Juan José Diez (1994). Família-escola, Uma Relação Vital. Col. Crescer. Porto: Porto Editora. Colecção Crescer Juan José Diez Tradução de Dulce de Sousa Salgado Vidigal Marinha (membro da Associação Luso-Espanhola de Pedagogia - ALEP) Título original: Familia-escuela, una relación vital Copyright O NARCEA, S. A. de EDICIONES, 1982 Edicão original: ISBN 84-277-0-575-1 Copyright para a Língua Portuguesa O PORTO EDITORA, LDA. - 1994 Rua da Restauracão, 365 4099 PORTO CODEX - PORTUGAL Reservados todos os direitos. Esta publicaçâo não pode ser reproduzida nem transmitida, no todo ou em parte, por qualquer processo electrónico, mecãnico, fotocópia, gravação ou outros, sem prévia autorizacão escrita do Editor. ISBN972-0-34024-X ITO EIITORR,LIR. Telex 27205P Adm./Escrit./Arm. Rua da Restautação,365- 4099PORTO CODEX - PORTUGAL H IO2I 2005813Telefax IO2I 313072 Livrarias Rua da Fábrica,90/ Pc de D.Filipa de Lencastre,42- 4000PORTO H IO2I 2007669 H IO2I 2007681 D f 5T R I 8 U I D O R E S ZONA CENTRO LIVRARIA ARNADO,LDA. Escrit./Arm. Rua da Figueita da Foz,5Subcave,Apattado 375- 3007COIMBRA CODEX H I039127573Telefax I039I 22598 Livraria Rua de João Machado,9-11- COIMBRA H I039I 33528 ZONA SUL EMPRESA LITERÁRIA FLUMINENSE,LDA. Escrit./Arm. Av.Almirante Gago Coutinho,59- A -1700LISBOA H IDll 8486192r3Telelax ID1I 806344 Livrarias Av.Almirante Gago Coutinho,59- D I Rua da Madalena 145- LISBOA H IOll 848619213 H ID1I 872166 Índice Introdução 7 Relação Pais-escola Na Educação Integral Do Filho 11 1.educação Corporal ... 13 - Acção Específica Dos Pais.. ... 14 - Acção Específica Da Escola... ... 16 - Acção Comum. ... 18 2. Educação Intelectual.. ... 23 - Acção Específica Dos Pais.... ... 25 - Acção Específica Da Escola... .. 29 3.educação da Afectividade .. 31 - Acção Específica Dos Pais.... ... 32 - Acção Específica Da Escola... ... 36 - Acção Comum. ... 39 4.educação da Expressão.. ... 43 - Acção Específica Dos Pais.... ... 44 - Acção Específica Da Escola... . 48 - Acção Comum. ... 49 5.educação Para A Liberdade ... 51 - Acção Específica Dos Pais.... ... 53 - Acção Específica Da Escola... ... 60 - Acção Comum. .. 63 6.educação Para A Vida Comunitária.. ... 73 - Acção Específica Dos Pais.... ... 75 - Acção Específica Da Escola... ... 76 - Acção Comum. ... 78 5 7. Educação Para A Transcendência.. 81 - Acção Específica Dos Pais 82 - Acção Específica Da Escola.. 84 - Acção Comum.... 86 Relação Família-escola Nas Estruturas Educativas. 87 8.sentido da Relação Estrutural.. 89 9.identidade e Funções das Pessoas que Compõem a Comunidade. 93 - Educandos 94 - Educadores: 1.pais... 99 2.professores.. . 102 3.tutor. . 105 - Pessoas Com Cargos Directivos: 1.director . 107 2.coordenador De Estudos.. . 109 3.entidade Nominal... 109 - Órgãos Colegiais De Direcção: 1.conselho Geral De Escola. 111 2.conselho Administrativo... 112 - Estruturas Não Administrativas: 1.tutoria 113 2.assembleias.. .. 114 3.associações De Pais .. 116 Conclusão. . 119 6 Introdução Terminaram as aulas. São os últimos dias do mês de Junho. Um pai apresenta-se no colégio X para tomar conhecimento das notas do filho, mas estas não aparecem na pauta porque o menino em questão não consta das listas de matrícula desse colégio. Grande irritação do pai do menino, seguida de um telefonema para a mulher, para lhe fazer ver o mau funcionamento do colégio. Quando pôde responder à ira do marido, a senhora disse: Mas então tu não sabes que o nosso filho não anda nesse colégio? Ele anda no colégio N. O caso, que não vale a pena classificar, fala, por si só, de uma situação de ignorância mútua na relação fam7ia-escola. Era esta a realidade em tempos não muito recuados. Temos de reconhecer, porém, que esta indiferença, que teve diversos graus e matizes conforme os lugares e os tempos, apresenta agora uma tendência progressiva, embora lenta, para um maior relacionamento entre todos os educadores, pais e professores. Na actualidade existe uma maior consciência participativa, que se traduz numa relação pais-escola cada vez mais forte. 7 Todavia, apesar do panorama relacional ser agora mais fácil, temos de constatar a indiferença ainda existente em alguns sectores da fami ia, particularmente entre os pais com filhos mais velhos, e os de mais alta e mais baixa posição sócio-económica; e ter também em linha de conta certos pais, excessivamente conscientes da sua função participativa, que se intrometem em assuntos escolares que não são da sua competência. A tendência para uma maior relação família-escola obedece a várias causas. Uma delas é o sentido que a sociedade actual tem da responsabilidade educativa que compete aos pais na educação integral dos filhos, responsabilidade que não se condescende com o abandono despreocupado da sua educação nas mãos dos professores, por mais excelentes que sejam, reservando os pais para si, exclusivamente, a atenção ao desenvolvimento fisiológico dos filhos, sem colaborar com os restantes educadores no desenvolvimento de todas as dimensões da personalidade. Outra causa é a consciência, cada vez mais vincada, de que a educação é um fenómeno complexo que necessita da acção combinada de muitos educadores. A problemática que implica o tratamento pedagógico dos diferentes aspectos que formam a personalidade - liberdade, socialização, afectividade, transcendência, inteligência, etc. -, é de tal importância, que ultrapassa a capacidade de um só educador. Daí a necessidade de que sejam várias as pessoas que ajudem um educando a realizar-se, ajuda que não será real se a acção desses educadores não for bem coordenada, já que o sujeito da educação é um único, com um largo leque de funções integradas. 8 Um terceiro factor que contribui, sem dúvida, no momento actual, para uma maior relação fam7ia-escola, é a existência de uma maior sensibilidade, em todos os espaços institucionais da sociedade, para exigir a participação como um direito. Para isso contribuiu, certamente, a mudança política que permitiu a passagem de estruturas sociais de carácter piramidal para outras mais horizontais. Finalmente, temos de considerar também como causa determinante da crescente relação pais-escola o ordenamentojuridico vigente, que permite e regula a participação das pessoas e grupos na vida das escolas. Esta é a situação actual. O futuro é um desafio a todos os educadores para que a relação mútua, nas escolas, seja um facto quotidiano e real, e não um episódio de circunstância. Um desafio que tem carácter de urgência, porque a relação pais-escola é vital para a educação dos filhos, e é grave chegar tarde a qualquer etapa da sua maturação como pessoas. Realmente é importante que exista esta relação entre os diversos educadores de um educando. Porém, não é menos importante que se entenda o verdadeiro sentido desta relação. É que, em muitas ocasiões, concebe-se a relação fam1ia- escola unicamente como um simples diálogo, mais ou menos frequente, entre pais e professores sobre o resultado académico dos estudos dos filhos, ou a assistência, pouco ou muito participativa, às reuniões convocadas pela escola. Todavia, a integração das pessoas, que estão envolvidas num mesmo processo educativo, exige muito mais que esta simples relação informativa. 9 O sentido autêntico da relação famlia-escola reside no facto da educação e da realidade existencial se reportarem ao mesmo sujeito, o educando. Já que a educação, mais que uma simples apren dizagem de conteúdos científicos e culturais destinados a promover a integração social e profissional do indivíduo, é o despertar de todas as capacidades inerentes ao ser humano, todos os educadores de um educando devem estar presentes em cada um dos diferentes aspectos que o hão-de formar como ser único, e, portanto, original. Porém, esta acção terá, necessariamente, modos e graus diferentes, deverá estar coordenada, por incidir no mesmo sujeito, e deverá abarcar todas as dimensões que a educação envolve e todas as estruturas que para ela contribuem. Famlia e escola têm, na educação da criança, um lugar de encontro, de acção e de relação coordenadas. A acção educativa dos pais e da escola pode ser coincidente ou complementar, em todas as dimensões da pessoa, segundo os aspectos que importa educar em cada caso concreto, contudo devem ser sempre acções incidentes, já que recaem no mesmo educando. Esta incidência é, pois, uma relação vital. A finalidade deste livro é, precisamente, oferecer aos pais, e aos educadores em geral, uma singela reflexão pedagógica acerca de tão importante perspectiva da relação famlia-escola, que possa ajudá-los a estimular, determinar e coordenar as suas tarefas educativas diárias. 10 Relação Pais-escola Na Educação Integral Do Filho 11 1. Educação corporal Considerada a educação corporal em sentido amplo, e sempre referida ao homem inteiro, único, é necessário determinar o seu dominio em três dimensões. A primeira destas coordenadas é a saúde e o vigor fisicos, como condição necessária e básica para que o corpo possa desenvolver convenientemente as suas funções. Mais do que uma acção, trata-se de um estado biológico que condiciona fortemente qualquer acção humana. Na realidade, este aspecto da perfeição corporal tem uma grande influência na educação, por isso são fundamentais os cuidados a ter com o corpo. Outro aspecto da educação fisiológica é a capacidade que o corpo deve ter para se inter-relacionar com o psiquismo. Matéria e espírito são duas realidades de um mesmo homem. Ambas são emissoras e receptoras das mensagens vitais que trocam entre si. Assim, um corpo não é perfeito pelo simples facto de ser bem constituído e de ter força, saúde e destreza. O corpo tem de ser um canal através do qual circule facilmente a vitalidade do psiquismo: vida intelectual, afectiva e volitiva. 13 Um corpo mal alimentado, por exemplo, dificilmente possibilitará que o espírito reaja com energia. Contudo, a função do corpo, quanto ao psiquismo, não é somente a de servir de canal ao seu dinamismo vital, mas também a de lhe proporcionar as experiências sensoriais que alimentarão a sua vida e serão a base da sua saúde mental e afectiva. Uma percepção visual deficiente reduz a capacidade mental para reter conceitos exactos e ricos de matizes. Um sistema nervoso alterado pode prejudicar a paz de espírito. E o mesmo poderíamos dizer de todas as múltiplas funções em que alma e matéria intervêm constantemente. Além disso, um corpo está educado quando é capaz de dar expressão às vivências, sentimentos e criações que o homem traz dentro de si. Não basta um corpo são per feitamente harmonizado com uma alma sã. O corpo só é perfeito, quando tem também a capacidade de manifestar, com beleza, todas as riquezas interiores do homem. Acção específica dos pais No campo biológico, a acção educativa dos pais em relação aos filhos orienta-se, principalmente, no sentido de lhes dar uma sã estabilidade somática. A alimentação, a higiene, a preocupação com as doenças e o exame períodico do estado de saúde são factos quotidianos do cuidado corporal. Contudo, educar o aspecto biológico dos filhos é algo mais que cuidar do seu desenvolvimento pessoal equilibrado. Os pais têm obrigação de habituar o filho à dietética familiar e a um horário fixo de 14 refeições, evitando as irregularidades caprichosas, que, quando frequentes, só podem produzir uma deficiente nutrição. Igualmente, devem procurar que, desde muito pequenos, os filhos criem hábitos pessoais de limpeza do próprio corpo, das suas roupas e do meio que os rodeia. O exame médico periódico dos educandos costuma fazer-se, geralmente, na escola. Porém, os pais devem exigir que se faça pontualmente nos momentos convenientes, com o rigor e profundidade necessários à sua eficácia. Se o exame médico que se realiza nos centros escolares é, muitas vezes, insuficiente, os pais têm o dever de mandar fazer aos filhos o necessário exame periódico ao seu estado de saúde. Paralelamente a estes factores, que determinam um bom estado de saúde, há que assinalar um outro que nem sempre se estimula nos filhos (especialmente nesta época de hedonismo) e que é uma certa austeridade de vida, sempre necessária para que o corpo se mantenha em boa forma. Assim é a prática dos autênticos desportistas e atletas, conscientes de que não é possível o domínio do corpo, se a falta de regras for a tónica da sua vida. Não podemos, porém, esquecer que austeridade não significa carências, mas apenas equilíbrio, isto é, torna-se necessário que se adopte um estilo de vida em que se conjuguem harmonicamente impulsos e razão. Não duvidamos que este esquema educativo entre em choque com a mentalidade que os meios de comunicação social divulgam incessantemente. O que falta provar é que o consumismo humanize mais o homem do que a vida regrada, incluindo a sua dimensão biológica. Neste aspecto da educação física dos filhos, a tarefa dos pais é difícil mas necessária, pois a saúde e o bem-estar 15 daqueles condicionam o trabalho a efectuar, neste sen- tido, pelos professores na escola. acção específica da escola No que diz respeito ao aperfeiçoamento somático dos educandos, a escola caminha, fundamentalmente, em três direcções. Uma delas é a que aponta, de forma sistemática, não só para o desenvolvimento muscular do corpo, mas também para o fortalecimento da sua capacidade de movimento, de uma maneira plural e ordenada. A ginástica, o atletismo e o desporto são a expressão dinâmica de actividades físicas que requerem a orientação de educadores qualificados, tanto científica como tecnicamente, e que se ajustam perfeitamente aos objectivos propostos. É necessário também um desenvolvimento planificado e progressivo destas actividades. Estes motivos ultrapassam a competência específica dos pais, embora estes tenham a obrigação de controlar todo o processo, como, aliás, nos outros campos educativos. Ajudar o educando a que se aperfeiçoe neste sentido é, em primeiro lugar, estimulá-lo a que tome consciência da sua condição física. Dificilmente poderá ocorrer o fluxo vital corpo-espírito, em reciprocidade de actuações, se a pessoa não sentir em si a força das duas substâncias que a constituem. Esta tomada de consciência, tal como a educação, é progressiva, mas necessária, embora a um nível mais elementar, como ponto de partida para exercitar o edu cando na interacção das funções psicossomáticas, a qual constitui outro dos objectivos deste aspecto educativo. 16 Os exercícios de concentração, psicomotricidade, relaxe, etc. programados para todos os ciclos educativos e realizados por cada educando de acordo com o seu próprio ritmo, constituem o núcleo essencial do que é a educação do corpo, enquanto sujeito de relação com o psiquismo. É evidente que também esta dimensão da educação corporal é tarefa da escola, pois a sistematização, o tempo e a exigência técnica que a sua realização requer ultrapassam as possibilidades familiares. Outro campo de acção da escola, no que respeita à educação do corpo, é o de desenvolver a capacidade de expressão corporal. A expressão é uma necessidade vital do ser humano. O homem é constantemente bombardeado por tudo quanto o rodeia: natureza, pessoas, Deus. Este impacto forma um mundo interior de experiências, que será tanto mais rico quanto maior reflexão tenha feito sobre elas. Estas experiências geram, por sua vez, sentimentos e criações que, saindo da própria interioridade do homem através da comunicação, tornar-se-ão presentes num outro ser. E, se esse outro ser não for só receptor, mas também emissor, estabelecer-se-á um diálogo, que pode chegar a converter-se em amor, realizando-se assim a totalidade da pessoa: Educar os canais de comunicação de que o homem dispõe, para serem instrumentos fiéis de transmissão, é, assim, algo de importância capital na vida do ser humano, para a sua realização como pessoa. Um dos veículos de expressão que o homem possui é o próprio corpo. A comunicação através do corpo desdobra-se num leque de formas que vão desde o simples movimento rítmico à dança, passando pela dramatização, a mímica, 17 o canto e a música, formas de expressão corporal cuja educação também é mais da competência da escola que da família, ainda que esta, sempre que possa, deva fomentá-las. Esta separação de competências entre pais e escola não significa ignorância das acções educativas levadas a efeito por uns e por outros, isto é, não significa ausên cia de relação mútua. Pelo contrário, é necessário conhecer o processo educativo que cada um realiza, e, em consequência, um diálogo permanente acerca dele, para que não se produza no educando um crescimento estratificado, mas convergente e em contínuo aperfeiçoamento. Acção comum Se os aspectos da educação corporal expostos anteriormente não são de igual competência da família e da escola, há um, contudo, em que essa competência tem de ser concorrente: a prevenção da droga. Enquanto as outras dimensões da educação somá tica buscam o desenvolvimento do corpo na sua totalidade, a prevenção da droga tem por objectivo evitar a sua destruição. Aquelas constituem uma acção directa de aperfeiçoamento exercida sobre o próprio corpo; esta é uma acção indirecta, que consiste em evitar as causas que podem levar um educando à droga, e a estimular nele os recursos que possam imunizá-lo contra esse flagelo. Sem dúvida que as causas da proliferação da droga são múltiplas e nem sempre com origem na família ou na escola. O snobismo e a influência das companhias 18 fazem proliferar o número de drogados. Todavia, um casal desavindo, os pais que não dialogam com os filhos, o autoritarismo paterno, a indiferença em relação aos filhos, o ambiente materialista da fam7ia (carente de valores espirituais que são, justamente, os que dão a felicidade) são também, em muitas ocasiões, motivos que estão na origem desta catástrofe social. Quantos filhos drogados poderiam dizer aos pais o mesmo que um jovem estudante deixou escrito para que fosse lido depois de se suicidar: Pais, destes-me tudo, menos aquilo de que eu precisava,. E a droga não deixa de ser um suicídio, embora o caminho até à morte seja mais demorado. A escola também é responsável pela opção dos alunos pela droga. Se, muitas vezes, a causa de se contrair o vício é a infelicidade, outras vezes a escola é culpada de os educandos não serem felizes. A escola deve ser o lugar onde os alunos se sintam felizes, isto é, o lugar onde realizem actividades aprazíveis - este é o significado etimológico da palavra escola. Em vez disto, a escola é, geralmente, um lugar de insucessos e angústia. Para o demonstrar basta verificar a elevada percentagem de alunos do Ensino Básico e do Ensino Secundário reprovados em cada ano. Na verdade, os alunos não estão motivados para o estudo, pois a escola transformou as actividades numa aprendizagem de conteúdos científico-culturais que nada têm a ver com as suas vidas. Sabemos que o homem é curioso por natureza, no entanto o educando não se sente estimulado para pesquisar o que desconhece. A escola mata o interesse. Mas o que é interesse? Esta palavra deriva de duas palavras latinas: inter (entre) e esse (ser ou estar). Isto é, interesse significa disposição 19 para descobrir o âmago das questões. Pois bem, em vez de possibilitar ao aluno o contacto directo com a essência do pensamento, da arte, da natureza, da sociedade, de Deus, a escola coloca entre ele e essas essências o muro da palavra (a constante aula expositiva) e do livro (radiografia sem vida da realidade) que, necessariamente, por razões psicológicas e biológicas, produzirão tédio num ser cheio de vitalidade. A Filosofia não serve para ajudar o educando na solução dos seus problemas acerca da existência, a Matemática não o ajuda a construir um pensamentó lógico, nem a Arte serve para despertar e desenvolver a sua sensibilidade, nem a História lhe proporciona o compromisso da sua vida com a dos outros homens, nem o estudo da Língua lhe permite desenvolver a capacidade de expressão e nem a Religião o incita ao encontro com Deus. O educando transforma-se num simples receptor de mensagens verbais, convertendo-se num arquivo de dados, que utilizará mais tarde, face a i uma sociedade que ignora a pessoa, e quase só valoriza o consumo de bens materiais. Por outro lado, a escola não está a ser um lugar de convívio, um ponto de encontro entre as pessoas. O diálogo, a atenção sistemática ao equilíbrio afectivo dos edu'Ki candos (não esqueçamos que a afectividade é o factor que mais problemas põe a qualquer homem), a orientação necessária ao seu projecto de vida, o acompanhamento pessoal do processo educativo de cada aluno são factores educativos ausentes da escola. Estas são as situações na maioria das realidades escolares, situações que não conduzem senão a insucessos, materializados em más notas, o que origina, muitas vezes, novos problemas educativos e de relação na famí- 20 lia. E admiram-se os pais, os educadores e a sociedade que os jovens se refugiem noutros mundos de pretensa felicidade, como pode ser o da droga. Feita esta análise, deduz-se que a acção coordenada de pais e escola, na prevenção da droga, tem por objectivo conseguir uma família e uma escola que sejam espaços onde os filhos possam sentir-se à vontade e felizes na sua relação com todas as outras pessoas que os rodeiam. Além disso, é de capital importância uma acção educativa comum que motive nos educandos a formação de uma personalidade forte, capaz de agir crítica e livremente perante qualquer situação, sem ser objecto de pressões da sociedade circundante. Esta personalidade requer, além da capacidade crítica e do sentimento de liberdade, a posse de uma pirâmide de valores próprios, em cujo vértice estão os valores espirituais, que são os que, de forma autêntica, dão felicidade ao Homem. No que se refere à educação corporal dos filhos, são estas, fundamentalmente, as acções exigidas por uma relação vital entre família e escola. 21 22 2. Educação intelectual A educação intelectual implica a assimilação de conteúdos científico-culturais que sirvam de referência a todas as experiências naturais e sociais que a pessoa viva, e que sejam a base da sua actividade profissional. Todavia, de modo algum constitui a essência da educaçáo e muito menos se pode considerar como o único campo desta educaçáo. Educar a dimensão intelectual do homem é desenvolver as suas capacidades de observação, experimentação, análise e síntese, compreensão, raciocínio, sistematização, crítica, criatividade, interiorização, admiração, contemplação, que são o suporte da inteligência. Observar é o mesmo que fotografar uma realidade qualquer. A observação é um processo que requer agudeza de sentidos, atenção voluntária e, sobretudo, um esforço mental assimilador dos dados recebidos, para que a impressáo fotográfica seja nítida e rica de matizes. A experimentaão apresenta as mesmas características da observação, mas actua sobre uma realidade provocada. 23 A análise implica a decomposição de um todo em partes, que serão objecto de estudo particular. A síntese é a recomposição dessas partes para que sejam um todo, mas já muito mais significativo. A compreensão é o acto de entender o signifi cado dos conceitos, das ideias e dos factos. O raciocínio é a capacidade de fazer induções e deduções lógicas. A sistematização consiste na ordenação das ideias num quadro mental. A criatividade é o processo mental que dá ori gem a novos seres ideológicos, até então desconhecidos para a própria pessoa, e através dos quais prolonga a sua identidade, o que a faz sentir-se mais confiante. A critica é a atitude através da qual o homem toma posição perante o pluralismo de ideias e de situações existentes na sociedade, não se deixando coisificar, pela sucessão de impactos publicitários, políticos e ideológicos que tendem a despersonalizá-lo. A ilnteriorização é o processo mental que per mite ao homem encontrar-se consigo mesmo, no âmago do seu ser. É aí que se identifica como homem e reconhece o seu eu como individualidade original e única. É aí que toma consciência das experiências que lhe chegam do exterior, para as assumir num processo integrador da personalidade. A admiraçâo é o êxtase intelectual perante a verdade, a beleza e o bem. Pressupõe a ingenuidade e singeleza de espírito inerentes a uma consciência que sempre procura o autêntico. A contemplação, finalmente, é o enlevo que inunda a mente humana, quando esta se entrega, sem 24 resistência, a essa verdade, a essa beleza e a esse bem, sem escutar a voz da razão. Preparar o homem para que possa desenvolver a sua intelectualidade em todas estas direcções é educar a sua inteligência. Tudo o mais é transformá-lo num computador. Acção específica dos pais A função da família, quanto à educação intelectual dos filhos, é mais em termos de assistência, exigência e ajuda à escola, do que em termos de acção directa sobre a sua inteligência. É naquelas atitudes que se estabelece a sua relação com a tarefa da escola no âmbito intelectual, sendo a inteligência do educando o ponto de encontro entre as duas acções educativas. Nesta perspectiva há que ter em conta factores tão importantes na educação intelectual como a avaliação, a investigação psicotécnica das faculdades mentais, o professor particular e o ambiente cultural familiar. Embora a avaliação seja função da escola, exige, porém, da parte dos pais uma conduta coordenada com ela, o que implica, em primeiro lugar, dar à avaliação o seu sentido real. No caso da escola, avaliar é detectar uma situação educativa, utilizando os meios que mais se aproximem dessa situação, sem pretender fazer uma medição, no pleno sentido da palavra, já que o homem é imensurável, por natureza. Localizada a situação, há que fazer o diagnóstico da mesma, determinando as suas características e assinalando as causas que lhe deram origem. A partir daí é possível estabelecer um prognóstico que permita estruturar a acção educativa necessária ao 25 aperfeiçoamento do aluno. Avaliar é, pois, muito mais do que fazer um exame ao aluno sobre uma parte do programa de uma disciplina, corrigir o seu conteúdo, classificá-lo com um número, dar-lhe secamente o resultado e em casa pedir-lhe contas desse resultado. Uma tal concepção de avaliação conduz os pais e a escola a servirem-se da nota como estímulo para o educando, e este a considerá-la como um fim a atingir, ainda que seja por processos ilícitos. Contudo, o sentido da avaliação não é este, nem acaba aqui. A avaliação deve ter por objecto todos os factores da educação intelectual, e não exclusivamente as matérias do plano de estudos, como costuma ser prática corrente nas escolas. No campo da educação intelectual dos filhos, um trabalho coordenado entre os pais e a escola exige a esta que ensine todos esses factores e que os avalie convenientemente. Este comportamento dos pais no que diz respeito à avaliação implica, primeiramente, entender o seu sentido, mas, além disso, exige uma atitude educativa para com os filhos, que consiste em coordenar a sua acção com a da escola, não só para eliminar as causas do insucesso intelectual, se existe, mas também para desenvolver as condições que conduzem ao êxito. Esta acção educativa exige que entre pais, professores e educandos haja um diálogo constante que nunca poderá assumir carácter agressivo e humilhante, embora o tratamento das situações deva ser feito em termos claros e adequados. De tudo o que se disse deduz-se que a prática, já frequente, de processar as avaliações através do computador não é o método mais educativo. Se o homem é imensurável e original em cada individualidade, se a 26 avaliação escolar é um fenómeno humano complexo que implica a análise de causas e efeitos, se o diagnóstico da avaliação deve conduzir ao diálogo e à orientação pessoal do educando, parece não haver uma boa ligação entre um elemento tão importante do processo educativo e a electrónica. Outro tipo de avaliação com o qual os pais têm a ver é o exame psicotécnico das faculdades mentais dos filhos, que é da competência do psicólogo e costuma fazer-se por intermédio da instituição escolar. A função paterna, neste campo, consiste, primeiramente, em procurar que esta investigação se faça de forma séria e seja realizada por pessoas competentes. Em segundo lugar, que a interpretação dos dados obtidos seja cautelosa e sem determinismos. Quantas vezes se cria um trauma em muitos educandos, quase os rotulando de deficientes mentais, por causa de um exame psicotécnico feito de forma leviana e ainda mais levianamente interpretado. Como é que é possível determinar o futuro de um educando, em especial o seu futuro profissional, através da medição numérica de uns testes? Quando na Física mais exacta os cálculos se fazem sempre com margens de erro, como é que se pode ter a pretensão de medir matematicamente as capacidades de um ser humano, ligado a um projecto pessoal de vida, dotado de um dinamismo de aperfeiçoamento progressivo e sujeito a todo o tipo de condicionalismos? As medições psicotécnicas bem feitas são valiosas, sempre que encaradas com a devida relatividade e se considerem complementares de outros dados, com vista a uma prudente e sistemática orientação pessoal do educando, efectuada por educadores que convivam com ele diariamente. 27 No aspecto intelectual da educação, é totalmente da competência específica dos pais a ajuda prestada ao filho por um professor particular. Isto, porém, tem sérias incidências com a competência da escola. A conveniência ou inconveniência da ajuda do pro fessor particular deriva da necessidade que um educando possa ter de uma forte atenção individualizada ao seu processo de maturação intelectual, dado que o antipedagógico excesso de colectivização escolar existente o está a prejudicar irremediavelmente. As causas desta necessidade podem ser várias, tais como um atraso em consequência de uma doença, ou a existência de uma quebra substancial na assimilação de conteúdos que se apresentem de forma progressiva, como, por exemplo, os de Matemática. O professor particular não pode ser uma moda, nem um substituto do professor da escola, nem uma fórmula para evitar o esforço intelectual do educando, já que esse esforço é aquilo que realmente apura a in teligência. Sempre que haja um professor particular, este deve trabalhar em perfeita coordenação com a escola. Se a educação intelectual pertence mais directa mente à escola que aos pais, a estes compete, especificamente, criar um clima familiar que favoreça o desenvolvimento das capacidades intelectuais dos filhos. Este ambiente consegue-se com bons e variados livros, com obras musicais seleccionadas, com brinquedos educativos, com visitas a museus e exposições, com viagens culturais, com o uso consciente dos meios audiovisuais, favorecendo o silêncio e, sempre que possível, facultando um lugar próprio para o estudo. Os factores determinantes da educação intelectual que competem aos pais são, em síntese, o acompanhamento, a exigência e a ajuda à escola. Estas atitudes cons 28 tituem uma acção indirecta, sempre exercida em coor- denação com a acção da escola. Acção específica da escola É função primordial da escola determinar os objectivos cognitivos que cada educando deve atingir ao longo do seu processo pessoal de maturação intelectual, e, paralelamente, estabelecer os temas científico-culturais que melhor contribuam para conseguir alcançar os objectivos determinados. Este é o ponto de partida da educação intelectual escolar, que, porém, é insuficiente para que ela se produza. É de capital importância a didáctica que se aplica no tratamento das diversas matérias de nível cognitivo, pois é evidente que se educa mais através das atitudes que dos conteúdos. Podemos dizer que o mérito de Sócrates foi ter um método, não um programa. Com a memorização da Biologia podemos ficar a saber muito - pelo menos de momento - da vida natural dos seres. Porém, é dissecando, dassificando, observando ao microscópio, que a pessoa desenvolve e aperfeiçoa a sua capacidade de observar a vida. Podemos saber Química e Física, trabalhando no quadro e estudando nos livros. Porém, aprende-se experimentando no laboratório. O educando aperfeiçoa as suas capacidades de compreensão, de análise, de síntese, de sistematização, quando se defronta directa e pessoalmente com os textos literários, filosóficos, etc. Isto não acontece quando o professor lhe transmite o saber já todo feito, com contínuas explicações sobre o conteúdo dos manuais. Uma coisa é conhecer os acontecimentos históricos e os factos sociais do presente, e outra coisa é saber julgá- los, 29 tomando posição pessoal sobre eles, tendo em vista que se é sujeito da história e não uma marioneta despersonalizada. Para repetir um saber já feito basta memorizar. Porém, para reagir como pessoa, no meio do caos dos acontecimentos sociais, é necessário analisar documentos e factos, relacioná-los, julgá-los e discuti-los. O silêncio e a reflexão pessoal conduzem à interiorização, e não é simplesmente escutando os que sempre falam, que se chegará a esse estado. A admiração e a contemplação acontecem quando se entra em contacto directo com a vida, num ambiente de paz e de autêntica liberdade, sem a ambição de ter, mas somente com o enorme desejo de ser. E é também função da escola estabelecer o modo de avaliar o processo cognitivo de cada educando e a forma mais adequada de determinar, dentro do possível, o nível da sua maturidade em cada uma das facetas que constituem a vida cognitiva. 30 3. Educação da afectividade O campo específico da afectividade é muito vasto, pois é constituído por uma série de dinamismos sensíveis, instintivos e passionais de difícil delimitação. Alegria e tristeza, prazer estético e desagrado, amor e ódio, entusiasmo e depressão, esperança e frustração, coragem e desânimo, autoconfiança e complexo de inferioridade. são realidades psíquicas difíceis de enquadrar em esquemas preconcebidos. É mais fácil estabelecer os limites dos factos cognitivos do que os dos aspectos afectivos e vocacionais. No entanto, o mundo interior da afectividade é da maior importância para o homem e coloca-lhe muitos mais problemas que o seu mundo cognitivo. As guerras não se fazem em defesa de uma ideia filosófica, mas sim pelo desejo de domínio. A política não está ao serviço de uma teoria, mas do poder. As revoluções não visam destruir princípios científicos, mas formas de governo. A união matrimonial não é posta em causa por uma teoria literária, mas porque se desvalorizou o amor. O afastamento entre pais e filhos não se deve a qualquer lei física, mas ao modo diferente de encarar a vida. A pessoa não se sente angustiada por 31 não se recordar de um data histórica, mas angustia-se porque vive na solidão. A afectividade é uma necessidade psicológica básica que dá calor e vivacidade à existência, de tal maneira que a falta de maturidade afectiva pode causar neuroses, obsessões, complexos, desdobramento da personalidade, desajustes, inadaptações familiares e sociais, etc. Pelo contrário, o equilíbrio afectivo produz serenidade, optimismo, paz, alegria, vontade de viver. Na realidade, a vida afectiva da pessoa surge do choque com as experiências que chegam até ela do mundo circundante e das relações com as outras pessoas. É, pois, no mundo experimental e no de relação que devemos situar a educação da sensibilidade. Acção específica dos pais A educação afectiva implica o equilíbrio interno dos mecanismos da sensibilidade, de forma que a pessoa encontre segurança emotiva, se sinta perfeitamente igual a si própria e considerada pelos outros. Este equilíbrio interno pressupõe mais uma luta e uma conquista do que uma realidade permanente. A vida afectiva é extraordinariamente volúvel e, quando desajustada, nem mesmo a razão tem domínio sobre ela para a equilibrar. A vida afectiva segue, muitas vezes, caminhos bem diferentes dos indicados pela lógica. Conhecida esta realidade, entende-se facilmente que, no que diz respeito à afectividade dos filhos, a acção educativa dos pais, assim como a dos outros educadores em geral, é de uma transcendência capital na for- 32 mação da sua personalidade. Sobre este assunto são altamente esclarecedoras as palavras de Georges Mauco, quando alude à educação da afectividade. Ninguém nega, hoje em dia, o erro da educação que descura o desenvolvimento da sensibilidade e do carácter, em benefício, por vezes exclusivo, da educação intelectual. Os mais recentes trabalhos de psicologia, e especialmente os de psicanálise, permitem calcular as graves consequências do desconhecimento do desenvolvimento da criança. Se a criança depara com dificuldades na expressão dos seus primeiros sentimentos, toda a sua vida corre o risco de não ser autêntica. Assim como a criança, a quem ensinam a andar demasiado cedo, está sujeita a contrair uma deformação nos membros inferiores para o resto da vida, também os primeiros conflitos afectivos, isto é, os primeiros passos da sensibilidade (se nos é permitida esta imagem), são os que determinam a maioria dos problemas de carácter e os sofrimentos morais do adulto. Certos pais, vítimas, por sua vez, de uma errada influência paterna, não estão habilitados a desempenhar o seu papel de educadores. O pai não sabe impor essa autoridade masculina, tranquila e enérgica, que emana da sua força indiscutível, e que oferece à criança o ideal varonil necessário ao seu desenvolvimento. A mãe não é uma mulher com naturalidade suficiente para oferecer à criança essa ternura harmoniosa e serena, que nada tem a ver com as tiranias (agressiva ou amorosa) que caracterizam tantas mães subconscientemente egoístas. É nestes casos que a escola e os educadores podem ter grande influência. Porém, também aqui se observam insuficiências. As nossas instituições escolares não permitem a educação afectiva. A pedagogia intelectualiza e torna i nsensível a criança, asfixiando prematuramente a força dos seus primeiros impulsos. E, no entanto, para a educação da sensibilidade, a escola poderia dispor da força dos sentimentos colectivos, que proporcionariam exemplo e estímulo aos débeis, aos vacilantes e aos inibidos. Deste modo, a FE-3 33 escola ajudaria a criança a transformar o egocentrismo dos primeiros Iaços afectivos familiares, em relações muito mais amplas. Esta primeira libertação da sua energia afectiva orientá-la-ia para a doação de si mesma ao próximo e à colectividade, objectivo último do seu desenvolvimento futuro como adulto. A falta de naturalidade é uma barreira que separa o adulto da criança. Muitos pais e educadores adoptam, para com os filhos, uma afitude convencional, exactamente como se desempenhassem um papel numa peça de teatro. Esta tensão pode ser constante e provocada pelo facto de o adulto sofrer as suas próprias repressões afectivas. É pre ferível mostrar-se desagradável, ter um acesso de mau humor ou uma fraqueza passageira do que adoptar uma atitude ambígua e sistemática. A perda eventual do domínio de si mesmo é menos prejudicial para a criança do que a contínua simulação da afectividade natural cujo calor é necessário para o desenvolvimento da sensibilidade infantil. (1) Neste aspecto desempenham um papel importante não só o ambiente que se viva na família como também a importância que nela se dê aos valores estéticos, sociais, morais e religiosos. Mas, sobretudo, é importante que exista um clima de compreensão, de dádiva e de amor entre os membros da família, para que cada um se sinta protagonista da sua própria vida e comprometido com a vida dos outros. O diálogo é o veículo privilegiado destas relações. Contudo, terá de ser um diálogo que implique capacidade de escuta, um diálogo em que o emissor saiba pôr-se no lugar do receptor, para poder admitir as (1) Mauco, G., Educación de la sensibilidad en el niño, Aguilar, Madrid, 1981. 34 razões deste sem renunciar às suas, quando lhe pareçam evidentes. Todavia, sem obstinação mas com um espírito de abertura à verdade, venha ela donde vier. E teremos de dialogar sempre e segundo as características psicológicas de cada criança. Há pais que não têm a preocupação de conversar intimamente com os filhos senão quando chega a adolescência. Pensam que é esse o momento, por se tratar de uma situação de crise no crescimento da pessoa, e, muitas vezes, chegam tarde. O filho, que não dialogou nem brincou com os pais desde pequeno, terá tendência para se fechar em si mesmo ou no círculo restrito das suas companhias. As circunstâncias sócio-económicas e o ritmo trepidante da vida actual não favorecem o diálogo. A televisão, o cansaço de um dia de trabalho, muitas vezes duro, as reduzidas dimensões da habitação, a falta de espaços verdes, as diferenças de horários a que estão sujeitas as pessoas da família, etc. são sérios obstáculos ao encontro entre pais e filbos. Teremos, porém, de procurar solução para o problema, pois está em jogo algo tão importante como a própria pessoa. E, em certas ocasiões, haverá que decidir entre o que se pretende que o filho seja ou o que tenha. E tem acon tecido que alguns casais, como resultado das suas reflexões em comum numa escola de paisu, tomaram a resolução de abandonar um posto de trabalho, e, consequentemente, um ordenado, para dedicarem mais tempo ao convívio com os filhos. Esta convivência é, sem dúvida, um dos factores mais determinantes do equilíbrio emocional de um educando, e, por isso, uma das funções mais importantes 35 que os pais têm de desempenhar relativamente à edu- cação afectiva dos filhos, sem que a consideração deste valor suponha pouco apreço pelas outras funções que também lhes competem. Acção específica da escola A incumbência da escola na educação afectiva é a continuação da que pertence à família: criação de um ambiente agradável, afirmação dos valores estéticos e morais, estimulação de relações afectuosas e abertura ao diálogo. De todos estes aspectos da educação da sensibilidade há que destacar, especialmente, os do relacionamento e do diálogo, dada a sua maior problemática no momento de agir. Tem-se dito repetidas vezes que a educação, como atitude, é fundamentalmente relação. Daí que se possa suprimir o instrutor, o professor, mas nunca o educador, o mestre. Ensinar e indicar são funções que as máquinas e os livros podem realizar, por vezes até melhor que um professor; pensemos, por exemplo, nos computadores. É que o ensino, a simples comunicação de dados científico-culturais, apenas indirectamente geram educação, enquanto proporcionam ao educando uma bagagem cultural, se este fizer por assimilá-la, e na qual vai registando as suas próprias experiências socionaturais. No entanto, para que a educação seja, como dissemos, a realização do homem como pessoa, isto é, o desenvolver todas as suas capacidades humanas, a realização de um projecto pessoal de vida, o ser 36 ele próprio, a sua entrega total aos outros, o sentir-se feliz, tem de conseguir uma identificação, um equilbrio emocional, um compromisso, um risco, um estímulo, situações que não se atingem a não ser através de uma relação pessoal. Daí que, num processo educativo, nunca se poderá prescindir do educador. No campo das relações e quanto ao grave problema da carência de laços interpessoais, o problema que existe na escola não é tanto o de uma relação deseducativa por parte dos educadores, já que o educando corresponde, geralmente, de modo positivo à relação afectuosa que lhe oferece o educador. É certo que há casos de professores que marcam os seus educandos e impedem o seu crescimento como pessoas, por causa da relação de domínio que exercem sobre eles. Porém, a realidade, de modo geral, é a existência nas escolas de uma separação didáctica que impede a relação pessoal, individua lizada, entre o educador e o educando. Uma escola que tem como objectivo fundamental o desenvolvimento dum programa, e como estratégia a habitual exposição das matérias que o professor explica aos alunos (cuja única actividade é a de escutar), não permite entrar na problemática de cada pessoa, nem numa relação familiar. Nesta situação despersonalizada, nada motivadora, a relação entre alunos e professor tem mais de tensão colectiva do que de relação educativa. E pensemos que há estudantes que passam cinco a seis horas diárias em situações como esta. Quando a classe se apresenta, de modo habitual, como um processo de trabalho individualizado e de pequenos grupos, com um acompanhamento pessoal do educador junto de cada aluno, só então tem lu- 37 gar uma autêntica zelação educativa entre todos os componentes do grupo. Só então as pessoas se sentem pessoas e estão descontraídas, podendo definir melhor a sua identidade e conseguir um equilíbrio emocional. Todavia, a relação humana na aula, por muito pessoal que seja, não é suficiente para que a vida afectiva do educando ganhe equilíbrio. Há problemas sentimentais e de identidade que requerem um diálogo mais íntimo do que aquele que o clima da aula pode proporcionar. É necessário um diálogo como o de pai-filho. E, à semelhança da família, a escola deve procurar situações, dentro ou fora do horário lectivo, que possibilitem o encontro livre e individual do educando com o educador que mereça a sua confiança. Este é o autêntico sentido da acção do tutor. A tutoria, basicamente, não é uma função administrativa e de coordenação de um grupo de educandos. A acção do tutor é um intercâmbio pessoal e livre entre o educador e o educando, tendo em vista a evolução deste. Este processo exige uma perfeita coordenação e uma estreita relação pessoal com os pais. Que os alunos têm problemas afectivos, especial mente na sociedade actual, é algo tão evidente que só poderá negá-lo quem não estiver envolvido no seu mundo emocional. Todos têm problemas: tem-nos a criança de cinco anos que vive em casa uma tragédia matrimonial; a de seis anos que não quer ir ao colégio porque um menino mais velho lhe bateu, na cazrinha; o aluno do Secundário que não se pode concentrar nos estudos por causa da falência dos negócios do pai; a menina que sabe que o pai vive com uma outra mulher, 38 mesmo em frente da sua casa; o universitário que se suicida, atirando-se da janela da biblioteca da faculdade. E tantos rapazes e raparigas que diariamente fogem de suas casas; e tantos que se sentem sós, porque não têm um amigo autêntico; e tantos que não encontram o sentido da vida, porque os adultos materializaram o mundo, desprezando os valores do espírito; e tantos que detestam uma escola que nada tem a ver com a sua existência. Quando na família não há diálogo, quando na escola não há diálogo, como harmonizarão os alunos o seu mundo afectivo? Como conseguirão uma maturidade emocional, quando a família vai por um lado e a escola por outro? Está aqui a responsabilidade. acção comum Se a educação da afectividade requer uma estreita relação entre os pais e a instituição escolar, a dimensão sexual exige muito mais, porque o sexo desempenha um papel capital na sensibilidade humana. O primeiro aspecto em que a família e a escola devem estar de acordo consiste em entender a educação sexual como um processo. Não podemos pensar que se educam sexualmente os filhos apenas porque, em dado momento, que pode ocorrer em casa ou na escola, se lhes explica a biologia genética do ser humano. A educação sexual, como qualquer outro aspecto educativo, requer uma planificação que contenha objectivos bem definidos e escalonados, além de linhas de acção muito concretas que permitam a consecução dos mesmos. 39 É evidente que a educação do presente tem pro jecção no futuro. Todavia, o que se pretende é que o homem viva, em toda a plenitude de que seja capaz, nas diferentes etapas da sua maturação, cada momento da sua existência. Em cada instante da vida o homem é sempre um todo, ainda que essa unidade apresente aspectos diversos. Desde o momento em que começa a distinguir o seu próprio eu como diferente do eu das outras pessoas, até que toma conhecimento da psicologia masculina ou feminina, o educando tem de saber integrar a sua sexualidade em todos os momentos da vida. É preciso saber não só conviver, mas também ter a noção de que, nas relações diárias, os dois sexos se complementam. Família e escola têm de entender a educação sexual como um processo. Mas, fundamentalmente, terão de coordenar os seus critérios no sentido de estabelecerem os fins últimos e a progressão dos objectivos próprios de cada idade, uns e outros implícitos já na natureza específica da educação sexual. A disparidade radical de critérios neste campo pode ser mais perniciosa para o educando do que noutros aspectos educativos. Claro que, tanto à família como à escola, põe-se sempre o problema de consciência de serem autênticas na proposta de valores, e capazes de defender as suas posições, quando pensam ser as correctas, ainda que possa haver diferenças entre elas. Mas qual é a opção do educando? Este problema não é específico do valor sexualidade, mas diz respeito a todos os valores envolvidos na educação. A coordenação de critérios deve conduzir, finalmente, à coordenação no modo de educar a sexualidade dos filhos, especialmente na forma de 40 orientar cada um, através de encontros individuais, que permitem uma maior atenção às suas características pes- soais. Atendendo a que os ritmos de maturidade dife- rem de uns educandos para outros, esta será a maneira mais adequada de tratar a educação da sexualidade. 41 4. Educação da expressão O homem dispõe de um leque muito variado de canais para poder comunicar as suas experiências, criações, sentimentos e ideias. Na educação, tem-se privilegiado essa capacidade expressiva do ser humano quase exdusivamente através da palavra, oral ou escrita. No entanto, o próprio corpo - como já vimos anteriormente -, a expressão plástica, as imagens e os sons são outros tantos veículos através dos quais o homem se pode abrir aos seus semelhantes. E isto sem considerar, por agora, outras possibilidades que a ciência já começou a investigar. E até se diz que, se a Psicologia tivesse progredido tanto como a Física, os homens, hoje, poderiam comunicar entre si através do simples pensamento. No momento actual da educação há que dar especial realce à importância que tem, para qualquer pessoa, a linguagem audiovisual. Não se trata de supervalorizar este canal expressivo em relação aos outros. Todavia, não podemos ignorar a importância capital da possibilidade de nos expressarmos através de qualquer manifestação plástica (desenho, pintura, modelação, etc.) ou através do movimento. E isto sem esquecer a cons- 43 tante necessidade da linguagem verbal. Embora por vezes se afirme que uma imagem pode valer mil palavras, também é verdade que uma palavra pode sugerir mil imagens. A importância a dar à linguagem audiovisual fundamenta-se no facto antagónico de que, quando a imagem e o som estão presentes em todos os locais que servem de apoio à vida actual - cinema, televisão, cartazes, vitrinas, etc. -, o homem apenas tem em si a capacidade de receber as mensagens que continuamente lhe chegam através destes meios de comunicação, e, à partida, não está educado para transmitir, através dos mesmos, as suas próprias mensagens. Resumindo: o homem apenas está preparado para a missão de receptor e não para exercer a actividade de transmissor. A capacidade de expressão do homem é grande e manifesta-se em muitos aspectos. O que acontece é que uma educação mal orientada, que planeia a sua actividade principalmente na transmissão de conceitos aos educandos, torna-os incapazes de darem viabilidade às suas necessidades vitais de comunicação. Como em tantos outros casos, é uma questão de escolha entre o ter e o ser. E os sistemas educativos, em função da ideologia social reinante, escolheram o ter. Acção específica dos pais A familia oferece, sem dúvida, o ambiente ideal para que se realize a linguagem verbal, especialmente a linguagem verbal oral. Assim, os pais encontram-se numa situação privilegiada em que terão muitas ocasiões para 44 educar o modo de expressão dos filhos. Esta educação da expressão supõe, como exigência mínima, o emprego de uma linguagem apropriada, especialmente na altura em que os educandos se julgam com mais personalidade para utilizarem uma certa desenvoltura no falar. E linguagem correcta não tem nada a ver com linguagem afectada nem tão-pouco com linguagem grosseira. Além disso, o falar bem exige o emprego de frases daras e com estrutura correcta. O trabalho dos pais, neste campo, pressupõe que eles possuam hábitos e conhecimentos linguísticos, ainda que elementares. Outra responsabilidade dos pais é a de estimular nos filhos o gosto pela leitura, porque os bons estilos literários aperfeiçoam a linguagem de quem os lê. Esta tarefa de estímulo da leitura deverá ter como complemento uma boa, em qualidade e em quantidade, biblioteca familiar. Sem dúvida que o estímulo e a orientação dos filhos no que respeita à leitura exigem uma estreita colaboração entre a família e a escola. É que a escola não só tem muito a fazer na área da linguagem, mas, em muitas ocasiões, também tem maior preparação pedagógica que os pais para ajuizar do valor educativo de um livro. Em relação à Iinguagem audiovisual, grandes cuidados competem à família. Na realidade, hoje em dia, é em casa, e não na escola, que o educando recebe um maior número de mensagens dos chamados meios de comunicação de massas, especialmente da televisão. Acerca desta problemática, escreve Alberta Engwall: Como espectadoras de televisão, as crianças são essencialmente umas intrusas, umas estranhas, umas con- 45 vidadas sem convite. São espectadoras de cenas pensadas para outros olhos, são orelhas que escutam palavras pensadas para outros ouvidos. É verdade que há alguns programas de televisão concebidos especialmente para as crianças. Aí são oferecidos aqueles temas denominados pelas próprias pessoas que per tencem à indústria como o insuportável programa do sábado de manhã. Na televisão comercial para crianças, a publicidade é abundante, além de pouco imaginativa. Ela centra-se nos produtos próprios para crianças - especialmente brinquedos, alimentos para o lanche - e reflecte a esperança do anunciante em que os jovens espectadores induzirão os pais a comprar os artigos anunciados. O testemunho dos pais confirma que esta esperança não é vã. A maior parte do que as crianças vêem na televisão são programas pensados para adultos, para pessoas mais i nformadas que elas em relação ao mundo em geral, mais capazes de distinguir a fantasia da realidade, mais conscientes dos objectivos de qualquer propaganda. Tudo o que os espectadores adultos captam por intermédio da televisão é filtrado por um espírito crítico que resulta dos conhecimentos adquiridos anteriormente através da leitura, da escola e da experiência da vida. E os conteúdos dos programas de televisão são analisados por um sistema nervoso mais evoluído. Pelo contrário, para as crianças, os conteúdos dos programas televisivos são muito diferentes de tudo quanto Ihes oferecem as suas experiências de vida e não têm fontes de conhecimento com as quais possam estabelecer paralelo. Como não sabem ler, não podem captar todas as mensagens das páginas dos livros nem folhear os jornais em busca de outras perspectivas do mundo. A própria inteli gência das crianças está em evolução e, em geral, é incapaz de estabelecer critérios, ou de avaliar tudo o que presencia no televisor. Para a criança, a televisão é uma janela antecipada aberta ao mundo." (1) (1) Liebert, R. e outros, La televisión y los niños, Fontanella, Harna, 1976, págs. 12 e 13. 46 Esta situação familiar responsabiliza muito os pais, não só no que respeita ao desenvolvimento da capacidade crítica dos filhos face ao conteúdo das ideias e das atitudes expressas nas mensagens, como em relação ao aspecto linguístico da imagem. O primeiro objectivo para que deve orientar-se o seu trabalho educativo, neste campo, é ensinar os filhos a compreender a simbologia da linguagem audiovisual. Uma compreensão incorrecta do vocabulário verbal dificulta a compreensão das ideias que se querem transmitir. Da mesma maneira, não conhecer o simbolismo de uma imagem é ficar cego para captar o sentido de uma mensagem audiovisual. Esta é a dimensão receptiva da educação para utilizar a linguagem dos meios de comunicação de massas. O outro objectivo a considerar pelos pais é o de ensinar os filhos a serem transmissores de mensagens audiovisuais. Este é um aspecto em que também a escola deve trabalhar e de forma mais sistemática que a família. Todavia, o que se passa é que um aluno, embora com muitas limitações, tem mais possibilidades em sua casa do que na escola, de manejar uma máquina fotográfica ou de cinema, um projector ou um vídeo. O que acontece é que os educandos que têm esta possibilidade carecem, geralmente, de uma formação técnica que lhes permita usar estes meios como autênticos veículos de expressão das suas vivências, ou para comunicar aos outros as suas ideias, ficando-se pelas imagens anedóticas ou narrativas. Uma mudança no sentido da linguagem audiovisual exigiria, na maior parte dos casos, a formação prévia dos pais e a investigação dos meios adequados para que esta formação se tornasse realidade nos filhos. 47 É evidente que a situação acerca da educação das capacidades de expressão audiovisual, no ambiente familiar, depara com sérias dificuldades quando se pretende passar à prática, dadas as precárias condições sócio-económicas de muitas famílias. Porém, deixar o filho a ver televisão, abandonando-o à sua sorte perante o forte impacto da imagem, nunca será educar para a expressão, através dos meios de comunicação. De qualquer modo, neste aspecto da educação das capacidades expressivas, como nos outros, é este o desafio dirigido à família. Acção específica da escola A escola não só tem a competência como também a obrigação de desenvolver todas as dimensões expressivas da pessoa, e isso de forma sistemática, coordenada e com uma definição dara dos objectivos para cada nível educativo, induindo, naturalmente, o correspondente ao chamado Ensino Médio. Quando uma aluna do Secundário escreve o mesmo erro em todos os seus testes de avaliação e em nenhum deles, depois de dassificados, o professor assinala o erro ortográfico, devemos reflectir sobre a situação: como é orientada esta rapariga no sentido de conseguir uma correcta expressão verbal escrita? E quando, já a nível universitário, os acentos gráficos são esquecidos, as frases não são pontuadas e a letra é ilegível, poderemos estar seguros de que se educa a capacidade de expressão escrita? E quando, de forma habitual, durante os anos de escolaridade, pouco diálogo há nas aulas, pois o que 48 existe é o monólogo de um professor que fala para os alunos, que escutam, colocados uns atrás dos outros, poderemos estranhar a incapacidade que o homem normal sente para se exprimir em público? Pelo contrário, a discussão de ideias em grupo, os trabalhos realizados em equipa e uma organização escolar caracterizada pela participação habituariam o educando a exprimir-se publicamente sem complexos. E se da expressão verbal passarmos a outros aspectos da expressão, teremos a certeza de que a pessoa saberá expressar-se através do seu corpo ou das suas capacidades de modelar e pintar, quando, em muitas escolas, quase nunca se põe o aluno em movimento, para que aperfeiçoe o corpo como veículo de comunicação, e os únicos exercícios plásticos são copiar modelos existentes? Também não é melhor o panorama no que se refere à educação para a expressão audiovisual. Perante esta situação, que é vista não com pessimismo mas apenas com realismo, a escola tem de tomar consciência da sua responsabilidade, e a família, embora tenha de ajudar a escola, também tem de ser exigente para com ela, para que resolva eficazmente os problemas de organização e preparação pedagógica dos professores, um dos quais é, sem dúvida, uma autêntica formação para o desenvolvimento das capacidades de expressão dos educandos, de modo que estes não fiquem frustrados num campo tão importante da sua personalidade. Acção comum Existem duas causas que condicionam negativamente as capacidades expressivas da pessoa: a falta de FE-4 49 espontaneidade e a existência de complexos. Estes dois motivos têm estreita relação entre si, embora nem sempre o primeiro esteja dependente de qualquer complexo pessoal. A verdade, porém, é que ambos os problemas têm origem, muitas vezes, nas mesmas motivações ou são problemas de ordem afectiva. Daqui resulta que expor qual deve ser a acção edueativa comum da família e da escola, a propósito destes problemas que condicionam a expressão, seria voltar a falar de aspectos já tratados, pelo que nos escusamos de os referir novamente. No entanto, há que lembrar, uma vez mais, a importância de que exista na família e na escola um ambiente sereno e um clima de franco diálogo entre todas as pessoas do grupo, para que o educando possa crescer com naturalidade. E isso acontecerá se, entre outros factores da sua educação, o aluno tiver a possibilidade de se expressar com espontaneidade. 50 5. Educação para a liberdade Educar para a liberdade é ajudar um aluno a formular o seu projecto pessoal de vida e estimular as suas capacidades para que o realize em cada instante da sua existência. Todavia, que fique bem claro que o projecto é pessoal. Efectivamente, cada homem tem de ser o sujeito da sua própria história, porque cada homem é autor e actor do seu próprio drama. E, se é verdade que todo o ser humano tem em comum com o outro a sua vocação ontológica, isto é, a vocação de ser o que a sua natureza tem capacidade de ser, também é certo que tem uma vocação específica pessoal. É que cada homem é uma individualidade original e irrepetível. Nem mesmo no seio materno se esbatem as identidades da mãe e do filho. Por isso o homem aventura-se em cada situaçáo que lhe surge na vida, e ninguém o pode substituir nas suas decisões. Mesmo na hora da morte nenhum homem pode substituir outro homem. Porém, também é verdade que o ser humano não chega à vida na plenitude das suas capacidades. Daqui resulta que, embora sendo um ser diferente, não é inde- 51 pendente, devendo ser substituído, sobretudo pelos pais, enquanto não tiver capacidade de tomar decisões responsáveis. Não obstante, o ser humano está destinado a assumir, de modo progressivo, a sua própria existência, sem substituições que o impeçam de ser ele mesmo, e, assim, ser o homem livre que está destinado a ser. Esta liberdade do homem te, fundamentalmente, quatro dimensões. A primeira é determinar para si mesmo a identidade que o vai definir como homem, não quanto à sua essência, porque essa é-lhe natural, mas quanto à sua maneira de ser, que é, em última análise, a sua educação. A segunda dimensão consiste na escolha pessoal de valores. Ninguém tem o direito de escolher por outro o que ele entende que é importante para si próprio. Escolher o estado de vida é a terceira dimensão. Optar pelo casamento, escolher a pessoa que vai ser a companheira de toda uma vida, preferir a vida religiosa ou o celibato ou o sacerdócio, são decisões estritamente pessoais e intransferíveis. A actividade profissional a que o homem deseja dedicar-se constitui a quarta dimensão. A profissão é, para além de um compromisso com os outros, um modo do homem perdurar nas suas criações. O trabalho é mais uma forma de identificação da pessoa, e, por isso, deve ser sua a escolha. Que cada homem tenha o direito de pessoalmente optar em cada uma destas quatro situações, que reflectem os direitos da sua liberdade, não significa que deva fazê-lo sem contar com as outras pessoas que estão envolvidas na sua decisão. O homem é um ser com identidade própria, mas vocacionado para a relação com os 52 outros homens. O que significa é que essa decisão tem de ser sua, precisamente nos momentos da vida em que ninguém deve decidir por si, porque há momentos em que só a própria pessoa tem de assumir responsavelmente a sua existência. E é evidente também, e isto faz parte da sua essência, que o homem é um ser condicionado, pelo que a sua liberdade é sempre limitada e relativa. Um destes condicionamentos é a educação. Toda a educação, seja qual for a sua filosofia de base, condiciona o indivíduo, pois cria hábitos que o levam a agir em determinada direcção. De igual modo, a falta de uma certa educação é condicionante, pois também cria hábitos no comportamento do homem. Por isso, educar a pessoa para que seja livre não equivale a deixá-la desprovida de um sistema de valores, nem de um conjunto de hábitos, nem no vazio da sua própria responsabilidade, quando não tem capacidade para assumi-la. Mas educar a pessoa para que seja livre também não pode ser predeterminá-la (o que é muito diferente de condicioná-la), tornando-a incapaz de optar pessoalmente face aos diversos caminhos que a vida lhe abre. Esta é a arriscada tarefa da educação para a liberdade. Trabalho difícil, mas necessário para que a dignidade do homem seja um facto. Acção específica dos pais A parte que compete aos pais na educação da liberdade compara-se a uma moeda que apresenta duas faces de capital importância: a autoridade e o diálogo. 53 A consciência de que o mundo está em crise é um fenómeno universal. Por todo o lado se fala e se escreve sobre crise ideológica, crise religiosa, crise política, crise económica. E também se tem consciência de que existe crise de autoridade, de que a crise de autoridade na família é um dos aspectos. Desde o conceito e formas de autoridade paterna nas sociedades tribais e patriarcais, ou do pater familias da sociedade romana, ao tratamento de tu entre pais e filhos na sociedade actual, há uma profunda evolução que se acelerou vertiginosamente nas últimas décadas, e que continua em progressão. Como em toda a crise de valores, temos a sensação de que os alicerces da vida humana abrem brechas criando uma situação caótica, que origina desorientação e vertigem. No entanto, as situações de crise são normais em todo o ser que, como o homem, está em contínua evolução, e trazem consigo a ruptura de uma etapa ultrapassada, para entrar nas interrogações de outra etapa nova que há que viver. A gravidade desta situação não é o sofrer a crise, mas sim o risco de não orientar para o despontar dos autênticos valores o novo caminho que se abre à existência. Daí a necessidade de definir o alor essencial da autoridade paterna, para o ligar intimamente, como qualquer coisa de imutável, com as formas, sempre em mudança, da vida. Este valor, cuja raiz se prende ao conceito etimológico da palavra latina autoritas, é o ascendente, isto é, o predomínio moral. É, pois, uma corrente de superioridade que submete fortemente uma pessoa a outra, provocando nela uma atitude de dependência voluntária. 54 A autoridade estará longe, portanto, de provocar uma submissão baseada na força. Os pais têm autoridade na família, pois a paternidade confere-lhes totalmente a ascendência sobre os filhos. E isto por uma dupla razão. A primeira, porque a fam7ia é uma sociedade onde a autoridade não depende do consenso maioritário dos seus componentes, mas é uma predeterminaçáo da natureza, pois não tem capacidade natural para escolher a pessoa que detém a autoridade aquele cuja existência depende dessa pessoa. O pai é ascendência e o filho é descendência. A segunda razão é que o filho é um ser que caminha progressivamente para a posse da sua responsabilidade de adulto, ponto de maturação da sua personalidade, a partir do qual se torna independente do pai, quer no aspecto psicológico quer no aspecto legal. Porém, até que chegue esse momento de plenitude e enquanto dele se encontre distante, e, consequentemente, mais ou menos privado de liberdade - que é a faculdade de se autodeterminar -, o pai compensa, com a sua ascendência, a decisão que o filho está ainda incapaz de assumir. Sobre este ponto de vista, é evidente que o sentido da autoridade paterna não se fragmenta, pois a essência das coisas não muda, a menos que mude a sua natureza. E, por outro lado, os factos demonstram que o que está em crise não é o conceito, mas o modo de lhe dar forma real. E é neste ponto que surgem o conflito de gerações, o autoritarismo, a tibieza, a fuga, o desentendimento, o não saber que fazer. No fundo de toda esta problemática está latente, quer em relação aos pais, quer em relação aos filhos, um falso conceito do sentido de autoridade. 55 Os impulsos de rebeldia da criança costumam ter a sua origem nos instintos incontrolados, quando o raciocínio e a vontade estão apenas a despontar ou em vias de crescimento. A insubordinação do adolescente tem a sua base psicológica na auto-afirmação da personalidade, muitas vezes desvirtuada, por confundir a liberdade com o prazer. Por outro lado, o autoritarismo e a tibieza dos pais criam raízes em atitudes erradas face aos filhosincompreensão, ausência de diálogo, falta de abertura a novos valores, falta de dedicação, viver a vida, de uma forma egoísta, rigidez ou fraqueza de carácter, mau relacionamento do casal, etc. - ou, o que é mais grave, a tentativa de encobrir a falta de ascendente moral com o uso do poder e da força. Só existe uma atitude capaz de equilibrar as relações de autoridade-dependência entre pais e filhos: a autenticidade. A autenticidade permite que os pais sejam pais, e não que aparentem uma paternidade, e torna possível que os filhos sejam filhos ou, o que é o mesmo, seres dependentes do tronco gerador, até que a carga de uma personalidade autêntica e rica dele os desprenda, para viverem por si mesmos a aventura de serem livres. Os casos, mais ou menos graves, de autoridade mal compreendida são quotidianos, infelizmente. Não educa para a liberdade a mãe que, viajando no autocarro. manda sentar o filho de dois anos, e fica desarmada, sem saber o que fazer, quando a criança se coloca de pé sobre o assento; não educa para a liberdade o pai que pede autoritariamente um objecto ao filho de cinco anos, merecendo que o filho lhe diga: Por favor; e o mesmo 56 acontece com o pai que consente que o filho de seis anos remexa todas as pedras do tabuleiro, porque lhe ganharam uma, permitindo-lhe voltar ao início do jogo. Muito menos educam os pais que obrigam os filhos a tirar um curso, quando estes preferem aprender um ofício, ou os que impedem uma filha de fazer os estudos necessários à realização vocacional da sua vida. Autoridade - quando é autêntica -, sim. Autoritarismo, não. Assim sendo, não é autêntica autoridade impossibilitar, sem razões plausíveis, a opção livre de um filho, quando este está em situação de assumir o seu futuro, no que constitui a sua identidade, a sua escolha de valores, o seu estado de vida e a sua actividade profissional. Esta opção é evidentemente um risco, mas a vida é um escolher contínuo face às interrogações do futuro, que se apresenta ao homem como um espaço infinito a que tem de lançar-se sozinho, porque, nos grandes momentos, nenhum homem substitui outro homem. Como meio educativo de exercer a autoridade há que realçar, uma vez mais, o valor do diálogo. Tudo na vida motiva o diálogo. As bolas coloridas do berço interrogam a criança, e esta responde estendendo os bracitos p ara elas. O brinquedo mecânico interroga o destruidor, de quatro anos, e a resposta deste é desmanchá-lo para ver como funciona. A Natureza interroga o homem, e este devolve-lhe a resposta, investigando a essência dos seres. Tudo na vida interroga o homem: a tempestade medonha e o mar bravio, o pôr do Sol no horizonte escarlate, os factos da vida humana, e a dor, e a alegria, e a morte. Porém, são sobretudo os outros homens que o interrogam, inclusivamente aqueles que guardam silêncio. 57 A pessoa forja-se no diálogo, porque no diálogo ninguém se sente o único possuidor da verdade, mas os intervenientes escutam-se atentamente uns aos outros; porque as pessoas que dialogam se comprometem com o que afirmam ou negam; porque se provocam atitudes críticas, necessárias para que o homem não seja vítima de dogmatismos; porque as pessoas se sentem aceites; porque o que dialoga se define a si mesmo e, portanto, revela a sua identidade; porque, em suma, através do diálogo se caminha para a liberdade. A urgência que os pais têm em estabelecer o diálogo como factor básico para educar os filhos para a liberdade, exige-lhes - e também aos filhos - um conjunto de atitudes, sem as quais o diálogo será conversa de surdos. O diálogo exige dos pais a atitude de compreender o filho. E compreender, todavia, não significa estar de acordo com as ideias ou o comportamento do filho, quando se está convencido de que são errados ou inverosímeis. Compreender é não estranhar os comportamentos e os gostos de um adolescente. Compreender é admitir que o filho, muitas vezes, é vítima dos impactos ambientais. Compreender é aceitar que a juventude também tem razão. Compreender é ter consciência de que, por definição, o educando é um ser que não chegou ainda à maturidade. Outra exigência do diálogo, em relação aos pais, é a aceitaçâo da pessoa do filho. Pode-se rejeitar os valores e as atitudes de um filho, se houver motivo para isso, e dizer-lhe não, se necessário; porém, nunca se pode rejeitar a sua pessoa. É preciso aceitá-lo como é. Não existe o filho ideal, como não existe o pai ideal. 58 Além disso, o diálogo pede que se moderem os comportamentos. Enquanto um pai disser ao filho: isto é assim, porque sou eu que o digo,, não há possibilidade de diálogo. A paternidade não garante a posse da verdade. Se há ocasiões em que o equívoco é dos filhos, noutras alturas a falta é dos pais. O diálogo também exige humildade. O orgulho encerra a pessoa no seu reduto, impedindo-a de vir ao encontro da comunicação. Finalmente, para dialogar é necessário estar aberto aos novos valores que surgem com a evolução da humanidade. Os valores, se o são, não estão adstritos a um determinado tempo e, assim, cada geração descobre alguns que até aí eram desconhecidos. O facto de não entender isto agrava, muitas vezes, o conflito de gerações. Há que fazer uma análise dos valores que a juventude traz consigo, e não os negar, pelos simples facto de não pertencerem ao campo axiológico dos adultos. Toda esta série de exigências pressupõe uma grande preocupação para os pais - e também para os filhos dialogantes -, mas, na altura própria, também Ihes proporciona, na maioria dos casos, a grande satisfação de verem como o filho assume a sua própria vida de forma livre e responsável. O diálogo, na educação da liberdade como em qualquer outro campo, é um risco. Contudo, toda a vida é um risco. E, certamente, são também riscos o autoritarismo e a falta de diálogo na educação, factores que podem levar os filhos - e tal acontece em muitos casos - a uma ruptura afectiva e efectiva com os pais. Cada vez são mais alarmantes as estatísticas no que se 59 referem a adolescentes e jovens fugidos de casa. A causa inicial deste afastamento estará sempre nos filhos? É problema para meditar. Estes dois aspectos da educação para a liberdade diálogo e autoridade - atingem o seu objectivo, quando, na família, se vão dando ao filho as responsabilidades que ele seja capaz de exercer, de acordo com o seu nível de maturidade. A liberdade é uma aprendizagem quotidiana. Ilunca se é totalmente livre, embora o homem esteja destinado a usufruir sempre uma maior liberdade. Dificilmente será um indivíduo responsável na idade madura aquele que não o pôde ser gradualmente desde a infância. Educar os filhos para que sejam homens responsa velmente livres é uma tarefa difícil e dura para os pais, mas é também uma tarefa apaixonante, pois a liberdade é a raiz da personalidade humana. Acção específica da escola Tal como os pais, a escola educa para a liberdade, através do diálogo e da autoridade. Por isso, nestes dois campos, as posições são idênticas, quer para a família, quer para a escola, e pressupõem uma forte coordenação no modo de as pôr em prática. Mas, além disso, a escola educa através da sua maneira de actuar. Um educando não aprende a ser livre porque estuda nas aulas a Declaração dos Direitos do Homem. Aprende a ser livre quando os sistemas educativos Ihe apresentam um padrão no qual ele pode desenvolver, progressiva e racionalmente, as suas capa- 60 cidades críticas e de opção, dentro de um compromisso de obrigações que o aperfeiçoam como pessoa e o inserem na sociedade. Nesta perspectiva, cabe perguntar se os sistemas dominantes, chamados educativos, criam autêntica liberdade. Quando, de modo habitual, se dá aos educandos o trabalho todo ordenado até aos mínimos detalhes - situação determinada, tempo de realização, modo de apresentar os trabalhos, materiais para os realizar, formas de expressão, etc. -, e isto durante todo um dia lectivo, e ao longo de uns doze anos de escolaridade, realmente poderão eles aprender a ser livres? Um sistema educativo torna o educando capaz de optar pela liberdade, quando desenvolve nele, progressivamente, a dimensão critica da pessoa e lhe possibilita ser, gradualmente, responsável pelos seus actos. A estrutura escolar não deve, portanto, limitar o educando, senão na medida em que este não tenha a maturidade suficiente para se responsabilizar pela sua própria formação. Quer isto dizer que no sistema escolar deve haver tempos de actividades pessoais em que, segundo a programação geral e debaixo da orientação e o controlo constantes dos professores, os alunos tenham pos sibilidade de escolher, conforme o seu nível etário, o tipo de trabalho a realizar, o modo, o momento, etc., para que, pouco a pouco, possam tomar sob a sua responsabilidade a existência que lhes é própria. Por idênticas razões, o sistema escolar deve assentar também no diálogo entre educandos e educadores, pois é o diálogo, e não o monólogo dos professores, que desperta a atitude crítica, base em que assenta a liberdade. 61 Este programa pressupõe, evidentemente, um equilíbrio para não sair frustrado na educação. Temos de tomar consciência de que, se é grave falhar por excesso, deixando o educando vaguear sem rumo ao seu livre arbítrio, também é grave falhar por defeito, frustrando, por causa do medo, uma pessoa que está ocacionada a ser ela própria numa vida de que é a inica protagonista. Não há dúvida de que um sistema escolar que programa os alunos é mais cómodo para os professores, e, 3parentemente, mais eficaz na orientação dos comporamentos. A questão que se põe é se um sistema coisiicador, é capaz de modificar as atitudes interiores do ducando a quem não se motiva e a quem simplesmente e obriga. Certamente que há ocasiões em que o aluno deve agir por obrigação. O que é preciso saber é se a obrigação,, sem mais, presume uma atitude de aceitação e de compromisso do sujeito. A que obedece então a crescente onda de rebeldia juvenil? Tratar-se-á de um fenómeno estritamente psicológico, próprio da idade? Não será também que, durante muitos anos de escolaridade, o educando é um paciente em vez de um agente, isto é, é mais objecto que sujeito? Educar é um compromisso sério, porque está em jogo, nem mais nem menos, a existência de uma pessoa vocacionada não só para a liberdade, mas também para a felicidade. E isto com a agravante de que apenas pode usufruir essa existência uma vez. Daqui resulta também a grandeza do compromisso com a educação. O problema dos sistemas escolares é urgente e não admite demora. As pessoas que vejam, a este respeito, quais as suas responsabilidades. 62 Acção comum Família e escola têm uma missão comparticipada: a orientação pessoal do educando. É uma orientação que abrange quatro frentes, os quatro determinantes da sua existência (identidade, valores, estado e profissão), perante os quais eIe tem de tomar uma atitude pessoal e inalienável. A procura da própria identidade É claro que cada homem que chega à vida é que tem de descobrir o seu próprio caminho para alcançar o fim que é a razão da sua existência. Porém, isto não significa que as descobertas, que tem de fazer por si mesmo, tenham necessariamente de ser feitas sem a ajuda de outrem. Pelo contrário, o homem necessita que outros homens estejam a seu lado, iluminando o rumo das suas pesquisas e apoiando ou contradizendo as suas conclusões. O primeiro aspecto desta orientação é o que se refere à identidade do educando. Um homem não pode afirmar-se como pessoa, se não tiver uma definição de si próprio. E definir é estabelecer limites a separar uma entidade de outra entidade. Quer isto dizer que, ao definir-se, o homem determina conscientemente aqueles aspectos que, por lhe serem próprios, o separam dos outros homens. Como tudo no ser humano, a identificação é um processo. O homem está em formação durante toda a vida, e tem de se debruçar constantemente sobre si pró- 63 prio para que os estímulos, muitas vezes alienantes, que lhe chegam de fora não o despersonalizem, reduzindo-o a um robô. Porém, se esta tarefa de identificação é um objectivo de toda a vida, adquire maior acuidade no período que vai desde a idade da razão à idade madura. Quando a pessoa tem mais projectos que realizações, precisa de procurar sobretudo aquilo que há-de constituir a sua identidade: existência e essência, traços de inteligência, afectividade, carácter. Nesta procura, o educando tem de se apoiar em pessoas já possuidoras da sua identidade, seguras de si mesmas, com uma personalidade muito definida e capazes de responder às muitas interrogações que lhe dirijam sobre o próprio ser. Estas pessoas devem ser, essencialmente, os pais e os educadores, pois de contrário corre-se o risco de que o adolescente e o jovem procurem identificar-se com os ídolos da moda, mesmo que estes não sejam o paradigma que melhor se adapte àquilo que deve ser a sua autêntica identidade. É importante que os educadores, chegada a hora de orientar, manifestem a maior segurança. Se assim não for, o educando pode encontrar-se sozinho perante o vazio das suas próprias incógnitas, já que o adulto, que devia servir de modelo, lhe oferece a imagem de uma personalidade confusa e imprecisa, que nada vale como ponto de referência no momento em que tiver de determinar a sua. 64 Encontro com os valores A escolha de valores é a segunda frente em que os educandos devem ser orientados. É esta uma área igualmente muito delicada, pois assim como a personalidade forte de um educador pode anular a identidade potencial de um educando, do mesmo modo a pirâmide de valores dos pais e dos professores pode predeterminar o esquema axiológico de pessoas que apenas estão a despertar para o mundo dos valores. Área delicada, certamente, mas que deve ser enfrentada com coragem, dando testemunho claro e firme dos próprios critérios de valor, perante um educando carente, mas ansioso por encontrar os valores que dêem sentido à sua vida. Quantas vezes o errado liberalismo educativo de alguns pais é a causa dos filhos viverem na angústia da dúvida. Pensaram que, quando eles os interrogavam acerca dos grandes porquês, da existência humana, o silêncio era a melhor resposta que podiam dar-lhes. Tinham em vista não os substituir na construção da sua própria escala de valores, e, assim, deixaram-nos mergulhados na noite da desvalorização da sua existência. Este problema assume carácter geral, pois o mundo dos adultos eliminou os valores do espectro social, e mer gulhou, conjuntamente com o mundo jovem, num materialismo que só obteve como resultado a solidão e a infelicidade do homem actual. É evidente que a orientação do educando no campo dos valores sobre que assenta a verdade do educador é um condicionamento para ele. Porém, é igualmente FE-5 65 condicionante deixá-lo desprovido de uma escala de valores, oferecendo-Ihe em troca o vazio. Tudo no mundo condiciona o homem, e é mais grave o condicionamento da insegurança que o da verdade sinceramente aceite. O importante é que educador e educando procurem juntos essa verdade que os torna autenticamente livres, não tomem atitudes dogmáticas nem autoritárias, e vão abrindo gradualmente o leque das diferentes ideologias existentes no campo dos valores. O educador deve ser sempre daro e mostrar-se seguro quanto às verdades que constituem a sua escala de valores. Isto dá confiança ao educando, que, ao mesmo tempo que adere à verdade das pessoas para ele dignas de crédito, mantém uma atitude de pes quisa para se certificar dessa verdade ou para se decidir pela sua verdade. Desta maneira, no momento oportuno, um filho deve fazer a sua opção de valores, coincidam eles ou não com os dos pais ou os dos professores. Esta é a sua responsabilidade, este é o seu risco, esta é a sua liberdade. Responsabilidade, risco e liberdade que possui por ser homem, dimensões da capacidade de aperfeiçoamento que lhe confere a sua natureza humana, nas quais pode ser ajudado, mas nunca substituído. Escolha do estado de vida Outra incógnita do futuro do educando é a do estado de vida: que modo de vida, quais as pessoas com quem a compartilhar, que nível de compromisso? 66 Também neste campo a decisão final é do educando. Ninguém pode contrair matrimónio em vez de outra pessoa. Da mesma maneira, ninguém pode subs- tituir outrem numa vida consagrada a Deus e aos outros. Solidão ou comunidade, família ou celibato são modos de viver intransmissíveis. A escolha de estado é mais uma atitude de vida face ao futuro do que uma decisão momentânea. Supõe um processo de maturidade da pessoa, o qual, geralmente, não se atinge sem a ajuda de outras pessoas. E é aqui que entra a orientação familiar e escolar. Orientar um educando é colaborar com ele na busca progressiva do estado em que se fixará na sua vida adulta. É consciencializá-lo da importância que tem, para a sua felicidade, o acertar correctamente na escolha de estado. E é motivá-lo para que entenda a sua decisão como um compromisso, perante si próprio e perante os outros, que o marcará toda a vida, contra a eoncepção relativista que a juventude herdou dos adultos. Numa sociedade artificial e confusa que hoje diz sim, e amanhã diz não, deve-se recuperar o valor da palavra dada a Deus, a um homem ou a uma mulher e suportar todas as consequências que daí advenham, pois isso é sinal de maturidade. Só uma pessoa que tenha atingido o equilíbrio de si mesma é capaz de correr o risco de se comprometer para a vida inteira. É mau que um dia se quebre um sim, mas ainda pior é condicionar a primeira promessa que se faz. À família e à escola, em estreita coordenação. compete orientar; ao filho, decidir. Porém, a orientação há-de ajudá-lo a decidir com responsabilidade, conhecimento de causa e empenhamento. 67 Orientação profissional A profissão é a quarta incógnita que se apresenta à perspectiva de um educando. O que vais ser, quando fores grande?, é uma das primeiras perguntas que se fazem aos meninos, e são do anedotário infantil quotidiano as respostas de sempre: toureiro, militar, enfermeira, futebolista, professora... Todavia, atingida a adolescência, esta questão torna-se premente e angustiante. O pluralismo profissional é cada vez maior num mundo de complexas especializações científicas, técnicas, humanísticas, linguísticas, etc., que colocam o educando perante um autêntico problema no momento de escolher a sua actividade profissional. Além disso, este problema agrava-se, pois, contraditoriamente, a um maior número de profissões corresponde uma menor possibilidade de encontrar um posto de tra balho, sem que isto signifique, claro está, que a causa desta insuficiência seja aquela especialização. Por outro lado, o educando está consciente de que a complexa situação laboral da sociedade impede, em muitas oca siões, que a pessoa possa exercer a actividade profissional que realmente a realiza como pessoa. E isto fundamentalmente por duas razões. A primeira, como já dissemos, pela carência de postos de trabalho que obriga o homem actual a inserir-se numa actividade laboral para a qual não sente vocação, mas a que tem de se agarrar para sobreviver. A segunda, por uma falsa concepção do que é a actividade profissional, avaliada, essencialmente, como instrumento de riqueza e de poder, e, por isso, de prestígio social. Em muitas ocasiões, a família, a escola, a sociedade em geral confundem o educando 68 na sua perspectiva vocacional, valorizando as profissões pelo dinheiro que nelas se ganha, e não pelo aperfeiçoamento interior que pode proporcionar à pessoa, nem pela sua transcendência social. Isto é grave, pois a actividade laboral, ainda que deva ser um meio digno de subsistência, é um acto criativo pelo qual a pessoa se prolonga e perdura, já que a obra criada é, de certo modo, parte de si própria. Sendo assim, a actividade laboral não é profissão, mas vocação. E a profissão não é trabalho, mas prazer. Porque o prazer é a actividade que recreia o homem, que é uma projecção de si mesmo, ainda que o canse física e psiquicamente. Pelo contrário, o trabalho é a actividade imposta pelas circunstâncias, e que o homem realiza como se fosse uma peça mais da máquina que manobra. Outra realidade que avoluma a dúvida vocacional do adolescente é a situação de mudança no mundo laboral, especialmente no que diz respeito à ciência e à técnica. Os progressos nestes campos são tão rápidos que a aptidão do presente não vale no futuro. E isto sem pensar que o engenheiro, o arquitecto, o biólogo, o mecânico. que agora se preparam nas Escolas e na Universidade, não serão os profissionais capazes de resolver, talvez dentro de muito pouco tempo, os problemas da arquitectura espacial, da alimentação nos voos interplanetários, da arquitectura submarina, etc. Enquadrar o homem em estruturas laborais já existentes, quando o mundo está em tão rápida evolução, será habilitá-lo profissionalmente? Amplo, grave e difícil é o quadro que a orientação vocacional dos filhos nos apresenta. Nessa orientação estão comprometidas, sem dúvida, a família 69 e a escola. Ambas comprometidas por igual na proposta do valor da vocação. As duas igualmente atentas às aptidões e inclinações que o educando manifesta face às diversas actividades profissionais possíveis. As duas com igual necessidade de diálogo, quer em casa, quer nos corpos directivos das escolas; quer entre si, quer com os educandos. Mais comprometida a escola nos aspectos pedagógicos que o futuro vocacional exige. Porque, para além da simples observação, a escola tem de explorar cientificamente as capacidades e a personalidade do educando, através de provas psicotécnicas sérias. E, sobretudo, a escola tem de realizar uma acção didáctica que suscite o interesse do educando para o mundo científico- cultural e desperte os seus gostos profissionais. E isso só o pode conseguir uma didáctica que o coloque em contacto directo com esse mundo científico-cultural. Em certa ocasião, alguém perguntava a um aluno do Secundário o que gostaria de ter feito e não fizera nas aulas de Biologia. A resposta foi: Ter realizado o transplante do coração de uma rã. É que é no contacto directo com a vida que pode surgir a vocação pela Biologia. Será que, aprendendo de cor as elassificações dos insectos, ela nascerá também? Do mesmo modo, os mecânicos só surgirão nas aulas práticas de Tecnologia, e os historiadores quando o modo habitual de estudar História for a análise e a crítica de documentos. A opção vocacional, salvo raras excepções, não é decisão de um momento, mas é a meta final de um processo educativo. É errado pensar que um adolescente está em condições de fazer uma escolha profissional, pelo simples facto da instituição escolar, no último ano do seu curso, lhe ter proporcionado um ciclo de conferências 70 sobre as suas possibilidades de integração no mundo do trabalho. Como toda a educação, a capacidade profissional da pessoa vai-se adquirindo de forma progressiva e no diálogo constante entre o educando e o educador. Identidade pessoal, atitude perante os valores, escolha de estado e opção profissional são quatro difíceis questões que se colocam a um educando, e quatro imperiosas responsabilidades para com ele, que se colocam aos pais e à escola. Dar-lhes resposta acertada é caminhar para a liberdade. 71 6. Educação para a vida comunitária Educar para a vida em comunidade significa desenvolver a dimensão social e política do homem. A sociabilidade abrange uma série de relações com as pessoas, que vai desde os comportamentos mais elementares de cortesia até ao compromisso mais profundo com a emancipação do homem, passando pela inserção activa nas estruturas económicas e culturais da humanidade. A educação política pretende que o homem tome consciência da responsabilidade que lhe cabe no bom andamento da comunidade, e também que participe activamente, se for preciso e se se sentir vocacionado para isso, nas estruturas de governação, com o fim de servir não os interesses de um partido, mas os interesses da comunidade. Educar para a vida comunitária é, portanto, criar o sentido de comunidade entre os homens. Forma-se uma comunidade, quando há participação e quando há compromisso. Comunidade é um vocábulo cuja raiz é a palavra latina communitas, que, por sua vez, deriva de communis, o comum. Assim, comunidade é a quali- 73 dade do que é comum. Esta ideia está igualmente subjacente nas palavras comunhão e união. Esta característica da comunidade, referida à realidade humana, exige a conjugação de, pelo menos, seis factores, para que exista, de facto, comunidade: associação livre de pessoas, unidade de princípios, unidade de objectivos, unidade de acção, relação de amor e disposição para o trabalho. Dado ser difícil reunir todos estes factores nos diversos grupos de homens que existem na sociedade, a comunidade apresenta-se mais como um desafio do que como uma realidade. Contudo, a educação exige que se enfrente esse desafio. O primeiro passo para a comunidade é a partici pação, conceito que, sobretudo nos tempos actuais, necessita de precisão, para evitar confusões. Participar é tomar parte na vida da comunidade. A raiz etimológica deste vocábulo é o substantivo latino pars (parte) e o verbo capere (tomar). E participante, do latim particeps,, é o que toma parte. Daqui resulta que tenham sentido diferente as palavras participação e gestão, esta derivada de gerere,, que significa levar consigo, executar, administrar, produzir. Isto quer dizer que a participação depende da função que cada membro exerce na comunidade, e acontece, algumas vezes, que a gestão é o modo de participação de um qualquer indivíduo, ou de todos, se a todos corresponderem as mesmas funções. Estar educado para a vida comunitária é ter cons ciência da própria identidade dentro de uma determinada comunidade - quer ela seja familiar, educativa, política, religiosa, recreativa, cultural, des- 74 portiva, de amizade, etc. -, e, como consequência, estar consciente da função que nela se tem de desempenhar para o bem comum, o que é o mesmo que estar consciente do grau e campo de participação a que se tem direito e dever. A comunidade forma-se através da participação, mas também, e necessariamente, através do compromisso. É que a participação não é só um direito a ter em conta por cada membro da comunidade, mas é também a obrigação que tem de cumprir a sua função para enriquecer as restantes pessoas dessa comunidade. Desta maneira, não está preparado para a vida comunitária aquele que não aceita o compromisso que a vida em comunidade exige: a entrega de si mesmo aos outros. Acção específica dos pais A primeira comunidade em que a criança está inserida é, pela lei da vida, a família. Por isso a esta compete ser a primeira educadora da dimensão social dos filhos, e isto de uma maneira mais prática que teórica. Se a fam7ia quer educar para a vida comunitária, deve existir nela uma estrutura participativa e de com promisso, o que significa que cada um dos seus membros, e segundo a sua maturidade, tem de estar consciente daquilo que é dentro da família, da função que lhe compete desempenhar e das suas obrigações para com cada um dos restantes membros. Os pais assumem a direcção da fam7ia e, consequentemente, as decisões importantes. Contudo, se escutam a opinião dos filhos, se a tomam em consideração, 75 se estabelecem um dima de diálogo, se lhes atribuem responsabilidades, se são exigentes consigo próprios e se exigem o cumprimento do dever, estão a educar para viver em comunidade. O autoritarismo - não a autoridade - destrói a participação, anula o compromisso e, assim, dissolve a comunidade. A co-responsabilidade bem dirigida entusiasma, é fonte de exigências pessoais e motiva a vida em comum. Todavia, para além da famlia, o educando está inserido noutra comunidade mais ampla: a vizinhança. Esta é outra realidade social na qual o indivíduo está envolvido, e que, como no caso da famia, deve possibilitar a sua capacidade de participação e de compromisso, isto é, de viver em comunidade. E aqui também tudo deve acontecer mais através da prática que da teoria social, sem que isto faça supor que os pais, na sua acção educativa, devam rejeitar o estudo dos valores comunitários. A família e a vizinhança são as duas esferas em que se dá preferência à acção dos pais, no momento de educar a dimensão comunitária dos filhos. Acção específica da escola Como em todos os casos, incumbe à escola, mais que aos pais, a formação científica dos filhos. No campo da educação para a vida comunitária, a escola é obrigada a formular os projectos teóricos da Sociologia e da Potítica, para que o educando possa tomar uma atitude crítica pessoal perante os diferentes sistemas de convivência humana. Conhecimento, avaliação, dis- 76 cussão e atitude em relação aos valores sociais e políticos são as quatro facetas que se exigem à escola na educação teórica para a vivência comunitária. Porém, como se aprende melhor aquilo que se faz, a escola tem de estabelecer um sistema educativo e uma organização geral nos quais se torne realidade a participação e o empenhamento responsável dos educandos. Esta actuação pressupõe uma planificação anterior em que não só se identificaram as pessoas da comunidade educativa como se determinaram as suas funções específicas. Neste esquema geral enquadrar-se-iam os delegados de turma, o conselho de alunos, as comissões de actividades, os encarregados da escola, a participação no conselho pedagógico, etc. Porém, a participação e o compromisso dos alunos não deve ser relegado apenas para o exercício em organismos escolares mais ou menos isolados. Pelo contrário, a sua prática deve ser habitual no âmbito de toda a dinâmica escolar, na qual devem ser consideradas a sua opinião, a sua entrega e a sua exigência. A escola, tal como a família, também não é uma sociedade democrática no sentido político. Mas a educação para viver numa comunidade democrática alcança-se melhor num sistema escolar mais participativo do que num sistema de aulas teóricas. É dialogando que se aprende a dialogar, é criticando que se aprende a criticar, é tendo responsabilidade que se aprende a ser responsável, é votando que se aprende a votar e é comprometendo-se que se aprende a tomar compromissos. Tudo isto, claro está, na justa medida e segundo as capacidades dos educandos, mas fazendo com que esta dinâmica 77 educativa seja realidade autêntica na escola, ainda que, por vezes, se torne incómoda para os educadores. Só assim a desejada comunidade escolar o será de facto e educará para uma verdadeira vida social e política. Acção comum Uma vez mais, a acção educativa comum à família e à escola é a orientação. E é preciso insistir que a educação é, sobretudo, um diálogo franco entre o educando e o educador, ainda que cada pessoa seja única e intransmissível. Não é preciso repetir aqui o que já foi dito acerca da orientação. Unicamente será de assinalar que, na educação social da pessoa, é fundamental a orientação dos educandos por parte dos pais e da escola, sobretudo em dois aspectos da socialização, não porque sejam, talvez, os mais importantes, mas porque podem ser origem de conflitos, especialmente na adolescência: as amizades e a militância politica. A amizade apresenta-se como problema por várias razões. Uma delas, e não a menos grave, é a falta de um amigo. Muitos educandos têm a amarga experiência de não ter na sua vida uma pessoa que, realmente, se possa identificar com o que se entende por um amigo,. Por isso há adolescentes e jovens que, carentes de laços afectivos familiares e de uma amizade autêntica, sofrem uma angustiosa solidão. Outra causa da amizade ser problema é o tipo de amigo com quem o educando se identifica, já que os valores de uma pessoa são fortemente influenciados pelos 78 valores da pessoa amiga, o que, por vezes, pode con- duzir ao aniquilamento dos valores próprios. Quanto à política, no seu sentido mais rigoroso, o educando pode tomar três atitudes distintas: o como- dismo,, a intervenção não comprometida com o partidarismo e a militância A orientação deve combater o comodismo, porque é uma atitude anti-social. O homem não pode ficar indiferente perante a vida quotidiana da comunidade em que está inserido, pois a sua indiferença cria obstáculos à vida normal da sociedade, sendo causa de empobrecimento não só pessoal como comunitário. A intervenção política do cidadão vulgar, náo filiado em qualquer partido, é uma obrigação para o homem que não seja um ente anti-social. Orientar o educando para que se integre devidamente na comunidade política, é consciencializá- lo do dever que tem em participar, de forma activa, na dinâmica geral da direcção dessa comunidade. A militância é um compromisso da pessoa com a política, através da filiação num qualquer partido. Porém, este compromisso, como qualquer outro, implica sempre um risco. Daí que a militância se apresente ao educando como uma questão que ele deve resolver com a ajuda dos pais e da escola. E, uma vez mais, há que salientar que a acção educativa consiste em orientar e não em predeterminar a pessoa do educando. A um adolescente com dúvidas de carácter político, a família e a escola podem e devem propor-lhe o seu esquema de valores; podem e devem motivá-lo para a opção política que julguem mais conveniente para a comunidade; mas o que não devem - nem podem - é obrigá-lo a 79 aceitar um sistema político conhário à sua própria vontade. Um educando, nalguns períodos da sua vida, terá a ideologia política dos pais ou da escola. Contudo, num determinado momento - quando tiver de assumir a sua própria história - só ele decidirá acerca do seu compromisso político. Ninguém pode forçar a vontade profunda de uma pessoa; e pretender fazer isso, quando o indivíduo atingiu já a maturidade, é desumanizar o homem. Amizades e política. Dois aspectos da sua dimensáo social, nos quais o educando - para se integrar na grande comunidade humana - necessita do forte apoio orientador, em estreita colaboração, dos pais e da escola. 80 7. Educação para a transcendência O termo transcendência, referido ao homem, significa saída de si mesmo em direcção a alguma coisa ou a alguém, que não ele próprio. E, certamente, o homem possui uma dimensão transcendente, visto que não é um ser isolado no mundo. O universo, as plantas, os animais, os outros homens, Deus, são entes distintos de si, são outros seres. Esta realidade exige que o homem estabeleça uma relação entre o seu próprio ser e os outros seres, pois ficar fechado em si mesmo seria destruir a sua capacidade de relacionamento, e, portanto, destruir uma das vertentes da sua perfeição. O homem tende para a sua plenitude, se procurar atingir a plenitude de todas as suas capacidades, entre elas a sua dimensão trans cendente ou relacional, visto que não é um ser com capacidades exclusivamente imanentes, isto é, capacidades que não despontam para o exterior de si mesmo. Sendo assim, ainda que a transcendência do homem se refira a todos os entes que o rodeiam, este termo costuma referir-se, preferentemente, à relação do ser humano com Deus. É aqui precisamente que incide este aspecto da educação. FE-6 8 Transcender para Deus significa entrar em relação de amor com Ele. E, se não houver amor, não é perfeita a relação. Por isso, educar o homem para a transcendência é proporcionar-lhe o encontro com Deus. A partir deste encontro, Deus tornar-se-á mais perceptível ao homem, manifestando-lhe a sua presença em Cristo, o Deus feito homem. Como consequência desta manifestação, o homem transcende para Deus através de Cristo. Uma vez encontrado Cristo, os outros aspectos da transcendência - dimensão religiosa do homem - são simples consequências: verdades teológicas, oração, vida comunitária, compromisso com o homem. Acção específica dos pais A educação religiosa dos filhos é um problema de grande importância, mas um problema muito delicado, pois atinge o homem nos seus sentimentos mais profundos: o mistério, a consciência, o sentido da existência, a morte, o além. realidades que têm muito a ver com as mais íntimas convicções da pessoa. Embora o problema seja delicado, isso não signi fica que o devamos evitar. O filho, desde muito pequeno, é assaltado por interrogações de ordem transcendente. A experiência da morte de algum familiar coloca-lhe questões sobre o que estará para além da vida,, e pergunta qual é o sentido de tudo aquilo. Com o passar dos anos, estas interrogações tornam-se cada vez mais prementes: a existência e a essência de Deus, a dor, o mal, a imortalidade, a providência, etc. 82 Perante tais interrogações, os pais não podem deixar os filhos sem resposta, o que implica que já tenham dado a si próprios essa resposta. E claro que a resposta - seja de que ordem for - à pergunta formulada pelo filho, condiciona-o no seu modo de compreender a transcendência. Porém, também é condicionado pelo vazio do silêncio, que não o torna mais livre na sua opção religiosa. A fé do filho - uma fé motivada, explicada, dialogada - costuma ser a fé dos pais, a quem cabe a grave responsabilidade de ter uma religiosidade formada, ilustrada, responsável. Não obstante, não basta dar a resposta e mostrar o modo de viver a transcendência, resposta que o filho aceita e modo de vida a que o filho adere. Simultaneamente, ele tem de crescer e responsabilizar-se pela vida transcendente que se lhe propõe, para que, no momento exacto em que deva fazer uma opção pessoal, tenha capacidade para a fazer livre e responsavelmente Como a transcendência é relação, para educar a dimensão religiosa dos filhos não basta que os pais os esclareçam (quer em momentos previamente estabelecidos, quer em situações ocasionais), mas é também necessário e da maior importância ter actos de culto em família, nos quais experimentem, com amor, a comunicação pessoal e comunitária com Deus. Será uma oração íntima, agradável, existencial, na qual a família inteira dialoga com Deus Pai sobre todos os problemas vitais que afligem o homem. Outro factor importante na educação transcendente dos filhos é a participação na vida de comunidades religiosas mais amplas do que a comunidade familiar. O homem tem uma vertente individual que é, certamente, 83 objecto de transcendência, mas também tem uma dimensão comunitária, que igualmente deve estar impregnada de um sentido transcendente. É que o homem - individual enquanto pessoa - não é um ser isolado, pois está na vida com outros, razão pela qual é continuamente solicitado a realizar-se comunitariamente, inclusive na sua vida de transcendência. Neste padrão de vivência comunitária da fé enquadram-se os actos litúrgicos, em que, na companhia dos pais, o filho participa na festa que a grande família dos crentes faz ao Senhor Deus. Os pais devem explicar aos filhos o sentido profundo dos ritos e motivá-los para que participem neles com o maior empenho possível, unidos na alegria e no amor a Deus e a todos os irmãos da comunidade. Esta educação religiosa que os filhos devem receber dos pais é insubstituível. Acção específica da escola Se é da competência dos pais a instrução religiosa formal e ocasional, à escola compete a instrução mais sistemática, ou, por outras palavras, mais teológica. Contudo, isto não significa, de modo algum, que a escola não tenha de atender ao ocasional e ao diálogo simples, num aspecto da formação da personalidade do educando, em que a individualização é totalmente necessária, já que a evolução religiosa - que é encontro e relação pessoal e comunitária com Deus - tem ritmos muito diferentes de pessoa para pessoa. O que significa é que, 84 admitida esta verdade, a escola tem de procurar que o educando chegue a fazer uma correcta sistematização dos conteúdos religiosos que respondem às grandes questões que a transcendência coloca ao homem. Todavia, como já foi dito tantas vezes, é fundamentalmente a vida que educa. Por isso é necessário que a escola facilite a vida transcendente, que é relação com Deus, troca de experiências, diálogo sobre tudo o que encerra mistério, compromisso de libertação do cativeiro a que o homem está submetido. E tudo isto tendo em atenção o equilibrio, a prudência e a psicologia dos educandos, para que estes possam assumir, progressiva e responsavelmente, a sua vida de transcendência. Cabe aqui perguntar se a escola tem o direito de interferir na dimensão religiosa do homem. Porém, fazer esta pergunta é o mesmo que perguntar se a escola tem o direito de educar. E, como o homem é um ser destinado à transcendência, seria deixá-lo limitado, se a escola - que é, por natureza, uma entidade educativa, e não especialmente instrutiva - ignorasse essa dimensão. O certo é que a escola tem esta função educativa por delegação dos pais, o que de resto acontece com os outros aspectos da educação, facto que não significa que, normalmente e por várias razões, a iniciativa parta deles, embora sempre suponha a sua liberdade de opção. Por este e outros motivos, torna-se necessário um perfeito entendimento de ideias e de atitudes entre os pais e a escola, embora, como no caso dos restantes valores que se propõem ao homem, cada qual tenha de ser fiel à sua opção dos mesmos. 85 Acção comum Embora não seja o único, o testemunho é o deno minador comum da acção da família e da escola, no que se refere à educação para a transcendência. A resposta às interrogações, o diálogo, o estudo sistemático dos conteúdos teológicos, a vivência comunitária, etc., são, efectivamente, factores de educação. Mas a vida dos educadores é que verdadeiramente educa. A melhor resposta às interrogações que o educando con tinuamente coloca, é a fé viva dos pais e dos professores. Fé que não é só conceito, nem só acto de culto, nem só participação comunitária, mas compromisso com Deus, com o semelhante, com as estruturas sociais, com a política, com a economia, com a cultura, com o desporto, com a ciência, com a arte. com a vida, e isto ! numa perspectiva transcendente que dá um sentido próprio à afirmação do ser. Durante a infância, os pais e os professores são mitos para a criança; durante a adolescência e a juventude, são super-homens com quem pretende identificar-se. Deste modo, facilmente se compreende que, sendo o testemunho importante para qualquer pessoa, torna-se indispensável para o educando. Por outro lado, é um facto comprovado que a fé i I se transmitiu sempre, de geração em geração, mais pelo modo de viver dos crentes do que pelo seu esquema mental de verdades. Dar testemunho. É este o desafio que a transcen dência exige aos educadores. 86 Relação Família-escola Nas Estruturas Educativas. 87 87 ÌIM E C i4;ú, k 88 8. Sentido da relação estrutural Já dissemos que o ponto de encontro da relação famlia-escola é o educando, cuja pessoa constitui a razão de ser desta relação, reputada de vital, pois incide em cada uma das dimensões perfectíveis do ser humano. É essencialmente na educação de cada uma destas capacidades operativas que a natureza psicossomática do homem possui - crescimento biológico, movimento corporal, inteligência, afectividade, expressão, liberdade, sociabilidade, transcendência - que se deve ter em conta a coordenação das acções específicas da família e da escola, já que, sem uma perfeita união das suas acções, não se dará uma equilibrada maturação do educando. A relação vital entre os pais e a entidade escolar é, pois, antes de mais, uma acção educativa que incide sobre cada uma das faculdades humanas de um educando, que se realiza a partir da própria identidade. Mas a relação família-escola, para ser mais eficaz, também deve acontecer nas estruturas que toda a comunidade educativa tem de estabelecer para apoiar as acções que são realizadas por cada um dos seus componentes. E, assim, a primeira coisa a fazer, no aspecto 89 estrutural, é determinar os organismos em que devem estar representados os diversos estratos que constituem a comunidade. Logo depois, a comunidade deve fixar as necessá rias interdependências entre as pessoas que dela fazem parte, visto que é um organismo vivo, que não poderá realizar-se como tal, se cada um dos membros que a compõem desempenhar as suas funções de uma maneira independente, em relação aos outros. Quando as pessoas de um grupo humano se identificam como seres não relacionados entre si, esse grupo poderá ser um conjunto de individualidades, que vivem a sua existência e se auto-afirmam pelas actividades exteriores que exercem, mas de maneira nenhuma forma uma comunidade. A união entre as diversas pessoas da comunidade educativa, e entre as suas respectivas funções, não anula, de modo algum, a identidade de cada uma delas. Pelo contrário, o encontro de pessoas e acções, desde que respeite a essência e a originalidade do ser, desenvolve os dinamismos perfectivos que cada indivíduo possui e aumenta a onda expansiva da sua acção, que toma então características de universalidade. As inter-relações tornam-se realidade na partici pação, na representatividade e na co-responsabilidade. Nenhuma pessoa, que realmente pertença à comunidade, pode ficar marginalizada, quer em relação a si própria, quer em relação à sua acção. Fisicamente ou por delegação, todas as pessoas e todas as funções devem estar presentes em toda a comunidade. Só assim cada indivíduo é comunidade. 90 Construir os aquedutos, embora necessários para a rega, não significa logo a passagem da água fertilizante. Só quando o correr da água se torna realidade, é que começa a fluir a vida. Da mesma maneira, estabelecer a rede de intercomunicação entre as pessoas e as funções da comunidade educativa não significa que esta tenha vida. O amor é a vida. Por isso, a organização das pessoas é simples estrutura ou organismo funcional, mas em nenhum caso comunidade, se entre elas não existir uma relação de amor. Porém, o amor não surge por disposições regulamentares, mas pela vontade que as pessoas sentem de se amarem umas às outras. O amor não se programa. Nasce do encontro num ideal comum. Assim, ainda que pareça um paradoxo, o amor é ao mesmo tempo ponto de partida e meta de chegada. Sem um amor inicial é quase impossível que se forme a comunidade. E sem um crescimento no amor não se aprofunda a essência da comunidade. 91 9.identidade e Funções das Pessoas que Compõem a Comunidade Estabelecer as inter-relações estruturais entre a família e a escola pressupõe conhecer a identificação das diversas pessoas que as constituem, definir as respectivas funções e considerar as exigências, as obrigações e os direitos que lhes são próprios. Todos estas variáveis são determinadas ao constituir-se a comunidade educativa. Basicamente, os elementos desta comunidade são os educandos, os pais, os tutores, os professores, o orientador, o coordenador, o director, as pessoas que dão nome ao colégio, assim como o pessoal não docente. Para que possa realizar-se uma verdadeira acção educativa, há que estabelecer, entre todos, uma acção coordenada, quer a nível pessoal quer a nível estrutural. Esta coordenação implica a participação de todas as pessoas na vida da comunidade, segundo o grau de compromisso assumido por cada uma. Esta maior amplitude no grau de participação deverá ser estabelecida com sinceridade e com prudência. Com sinceridade, procurando que, por parte dos membros da comunidade, haja uma participação real e autêntica, que, 93 embora acarrete riscos, jamais poderá ser um mito. Em segundo lugar, há que estabelecê-la com prudência. A entidade responsável e a própria comunidade devem medir o estado de maturidade nela existente, de maneira que se estabeleça uma participação adequada e dinâmica, de acordo com o seu crescimento. São duas, pois, as bases formais em que assenta a organização das relações comunitárias escolares: a legislação vigente e o estatuto próprio. Este é um órgão legal que a comunidade oferece a si mesma e que estabelece as regras de relacionamento interno. Com estas bases e respeitando os princípios do Ideário - opção ideológica do instituto escolar - a comunidade educativa tem de organizar-se para poder realizar o seu projecto educativo: objectivos, conteúdos programáticos, metodologia a seguir. O quadro seguinte, em que aparecem definidos a identidade, as funções, as exigências, os direitos e os deveres das diversas pessoas que podem constituir a comunidade, tem apenas carácter de orientação, pois ninguém as pode substituir na tarefa que lhes compete de estabelecer a sua própria vida comunitária. Educandos Identidade Os educandos são, simultaneamente, os sujeitos e os principais agentes da sua própria educação. Sobre eles incide directamente toda a acção da comunidade educativa, cuja existência é por eles justificada. Se todos os 94 Organigrama Educadores Entidade Nominal Direccção Pais Professores Associação Departamentos Conselho Pedagógico Línguas C. Humanas C. Naturais Experiências Religiao e Moral Coordenaçào Conselho Conselho Departamento Serviços de Estudos Administrativo Geral de Orientação Técnicos de Escola Educandos Conselho De Alunos - Escolar Básico Secun N Io Aluinos membros da comunidade são sujeitos de educação, como seres em contínuo aperfeiçoamento, os educandosentes que vivem o presente com forte projecção para o futuro - são-no de um modo específico, dado o momento do processo evolutivo em que se encontram, no qual o aspecto educativo é essencial. Mas os educandos são também os primeiros edu cadores de si próprios. Cada pessoa é que orienta o seu próprio aperfeiçoamento, porque a educação não vem de fora, é algo que está no interior do próprio sujeito que se educa. De fora vem apenas o estímulo que acciona o dinamismo de aperfeiçoamento de que o educando é portador. Funções Pela sua natureza, a função dos educandos dentro da comunidade educativa não tem carácter meramente receptivo. Pelo contrário, eles são chamados a desempenhar, de acordo com as capacidades de que sejam possuidores, um papel eminentemente activo, participando com a sua opinião, com a sua atitude e com as sugestões pessoais e de grupo em tudo aquilo que se relaciona com a sua formação, principalmente nos seguintes aspectos : - objectivos da sua educação; - linha educativa da escola; - trabalho escolar; - actividades gerais; - normas de convivência; - avaliação do rendimento educativo- 96 Exigências Esta natureza e estas funções exigem dos educandos: - a responsabilidade própria da idade para assumirem consciente e deliberadamente a sua educação; - abertura aos estímulos de aperfeiçoamento que os educadores lhes proporcionam; - um compromisso activo com toda a acção educativa da comunidade, na proporção correspondente à posição ocupada na hierarquia da mesma. Direi tos Os educandos têm direito: - ao respeito pela sua consciência cívica, moral e religiosa ; - ao seu desenvolvimento físico, mental, afectivo, moral, social e transcendente, dentro de uma adequada liberdade e responsabilidade; - a ser educados tendo em conta a sua dignidade de pessoas; - a ser orientados na educação e profissionalmente, atendendo ao seu próprio temperamento, à sua persona1idade e aos problemas pessoais de aprendizagem; - a que as actividades escolares da educação básica se ajustem ao seu nível de maturidade, e a que a progressão no sistema educativo corresponda ao seu rendimento, avaliado objectivamente; - à utilização das instalações, mobiliário e material da escola, que devem ter as máximas garantias de FE-7 97 higiene e de segurança e devem estar adaptadas às necessidades físicas e psíquicas; - à participação na vida escolar, de acordo com as suas capacidades; - a criar associações para melhor desenvolver as suas actividades formativas e recreativas; - a formular, perante os professores e a direcção da escola, todas as sugestões e reclamações que julguem oportunas; - ao seguro escolar estabelecido no sistema de Segurança Social vigente; - ao serviço médico e a uma preventiva e eficaz acção sanitária. Deveres - Realizar responsavelmente o trabalho escolar. - Assistir pontual e regularmente às aulas. - Participar nas actividades gerais da escola. - Exercer as tarefas que, dentro da orgânica da escola e de acordo com as suas possibilidades, lhes são atribuídas. - Respeitar a dignidade e as funções dos colegas, dos professores e de todas as pessoas que trabalhem na escola ou que estejam relacionadas com ela. - Manter limpo e em bom estado de conservação o edifício, as instalações, o mobiliário e o material. - Cumprir rigorosamente as normas de convivên cia estabelecidas na escola. 98 Educadores 1. Pais Identidade Embora os educandos sejam educadores de si próprios, os pais não deixam de ser os principais educadores dos filhos, ao mesmo tempo que são sujeitos da própria educação, na sua qualidade de pais. Os pais são os educadores naturais dos filhos, já que a essência da paternidade é gerar a vida - que é o próprio filho -. Porém, a vida de um ser humano não é obra que se realize duma vez, é antes uma contínua realização, até ao momento em que o filho consiga orientar-se sem a ajuda paterna. Todavia, os pais são também, e ao mesmo tempo que educadores, sujeitos de educação - como pais que são -, pois a paternidade é um processo de aperfeiçoamento do ser humano. Não há pais perfeitos na altura do nascimento de um filho, mas é nesse momento que cada pai assume o compromisso de aperfeiçoar constantemente a sua paternidade. É, pois, importante que tenham uma atitude não só de aprendizagem e de renovação, como de vivo interesse pelo papel que Ihes cabe na própria educação. Funções Dentro da comunidade educativa, e por força do que foi dito atrás, os pais estão envolvidos na: 99 a) Informação: - acerca do processo educativo dos filhos, de vendo estar a par dos conhecimentos adquiridos nas diversas matérias, hábitos intelectuais, capacidade de expressão, hábitos de estudo, técnicas de trabalho, sociabilidade. ; - acerca do seu correcto futuro profissional, porque esse futuro deve ser determinado pelo educando sob a orientação conjunta de todos os seus educadores; - acerca da vida geral da escola; - acerca da política educativa nacional. b) Participação: - na determinação dos objectivos gerais da escola; - na indicação das grandes linhas metodológicas que o professorado deverá seguir; - nas actividades extra-escolares dos educandos: convívios, biblioteca, excursões, desportos. ; - na avaliação da obra educativa realizada pela comunidade; - nas Associações de Pais. c) Formação - psicológica, para possuírem, ainda que de forma elementar, conhecimentos científicos acerca do psiquismo humano e do seu processo de maturação; - pedagógica, para fundamentarem cientificamente a intuição educativa que é própria dos pais; - cultural, não só porque os pais são pessoas (sujeitas, por isso, a um aperfeiçoamento contínuo), mas também porque devem entender a linguagem do mundo em que, juntamente com os filhos, estão inseridos. 100 Exigências Aos pais, como membros da comunidade educativa, exige-se : - uma atitude interessada em relação a todo o projecto e trabalho educativos da comunidade; - uma atitude dialogante com todos os membros da comunidade educativa, particularmente com os mais directos educadores dos filhos; - uma atitude de entrega pessoal à comunidade e de compromisso para com a mesma. Direi tos - Receber informação periódica do processo educativo dos filhos e do andamento geral da escola. - Participar nos órgãos administrativos e de direcção para que sejam designados, e também nas actividades gerais da escola. - Ser considerados como sujeitos de educação permanente. - Ser membros da Associação de Pais. Deveres - Colaborar activamente com os professores na educação dos filhos. - Procurar que estes cumpram as normas estabelecidas na escola. - Tomar parte activa nas reuniões e nas entrevistas para que sejam convocados. 101 - Justificar ou solicitar por escrito as ausências dos filhos às aulas ou às actividades gerais. - Prestar o seu contributo pessoal, sempre que pos- sível, em todas as actividades escolares que possam ser da sua competência. 2. Professores Identidade Ser professor é ser educador. Professor é, simples mente, um nome funcional que serve para distinguir um educador de outro, segundo as suas actividades específicas. Um mero profissional do ensino não tem lugar na comunidade educativa. Ser educador é também ser pai, porque a educação é a vida do educando. Ao mesmo tempo, e porque a sua missão é educar a comunidade, o educador é sujeito da sua própria formação. E nenhuma outra actividade necessita de tanta actualização como a sua. Funções O professor está empenhado: - na educação, como função de estímulo e ajuda a cada educando, para que este consiga transformar-se na pessoa que está destinado a ser; - na participação comprometida e integrada em todo o projecto educativo e em toda a acção da comunidade educatica; - na avaliação dessa acção; 102 - na formação cultural, científica e psicopeda- gógica que auxilie a sua personalidade de educador. Exigências Perfil do educador: - motivador, que entusiasma; em vez de repetidor de receitas, que enfada; - criativo, que suscita a actividade; em vez de rotineiro, que produz passividade; - dialogante, que aceita a pessoa do outro e a ajuda a ser ela mesma; em vez de autoritário, que des personaliza; - humilde, que cria situações de pesquisa; em vez de nmagister, que cria dogmatismos e impede a descoberta ; - integrador, que promove a cooperação; em vez de polarizador, que conduz à coacção; - globalizador, que forma mentes capazes de sintetizar e de sistematizar; em vez de atomizador, que transmite conhecimentos desconexos e cria mentes desintegradas; - aberto, que aceita os novos valores; em vez de fechado, que origina a ruína; - gerador de educação; em vez de executor de educação. Direitos - Realizar a acção educativa segundo critérios e métodos próprios, dentro do sistema educativo global da escola. 103 - Utilizar todas as instalações e o material didáctico da escola, sempre que o julgue oportuno para realizar uma acção educativa mais eficaz. - Ser respeitado pelos alunos e por todas as pessoas que compõem a comunidade educativa. - Fazer chegar à autoridade correspondente as sugestões e reivindicações que julgue oportunas. - Participar em todos os órgãos directivos, administrativos, económicos e educativos que sejam da sua competência, e em todas as actividades gerais da escola. - Aperfeiçoar-se como pessoa e como profissional. - Receber com pontualidade a remuneração eco nómica correspondente ao seu trabalho, de acordo com a legislação e os contratos laborais vigentes. - Gozar as férias e licenças segundo a legislação em vigor. Deveres - Educar de acordo com o sistema educativo estabelecido na escola. - Desempenhar a docência das disciplinas que lhe forem destinadas, dentro da área da sua competência. - Realizar uma acção educativa eficaz de modo a que os objectivos gerais da escola sejam conseguidos. - Respeitar a dignidade dos alunos e das outras pessoas que formam a comunidade educativa. - Ser pontual, não só nas aulas como em todas as outras actividades que exerça. - Ter em dia a documentação pedagógica exigida na escola, para tornar mais eficaz a educação. 104 - Coordenar a sua acção educativa com a de todo o professorado, através dos departamentos por áreas científicas e artísticas afins em que se agrupam. 3. Tutor Identidade O tutor é, essencialmente, um educador, o que significa que é a pessoa que mais influência tem na formação da individualidade de outra pessoa, que está vocacionada para uma plenitude harmónica e única. Funções O tutor tem duas funções específicas: - o estímulo e orientação pessoais do educando no processo de maturação de todos os aspectos da sua personalidade; - impulsionar o dinamismo da pessoa, já que o educando é o principal interveniente na sua própria educação. Exigências O tutor tem de satisfazer as seguintes exigências: - possuir uma filosofia do homem: para orientar, deve saber o que é o homem e para onde caminha; - interessar o educando na sua própria educação; 105 - ajudar a descobrir a verdade: com humildade e diálogo, para que o educando a encontre por si próprio; - ter em conta a posição do educando: o que implica compreensão e abertura, que não é o mesmo que aprovação de critérios incorrectos; - promover a responsabilidade: é o educando quem decide o seu destino; - possuir capacidade psicopedagógica; - amar: a educação é obra de amor, e o amor é entrega; - possuir uma psicologia equilibrada Direitos O tutor é membro de direito do Conselho Geral de Escola e do Departamento de Orientação. Deveres - Entregar pessoalmente a cada educando o resultado das diferentes avaliações, para o poder orientar no seu processo educativo. - Presidir à sessão de avaliação do seu grupo de tutoria e redigir a acta correspondente à mesma. - Guardar cuidadosamente os dados pessoais de cada educando. - Realizar diariamente uma breve orientação de grupo com todos os alunos de si dependentes. - Entrevistar pessoalmente os pais de cada um dos alunos, uma vez em cada trimestre escolar, ou as vezes que julgue necessárias. 106 - Estabelecer contactos, de forma periódica e sem- pre que o caso o requeira, com a Direcção e com os outros educadores, a fim de conseguir uma coordena- ção entre todas as pessoas que intervêm num mesmo processo educativo. Pessoas com cargos directivos 1. Director Identidade e funções O director é a pessoa que orienta, coordena, anima e aprova toda a acção educativa da comunidade. Exigências A natureza das suas funções, que são basicamente de direcção, ainda que educativa, exigem do director: - personalidade equilibrada; - capacidade de adaptação às pessoas; - domínio das situações; - capacidade de diálogo; - conhecimento das pessoas; - preparação técnica; - atenção permanente à política educativa do País. Resumindo, o director terá de ser a pessoa capaz de criar um dima satisfatório de interacção, de tal maneira que todas as pessoas se sintam bem, com vontade de realizar e compartilhar as suas experiências com os outros. 107 Competências - Estabelecer, depois de ouvida toda a comunidade educativa, a política pedagógica da escola. - Estimular o trabalho escolar. - Coordenar a acção educativa dos professores e do pessoal auxiliar. - Criar oportunidades de diálogo entre todos os membros da comunidade educativa. - Admitir e suspender, conforme o caso, os alu nos, professores e outras pessoas que trabalham na escola, depois de observadas as disposições estabelecidas no Estatuto. - Nomear ou suspender as pessoas que desempe nham os diferentes cargos e funções existentes na escola. - Determinar a gestão económica da escola, ouvidos os órgãos de consulta correspondentes. - Avaliar o rendimento educativo de cada um dos membros da comunidade. - Exigir o cumprimento do Estatuto de regulamento interno. - Autorizar qualquer acção própria da escola, que não esteja em contradição com o Estatuto da mesma. - Convocar e presidir às sessões dos diferentes conselhos da escola, sempre que o julgue oportuno. - Estabelecer contactos periódicos com os coorde nadores, tutores, professores, pais e alunos. - Relacionar-se, directa ou indirectamente, dele gando noutra pessoa, com as autoridades académicas superiores. - Representar oficialmente a escola. 108 2. Coordenador de estudos Identidade, funções e exigências Considerando que o coordenador de estudos é a pessoa que compartilha tarefas e responsabilidades com o director, as características pessoais que lhe são exigidas são também idênticas. Competências - Velar pelo cumprimento das regras de convivência na escola. - Organizar o calendário e o horário escolares e exigir o seu cumprimento. - Autorizar as faltas de professores e alunos. - Proceder à substituição de professores nas aulas. - Comunicar à Direcção as ausências dos professores. Organizar as actividades gerais da escola. Aplicar sanções educativas aos alunos que as mereçam. - Avaliar a acção educativa dos professores 3. Entidade Nominal Identidade É a pessoa ou pessoas que administram a escola, uma vez que são proprietárias da mesma. 109 Competências - Estabelecer o Ideário da escola. - Contratar o pessoal. - Fazer uso dos direitos e cumprir os deveres que provêm das relações contratuais com o pessoal. - Responsabilizar-se pela gestão económica. - Assumir a responsabilidade do funcionamento da escola perante a Administração, os pais dos alunos, os professores e o pessoal não docente. Órgãos colegiais de direcção As inter-relações formais e organizadas entre a família e a escola, tornadas realidade nas pessoas que as compõem, têm a sua convergência nos órgãos colegiais de direcção, pois aí se exerce a participação coordenada dos diversos componentes da comunidade educativa, através dos representantes eleitos democraticamente. Esta relação apresenta-se perfeitamente estruturada, visto que todos os membros de um órgão têm as mesmas funções, direitos e deveres, como se fossem uma só pessoa, embora com capacidade de emitir a sua opinião e de exprimir a sua votação de maneira diferente. Através destas estruturas, família e escola coordenam a forma de exercer a sua acção educativa, formando uma só vontade face ao objectivo fundamental que as une: a educação dos filhos. Uma escola pode instituir os órgãos de direcção que julgue necessários para um melhor funcionamento edu- 110 cativo. Porém, há dois que são básicos e que se podem chamar: Conselho Geral de Escola e Conselho Administrativo. Com eles pode-se estabelecer o seguinte quadro: 1. Conselho Geral de Escola Identidade O Conselho Geral de Escola é o órgão máximo de participação e representação de todos os componentes da comunidade educativa. Funções - Confirmar a planificação educativa do ano lectivo, para ser aprovada pelo director. - Avaliar periodicamente o desenvolvimento dessa planificação. - Confirmar o orçamento económico do ano, apresentado pelo Conselho Administrativo, para posterior aprovação pelo director. - Auxiliar ou substituir o director nos casos de nomeação ou suspensão dos cargos de responsabilidade educativa, de direcção e administração, prevista nos Estatutos da escola. - Dar a sua opinão sobre a admissão e suspensão de professores e alunos. - Ajudar a direcção em todas as questões legais relacionadas com a escola. 111 - Representar a comunidade educativa em todos os actos ou circunstâncias que a direcção julgue oportuno. - Aprovar inovações no articulado dos Estatutos ou em qualquer emenda a introduzir. Elementos do Conselho Geral de Escola - Director. - Coordenadores de estudo. - Secretário da escola. - Administrador da escola. - Um tutor, eleito pelos componentes do Depar tamento de Orientação. - Orientador. * - Dois professores, escolhidos pelo Conselho Pe dagógico. - Um representante dos serviços técnicos, esco Ihido pelas pessoas que os desempenham. - Aluno-delegado da escola. - Dois pais de alunos, eleitos por todos os pais. 2. Conselho Administrativo Identidade e funções É o órgão de direcção encarregado de supervisio nar a gestão económica da escola, controlar as ajudas () Seria desejável que existissem em todos os institutos escolares, para coordenarem toda a acção dos tutores e realizarem a orientação não só dos educandos que apresentam problemas específicos, como a dos seus pais. A eles caberia ainda a orientação psicopedagógica dos professores. 112 estatais, ou de outras entidades públicas, que a escola vier a receber, assim como interferir na realização, desen- volvimento e balanço do orçamento anual. Elementos do Conselho Administrativo - Director. - Administrador. - Secretário. - Coordenadores de estudo. - Dois professores eleitos pelo Conselho Pedagógico. - Aluno-delegado da escola. - Dois pais de alunos, eleitos por todos os pais Estruturas não administrativas O encontro dos pais e da escola dá-se na acção educativa diária, e nas estruturas administrativas que a essa acção estão destinadas, para a tornarem mais eficaz. Porém, também deve acontecer através doutras vias que, posto que não impliquem àcções de direcção e administração, são altamente educativas. Há que destacar aqui, pela sua importância, a tutoria, as assembleias e as associações de pais. 1. Tutoria A acção de tutoria tem três campos preferenciais os educandos, os pais e os professores. FE-8 113 Em relação aos pais, a tutoria supõe a circunstância normal de encontro com a escola na pessoa do tutor, na qualidade de educador que tem a função de coordenar todas as correntes educativas que recaem num mesmo aluno. Este encontro exige, em primeiro lugar, uma informação mútua acerca do andamento do processo educativo do filho, informação que deve ser o mais objectiva possível, e, portanto, extremamente sincera. Logo, a partir desta informação, pais e tutores têm de analisar as causas da situação detectada e estabelecer o plano específico e comum que devem seguir para melhorar aquele processo. As entrevistas pais-tutor devem ser periódicas e bastante frequentes, para que haja um eficaz acompa nhamento educativo do filho. Estas entrevistas não impedem, certamente, o encontro entre os pais e qual, quer professor, sempre que se julgue conveniente. Todavia, quando as circunstâncias não o aconselhem, é preferível canalizar a relação pais-escola através da tutoria, como ponto de relação das diversas acções educativas. Os temas de diálogo entre o tutor e os pais abrangem todos os aspectos que constituem a educação integral do filho. 2. Assembleias São sempre valiosas, se têm um assunto com interesse para os pais, se estão bem preparadas e se nelas houver uma participação activa. 114 As assembleias informativas, quer se destinem a um grupo determinado de pais, como, por exemplo, os que pertencem a um mesmo curso ou ano, quer tenham um carácter mais geral, como sejam aquelas que se organizam para todos os pais, são certamente importantes, pois os pais devem estar a par, não só do processo educativo dos respectivos filhos em particular, mas também do andamento geral da escola e da problemática educativa nacional, para que tenham plena consciência dos direitos e deveres que lhes cabem em matéria de educação. Em cada dia que passa, os pais devem compreender que constituem, por direito próprio, a primeira voz exigente perante os poderes públicos, para reclamar tudo o que, do ponto de vista educativo, há que dar a seus filhos. Em muitas destas assembleias de pais é conveniente a participação dos professores, com o fim de unificar cri térios e acções. Porém, mais importantes que estas assembleias informativas, são as que têm como finalidade a formação dos pais. Para serem realmente eficientes, estas assembleias devem ter um carácter sistemático e ser programadas como ciclos de conferências, cursos monográficos sobre temas de psicologia, pedagogia, cultura, etc. Neste campo da formação de pais, há que destacar, pela sua eficácia, a Escola de Pais, entendendo como tal os cursos organizados para grupos reduzidos de casais, com uma programação a desenvolver durante vários anos e com aulas cuja periodicidade não deve ultrapassar os quinze dias, em sessões de cerca de três horas. A Escola de Pais, ajusta-se a todo o momento à dinâmica de grupo, tanto no que respeita aos temas como no que se refere à metodologia. 115 3. Associações de pais Como já foi dito, a constituição destas associações é livre, podendo criar-se numa escola quantas associações os pais julguem convenientes, já que eles são as únicas pessoas que, neste campo, podem decidir. No entanto, parece que uma só associação pode dar mais coesão à força conjunta dos pais na escola. Cada associação tem de estabelecer as suas funções específicas, funções que devem estar contidas num Estatuto próprio. Mesmo assim, é importante que se atribuam a função representativa (ainda que não seja necessária à associação senão para que os pais a exerçam nos órgãos colegiais da escola), e as funções informativa, formativa e participativa. A associação de pais é chamada a desenvolver todos os valores que cada pai, em particular, tem o direito de se arrogar, mas sobretudo aqueles de mais difícil de finição. Deve constituir-se uma Direcção que organize as comissões específicas: actividades extra-escolares, actividades escolares, orientação familiar, actividades económicas, actividades socioculturais. Em obediência ao regulamento interno e ao Estatuto da escola, quando este existir, as associações de pais terão em vista diversas finalidades, considerando entre elas a defesa dos direitos dos pais, no que se refere à educação dos filhos, e a colaboração no trabalho educativo dos centros escolares, e, de modo especial, nas actividades complementares ou extra-escolares. As associações de pais têm ainda outras finalidades: 116 - eleição dos seus representantes e participação activa nos órgãos colegiais; - elaboração, desenvolvimento e modificação do regulamento interno da escola (actividades realizadas em colaboração com o conselho de professores); - orientação e estímulo aos pais no que diz respeito às obrigações de sua competência, relacionadas com a educação dos filhos. A associação de pais pode realizar reuniões nas instalações da escola, quando tenham por objectivo fins próprios e não perturbem o andamento normal das actividades docentes. Mesmo assim, deve dar-se conhecimento prévio ao director. Há, pois, que vitalizar as associações de pais para que a acção educativa tenha uma verdadeira intervenção de todos os elementos participantes. Só assim se poderá melhorar qualitativamente a educação. O espaço limitado do edifício escolar, das quatro paredes da sala de aula e dos corredores, sufoca cada vez mais o aluno. As actividades extra-escolares são formas de a escola se abrir a uma realidade nova e operante, visto que a abertura e a operacionalidade são pontos-chave dentro da estrutura escolar. Mais que nas estruturas orgânicas da escola é, certamente, na acção educativa, com que diariamente procuram ajudar os filhos a formar a sua personalidade, que a relação entre a família e a escola é mais importante. No entanto, aquela educação seria muito mais difícil sem o apoio destas estruturas onde, de forma organizada, se realiza a participação. Uma organização monolítica da escola mataria a relação vital que deve ter com a famlia. 117 Acção educativa e estruturas são duas situações de um encontro existencial entre educadores. Embora situa- ções diferentes, ambas são necessárias para que um edu- cando seja PESSOA. 118 Conclusão Compreender a importância que tem a relação entre a famlia e a escola, no que se refere à educação dos filhos, náo é extremamente difícil. Porém, não basta compreendê-la para que essa relação seja um facto. Família e escola hão-de criar em si mesmas uma série de atitudes que tornem realidade a existência de uma forte ligação entre elas. A primeira atitude é que ambas as entidades conbeçam a função que lhes corresponde na tarefa educativa. Não pode haver uma relação coordenada, quando pais e escola ignoram as funções que são da competência de cada uma das partes. Assim, é fácil que pisem terreno que não lhes pertence, sendo esta a causa de que haja desavença entre educadores que devem estar perfeitamente integrados pessoal e funcionalmente. Outra atitude imprescindível é a responsabilidade no desempenho da função que lhes é própria. A necessária relação entre família e escola só será real, quando as duas cumprirem fielmente com as obrigações educativas específicas que têm no processo de aperfeiçoamento dos educandos. Se família e escola são infiéis à sua função educadora, é impossível a relação, pois, 119 se faltar a colaboração de qualquer uma das partes, não pode dar-se o encontro de acções. A sinceridade é também uma atitude que não pode estar ausente. A duplicidade e o engano são radicalmente anti-educativos. Só perante a verdade pode haver um daro entendimento entre os educadores dos mesmos educandos, pois só então se poderá fazer luz nos pontos de conflito. É igualmente necessário que haja muita compreensão entre família e escola. Nem as pessoas, nem as situações são regidas por leis matemáticas, estabelecidas segundo os módulos desejáveis. Temos de admitir as deficiências e os erros humanos. A compreensão julga com benevolência e ajuda a procurar a melhor solução. É numa atitude de diálogo que se encontrarão os pais e a escola, pois no monólogo não há interlocutores que se relacionem. Com estas atitudes, a relação famlia-escola será uma relação vital. 1994 Execução gráfica de: BLOCO GRÁFICO, LDA. - R. da Restauraçáo, 3B7 - 4000 PORTO - PORTUGAL Fim (A obra contém 120 páginas)