campanhas. Como sempre ficava sozinha na propriedade, ela aproveitava para nadar e manter a forma física. Brandy foi integrante da equipe de natação da universidade. - Eu sei. - Pois bem, numa certa noite, ela foi até a piscina aquecida que ficava em uma espécie de ginásio fechado e, certa de estar sozinha, decidiu mergulhar nua. Estava escuro, não havia ninguém por perto e a porta estava trancada. O que Brandy não sabia era que Harrison havia instalado um sistema de foto e filmagem no local. - Estou começando a entender. - Alguns meses mais tarde, quando se recusou a integrar o grupo que estaria no palanque durante um discurso do senador, Brandy recebeu em Malibu um envelope com as fotos. - O homem é um príncipe! - Brandy diz que não podia se dar ao luxo de permitir que essas fotos fossem veiculadas. Ela já está processando um site da 99 internet por conta de uma montagem feita com seu rosto sobre o corpo nu de outra mulher. - Entendo. E por que ela decidiu contar tudo isso agora? -Bem, por algum tempo ela acreditou que poderia fazer alguma diferença, convencer Harrison a mudar sua posição com relação a algumas questões políticas. Ela reconhece que foi ingênua. - Todos nós somos em algum momento da vida. - Mas depois ela ganhou o Oscar... - No ano passado. - Exatamente. Brandy não é mais a atriz iniciante que era há quatro anos, quando recebeu as fotos. Ela já decidiu procurar os jornais, atacar Harrison com suas próprias armas. Harrison pode prejudicar sua imagem, mas não pode arruiná-la, e ela está farta de emprestar seu nome a um homem que não vale nada. - Que mulher corajosa! Quer dizer que Brandy está conosco? - Definitivamente. Eu... disse a ela que, se tudo der certo, ela não terá com que se preocupar, porque Harrison não terá nada a lucrar com a divulgação das fotos. - De fato. E se ele as divulgar, Brandy só terá de dizer ao mundo que Harrison tirou as fotos sem sua permissão. Ela ainda terá de encarar os tablóides e os canalhas da internet, mas Harrison não vai ganhar nada com isso. Pelo contrário. Será mais um escândalo contra alguém cuja imagem já estará mais do que arranhada. E quando acabarmos com ele, a última coisa de que o senador vai precisar será mais publicidade adversa. - Está dando certo, não é? E Henry? Conseguiu conquistar seu apoio? Sei que quer vender aquela história... - Henry diz que será um grande livro. É claro que os jornais terão toda a história primeiro. Ou melhor, Molly a terá primeiro, mas podemos publicar o livro em seis meses. Tenho tudo, menos um contrato. Mas isso é só um detalhe. - Eu sei. Vai vender seu livro, John, e acho que ele será um sucesso. - Ela se levantou para ir tomar banho. - Oh, disse a Brandy que vamos nos encontrar na praia. Vai haver um luau esta noite, e cada grupo vai preparar a própria comida em fogueiras. Pode convidar Henry, também. Oh, e peça a ele o exemplar de 100 Shallow Ground, caso ele tenha terminado a leitura. Ele prometeu me emprestar o livro. - Já terminou o outro? - Sim. É bom. Mas adivinhei o final muito antes do que gostaria, e isso tirou um pouco do suspense. - Adivinhou o final? Quando? Em que trecho? - John, qual é o problema? Não me diga que também leu o livro e não adivinhou o fim! É tão óbvio! Ele não devia ter dado aquela pista sobre o padrão dos vidros quebrados no escritório do embaixador. Não com tanta antecedência. Logo percebi que o vidro havia sido quebrado por dentro, não por fora. - É mesmo? Poucas pessoas perceberiam esse detalhe. - Leio mistérios e suspenses desde que consigo alcançar nas estantes para pegá-los. - Sei. A que horas temos de estar na praia? - Ainda temos uma hora - ela respondeu antes de fechar a porta do banheiro. Assim que ouviu o barulho do chuveiro, ele correu até o criadomudo e pegou o livro. Onde havia mencionado o padrão dos vidros quebrados? No capítulo quatorze? E começou a virar as páginas. Droga! Como Henry havia deixado passar algo tão importante? Aubrey Harrison apoiou-se no batente da porta e olhou para o sobrinho... seu maior inimigo. O idiota cuja ambição desmedida poderia estragar tudo. - Encontrou? Dillon passou as mãos pela cabeça. - Não. Já verifiquei todas as pilhas. Sei que isso estava aqui, entre as páginas de um caderno do jornal de domingo que devo ter guardado por alguma razão. - Ele examinou mais uma vez as páginas manchadas. - Geléia de uva. Não como geléia de uva. - Não. Prefere usá-la para decoração. - Harrison afastou-se da porta. - Venha, ainda temos tempo para um drinque antes de irmos à praia. Dillon seguiu o tio. - Não podemos escapar disso? Odeio pensar em comer na praia com toda aquela areia. 101 - Não vamos comer na praia. A organização do evento providenciou barracas improvisadas, algo como gazebos, e reservei uma delas para o nosso grupo. -Nosso grupo? Refere-se à doce Jane, à atriz sexy, o professor e o editor idiota? - Não. Esta noite jantaremos com os estimados cavalheiros da Pensilvânia. O congressista Patterson, Artemis Slade, nosso amigo representante da grande companhia petrolífera. E para completar tão seleto grupo, o jornalista favorito da América, o inigualável sr. Sampson. Todos sozinhos, é claro. As esposas foram passar o dia em Atlantic City. -Quer encontrar todos eles ao mesmo tempo? Não é perigoso? - Dillon aceitou o copo com uísque. - Não. Todos querem a mesma coisa. Poder. É o que faz o mundo girar, meu garoto. E todos sabem que o presidente terá poder suficiente para compartilhar com seus amigos. Já prometi a Patterson um posto no gabinete, e para isso ele só terá de conquistar o apoio da Pensilvânia. Agora, fale-me sobre Romanowski. O que seu homem descobriu? - Já disse tudo que havia para contar. Ele está investigando você, tio. Nenhuma surpresa, agora que sabemos que ele é JP Roman. Esse sujeito tem pintado seu perfil com cores bem distintas em seus dois últimos livros. Nada definido, nenhum nome, mas ele sabe como identificar um homem sem se comprometer. Ainda bem que temos sorte, tio. Ele está ocupado demais com a jovem professorinha para incomodar-nos durante essa semana. Sabe como são esses escritores. Muita conversa, nenhuma ação. Ele não virá atrás de você, meu caro senador. Não vai confrontá-lo abertamente, nem sobre suas posições políticas, nem sobre o episódio envolvendo a maluca da mãe dele. Romanowski não tem munição para tanto. - Espero que não. E quanto à jovem da boate? Ela já foi informada sobre o cancelamento do nosso encontro esta noite? - Estive ocupado com outras coisas. - Dillon, você é um idiota. Aprenda uma coisa, meu caro sobrinho. Nunca desaponte uma dama. - Ela não é uma dama. 102 -Mas ela pensa que é. Todas pensam. E eu nunca dou as costas para uma mulher magoada. Não depois da mãe de Romanowski. Naquela época tive sorte, porque ela sofreu um esgotamento nervoso e nunca foi procurar a mídia para fazer declarações. Espero sinceramente que essa jovem ruiva não volte para chutar nossos traseiros, Dillon, porque, se isso acontecer, a culpa será toda sua. 103 Capítulo XIV Conseguiu falar com Molly, Jane? - John perguntou /quando o grupo se reuniu na praia. - Não. Ela já deve ter fechado a escola, e o celular está desligado. Imagino que esteja a caminho de Washington, e vamos ter de esperar até ela chegar em casa. - Não podemos esperar. Estou pensando em incluir um certo jornalista no nosso esquema. - Mas Molly... - Jane, não podemos perder essa chance por causa de sua prima! Ela já devia ter entrado em contato conosco. - Tem razão - Jane concordou desapontada. - O que vai fazer? - Ainda não sei. - John, posso dar um palpite? - É claro, Henry. - Deve ter notado que toda a imprensa está presente para esperar pela chegada do presidente. Não podemos escolher um desses repórteres? - Henry tem razão, John - Jane concordou. - Não devemos esperar por Molly. E estaremos aqui, caso ela telefone. - Já escolhi um repórter - John revelou. - Quem? - perguntou Brandy. - O infeliz participante da festa na suíte do senador. - Ele se 104 levantou. - vou ver se consigo encontrá-lo. Quando eu chegar, tentem acompanhar minhas dicas. John encontrou seu escolhido sozinho no estacionamento reservado para os veículos da imprensa. Até o cinegrafista o abandonara para ir descansar, uma vez que não havia nada de interessante para ser registrado. - Jim? - Ele chamou. - Jim Waters, do Live at Six? Waters encarou-o intrigado. - Sim, sou eu. - Quero lhe dar os parabéns pela brilhante entrevista com o senador Harrison. - Ainda bem que gostou, porque foi o único trabalho que fiz nessa semana. A CNN chegou para a cobertura dos principais eventos, e agora nós, simples mortais, temos de nos contentar com as sobras. -Foi excluído, não é? Bem, o presidente deve chegar amanhã. Todos os órgãos de imprensa mandaram seus principais repórteres. - Humph! Trinta anos de profissão, e agora tenho de abrir espaço para meia dúzia de garotos com ternos de grife e cabelos impecáveis. Um homem amargo. Era tudo que John havia desejado. - Jim, acho que devia conhecer alguns amigos meus. - Para quê? - Meu caro Jim, você ainda não sabe, mas está prestes a se tornar um profissional invejado e respeitado. O presidente? Esqueça! Ele só virá para içar a bandeira no quatro de julho. Mais nada. Não fará discursos nem terá nada de novo para dizer, e só estará aqui por quatro, cinco horas no máximo. Mas você vai ter o furo da semana. Do ano, Jim. A menos que não o queira. Você quer, Jim? Às vezes as coisas eram fáceis demais. Henry se levantou ao ver John retornando com o repórter. - Como vai, sr. Waters? É um prazer conhecê-lo. - Este é Henry Brewster, da Brewster Books - John apresentou. - Aquela é a srta. Brandy Hythe, que dispensa maiores apresentações, e Jane Preston, de quem deve estar lembrado. 105 Waters deu a mão a cada um deles sem esconder a confusão que o dominava. - É um prazer conhecê-los. O que querem de mim? - Tempo no ar - John respondeu sem rodeios. - Jane adoraria falar sobre a educação infantil, caso esteja interessado. - Não. Isso já foi levado ao ar ontem. Ninguém se importa com notícia velha. John olhou para Brandy e fez um sutil movimento de cabeça. - Uma entrevista comigo o ajudaria, Jim? - a atriz perguntou em voz baixa e rouca. - Bem, eu... acho que sim. Está disposta a falar? - Para o seu jornal? É claro que sim. - Ótimo. Amanhã? Ao meio-dia? Oh, não, espere! Não tenho autorização para estar aqui amanhã. Não antes da partida do presidente. - Puxa, eles o descartaram mesmo - John comentou. - Tenho uma idéia. O senador Harrison vai fazer um anúncio na sexta-feira. Ainda não temos o horário, mas você certamente o terá. O que acha de encontrar Brandy uma hora antes do pronunciamento? Assim, você e seu cinegrafista poderão terminar a entrevista com Brandy a tempo de participarem da coletiva. O que acha? - Perfeito - Waters concordou. - Assim terei tempo para fazer uma pequena pesquisa. É de Nova Jersey, não, srta. Hythe? - Sim, nascida e criada em Nova Jersey. Só concedi uma entrevista durante a semana, mas sei que toda a imprensa prefere realizá-las na frente do salão de baile, ou na varanda, porque lá dentro acontecem todos os eventos. Estarei esperando por você no salão uma hora antes da coletiva do senador. Waters assentiu. Depois olhou para John. - É essa minha grande história? Francamente, senhor... - Escute aqui, esteja no local determinado com seu microfone e seu cinegrafista, está bem? Lá falaremos sobre seu grande furo. - Certo. Estarei lá. Boa noite a todos. Quando ficaram sozinhos, Brewster comentou: - Muito bem, John. Já temos um repórter e um cinegrafista. Só não temos Harrison. - Teremos, Henry. Teremos. Diga a ele, Jane. 106 - Brandy vai dizer a Harrison que chamou um repórter para falar sobre as fotos. Ela telefonará para a suíte do senador uma hora antes da coletiva marcada por ele e dirá que Harrison e Dillon têm cinco minutos para estar no salão e convencê-la a não falar. Molly deveria estar escondida atrás de uma cortina ouvindo e gravando tudo, mas agora é o sr. Waters quem vai estar presente. E então pegaremos o senador. - A srta. Hythe vai falar sobre as fotos? Não acho justo que ela se exponha dessa maneira. - Ela não vai se expor. As fotos serão apenas isca para atrair Harrison e Dillon - explicou John. - Mais alguma pergunta? - Não. Quero dizer, só uma. Acha mesmo que o homem fez aquilo? Eu li aquelas páginas, mas... Bem, se ele fez mesmo aquilo, não devíamos procurar a polícia? - Cada coisa a seu tempo, Henry. Primeiro temos de fazer o homem anunciar que não será candidato à presidência. Depois disso, tudo pode ser negociado. - Se você diz... Bem, agora acho que vou voltar ao hotel. Para ser franco, detesto areia. - Eu também - Brandy anunciou enquanto se levantava. - Não quer tomar um drinque comigo, Brewster? - Eu? Bem, eu... Será um prazer, srta. Hythe. - Brandy. Pode me chamar de Brandy, bonitão. Sozinhos, Jane e John decidiram aproveitar a fogueira para assar os marshmallows que ela havia comprado em um pequeno mercado da cidade. O quê? Ela esperava que ficasse ali sentado enquanto ela lambia marshmallows e chocolate derretido da ponta de um espeto? De jeito nenhum! - Jane Preston, quero ir para a cama com você - ele disse apressado, como se o anúncio pudesse salvar sua sanidade mental. E ela estaria em jogo, caso Jane lambesse aquele marshmaüow. - O que... O que foi que disse? - ela interrompeu o movimento antes de levar o espeto à boca. - Disse... que quero fazer amor com você. - Agora? - Não, em setembro. Sim, Jane, agora! Aqui! Não, no quarto. 107 Oh, em qualquer lugar, desde que possa tê-la. Compreende que estou desesperado? Ela deixou o espeto no fogo e limpou as mãos no vestido. - Nunca escreva outra história de amor, John. Você não é nada romântico. -Quer romantismo? Muito bem, você pediu. Jane, quero beijar seu corpo todinho. Quero fazer amor com você até vermos estrelas no teto do quarto. Quero acariciar cada curva de seu corpo e decorá-las com as pontas de meus dedos, quero sentir o sabor de sua... - Chega, chega! - ela o interrompeu com o rosto ruborizado. - Tudo bem... também quero fazer amor com você, John. Obrigada. Obrigada? Ela havia dito obrigada? Deus, era louco por ela. Ou talvez fosse apenas louco. De qualquer maneira, John segurou-a pela mão e levou-a para o hotel, pronto para passar por cima de qualquer um que tentasse se colocar entre eles e uma das camas do quarto. 108 Capítulo XV Maravilhoso. Esplêndido. Perfeito. John não encontrava um adjetivo capaz de descrever o que acabara de viver com Jane. - Sabe de uma coisa, parceira? Acho que encontrei tudo que sempre procurei e nem sabia que estava procurando. - John! Está dizendo... o que eu acho que está dizendo? - ela perguntou com um sorriso encantador. As faces estavam coradas, e ela emanava um calor delicioso sob o lençol. Ainda estavam abraçados e nus, e poder senti-la de encontro ao corpo era simplesmente fascinante! - Estou dizendo, minha cara srta. Jane Preston, que você é a mulher mais linda, maravilhosa e fantástica que jáconheci, e acabo de descobrir que quero tê-la em minha vida. O sorriso ganhou uma luminosidade ainda maior. - E ainda diz que quer escrever uma história de amor? John, pelo amor de Deus! Fale! Quero ouvir as palavras certas. John sabia que palavras eram essas. Jamais as pronunciara, e não sabia se seria capaz de dizê-las agora. Por outro lado, estava tão certo do sentimento que as palavras eram apenas um instrumento para expressá-lo, e talvez por isso elas desabrochassem em sua garganta com facilidade surpreendente. De repente acreditava em finais felizes. Acreditava na bondade, na pureza e no céu azul, em crianças rindo e brincando, em longas caminhadas e em envelhecer ao lado de alguém especial. 109 - Eu amo você, Jane - ele disse. Sabia que estava sorrindo como um idiota, mas era um idiota feliz. - Amo você. John e Jane estavam parados ao lado das bicicletas, vendo o helicóptero presidencial decolar. - É uma pena que não tenha conseguido vê-lo. Foi um momento histórico. - É como no futebol, Jane. A menos que esteja em um lugar muito privilegiado, vai poder ver melhor todas as jogadas se acompanhá-las pela tevê. Vai acabar se acostumando com isso quando estivermos realmente juntos. - Ainda não estamos? - Sim, mas... Bem, refiro-me a dividir um espaço físico. É claro que minha casa não vai servir para nós, porque não há lugar para uma cesta de basquete nem para um balanço no quintal. Oh!, há muito espaço livre, é verdade, mas moro numa encosta, o que significa que o terreno não é plano. Tia Marion pode ficar lá, se você não a quiser conosco, mas aposto que vai amá-la e... - John? John! - Humm? - Do que está falando? - Casamento. - Está me pedindo em casamento? - Sim, eu... Oh, Jane, esqueci que aprecia momentos românticos! Espere. Jane Preston, quer se casar comigo? - Oh, sim, sim... eu quero me casar com você, John. Um dia. - Um dia? O que quer dizer com isso? - Bem, nós nos conhecemos há menos de uma semana. Sei que amo você de verdade, mas... Ah, não nos conhecemos de fato! Precisamos de mais tempo. John riu e olhou para o céu. - Não acredito nisso! É a primeira vez que faço um pedido de casamento, e a mulher responde... um dia? - Por favor, John, não fique aborrecido. Você sabe que estou certa. - Está bem, está bem... Você está certa. O que fazemos agora? - Vamos andar de bicicleta. E depois voltaremos para o hotel, 110 para o nosso quarto... e continuaremos nos conhecendo. Cada vez melhor... - Ótima idéia. Podemos pular o passeio de bicicleta? Na manhã seguinte, depois de mais uma noite incrível, Jane aproveitou enquanto John estava no banho para tentar falar com Molly mais uma vez. Havia deixado várias mensagens na secretária eletrônica, mas até esse momento não obtivera resposta. Molly não atendeu ao telefone em sua casa, mas dessa vez Jane conseguiu encontrá-la no número do celular. - Molly? Molly, onde você está? Precisa vir para cá hoje. No máximo amanhã cedo. - Ah, acho que não, Jane - ela respondeu com tom distraído. - O que quer dizer com acho que não? Molly, já tenho seu furo de reportagem! E ele é muito, muito maior do que você esperava ou imaginava. O que está fazendo? Se disser que está em Cancún, juro que... - Cancún? Ficou maluca? Está completamente fora da temporada. Quando vai começar a viver de verdade, Jane? Falando em viver... como vai o professor? - Não vai conseguir me distrair com seus truques. Onde você está, e por que não vem para cá? - Jane, escute. Houve uma mudança de planos. Eu desisti do emprego no jornal. Não havia nenhuma possibilidade de futuro. - Desistiu do... Molly, de que planos está falando? - Meu principal objetivo nesse momento é salvar a reputação da Preston Kid Kare. - É Kiddie... Reputação? -Contei parte da história ao professor, e acho que ele vai poder explicar melhor do que eu. Só quero que saiba que nenhum sacrifício será grande demais por minha querida prima. Jane estava em pânico. - Molly, o que está acontecendo? - Se eu contar, você vai querer voltar para cá imediatamente, o que significa que não direi nada. E agora vou desligar o celular. Ah, sim, e obrigada, Jane. Meu nome vai ficar esplêndido em luzes cintilantes. 111 - Luzes? Que luzes? Molly! - Algum problema? - John perguntou ao sair do banheiro. - Você conversou com Molly? O que ela disse? E por que não me contou? - Ah... ela me fez jurar segredo. Desculpe. - Ela acaba de libertá-lo desse juramento. Comece a falar. John resumiu a história sobre a confusão na matrícula de um aluno temporário e como Molly temia que o homem fosse até lá para destruir o prédio. - Oh, meu Deus... O sacrifício... - Do que está falando? - Molly não seria capaz... Ela não pode ter assumido a responsabilidade de passar duas semanas cuidando do filho de outras pessoas! Não. A menos que houvesse algum proveito nisso. Ela dissera alguma coisa sobre luzes? O telefone tocou e ela atendeu apressada, certa de que a prima havia mudado de idéia e estava ligando para esclarecer toda a confusão que criara. - Molly? - Desculpe, deve ter havido algum engano. A telefonista deve ter transferido para o quarto errado. - com quem quer falar, senhora? - com John Patrick. Esse é o quarto dele? John Patrick Romanowski? JP? - John Patrick? Eu não sabia... Pensei que fosse apenas John. JP? Sim, espere um minuto. Jane entregou o telefone, ouviu ele dizer alô para sua querida tia Marion, depois foi esperar no outro lado do quarto. John Patrick. Havia ido para a cama com um homem sem saber sequer seu nome completo. John Patrick? John Patrick Romanowski. JP Romanowski. JP Roman. Não. Impossível. yVu matá-lo! 112 Jane abriu o armário e começou a pegar as malas vazias. Havia guardado em uma delas o livro que terminara de ler. Mas não havia nada ali. Nenhum livro. - Onde está meu livro? John desligou o telefone e encarou-a com ar resignado. Era inútil continuar mentindo. - Jane, escute, eu ia contar. Só estava esperando uma boa oportunidade. Estivemos ocupados, lembra? - Cale a boca! Agora tudo faz sentido. O disfarce, sua relação com Henry Brewster, as informações sobre o senador... Ia me usar, John! Como Molly sempre me usou. E agora ela está em outra de suas aventuras, enquanto nós... nós... Ele a abraçou. - Nós estamos aqui. Juntos. Eu a amo, e você disse que me ama. Acha que pode me perdoar por não ter contado antes? Jane suspirou. - Acho que sim, desde que não haja mais nenhum segredo. Há mais alguma coisa que não tenha me contado? - Só uma. - E ele começou a falar sobre Maryjo. - Então, agora ela sabe de tudo? - Henry perguntou quando ele e John se encontraram no Blue Pig para uma cerveja gelada. - Que bom. Já estava começando a ficar confuso sobre quem sabia o quê. Agora que Molly está fora dos planos, vamos mudar alguma coisa? - Não sei. Jim Waters vai desempenhar seu papel conforme esperamos, mas não gosto de contar com uma única possibilidade. - O que tem em mente? - Estive pensando... em vez de usarmos Brandy como isca para atrair o senador, podemos mandar um bilhete. Vamos ameaçá-lo com o que já sabemos. Marcamos um encontro à meia-noite e levamos um gravador. - O nome disso é chantagem, John. Podemos acabar presos, caso aqueles papéis não tenham o significado que estamos imaginando. E espero que não estejamos errados, porque, caso contrário, Brandy não terá como escapar da imprensa. Ela vai ter de falar sobre as fotos. 113 - Falando em Brandy, onde ela está, Bonitão? - Por que quer saber? - Ah, por nada. Sinto cheiro de romance no ar, só isso. - Vamos jantar juntos em Atlantic City. Ela já reservou uma limusine para hoje à noite. - Que maravilha! - Posso me sentar com vocês, cavalheiros? John viu Dillon puxando uma cadeira para acomodar-se. - Não, não pode, Holmes. Saia daqui. - Eu adoraria, JP, mas acho que precisamos conversar. - Sobre o quê? - Era melhor ignorar a ameaça velada na maneira como ele o chamara. - Sobre sua amiguinha. - Cuidado com o que diz, ou vou ter de pisar em cima de você. - Eu não me arriscaria - disse Henry. - Já viu o tamanho dele? No seu lugar, eu pediria desculpas. - Sim, é claro, eu peço desculpas, JP, e até me retiro, depois de pedir que lembre a srta. Preston sobre as fotos que estão comigo. E também tenho uma cópia do registro do hotel. John não se moveu de onde estava. Ele e Jane seriam marido e mulher... um dia. As fotos não teriam mais nenhuma importância. Mas Dillon não precisava saber disso. - Mais alguma coisa? - Não. Oh, sim, só mais uma coisa - ele disse ao se levantar. - Não como geléia de uva, JP, e não leio os jornais locais. Devia ter usado geléia de laranja e o Wall Street Journal. Pequenas falhas como essas podem arruinar um plano, sabe? bom dia, cavalheiros. - Do que ele estava falando? - Henry perguntou confuso. -- Ele sabe que vi os papéis e os coloquei de volta. Estamos encrencados. - Se ele sabe, deve estar preparado. E agora? - Podemos usar o plano B e contar com Brandy. - Não. Esqueça. - Já esqueci, Henry. -Mantemos o plano A e torcemos para que eles não encontrem alguma maneira de impedi-lo? - Ele ameaçou Jane. Não teria feito isso se não estivesse preocupado. 114 Homens como Holmes e Harrison estão acostumados a escapar ilesos de suas falcatruas. Eles ameaçam, as pessoas se acovardam. Para eles a chantagem é um meio de vida, Henry. Mas e se os desafiarmos? Se não dermos importância à chantagem? - Não acha que essa decisão cabe a Jane? - Ela quer ver Harrison destruído; não vai recuar agora. Mas você tem razão. Agora que estão prevenidos, eles podem pensar em uma explicação lógica que nos faça parecer idiotas. Talvez seja melhor enviar as cópias dos papéis para os jornalistas acampados lá fora. Faremos uma remessa anônima. - Citando que fonte? com que colaboração? Não, John. Nenhum meio de comunicação decente divulgaria algo tão importante sem bases concretas. Nem mesmo os tablóides, porque Harrison os processaria e ganharia a causa. - E ainda sairia como uma pobre vítima. Tem razão, Henry. Vamos cumprir o combinado. Vamos desmascará-los. A coletiva está marcada para amanhã, às cinco da tarde. Você e Brandy deverão estar no salão de baile às quatro em ponto. - Estaremos lá. Certifique-se de que Jim Waters também estará. - Ele aceitou a ameaça? - Harrison perguntou ao sobrinho. Dillon sentou-se no sofá da saleta da suíte. - É claro que sim. - E o que faremos se ele decidir ir em frente? - Aqui está o que vamos dizer, tio. Redigi um pequeno texto. Escute: "Não sabemos do que se trata. Também recebemos uma cópia pelo correio. Alguém pervertido e cruel está tentando se divertir à custa do sofrimento e da tristeza do senador, mas tudo isso não passa de um punhado de mentiras cujo objetivo é prejudicar a candidatura do homem mais honesto, correto e moral que jamais aspirou à presidência. Já é hora de a América dar as costas a essa política de ataques pessoais!" Puxa, tio, às vezes penso que devia ser escritor. É espantoso! Quando penso que você é o inventor da política de ataques pessoais... - Não estou com paciência para seus comentários sarcásticos, Dillon. Pratique sua expressão humilde, pesarosa e compenetrada, e escaparemos dessa ilesos. Ainda não acredito que teria mesmo... 115 - Tio, se ainda não acredita, vai acabar acreditando. Além do mais, nós dois conhecemos a verdade. - Meu Deus... Quero que essa semana acabe logo. Quero sair daqui e me livrar desses idiotas moralistas com seus elevados ideais públicos e bolsos sem fundo. Preciso relaxar. - O rei do bolso sem fundo quer relaxar? O especialista em acordos escusos? - Falou com a garota, Dillon? Conseguiu o telefone? Preciso relaxar. Talvez ela esteja livre esta noite. - Pelo amor de Deus, mantenha a calça fechada, está bem? Só mais um dia! Depois voltaremos a Washington, e você vai poder visitar todas as camas que quiser. - Tem razão - Harrison concordou sem olhar para Dillon. Ele esvaziou o copo de uísque ainda sem encarar o sobrinho. - Só mais um dia. 116 Capítulo XVI John e Jane estavam tomando o café da manhã, quando Brandy sentou-se à mesa dizendo estar um pouco nervosa. - Sei que improvisar faz parte do trabalho de uma atriz, mas dessa vez gostaria de ter um roteiro. - Podemos dar um jeito nisso - John opinou. - Sim, eu sei, e até já havia pensado em uma alternativa. Por que não encenamos aqueles papéis? - Brandy, essa é uma ótima idéia! - Jane de imediato aprovou. - John, você poderia fazer a parte da secretária eletrônica e a narração. E o Bonitão ficaria com o resto. Ele me contou que participou de um grupo de teatro na universidade. - Ah, ele contou? E também disse que ele fazia o papel do cadáver? Henry nem tinha texto! - Não importa. Tem uma cópia daqueles papéis? - Tenho cinco. Duas eu enviei para minha casa, só por precaução - John revelou. Depois tirou do bolso as folhas dobradas. - Aqui estão. Os seminários já começaram, e ninguém vai nos interromper aqui. Podemos ensaiar. John desdobrou as páginas e começou a leitura. - "O que segue é a transcrição fiel de uma mensagem telefônica. Eu, Dillon Holmes, Assistente Pessoal do Senador Aubrey Harrison, a recebi na data citada abaixo. A máquina em questão é a secretária eletrônica de minha casa; a voz na fita pertence ao 117 senador Harrison. Por motivos de segurança pessoal, a fita está em um cofre, e eu tenho a única chave." Segue a transcrição: "Você tem uma mensagem, recebida às vinte horas e vinte e três minutos de vinte e três de novembro, terça-feira. Mensagem" Ele entregou os papéis a Brandy. Ela começou a ler usando entonação emocionada. - "Dillon? Dillon, você está aí? Pelo amor de Deus, onde você se meteu? Disse que estaria em casa. Sabe, sobrinho, a idéia era que você cuidasse de mim, estivesse sempre disponível. Como se não bastasse essa incrível semelhança física que tem com seu pai, também precisava ser estúpido como sua mãe? Temos um problema. Um enorme problema. A cadela está me ameaçando com o divórcio e disse que vai citar Glória no processo. Glória? Isso foi há uma dúzia de mulheres! Não sei como ela descobriu. Adultério! Pode acreditar nisso? Ela quer me processar por adultério! Disse a ela que ninguém mais faz esse tipo de coisa. Sabe o que ela respondeu? Que vai dizer que eu a agrido! Agredir? Bem que ela merecia, mas nunca pus as mãos naquela ifeliz! Bêbada idiota! Passa o dia todo bebendo e à noite toma aperitivo antes de ir dormir. Pode imaginá-la como primeirdama? Que piada! Mas agora as ameaças são diárias. Esta noite a pior. Ela voltou a falar sobre Glória, e acho que dessa vez não está brincando. Onde você está, Dillon? Inferno, odeio essas máquinas! Enfim, ela diz ter provas do meu caso com Glória, sobre o filho de Glória, meu filho, e se eu não der a ela o divórcio e toda minha fortuna, ela vai levar essa história a público. Sei que o filho não é meu. Márcia também sabe. Não vejo Glória há um ano. Mas provar que não sou o pai é tão ruim quanto admitir que dormi com a mulher. E depois mais mulheres vão aparecer. Sabe como são essas coisas. Todas se descabelando e me acusando de tê-las enganado, todas querendo ser capa da National Enquirer e modelo de um comercial de calça jeans. Sabe o que isso faria com minha campanha? Campanha! Eu estaria destruído! Dillon, essa bêbada patética precisa sofrer um acidente. Não 118 ssei... Bater o carro, cair da escada, qualquer coisa! Ela está sempre embriagada. Por que não pode sofrer um acidente? Tudo bem, agora estou mais calmo. Ela tem o poder de me perturbar, sabe? Telefone amanhã. Vamos pensar em alguma coisa. E pelo amor de Deus, apague este recado. Surpreenda-me! Faça alguma coisa direito." Brandy entregou os papéis a John, que concluiu a leitura. - "Conforme estabelecido acima, a data da ligação é vinte e três de novembro. Em vinte e cinco de novembro, véspera de seu quadragésimo terceiro aniversário, enquanto eu, Dillon Holmes, estava na Califórnia, Márcia Harrison foi encontrada aos pés da escada da mansão Harrison em Georgetown. Ela tinha o pescoço quebrado e estava morta. Não tiro nenhuma conclusão, e não tenho conhecimento de nenhum ato criminoso, mas devo dizer que a mensagem deixada pelo senador Aubrey Harrison sugeria um homem muito, muito agitado e desesperado. Um homem cujos problemas se resolveram dois dias mais tarde. Por minha mãe, irmã do senador, e porque tudo pode ter sido apenas uma trágica coincidência, não tornei público este registro até agora, mas creio que o senador Harrison realmente assassinou sua segunda esposa." - É isso - Jane opinou. - Tudo parece ainda pior quando lido em voz alta. Vamos encenar a mensagem. - Concordo com Jane - disse Brandy. - A maioria decidiu - anunciou John. Faltavam algumas horas para o encontro no salão de bailes, e John e Jane caminhavam pela praia e tentavam relaxar quando foram abordados por um surfista. Camisa florida, nariz coberto por uma pomada branca e cabelos muito louros, ele tinha algo de familiar que... - Kevin! - John exclamou depois de alguns segundos. - Sempre admirei sua inteligência, JP. - Então... você não é um mendigo - Jane deduziu assustada. -Trabalha para Harrison e Dillon. Por isso esteve em nosso quarto e... - Jane, devagar, está bem? Estive realmente no quarto, mas 119 procurei deixar pistas óbvias para alertar JP. E ele as encontrou. Harrison e Holmes acreditam que trabalho para eles, mas a verdade é que meu chefe é outro. - Você é um federal. - Um federal? - Jane repetiu assustada. - Um agente federal? -Exatamente. Estamos estudando essa história há meses, Jane, desde que Holmes começou a verificar a possibilidade de lucrar com um escândalo sem ser atingido por ele. Só não conhecemos o conteúdo exato daqueles papéis, e sei que você os tem, John. John entregou as páginas que levava guardadas em seu bolso. Kevin leu o trecho e devolveu as páginas dobradas. - Isso é velho - disse. - Harrison não matou a mulher. -Então, o que está fazendo aqui? E como pode ter tanta certeza disso? - John quis saber. - Estou aqui porque sabíamos que Harrison vai se candidatar à presidência, e também tínhamos conhecimento dos rumores sobre ele ter assassinado a segunda esposa, um crime de que não temos provas concretas. Isso responde à segunda pergunta. Harrison escondeu a autópsia. Não quis nem saber o resultado do exame, porque sabia que a esposa estava bêbada ao cair da escada. Ele pagou alguém para se livrar do resultado, o idiota. Harrison é um bom político, mas tem uma inteligência sofrível. Além do mais, ele pode ter imaginado que a autópsia revelaria outras coisas condenáveis. -Em resumo, não acredita que Harrison tenha matado a esposa - Jane deduziu. - Exatamente. Na verdade, a autópsia comprovou que a mulher sofreu um violento ataque cardíaco. Ela morreu antes de começar a rolar a escada. Mesmo assim, sempre quis saber o que Holmes usava para pressionar Harrison. Curiosidade, entendem? - Quer dizer que Holmes acredita que Harrison matou a mulher... e vice-versa? - Cômico, não? Jane suspirou com evidente frustração. - Chegamos tão perto... - Vocês são amadores - disse Kevin. - Harrison está envolvido em crimes muito mais graves, e é por isso que estou aqui. Por isso me infiltrei na equipe do senador. Lamento, mas a história 120 toda não será exposta em menos de dois anos. Precisamos de tempo para colocar todos os patos em fila antes do tiro. - Até lá, Harrison anuncia sua candidatura, começa a campanha, conquista o eleitorado e pode realmente se eleger presidente dos Estados Unidos. Venha, Jane, vamos procurar Henry e Brandy e cancelar tudo. O plano foi um fracasso. O quarteto de amadores se reuniu no quarto de John e Jane para assistir pela televisão ao anúncio da candidatura de Harrison. Brandy havia sido informada de que Jim Waters só poderia ir ao hotel depois da coletiva, o que a impediria de usar um último trunfo e falar sobre as fotos com a imprensa, e Jim recebera a mesma notícia, o que o impediria de questionar o cancelamento da entrevista. Dillon Holmes ocupava o palanque e sorria para as câmeras de tevê, apresentando o senador com dúzias de adjetivos que não correspondiam à realidade. Harrison subiu ao palanque e acenou, agradecendo a presença de todos. De repente ele parou. John preparou-se para aquele que seria um dos piores momentos de sua vida. Jane rezou por um milagre. E suas preces foram atendidas. Aubrey sorria. - Hoje quero anunciar minha candidatura à presidência dos Estados Unidos da América! Vocês vão me ouvir fazendo promessas, e estou aqui para dizer que cumpro tudo aquilo que prometo! - Mentira! - gritou uma voz feminina no fundo da sala. - Você não cumpre suas promessas! Três horas esperando na chuva, e ainda tive de ir para casa a pé e sozinha quando compreendi que ele não ia aparecer! Harrison tentou cobrir o microfone com a mão, mas havia muitos deles. - Não telefonou para ela, imbecil? John sentou-se ao lado de Jane no sofá. - Pergunte se eu acredito em Papai Noel, meu amor, e eu direi que sim. 121 - Veja! Eles viraram as câmeras. Quem é ela? A mulher sorriu e apresentou-se: - Meu nome é Sheila Nesquith, e sou hostess do... ah, não importa, porque me demiti hoje de manhã. No final de semana passado, o senador me convidou para passar a noite com ele em seu quarto de hotel, e eu aceitei. Posso provar o que digo. Um homem de cerca de cinqüenta anos num terno listrado colocou-se na frente de Sheila. - Meu nome é Frederick Blake, e sou advogado da srta. Nesquith. Agora que temos a atenção de todos, quero fazer uma declaração. - vou ensinar esse idiota a nunca desprezar uma mulher! - Sheila gritou furiosa. - Temos a prova de que a srta. Nesquith mentiu sobre sua idade para ser admitida em um emprego de caráter... duvidoso, porém de excelente remuneração. Na verdade, ela tem apenas dezessete anos. E também temos provas incontestáveis de que o senador Aubrey Harrison manteve relações sexuais com minha cliente. Legalmente, ele pode ser acusado de estupro, embora o ato tenha sido consentido. - Que provas tem, sr. Blake? - perguntou um repórter. - Jim Waters! - John exclamou surpreso e eufórico. - É ele! - A prova está em local seguro. Assim que a polícia local for notificada, o que está sendo providenciado neste exato momento por meu sócio, a evidência será levada ao laboratório policial para análise. DNA, como devem ter deduzido. - O que ele está dizendo? - Jane perguntou confusa. - Bem, talvez eu esteja enganado, mas parece que a mocinha levou um souvenir - disse John. - E não me refiro a uma cópia do cardápio do hotel. Ela deve ter levado... - Peguei o preservativo, amorzinho! - Sheila gritou bem perto de um dos microfones. - Os dois! Você está encrencado! John e Jane se abraçaram. Brandy suplicava para que Henry comprasse os direitos de reprodução da história e fizesse dela a protagonista de um filme. Ela estava simplesmente apaixonada por Sheila Nesquith. 122 - Acabou, Jane - John exclamou com alegria contagiante. - O homem está arruinado! Vamos comemorar! Quando o quarteto saía do elevador para ir ao Blue Pig, Dillon Holmes surgiu no corredor. Dizer que ele estava arrasado era muito pouco. - Dillon! - John cumprimentou-o com sarcasmo. - Vai fazer as malas? Os ratos já começam a abandonar o navio? - Vá para o inferno, Romanowski. E leve sua vadia com você. - Holmes, Jane é uma mulher maravilhosa. Ela é delicada, gentil, inteligente e totalmente desprovida de agressividade. Felizmente, ou infelizmente, dependendo do ângulo do observador, eu já sou mais violento. Antes que Jane pudesse perceber o que ia acontecer, Holmes já estava caindo com o impacto do soco desferido por John. - Agora sim, podemos comemorar - John anunciou sorridente. Enquanto Holmes se contorcia no chão do corredor, os quatro seguiam felizes para o bar do hotel. - Sabe, John, já que vamos celebrar, acho que devemos aproveitar a ocasião para uma comemoração completa. Mudei de idéia a respeito de um assunto que já discutimos antes... - Que assunto? - Casamento. - Oh, não! Jane, não faça isso, meu amor, eu juro que não sou sempre agressivo e... - Cale a boca, John! Eu disse que mudei de idéia... porque decidi quando vamos nos casar. E não será mais... um dia. Será... imediatamente! Brandy e Henry aplaudiram o beijo apaixonado do casal.