História do Marxismo no Brasil | Biblioteca Virtual | CEVEP | UFMG O objetivo deste espaço é disponibilizar documentos sobre a História do Marxismo no Brasil. Grande parte do acervo compõe-se de documentos dos partidos marxistas brasileiros e análises sobre o tema elaboradas por inúmeros autores. A organização das idéias marxistas em nosso cenário político é o eixo que norteia a disposição de tais documentos. Assim, iniciados pela entrada das idéias socialistas no Brasil, os marcos cronológicos definem-se, em grande parte, pela história do PCB - o partido marxista mais longevo de nossa história - bem como, pelo surgimento de novas organizações marxistas, principalmente a partir dos anos sessenta. O acervo encontra-se dividido em duas formas principais de documentos: de um lado, disponibilizamos documentos primários, sobretudo relacionados à vida de tais partidos e, de outro, documentos secundários, destacando-se as análises publicadas por autores marxistas tanto em artigos de revista e jornal, quanto em livros. Neste último caso, disponibilizamos apenas capítulos considerados muito relevantes para a compreensão de cada período histórico. Por fim, encontra-se uma referência bibliográfica sobre o tema em seus diversos períodos. -- Sumário 1 – 1948 a 1922 2 – 1922 a 1931 3 – 1931 a 1935 4 – 1935 a 1943 5 – 1943 a 1947 6 – 1947 a 1954 7 – 1954 a 1958 8 – 1958 a 1964 9 – 1964 a 1974 10 – 1974 a 1989 11 – 1989 até hoje Lista de documentos História do marxismo no Brasil (1848/1922) Doc. 1.2- A Fundação do P.C.B. : O I Congresso (1922/1931) Doc. 2.1(1925) : 0 II Congresso do P.C.B. Doc. 2.2 (1928) : Bloco Operário e Camponês Doc. 2.3 (1928) : A cisão de 1928 Doc. 2.4 (1928/1929) : 0 III Congresso do PCB Doc. 2.5 (1929) : 0 III Pleno do C.C. Doc. 2.6 ( 1929/1930) : A questão da sucessão presidencial (1931/1935) Doc. 3.2 (1934) : 1.ª Conferência Nacional do P.C.B. Doc. 3.3 (1934) : A posição do P.C.B. frente às eleições Doc. 3.4 (1935) : Aliança Nacional Libertadora Doc. 3.5(1935) : Instruções para a organização de núcleos da ANL Doc. 3.6 (1935) : Como os trabalhadores do Brasil resolverão a crise Doc. 3.7 (1935) : A Insurreição Nacional Libertadora no Brasil (1935/1943) Doc. 4.1 (1937) : 0 perigo fascista e as eleições presidenciais no Brasil Doc. 4.2 (1937) : 0 golpe de estado fascista no Brasil é um golpe contra a Paz e a Democracia mundiais Doc. 4.5 (1940) : Ao povo brasileiro Doc. 4.7 ( 1975) - A reorganização do P.C.B. Doc. 4.8 (1953) - A Conferência da Mantiqueira (1943/1947) Doc. 5.1 (1943) - A posição do CNOP : a) Ampliemos as Bases para a União Nacional (1943). Doc. 5.2 (1944) - A posição do CNOP : b) 0 que é fundamental no momento? Doc. 5.6 (1946) : III CONFERÊNCIA NACIONAL DO P.C.B. (1947-1954) Doc. 6.2 (1949) : Informe político Doc. 6.5 (1953) : Projeto de programa Doc. 6.6 (1954) : Manifesto do Comitê Central: a ditadura Café Filho (1954-1958) Doc. 7.1 (1955) : Manifesto eleitoral do P.C.B. (1958-1964) Doc. 8.1 (1959) : Os comunistas e a sucessão presidencial 1 - História do marxismo no Brasil (1848/1922) Da chegada ao Brasil das idéias de Marx à formação do primeiro partido marxista. Disponibilizamos, neste espaço, documentos que permitem acompanhar desde a chegada do marxismo no Brasil, até a constituição da primeira organização partidária baseada naquelas idéias. O ponto de partida, o mais remoto possível, é dado pela Revolução Praieira e pela possibilidade de vê-la como um primeiro eco do socialismo no Brasil. O período pode ser pensado como o de constituição de uma proto-história do marxismo no Brasil e, assim, acompanhamos os primeiros momentos de circulação das idéias marxistas por aqui. Encerramos com a organização, em 1922, do primeiro partido brasileiro de orientação Marxista, o PCB - Partido Comunista do Brasil. Segundo alguns estudiosos, "naquele tempo não havia nenhuma lei especial que regulamentasse a organização e o funcionamento de partidos políticos como tais. Assim, o Partido Comunista do Brasil foi registrado sob o título das sociedades civis, o qual foi publicado no Diário Oficial da União a 07/04/1922. Este partido tinha a sigla PCB, mas chamava-se Partido Comunista do Brasil. Em 1961, mudaria seu nome para Partido Comunista Brasileiro, mantendo a sigla. Tanto o PC do B atual, quanto o PCB se reivindicam a continuidade do partido fundado em 1922". 2 - História do marxismo no Brasil (1922/1931) Fundação do Partido Comunista do Brasil à entrada de Prestes no partido Destaca-se no período o debate entre anarquistas e comunistas, principal polarização daquele momento. A discussão se dava através dos jornais a "A Plebe" (anarquista) e "Movimento Comunista" (órgão oficial do Partido comunista). Os Comunistas, refletindo a tese da Frente Única adotada pela III Internacional, defendiam a união de todas as forças operárias em um só bloco para enfrentar o bloco da burguesia. Os anarquistas não aceitavam esta tese. O momento é marcado ainda, pela realização do segundo e terceiro Congressos em 1925 e 1928 respectivamente, e pelo surgimento do Trotskismo no Brasil a partir do contato do pecebista Mario Pedrosa com as teses da "Oposição de Esquerda" em circulação na Europa, para onde viajara em 1929. Passando pela Revolução de 1930, o período encerra-se com a entrada de Luís Carlos Prestes no PCB em março de 1931 quando divulga a "carta aberta" na qual rompe definitivamente com o tenentismo, ataca os trotskistas e proclama seu apoio irrestrito ao PC e à Internacional Comunista. 3 - História do marxismo no Brasil (1931/1935) Entrada de Prestes no Partido à Intentona Comunista (1931/1935) Em 1932 o PCB realiza a Conferência Nacional do Rio de Janeiro, elegendo um gráfico para o cargo de secretário geral. É o auge da política de "proletarização do partido" que buscava substituir nos cargos das instâncias partidárias os intelectuais por operários. Muitos intelectuais como Astrogildo Pereira; Heitor Ferreira Lima, etc..., são expulsos. Os anos seguintes serão marcados, no plano internacional, pela ascensão do nazi-fascismo forçando à aglutinação da esquerda que abre-se para a possibilidade de formação de "frentes populares". No Brasil, diante dos avanços dos integralistas, os comunistas passam a defender a frente popular contra o fascismo. Dentro desta política, o PCB promove e apoia a formação da Aliança Nacional Libertadora - (ANL). Em 1935 a ANL convoca o povo para a luta insurrecionista contra Vargas, o que a leva à clandestinidade, além da perda do apoio dos trotskistas e dos anarquistas. A Intentona Comunista ocorrida neste mesmo ano levará ao desmantelamento do Partido. O movimento expressou, tanto o retorno da idéia de formação de frentes a partir da ascensão do nazi-fascismo, quanto a defesa das insurreições. 4 - História do marxismo no Brasil (1935/1943) Intentona Comunista à Conferência da Mantiqueira A partir do esfacelamento provocado pela reação governamental à Intentona Comunista (1935) abre-se um período de cisões no PCB. Em 1937 Hermínio Sachetta é expulso do Partido, embora controle parte de sua estrutura e, sobretudo, seu órgão oficial : "A Classe Operária". O golpe de Estado de 1937 sob o pretexto do "plano Cohen" provoca nova onda de repressão anticomunista e, assim, de 1937 à 1940 são presos os últimos quadros que ainda tentavam reorganizar o PCB. Tornam-se escassos os documentos do Partido neste período. Em 1942, o Brasil entra na guerra ao lado dos E.U.A e da URSS. Neste mesmo ano, começa a gestar-se a política de "União Nacional" em torno de Vargas e contra o fascismo. Em abril de 1942 militantes comunistas realizam uma série de conferências em Buenos Aires colocando em pauta a situação mundial e a reorganização do PCB. Em agosto de 1943 realiza-se, na clandestinidade, a Conferência da Mantiqueira: II Conferência Nacional do Partido Comunista. Os comunistas brasileiros estavam divididos, sobretudo, em relação ao apoio a Vargas. No entanto, a orientação adotada foi a de apoio incondicional ao presidente na guerra contra o fascismo e pelo trabalho persistente para a reestruturação do Partido. A conferência elege Luís Carlos Prestes - ainda no cárcere - secretário geral do Partido. 5 - História do marxismo no Brasil (1943/1947) Da Conferência da Mantiqueira à clandestinidade do PCB. A partir da Conferência da Mantiqueira abre-se um período marcado pela idéia de coexistência pacífica, política defendida por Stalin. Em 1945, Vargas liberta os prisioneiros políticos, inclusive Prestes, e legaliza o PCB. Neste mesmo ano, Prestes divulga a orientação do Partido : O programa de "União Nacional". O partido parece afastar-se de suas posturas tradicionais. Abandona não somente qualquer perspectiva proletária independente, como põe de lado até as suas tradicionais bandeiras anti-latifundiárias e anti-imperialistas. O PCB cresce de forma excepcional durante o período de legalidade e torna-se, pela primeira vez em sua história, um partido de massa. Em conjunto com o PTB, promove a campanha em favor da permanência de Vargas no poder. Mas, em outubro de 1945 um golpe força Getúlio Vargas à renúncia. O governo de Eurico Gaspar Dutra, que assume após a renúncia de Getúlio Vargas, inicia o processo de fechamento do PCB. O rompimento de relações diplomáticas entre Brasil e URSS, neste mesmo contexto, contribuiu para que o PCB fosse jogado na ilegalidade no final de 1947. O Partido, que até então apoiava o governo Dutra, rompe e o define como um governo de traição nacional a serviço do imperialismo. Inicia-se para o PCB um processo de autocrítica questionando a prática política anterior. 6 - História do marxismo no Brasil (1947-1954) Da clandestinidade do PCB ao Suicídio de Vargas e IV Congresso. No processo de autocrítica que se instala a partir da ilegalidade do PCB (1947), destaca-se a crítica à política de "União Nacional", feita em 1949 pelo próprio Luís Carlos Prestes, conforme : "substituímos a luta de classes pela colaboração de classes que pensávamos, erroneamente, evitar os golpes da reação, amainando as contradições de classes em vez de aprofundá-las". Em 1950, o PCB lança o "Manifesto de Agosto", consolidando uma virada à esquerda que se iniciara com a autocrítica provocada pela ilegalidade. O Manifesto propõe a organização de uma Frente Democrática de Libertação Nacional, que deveria formar-se para a conquista imediata do poder através do Exército de Libertação Popular. O Manifesto não significou, no entanto, uma ruptura com a proposta de ampla "União Nacional". Em relação à eleição de Getúlio Vargas, em 1950, o PCB mantém sua postura de oposição. Mas, novas mudanças se farão presentes. O suicídio de Vargas em 1954, detona a linha traçada pelo manifesto de 1950. Assim, em seu IV Congresso realizado naquele mesmo ano, o PCB, perplexo com a reação das massas, modifica sua posição : abandona as acusações contra Getúlio e procura alianças com os nacionalistas varguistas. 7 - História do marxismo no Brasil (1954-1958) Do suicídio de Vargas e IV Congresso à Declaração de Março de 1958 O IV Congresso (1954) reafirma o "projeto de programa de 1953" que propunha a compreensão da revolução brasileira, naquela etapa, como uma revolução democrática-popular, de cunho anti-imperialista e agrária anti-feudal. Assim, nas eleições de 1955, o PCB apoia Juscelino Kubitscheck e João Goulart, em virtude da disposição que apresentaram de lutar "em defesa da constituição, das liberdades democráticas e pela melhoria das condições de vida do povo" (Manifesto Eleitoral/1955). No entanto, em 1956, o PC é sacudido pelo XX Congresso do PCUS, no qual Nikita Kruschev rompe com o stalinismo. Também a invasão da Hungria pela URSS deixa perplexos os PCs do mundo inteiro. No Brasil, a direção do PCB, depois de quase oito meses do relatório, abre um período "democratizante" : debates internos, questionamentos, análises, etc., darão a tônica àquele momento. As discussões são, contudo, suspensas em nome da unidade do partido. Os dois anos seguintes serão marcados pelo afastamento de dirigentes ligados ao passado stalinista do partido. Saem pessoas como Diógenes Arruda, Jõao Amazonas, Maurício Grabois, etc... O processo culmina com a aprovação da "Declaração de Março" em 1958, que provoca uma grande reviravolta no Partido ao aprofundar a tendência democratizante ensaiada em 1956. 8 - História do marxismo no Brasil (1958-1964) Da Declaração de Março de 1958 ao Golpe de 1964. A Tese essencial da Declaração de Março de 1958 era de que a revolução no Brasil ainda não seria socialista, mas anti-imperialista e anti-feudal, nacional e democrática. Tal caracterização implicava na necessidade de formação de uma frente única nacionalista e democrática. Defendia ainda, o caminho pacífico da Revolução brasileira, pela pressão pacífica das massas populares e de todas as correntes nacionalistas no sentido de fortalecer e ampliar o setor nacionalista do governo de Juscelino Kubistheck. Tais orientações refletiam a orientação da nova política adotada no XX Congresso do PCUS (1956). A Plataforma incluía ainda, um importante ponto : "consolidação e ampliação da legalidade democrática. Esta será a plataforma que servirá de base para as Teses para o Vo Congresso, ocorrido em 1960. No entanto, no plano internacional, tanto a Revolução Socialista em Cuba, quanto a ruptura China/URSS tornam pertinentes para a Esquerda Brasileira questões que apontavam em sentido aposto, tais como a necessidade da revolução armada e da destruição do aparelho de Estado, ou ainda, a discussão sobre o lugar e/ou papel do partido, uma vez que em Cuba a revolução se fizera à revelia do PSP. O desenvolvimento de tais questões, forjará o aparecimento, na década de 60, de uma "nova esquerda" : surgem a AP (1962); POLOP (1961); MRT; PC do B (1962). O encerramento do período é dado pelo golpe militar. O fato, deixa claro os equívocos do PCB que, na ocasião, preparava o seu VI Congresso pensado para novembro daquele ano. A linha do PCB passa a ser criticada como resposta equivocada aos problemas colocados pela conjuntura. 9 - História do marxismo no Brasil (1964-1974) Da lógica da luta armada ao desmantelamento da Esquerda. A partir do golpe de 1964 assistimos ao aprofundamento do processo de fragmentação na Esquerda brasileira. Após 1967/68, em parte devido à influência das concepções que orientaram revoluções na América Latina - caso de Cuba, em parte como reação ao endurecimento do regime militar, inicia-se um processo de militarização e de fragmentação que transformará nossa esquerda num mosaico de pequenas organizações que, em sua maioria, defendiam a revolução armada. Do PCB surgem : PCBR(1968); ALN(1967); e as Dissidências, destacando-se a Dissidência Guanabara (origem do MR-8) e a Dissidência Leninista. Nessa "nova esquerda" sobrepõe-se à raiz stalinista - fortemente vanguardista e historicamente predominante em nosso pensamento de esquerda - as concepções foquistas que embalaram a Revolução Cubana. Daí a centralidade do tema da revolução que, no entanto, é enfocado apenas em sua dimensão militar. Assim, o ponto em torno do qual realizou-se o intenso processo de fragmentação dizia respeito à melhor estratégia de luta para a tomada do poder de Estado. O período foi marcado por sucessivos rachas, que por sua vez, eram seguidos por sucessivos reagrupamentos. Ao final do processo, marcado pelo confronto entre um implacável regime militar e uma esquerda fragmentada que defende a luta armada, vemos o esgotamento daquela perspectiva revolucionária. 10 - História do marxismo no Brasil (1974-1989) Do início do processo de democratização da esquerda brasileira à formação do PT. No início dos anos 70, sobretudo a partir de 1974 temos, de um lado, o completo desmantelamento de nossa esquerda provocado pelos duros golpes impostos pelo Regime Militar. Por outro lado, um intenso processo de reorganização pode ser acompanhado. Ao lado de uma dimensão física, já que a repressão fizera desaparecer grande parte dos quadros das organizações através da tortura ou do exílio, tal processo implicou também, uma reorganização no plano das concepções que informavam as ações políticas. Assim, a força da derrota sofrida, aliada à importância assumida pela luta pelas liberdades democráticas forjarão mais um processo de autocrítica em nossa esquerda. A particularidade desta autocrítica é dada, no entanto, pelos novos significados conferidos à democracia. Ou seja, escaldada pela dureza do regime militar e embalada pela luta por bandeiras democráticas, a esquerda brasileira inicia a autocrítica que permitirá a elaboração de novas formas de conceber a relação socialismo/democracia e, por conseqüência, de conceber a relação partido/sociedade. O encerramento do período é dado pela formação do Partido dos Trabalhadores (PT) em 1989, fato que pode ser tomado como expressão daquela inflexão democrática que se construíra, sobretudo, a partir de um questionamento dirigido às concepções vanguardistas acentuadas no período anterior. No plano internacional, o período é marcado pelos acontecimentos do leste europeu que acentuam o significado daquela discussão em torno da relação democracia/socialismo. 11 - História do marxismo no Brasil (1989 aos dias atuais) As novas relações entre democracia e socialismo. Por fim, encerramos com um décimo primeiro período que contemplaria a história da nossa esquerda a partir de 1989 até os dias atuais. Destaca-se aqui, o interesse por documentos que expressem as novas formas de conceber cada um dos termos da questão, quais sejam : democracia e socialismo, bem como a relação existente entre ambos. Por outro lado, trata-se também do primeiro período histórico no qual a esquerda brasileira conquista alguma instância do executivo. Inicialmente restrito à administração de prefeituras, o processo alcançará governos estaduais e forjará uma constante e rica discussão em torno de diversos temas. Assim sendo, o período oferece a rica possibilidade de acompanhar as questões envolvidas na construção de concepções democráticas por nossa esquerda. -- Doc. 1.2 - A Fundação do P.C.B.: O I Congresso (25, 26, 27.3.1922) Antecedentes 0 mais antigo dos grupos comunistas existentes no Brasil era o de Porto Alegre, organizado em novembro de 1918 sob a denominação de União Maximalista. Esta constituía, assim, o núcleo orgânico mais antigo de decididos partidários da Revolução Sovietista Russa e da Internacional Comunista. Noutras cidades, como Rio de Janeiro, Recife, São Paulo etc., onde as camadas mais avançadas do proletariado foram sempre quase que exclusivamente influenciadas pelos anarquistas, muitos militantes demonstraram, desde a primeira hora, fundas simpatias pela obra do Partido Comunista Russo e da Terceira Internacional. Todavia, só lentamente, mercê das lições e experiências da Revolução Russa e pela leitura direta da literatura bolchevista, foi a ideologia mais ou menos caótica até então predominante se transformando e firmando num sentido marxista. Estas tendências se acentuaram no Rio por meados de 1921, quando alguns camaradas definitivamente ganhos à causa do comunismo, provocaram reuniões gerais dos mais conhecidos militantes do proletariado local. Nessas reuniões foram largamente debatidos os problemas da Revolução Mundial à luz das experiências em curso na U.R.S.S. Inúmeros documentos foram lidos e discutidos, Depois de uma série de ardentes debates, as posições e atitudes se definiram numa parte - a maior parte - se inclinou decididamente pelos bolchevistas e, outra, permaneceu irredutivelmente contra. Isto indicou aos partidários de Moscou que seria inútil continuar com os debates. Era preciso concretizar. Foi assim que doze dos camaradas mais esclarecidos decidiram a fundação do Grupo Comunista, destinado a propagar e defender, no Brasil, o programa da III Internacional. A sessão de fundação do Grupo Comunista se realizou precisamente por uma coincidência de bom augúrio a 7 de novembro de 1921. Constituído o Grupo Comunista do Rio de janeiro, este entrou imediatamente em relações com todos os centros proletários do Brasil, expondo seu programa, divulgando as 21 condições de admissão na Terceira Internacional e decidindo a publicação de um mensário de doutrina e informações sobre o movimento revolucionário internacional, intitulado Movimento Comunista, cujo primeiro número se publicou em janeiro último. Outros grupos se formam Da troca de correspondência do Grupo Comunista do Rio com os diversos centros obreiros do país surgiram desde logo outros grupos congêneres nas seguintes localidades: Recife, Juiz de Fora, Cruzeiro. Isso, além da antiga União Maximalista de Porto Alegre, transformada em Grupo Comunista, em concordância com o Grupo do Rio. Noutras muitas cidades do interior do País, vários elementos revolucionários, embora esparsos, se manifestaram de acordo com a obra do Grupo. Este último ia, ao mesmo tempo, criando raízes no Rio, conquistando pouco a pouco a adesão de militantes dos melhores e mais conhecidos nos sindicatos revolucionários. Assim, os doze iniciadores do Grupo se foram multiplicando, semana a semana, contando já, por ocasião da abertura do Congresso, com 70 aderentes seguros, selecionados entre os trabalhadores conscientes, mais ativos e mais influentes em nosso meio. A realização do congresso Em meados de fevereiro, por iniciativa dos camaradas do Grupo de Porto Alegre, o Grupo do Rio entendeu-se com os demais grupos existentes sobre a necessidade de se apressar a reunião, em congresso, dos delegados dos mesmos, para definitiva organização do Partido Comunista. Havia urgência na organização do Partido em vista da aproximação do IV Congresso da Internacional de Moscou, no qual deveriam fazer-se representar os comunistas do Brasil. Um trabalho ativo foi iniciado, neste sentido, marcando-se a data de reunião do Congresso: 25, 26 e 27 de março. Chegando finalmente o dia 25 de março, realizou-se a primeira sessão do Congresso Constituinte do Partido Comunista do Brasil, sendo lida então uma entusiástica saudação enviada pelo Bureau da Internacional Comunista para a propaganda na América do Sul. Duas sessões se realizaram ainda no dia seguinte, 26, e duas finais no dia 27. Estavam representados por delegação direta os Grupos de Porto Alegre, de Recife, de S. Paulo, de Cruzeiro, de Niterói e do Rio. Não puderam enviar delegados os Grupos de Santos e de Juiz de Fora. Igualmente, se fizeram representar o Bureau da I.C. para a América do Sul e o Partido Comunista do Uruguai. Ordem do dia Foi estabelecida a seguinte ordem do dia para os trabalhos do Congresso: 1.º) Exame das 21 condições de admissão na Internacional Comunista; 2.º) Estatutos do Partido Comunista; 3.º) Eleição da Comissão Central Executiva; 4.º) Ação pró-flagelados do Volga; 5.º) Assuntos vários. 1.º) As 21 condições de admissão estabelecidas pela Internacional Comunista foram objeto de minucioso e demorado exame por parte dos delegados presentes, sendo discutidas e aceitas unanimemente, uma a uma. 2.º) Os estatutos do novo Partido, inspirados nos do Partido, Comunista da Argentina, e tendo em conta as condições especiais da situação brasileira, foram elaborados, discutidos e aprovados, a título provisório, pela unanimidade dos delegados. 3.º) A eleição para os cargos da Comissão Central Executiva do Partido foi feita com um perfeito espírito de cordialidade, tendo-se em vista as habilitações e possibilidades de cada um. 4.º) Como já existe, funcionando desde setembro do ano passado, um Comitê de Socorros aos Flagelados Russos, do qual fazem parte comunistas, anarquistas e sindicalistas, o Congresso deliberou que a C.C.E. promovesse, de acordo com o referido Comitê, uma maior ampliação na composição do mesmo, convidando indistintamente, para a organização de uma ação comum, todos os organismos operários e revolucionários do Brasil sejam quais forem suas tendências. Depois de outras resoluções de caráter secundário e aprovadas as moções que vão mais adiante, deu-se o Congresso por encerrado, entoando os delegados, de pé, comovidamente, as estrofes da "Internacional". Um viva à Terceira Internacional! e estavam terminados os trabalhos preliminares de fundação do Partido Comunista do Brasil. Nem por serem poucos, e sem exagerarem a modéstia de sua obra, os delegados presentes ao Congresso não menos convictos se mostravam da importância histórica do ato que realizavam. Eles representavam, ali, senão organicamente, de certo em espírito, as aspirações mais altas do proletariado do Brasil, finalmente integrado na vanguarda revolucionária do proletariado mundial. Moções aprovadas 1.ª Saudação à Internacional Comunista - 0 Congresso Constituinte do Partido Comunista do Brasil, reunido no Rio de Janeiro a 25, 26 e 27 de março do ano V da Revolução Social, saúda efusiva e fraternalmente a família comunista mundial e sua gloriosa vanguarda, a Internacional Comunista. Viva a Internacional Comunista! 2.ª Saudação à Revolução Russa - À gloriosa Revolução Russa e à sua invencível vanguarda, o Partido Comunista Russo, nossa mais entusiástica saudação e nossa mais inquebrantável solidariedade revolucionária. Viva a Revolução Russa! 3.ª À Memória dos Heróis da Revolução. À memória dos heróicos batalhadores da causa proletária mundial, gloriosamente tombados no campo da luta revolucionária, nossa comovida homenagem de soldados da mesma legião vermelha empenhada na libertação integral dos trabalhadores do mundo! Salve os mártires da Revolução! 4.ª Saudação aos perseguidos pela Reação Capitalista - Aos bravos camaradas que purgam, nos calabouços da burguesia internacional, o pecado de sua dedicação à causa do Comunismo, nossa cordial saudação de solidariedade e admiração. 5.ª Ao Bureau da I.C. para a América do Sul - Aos Camaradas do Bureau da I.C. para a América do Sul expressamos nossa palavra de entusiasmo pelo alentador e vibrante apelo que nos dirigiram por ocasião da abertura do Congresso Constituinte do Partido Comunista do Brasil. Firmamos aqui, nesta hora histórica para o proletariado brasileiro, nossa mais decidida e ardente vontade de trabalhar, ao lado dos comunistas de todo o mundo, pela mesma causa comum. Viva o Bureau da I.C. para a América do Sull 6.ª Aos Partidos Comunistas da Argentina, do Uruguai e do Chile aos camaradas dos Partidos Comunistas da Argentina, do Uruguai e do Chile, o Congresso Constituinte do Partido Comunista do Brasil lança uma saudação de fraternal solidariedade continental, por sobre as convencionais fronteiras das pátrias capitalistas. Viva a União dos Trabalhadores Sul-Americanos integrados na Internacional Comunista! 7.ª Aos Trabalhadores do Brasil - 0 Congresso Constituinte do Partido Comunista do Brasil, realizado na Cidade do Rio de janeiro nos dias 25, 26 e 27 de março, resolvendo sua adesão incondicional à Terceira Internacional, formando assim ao lado da vanguarda proletária mundial, lança uma saudação fraterna ao proletariado do Brasil, concitando-o a arregimentar-se em sua organização sindical e do Partido a fim de, uma vez firmado nos dois organismos que se complementam, poder travar as últimas batalhas para sua emancipação integral. A Comissão Central Executiva (Movimento Comunista, n.º 7, Julho de 1922, p. 175-182). Movimento Comunista. A fundação do PCB. I Congresso. In: CARONE, Edgard. O PCB; Corpo e alma do Brasil (1922 a 1943). 1 ed. São Paulo: DIFEL-BR, 1982. Volume I, p. 19-29. -- Doc. 2.2 - Bloco Operário e Camponês a) FORMAÇÃO Carta Aberta a Maurício de Lacerda, a Azevedo Lima, ao Partido Socialista, ao Centro Político dos Operários do Distrito Federal, ao Centro Político Unionista dos Empregados no Comércio, ao Centro Político Proletário da Gávea, ao Centro Político Proletário de Niterói: Candidaturas de classe - As próximas eleições federais, para renovação do Parlamento Nacional, estão interessando sobremaneira ao proletariado e às classes laboriosas em geral de todo o Brasil. Pode dizer-se que pela primeira vez, entre nós, vê o proletariado brasileiro a possibilidade de sua intervenção direta e independente no pleito a travar-se. Com efeito, até aqui - salvo alguma ou outra exceção de caráter local ou pessoal - jamais o eleitorado operário do Brasil participou de uma campanha eleitoral nacional como força própria, como classe independente, apresentando um programa de reivindicações ditadas por seus interesses e aspirações de classe. Os operários eleitores votavam indistintamente nos diversos candidatos da burguesia, a isto quase sempre obrigados pela pressão patronal e devido à sua própria desorganização partidária. Mas esses tempos são passados. 0 proletariado já vai adquirindo uma consciência de classe - o que quer dizer que já vai compreendendo serem seus interesses antagônicos aos interesses da burguesia. Ora, este despertar da consciência proletária reflete-se e projeta-se igualmente sobre o terreno eleitoral. 0 mesmo instinto de classe diz aos operários eleitores que eles, nas eleições para os cargos públicos, devem votar nos próprios candidatos, isto é, nos candidatos que representam realmente seus interesses de classe independente. É o que agora se verifica. 0 eleitorado proletário quer enviar gente sua, lídimos e autênticos representantes seus, ao Parlamento Nacional. Ele não quer mais votar no candidato-patrão - ou aliado e criatura do patrão - o qual será, necessariamente, nas Câmaras, como tem acontecido até hoje, o defensor dos interesses patronais contra os interesses proletários. Demais, o proletariado brasileiro vê o que se passa nos demais países do mundo e aprende no exemplo prático que nos vem - nisto, como em tudo o mais - do estrangeiro. 0 proletariado dos países europeus e americanos possui seus próprios partidos de classe e, nas eleições, só vota nos candidatos de seus partidos. Aqui mesmo bem perto de nós, no Uruguai, na Argentina, no Chile, os partidos operários participam dos pleitos eleitorais como força independente e como tais elegem seus próprios candidatos. A intervenção do P.C.B. - Assim sendo, o Partido Comunista do Brasil, constituído pela vanguarda consciente do proletariado deste país, não podia deixar de participar nas próximas eleições de fevereiro. Os interesses e as aspirações do Partido Comunista não são diversos dos interesses e das aspirações do proletariado em geral. Pelo contrário, o Partido Comunista é o único partido operário que verdadeiramente representa os reais interesses e as aspirações totais da classe operária. É, pois, em nome da massa proletária, que o P.C.B. se dirige, nesta Carta Aberta, às pessoas, aos partidos e aos centros acima mencionados, os quais, de uma forma ou de outra, apresentam-se aos sufrágios operários como candidatos das classes laboriosas e espezinhadas, cujos interesses dizem representar. É o caso de Maurício de Lacerda. Gozando da mais larga popularidade, com um passado de brilhantes lutas parlamentares em prol das liberdades públicas, ele surge no cenário da campanha eleitoral como candidato dos oprimidos e explorados. 0 Partido Socialista o apoia como candidato dos operários. Nós não concordamos de modo algum com a sua política individualista, não partidária, geradora de confusões e mal-entendidos, que só podem servir aos inimigos da política proletária, prejudicando, por conseguinte, ao próprio Maurício de Lacerda. Certo, sua popularidade é grande, e a massa, apesar de tudo, apesar daquelas reservas formuladas pela vanguarda, tem-no como um dos seus e irá votar nele, convicta de que votará num candidato proletário, defensor dos interesses proletários. Pois bem: o P.C.B., mesmo desconfiando, quer confiar em Maurício de Lacerda, e, em nome da classe operária, propõe-lhe a formação de uma frente única proletária na campanha eleitoral iniciada, tomando para base uma plataforma, única de combate, contendo as reivindicações mais elementares comuns às massas laboriosas em geral. Igual proposta fazemos a Azevedo Lima. Este possuí um eleitorado próprio, fortemente arregimentado e não depende de ninguém do ponto de vista estritamente eleitoral. Mas sua atuação combativa durante a extinta legislatura, com o criar- lhe uma justa auréola de indómita bravura no bom combate em prol das causas populares, criou também, tacitamente, uma espécie de compromisso moral entre ele e o proletariado. Demais, como reforço a esse compromisso, Azevedo Lima, embora ainda revelando certas contradições ideológicas, tem feito afirmações peremptórias de simpatia ao comunismo e tem tomado atitudes de desassombrado apoio às lutas de classe do proletariado, como foi principalmente no caso da campanha de A Classe Operária contra Luís de Oliveira. De tal sorte, a aliança de Azevedo Lima ao Bloco Operário, cuja formação propomos, parece decorrer logicamente de todo seu recente passado e assim o esperamos firmemente. Sua eleição é geralmente tida como assegurada pelo numeroso e dedicado eleitorado que ele pessoalmente arregimentou. Neste sentido é evidente que sua aliança conosco pouco resultado prático, numérico lhe trará. Há, porém, o aspecto essencialmente político da batalha e neste sentido sua adesão ao Bloco Operário, que propomos, é não só uma adesão lógica, mas necessária e de recíprocas vantagens, isto é, de vantagens para a política proletária, feita de verdade, nitidez e firmeza. Aos demais partidos e centros - 0 Partido Socialista, partido reformista, mas que pretende representar as massas laboriosas, além de apoiar a candidatura de Maurício de Lacerda, apresenta vários candidatos seus, não só aqui no Distrito Federal, como também no Estado do Rio, na Bahia, em Pernambuco, em Santa Catarina. Adversários intransigentes da nefasta política reformista, confusionista, colaboracionista do P.S.B., entendemos, todavia, que é esta uma excelente oportunidade para, aos olhos das massas, pôr-se à prova a sinceridade dos socialistas, que se apresentam aos sufrágios proletários. 0 P.C.B. quer unir, reunir numa frente única todas as forças proletárias que se apresentam para o próximo combate eleitoral. É o próprio interesse proletário - que o P.C.B. põe acima de tudo, visto como o interesse proletário é o próprio interesse do comunismo - que comanda, em momentos tais, a coesão e a unificação das forças diante do inimigo comum. E como nós não fazemos questão de nomes pessoais - guardadas, é claro, certas exigências mínimas - porém, sim, de programa, de compromisso coletivo, convidamos o P.S.B. a integrar-se na formação do Bloco Operário, sob cuja bandeira comum, batalhando sobre a mesma comum plataforma proletária, se apresentarão seus candidatos, no Distrito Federal e nos Estados. Falando claro e franco, nós não acreditamos na sinceridade dos chefes do P.S.B. nem dos seus candidatos, e muito menos em sua influência ou força eleitoral, mas estamos prontos a apoiá-los, desde que assumam publicamente, perante o proletariado, o compromisso de defender e submeter-se à plataforma proletária do Bloco Operário. Não sabemos ainda que atitude vão tomar, com relação às próximas eleições, o Centro Político Operário, o Centro Político dos Choferes, o Partido Unionista dos Empregados no Comércio, o Centro Político Proletário da Gávea e o Centro Político Proletário de Niterói. Quanto a estes dois últimos, não temos dúvida de que formarão ao nosso lado, dadas as afinidades entre o seu programa e o nosso. Quanto aos outros, não sabemos se pretendem apresentar candidatos próprios ou apoiar eventualmente tais ou quais candidatos. Seja como for, tornamos extensivo a essas organizações políticas operárias este convite para sua adesão ao Bloco Operário, na base dos princípios e reivindicações mais adiante expostas. Frente única proletária - É coisa muito fácil de compreender que a participação no pleito eleitoral de todos esses candidatos e partidos, concorrendo uns contra os outros, dispersivamente, só pode dar como resultado o enfraquecimento das forças operárias, que todos eles pretendem representar. Enfraquecimento e dispersão não somente no terreno estritamente eleitoral, aritmético, do pleito, mas sobretudo enfraquecimento e dispersão no terreno político. As massas operárias e as classes laboriosas em geral estão entre si ligadas por uma afinidade básica de interesses que lhes são comuns. Toda a gente pobre - operários, empregados no comércio, pequenos funcionários, artesãos, trabalhadores agrícolas, pequenos lavradores, todos aqueles que vivem de seu trabalho pessoal cotidiano - toda essa grande massa sofredora e oprimida passa a mesma "vida apertada", porque seus ganhos mal chegam, quando chegam, para fazer frente às dificuldades crescentes da existência. A carestia dos gêneros, a crise de habitações, a falta de trabalho, a inflação, a baixa cambial, a política escorchadora dos impostos federais, estaduais e municipais, toda a sorte de gravames pesando principalmente sobre os pobres, tudo isso cria uma base comum de interesses que o bom senso indica deverem ser defendidos pelo esforço comum dos interessados. É esta uma verdade claríssima, que ninguém poderá contestar: na defesa dos interesses, que são comuns, todos os interessados deverão unificar e concentrar seus esforços num bloco único que vá ao combate de fileiras cerradas, obedecendo a um plano comum único. É isto precisamente que nós vimos propor. 0 Partido Comunista, cônscio de que os interesses supremos do proletariado devem ser postos acima das tendências desta ou daquela facção política, propõe a formação de uma frente única, de um bloco operário de todos os candidatos, partidos e grupos que vão disputar as próximas eleições alegando ou pleiteando representação das classes laboriosas. 0 Partido Comunista não pretende concorrer com candidatos próprios e de tal sorte dividir as forças operárias. 0 Partido Comunista, que pleiteia a vitória da política proletária independente, propõe, portanto, a concentração de todas as forças operárias. 0 Partido Comunista está disposto a apoiar a campanha eleitoral dos candidatos e demais grupos e partidos que aceitem travar a batalha em comum, na base de uma plataforma comum, segundo um plano comum. Demais disso, o Partido Comunista, interpretando o verdadeiro e instintivo pensamento de classe das massas trabalhadoras, pretende, por este meio, iniciar uma vasta campanha de saneamento do meio político nacional, combatendo sem tréguas a política personalista, individualista e irresponsável dos cabos eleitorais sem princípio, sem programa, sem finalidade. É preciso sanear a política e para isto é preciso intervir nela e não se afastar dela, deixando-a entregue aos manejos imorais de ambiciosos e negocistas sem escrúpulos. E o primeiro passo a dar no sentido do saneamento da política está em exigir a responsabilidade dos políticos perante as massas. Queremos uma política de princípios, de programas, de responsabilidades. 0 Partido Comunista, partido do proletariado, tem responsabilidade, defende princípios e bate-se por um programa. Daí, sua atitude presente, saltando na arena do combate eleitoral e convocando para a defesa em comum dos interesses do proletariado todos aqueles que se apresentam como partidários do proletariado. (Astrogildo Pereira, Formação do P.C.B., p. 87-92). b) 0 CARÁTER ELEITORAL (1928) Não desconhecemos, em absoluto, a importância da luta extraparlamentar, da luta ilegal dos proletários, cujo valor é para nós maior do que o da luta parlamentar. Mas, daí concluir-se que nos devemos abster da participação no parlamento burguês é avançar no perigoso e contraproducente terreno do abstencionismo, cujas conseqüências foram e serão sempre reforçar as posições dos inimigos de classe do proletariado. Duas políticas se defrontam, atualmente, em todo o mundo: a proletária e a burguesa. Desertar de uma é favorecer a outra. Os operários não participaram, até hoje da neutralidade, tão recomendada pelos puristas da anarquia e pelos anarco-sindicalistas. Muito pelo contrário: longe de manterem esta falada neutralidade, incorporaram- se sempre na causa dos candidatos burgueses, cuja lábia era mais própria para iludi-los; e arrastá-los às urnas, nos pleitos eleitorais. E as eleições que deviam constituir um episódio de luta de classes, uma das muitas batalhas de classe, converteram-se sempre em tablado público onde se exibiam os arlequins da burguesia, fantasiados de amigos das classes menos favorecidas da sorte. E a consciência de classe dos trabalhadores mais e mais se dissolvia ao contato mascarado destes políticos sem escrúpulos, puros trampolineiros, cheios de um verbalismo mais ou menos demagógico, mas profundamente ligados aos interesses de sua classe, da classe burguesa, a que estavam presos pelos múltiplos laços de família e de inconfessáveis compromissos. E a famosa neutralidade política do proletariado só deu em resultado a palhaçada que vemos na política do Distrito Federal e na de todo o Brasil. Assim, pois, combater a política de classe do proletariado é favorecer os interesses da classe dominante, é dar aos burgueses que oprimem e exploram os trabalhadores, satisfação inigualável de se sentirem livres para os seus atropelos à grande massa dos que sofrem e curtem miséria no regime atual. Não há como negar esta verdade elementar, baseada nos fatos concretos a que assistimos diariamente. E só nos devem encher de satisfação as novas diretivas que vem adotando o movimento proletário entre nós, arregimentando suas forças para as futuras batalhas eleitorais, que inaugurarão uma fase na política, fazendo com que o proletariado entre em cena, independente dos chorrilhos políticos da burguesia, manifestando sua vontade firme de afirmar-se numa classe forte e politicamente capaz de escolher seus mais dedicados membros para as investiduras legislativas. Será um dos muitos meios de alargar sua luta geral contra os exploradores, criando uma nova frente de combate e preparando com ela novas bases para um mais largo movimento de massas capaz de derrubar definitivamente os seus exploradores e levá-los à definitiva vitória contra os seus inimigos seculares. E a burguesia sentirá, através da voz destes representantes operários, que a grande massa anônima já desperta e que os seus desejos, as suas aspirações elaboradas no meio dos sofrimentos e das lutas obscuras, tendem a transformar-se em clamor - no clamor irreprimível que será convertido na grande sublevação de todas as forças proletárias para a sua libertação, para a conquista integral de seus direitos, comprimidos e afogados pelo tacão de ferro da burguesia. Operários fabris e em transportes, lavradores pobres, pequenos funcionários, empregados no comércio e na indústria, técnicos e intelectuais que viveis do próprio trabalho, pequenos proprietários oprimidos, pobres de todas as categorias, alistai-vos gratuitamente no 1.º distrito, no Bloco Operário e Camponês, Praça da República, 40, 1.º andar, esquina da Rua da Constituição. Todos os dias úteis das 14 as 19 horas! Votai nos vossos e nossos próprios candidatos de classe independente! Eleitores proletários, inscrevei-vos em nossas listas! Colocai os vossos títulos à nossa disposição! Trabalhadores, auxiliai a nossa e vossa organização genuína! Criai Centros Políticos Proletários por todo o Brasil! Atividade e método! Disciplina e coesão! Entusiasmo e consciência! Sejamos como um bloco de aço maciço. P. Lavinsky (A Esquerda,Rio, 16.02.1928). Astrojildo Pereira. "Bloco Operário e Camponês". In: CARONE, Edgard. O PCB; Corpo e alma do Brasil (1922 a 1943). 1 ed. São Paulo: DIFEL-BR, 1982. Volume I, p.64-70. -- Doc. 7.1 - Manifesto eleitoral do P.C.B. (agosto de 1955) Brasileiros! Trabalhadores! Há um ano, os piores inimigos do povo conseguiram assaltar o poder e impor à nação a ditadura americana do sr. Café Filho. 0 golpe militar de 24 de agosto revelou a brutalidade dos métodos norte-americanos de dominação, pôs a nu a violência com que os agentes de Departamento de Estado fazem e desfazem governos em nossa terra. Que fez até agora este governo em que predominam os politiqueiros reacionários da U.D.N. e ocupam postos de destaque os ministros indicados pelo sr. Jânio Quadros? A resposta está na miséria crescente do povo, na alta acelerada dos preços de todos os artigos indispensáveis ao consumo popular. Está na, perseguição sistemática ao movimento operário e sindical, nos freqüentes atentados às liberdades democráticas, na violência com que se pretendeu intimidar os bravos portuários de Santos, em luta por um pouco mais de pão para seus filhos. Cresce a corrupção administrativa, aumentam as negociatas, os dinheiros do povo são esbanjados, enquanto faltam hospitais e escolas e morrem milhares de crianças sem qualquer assistência. A indústria nacional é ameaçada de estrangulamento pela pressão e pela concorrência dos monopólios norte- americanos. Acentua-se a diminuição catastrófica do comércio externo brasileiro, monopolizado pelos norte-americanos, que não permitem ao Brasil ter relações comerciais com a União Soviética e a República Popular da China. Odiados pelo povo, os golpistas a serviço do imperialismo norte-americano utilizam todos os pretextos para tentar justificar um novo golpe de Estado que implante no país uma ditadura militar fascista, que acabe com os últimos vestígios de liberdade, com os direitos e conquistas dos trabalhadores, que permita a entrega das riquezas nacionais aos monopólios norte-americanos. Esta a situação nas vésperas das eleições presidenciais. 0 Partido Comunista do Brasil, que luta infatigavelmente pelos interesses do povo, concita a todos os cidadãos a participar ativamente da campanha eleitoral. Através do voto, milhões de brasileiros poderão no dia 3 de outubro proferir seu julgamento sobre o governo, sobre os homens e os partidos que o apoiam, sobre sua política de preparação para a guerra, de miséria cada vez maior para o povo e de crescente submissão do Brasil ao imperialismo norte-americano. Através do voto derrotemos o governo de 24 de agosto e os generais golpistas. Com a vitória eleitoral, o povo unido e organizado melhor poderá garantir as liberdades democráticas, as conquistas e direitos dos trabalhadores, a defesa do petróleo brasileiro e da indústria nacional, enfrentar com decisão a carestia na vida. Lutemos, pois, com firmeza e entusiasmo, pela realização de eleições livres a 3 de outubro. Unamo-nos todos em defesa da Constituição - e das liberdades democráticas, contra as tentativas de golpe de Estado ou militar. Sem a salvaguarda das liberdades democráticas é mais difícil a luta contra a miséria, em defesa da paz e da soberania nacional. Unamo-nos para impedir no país a implantação de uma ditadura militar fascista. Reunamos todas as forças antigolpe, desde operários e camponeses até grandes capitalistas e fazendeiros interessados na defesa da Constituição. Tais forças, unidas, poderão isolar e bater as forças do golpe militar, impor a realização de eleições livres e garantir a vitória de seus candidatos nas urnas. 0 Partido Comunista do Brasil apoia e indica aos sufrágios do povo as candidaturas à presidência e vice-presidência da República dos srs. Juscelino Kubitschek e João Goulart, os quais, através de pronunciamentos públicos, já se declararam dispostos a lutar contra o golpe, em defesa da Constituição e das liberdades democráticas e pela melhoria das condições de vida do povo. A vitória das candidaturas Kubitschek e Goulart será a derrota dos generais golpistas, dará um novo impulso às forças democráticas e patrióticas e poderá determinar importante modificação na correlação de forças políticas, favorável à democracia, à paz, à independência e ao progresso do Brasil. Derrotemos nas urnas, de maneira esmagadora, a candidatura do sr. Juarez Távora, que representa a continuação do governo imposto ao país pelo golpe militar de 24 de agosto. Com esta candidatura visam os generais golpistas, juntamente com os setores reacionários da U.D.N. e com o demagogo Jânio Quadros, colocar na presidência da República um conhecido serviçal dos monopólios norte-americanos, partidário da entrega do petróleo brasileiro à Standard Oil e que jamais ocultou seu desprezo pelo povo e suas intenções ditatoriais. Desmascaremos o sentido diversionista da candidatura do sr. Ademar de Barros, estimulada pelos golpistas, que querem dividir as forças contrárias ao golpe militar para levar ao Catete o general fascista sr. Juarez Távora. Concidadãos! Façamos da campanha eleitoral uma cruzada em defesa das liberdades democráticas. A tarefa do verdadeiro democrata é votar em Kubitschek e Goulart, é lutar pela unificação de todas as forças patrióticas e progressistas a fim de que possam vencer os inimigos do povo. Na medida em que estiver organizado e unido, o povo saberá responder com vigor a qualquer tentativa de golpe de Estado, saberá ganhar as ruas para defender seus direitos e suas conquistas democráticas, saberá impor sua vontade e derrotar, em todos os terrenos, os que queiram implantar no país uma ditadura militar fascista. Conclamamos a todos os cidadãos, independente de condições sociais, de pontos de vista políticos ou de crenças religiosas, para a união e a luta pelas liberdades democráticas. Estendemos fraternalmente a mão aos trabalhadores getulistas juntos, trabalhistas e comunistas, constituímos poderosa força entre os trabalhadores das cidades e do campo, força capaz de defender com êxito as leis sociais já conquistadas, a liberdade sindical, o direito de associação, as conquistas e reivindicações das massas trabalhadoras. Dirigimo-nos aos patriotas e democratas que militam nas fileiras do P.S.B. da U.D.N. e do P.L. e aspiram à defesa do petróleo, da soberania nacional e das liberdades. Não vos deixeis enganar pelos reacionários de vossos partidos. Como democratas e patriotas, não podeis dar vosso voto a um general fascista e partidário confesso da entrega do petróleo brasileiro à Standard Oil. Dirigimo-nos também aos patriotas e democratas filiados ao P.S.P. juntos alcançamos a vitória eleitoral de 22 de maio na Capital de São Paulo. Marchemos agora juntos e façamos vitoriosas as candidaturas dos srs. Kubitschek e Goulart, já que a candidatura do sr. Ademar de Barros, no momento atual, não pode senão dividir e enfraquecer as forças que precisam e devem-se aglutinar contra o golpe militar fascista. Camaradas! Aos comunistas e a todas as organizações do Partido cabe o dever de lançar-se com entusiasmo à campanha eleitoral. Não poupemos esforços para assegurar nas urnas a vitória dos candidatos indicados e apoiados pelo nosso Partido, os srs. Kubitschek e Goulart. Expliquemos infatigavelmente ao povo o Programa de salvação nacional de nosso Partido. Prossigamos sem desfalecimento a luta patriótica em defesa do petróleo, intensifiquemos a luta pela paz, pela reforma agrária, pelas reivindicações dos trabalhadores e pela independência nacional. Não há tempo a perder. Lancemo-nos com ardor à campanha eleitoral. 0 Partido Comunista do Brasil concita o povo a criar milhares de Comitês Eleitorais, nas empresas e nos bairros, nas cidades e nas vilas, para levar à vitória as candidaturas dos srs. Kubitschek e Goulart. Através de comícios, assembléias, debates públicos, do rádio, de manifestações de massas é nosso dever esclarecer o povo, alertá-lo ante as ameaças golpistas, convencê-lo da necessidade de unir-se e organizar-se para a luta em defesa das liberdades e da Constituição, de suas conquistas e de seus direitos. Trabalhadores! Organizai-vos para defender as liberdades, para enfrentar com sucesso as tentativas liberticidas dos generais golpistas e assegurar a vitória de vossos candidatos! Todos às urnas a 3 de outubro! Derrotemos os inimigos do povo! Viva a unidade da classe operária! Viva a união de todos os trabalhadores das cidades e do campo! Viva a união dos brasileiros para defender as liberdades e garantir o pão para seus filhos! Contra a ditadura militar fascista, lutemos pela paz, pela democracia, e pela independência nacional! Agosto de 1951. 0 Comitê Central do Partido Comunista do Brasil (Voz operária, 24-09-1955) -- Doc. 8.1 - Os comunistas e a sucessão presidencial (04.09.1959) 0 pleito eleitoral de 1960, no qual o povo brasileiro deverá eleger os sucessores dos srs. Juscelino Kubitschek e João Goulart, assume neste momento uma grande significação política. As campanhas pela sucessão presidencial despertam para a vida política amplas camadas da população, aceleram o processo de seu esclarecimento e impulsionam o avanço do movimento nacionalista e do movimento operário e democrático. 0 quadro da situação política em que se desenrola a campanha eleitoral caracteriza-se pelo choque cada vez mais agudo entre as correntes nacionalistas e populares e os grupos entreguistas e retrógrados que servem ao capital monopolista dos Estados Unidos. 0 governo do sr. Kubitschek continua realizando concessões ao imperialismo norte-americano e recusando-se a atender aos reclamos da maioria da nação no sentido de alterações substanciais na sua orientação política. Entretanto, importantes conquistas parciais têm sido assinaladas pelas forças patrióticas. Além do êxito concreto que constitui a defesa do petróleo brasileiro contra as investidas dos trustes, um passo adiante acaba de ser dado com a encampação da CEERG, subsidiária da Bond and Share, pelo governo do Rio Grande do Sul, ato que representa profundo golpe no monopólio estrangeiro de energia elétrica. A ruptura das negociações entre o governo do Brasil e o Fundo Monetário, Internacional foi outro acontecimento significativo, que alcançou repercussão em todo o continente. Ao tomar essa atitude, o sr. Kubitschek cedeu às exigências do movimento nacionalista e às lutas dos trabalhadores e do povo contra a carestia, rechaçando pela primeira vez as imposições daquela organização financeira controlada pelos imperialistas norte-americanos. Ultimamente, como resultado de uma tenaz campanha popular, foram desalojados das posições-chave que ocupavam no aparelho de Estado os srs. Lucas Lopes, Rogério Campos, Garrido Torres e outros conhecidos entreguistas. Se este fato representa uma inegável vitória nacionalista, é necessário ter em vista, entretanto, que a recente reforma ministerial não levou aos postos de governo homens merecedores da confiança do povo. Um fator particularmente favorável ao êxito das forças nacionalistas e democráticas em nosso país é o alívio da tensão internacional que se verifica nos últimos tempos. Com o debilitamento acelerado do sistema capitalista e o fortalecimento contínuo do sistema socialista, torna-se cada vez mais difícil o desencadeamento da guerra mundial ou até mesmo a manutenção da "guerra fria" e da tensão entre as grandes potências. Os acontecimentos das últimas semanas, assinalados pelas reuniões de Genebra, as visitas de Koz'ov aos Estados Unidos e de Nixon à União Soviética, assim como as próximas visitas de Kruschoiv aos Estados Unidos e de Eisenhower à U.R.S.S. representam êxitos incontestáveis da político de paz do governo soviético e da luta dos povos pela paz e revelam a possibilidade de efetiva coexistência pacífica entre as duas maiores potências, cujo entendimento é condição básica para impedir a deflagração de um conflito mundial. Esta nova situação reflete-se em nosso país, estimulando as forças que resistem ao imperialismo norte-americano e pugnam por uma política externa independente de paz e amizade com todos os povos, inclusive com a União Soviética e demais países socialistas. 0 povo brasileiro não logrou, porém, até agora, alijar do poder os partidários da dependência ao imperialismo ianque, cuja interferência em nossos assuntos internos se manifesta publicamente através das declarações afrontosas do embaixador Cabot. A política econômica e financeira, mesmo após a demissão de Lucas Lopes e Roberto Campos, continua a ressentir-se de aspectos antinacionais e antipopulares, sobretudo no que tange ao comércio exterior, ao sistema cambial, ao abastecimento e preços. Persiste a recusa a abrir novos mercados, a reatar relações com a U.R.S.S. e outros países socialistas. A recente elevação do dólar-café impulsionou a desvalorização do cruzeiro em benefício exclusivo dos latifundiários e exportadores, em detrimento do poder aquisitivo das massas. Enquanto se mantém de pé o plano de estabilização monetária, que. o novo Ministro da Fazenda continua aplicando, não toma o governo qualquer medida efetiva para o combate à carestia. Ultimamente surgem ameaças à liberdade sindical e ao direito de greve, assim como manifestações de anticomunismo por parte da policia política e outros órgãos do poder. Esses aspectos impopulares da política do governo especialmente a alta vertiginosa do custo de vida, acentuam o descontentamento do povo, que se manifesta por vezes de forma espontânea e violenta, como nos acontecimentos de Niterói. Na situação assim criada conjugam-se objetivamente os esforços dos elementos entreguistas e reacionários estejam eles enquistados no governo ou militem na oposição. De um lado, os setores pró-imperialistas do governo tratam de impor a política de submissão ao capital monopolista estrangeiro, de concessões aos latifundiários de carestia desenfreada. Na medida em que impõem esta política, cresce a indignação das massas, estreita-se a base social do governo, cujo desprestígio aumenta. De outro lado os entreguistas e reacionários da oposição, notadamente setores dirigentes da UDN, e as forças de 24 de agosto, sem desistir de suas tentativas golpistas, buscam aproveitar-se do descontentamento popular para se mover do governo, através do golpe o setor nacionalista. Embora sejam extremamente complexos os interesses que se entrechocam na atual situação política, o, conflito entre nacionalistas e entreguistas define, no fundamental, o agrupamento de forças para o pleito eleitoral de 1960. 2 A primeira candidatura lançada à sucessão presidencial foi a do sr. Jânio Quadros, que se apresenta como candidato de oposição ao atual governo. 0 ex- governador de São Paulo tem como patronos a alta direção da UDN, os grupos responsáveis pelo golpe de 24 de agosto, elementos reacionários e entreguistas como Carlos Lacerda, e seus porta-vozes são o "Estado de S. Paulo", "Correio da Manhã", "0 Globo" e outros órgãos identificados com os interesses dos trustes estrangeiros. A candidatura Jânio Quadros se Caracteriza também pelo seu aspecto demagógico, capaz de enganar importantes camadas populares. Procura beneficiar-se do sentimento de oposição e do descontentamento popular gerados e agravados pela política econômica e financeira do atual governo. A fim de conseguir a adesão de setores das camadas médias e das massas trabalhadoras, levanta a bandeira da moralidade administrativa e da luta contra a corrupção, atitude que lhe valeu, em São Paulo, o apoio de algumas forças políticas de base popular. Na realidade, porém, as principais posições políticas de Jânio Quadros se identificam com o programa das forças antinacionais e antipopulares. Em novembro de 1955 converteu São Paulo no reduto da conspiração golpista e entreguista que visava impedir a posse dos eleitos pelo povo, manter no poder as forças do 24 de agosto e implantar o "regime de exceção" reclamado pelos agentes do imperialismo norte-americano como Carlos Lacerda. A campanha eleitoral de outubro de 1958 mostrou como sabe utilizar o dinheiro e a pressão do poder público em seu benefício. São particularmente elucidativos os contratos de construção, sem concorrência pública, de usinas termelétricas e outras obras, em São Paulo, num valor superior a cinco bilhões de cruzeiros. É conhecida sua posição contrária ao monopólio estatal do petróleo. Quando os grupos ligados ao imperialismo lançaram a campanha contra os empreendimentos estatais, tendo em mira sabotar o desenvolvimento independente de nossa economia, Jânio Quadros associou-se a tal movimento, em entrevista ao "Correio da Manhã". Sua alegada oposição ao atual governo limita-se a simples exploração demagógica, sabido como é que sempre apoiou os aspectos mais negativos da ação governamental: manifestou-se pela reforma cambial, exigida pelo Fundo Monetário Internacional para deter o desenvolvimento econômico do país, e declarou-se solidário com a política financeira de Lucas Lopes, que agravou consideravelmente a carestia da vida. Ao assumir tais posições, Jânio Quadros tornou-se intérprete de grupos econômicos dos mais reacionários do país - os latifundiários, exportadores e banqueiros ligados ao comércio exterior, que constituem o cerne da oligarquia paulista vinculada ao imperialismo. Aliados a setores retrógrados de outras regiões do país, estes grupos pretendem alcançar o poder com Jânio Quadros para tentar restringir o desenvolvimento industrial através da suposta "estabilização monetária", abolir o chamado "confisco cambial" e desvalorizar ainda mais o cruzeiro, congelar os salários e vencimentos e estender os privilégios do capital estrangeiro sob o disfarce de proteção à "livre empresa". Jânio Quadros é o candidato ideal das forças entreguistas e reacionárias. Sua candidatura representa um perigo precisamente porque, pela primeira vez, essas forças encontraram uma figura demagógica capaz de enganar os setores descontentes da população e mistificar uma parte das massas trabalhadoras e populares. Em oposição a candidatura de Jânio Quadros, numerosos deputados da Frente Parlamentar Nacionalista, a "ala moça" do PSD, os militares do dispositivo vitorioso a 11 de novembro e outros setores do nacionalismo lançaram a candidatura do Marechal Teixeira Lott, Ministro da Guerra. Chefe militar dos acontecimentos de 1955, Lott esteve à frente das forças que garantiram a legalidade democrática e tem sido, durante o atual período governamental, uma figura representativa do setor nacionalista do governo e um defensor da Constituição. Como expressão do sentimento nacionalista do Exército, o Marechal Teixeira Lott é um partidário intransigente do monopólio estatal do petróleo. Propugna o voto para os analfabetos, declara-se favorável a medidas de reforma agrária e não permitiu que o Exército fosse lançado contra os posseiros que, de armas na mão, lutaram pela terra no oeste do Paraná. Pronuncia-se pela limitação das remessas do capital estrangeiro e tem-se oposto aos aspectos mais negativos da reforma cambial. Lançada pelos setores nacionalistas da coligação governamental, a Candidatura Lott foi aceita pelo partido majoritário governamental, o PSD, contra a vontade dos grupos reacionários que influem na direção desse partido. Tais grupos preferiam um candidato de "união nacional" das forças conservadoras, a fim de isolar as forças democráticas e evitar que o embate eleitoral se trave em termos de luta entre nacionalismo e entreguismo. A candidatura Lott reflete as contradições existentes no seio do próprio governo e da coalizão de partidos situacionistas. Articulada por setores radicais do nacionalismo, logo ficou sujeita às pressões do grupo reacionário da cúpula do PSD. 0 Marechal Lott, militar declaradamente conservador, tem manifestado, ao lado de pronunciamentos patrióticos e democráticos, opiniões inaceitáveis, como a que se opõe às relações diplomáticas entre o Brasil e a União Soviética. Estes pontos de vista do Marechal Lott dificultam o apoio das forças nacionalistas e populares à sua candidatura e favorecem a propaganda demagógica de Jânio Quadros. Entre tanto, a adesão do Marechal Lott ao programa de "reformas de base" do PTB (limitação da remessa de lucros das empresas estrangeiras, reforma agrária, lei de greve, reforma da previdência social e recuperação do Nordeste) e a conseqüente indicação de seu nome à convenção nacional do PTB significam uma ampliação da base política e popular de sua candidatura. De outro lado, pelo fato de surgir vinculado aos partidos governamentais, a candidatura do Marechal Lott sofre a influência negativa dos atos impopulares do governo, sobretudo no que diz respeito aos aspectos reacionários de sua política econômica e financeira que se refletem diretamente na crescente elevação dos preços. A modificação dessa política, a aplicação de medidas tendentes romper com a dependência ao imperialismo e conter a alta acelerada do custo de vida, é condição necessária para que a candidatura ligada ao situacionismo possa contar com o apoio popular e enfrentar com sucesso a campanha demagógica de Jânio Quadros. Não se deve excluir a possibilidade de que o quadro atual da sucessão sofra transformações substanciais, desde que se tenham em conta outras contradições da vida política do país e os obstáculos que se erguem diante de cada uma das candidaturas já lançadas. No campo da coligação situacionista, as principais contradições à, se manifestam entre o PSD e o PTB, tanto no que concerne as divergências de ordem política e programática como no terreno da disputa de posições. 0 problema da vice-presidência na chapa do Marechal Lott, ainda não decidido, suscita dificuldades que não se podem desprezar. Por sua vez, o sr. Ademar de Barros insiste em jogar com a sua candidatura e articula com o PRP uma "terceira força" eleitoral a fim de influir na escolha definitiva dos candidatos. Igualmente, perduram obstáculos à unificação das forças em torno de Jânio Quadros. Amplos setores da UDN, particularmente no Nordeste, onde as seções udenistas, com algumas exceções, assumem posições nacionalistas o democráticas e se aliam ao PTB e aos comunistas, ainda resistem. A candidatura do ex-governador paulista. 0 sr. Juraci Magalhães, utilizando a bandeira das reivindicações do Nordeste, procura articular o lançamento de seu nome com o apoio de setores da UDN e do PSD. 3 Em face do problema da sucessão, o esforço dos comunistas deve ser concentrado nas seguintes tarefas políticas: 1 - Participar ativamente, e desde já, da campanha eleitoral e intervir nos acontecimentos a fim de contribuir para assegurar a vitória das forças nacionalistas e democráticas. Neste sentido, é necessário intensificar a atuação entre as massas e, juntamente com a luta por suas reivindicações, realizar o alistamento eleitoral, participar da discussão do problema sucessório nas fábricas, bairros, escolas e outros locais, a fim de que as próprias massas se manifestem, critiquem as posições dos candidatos e formulem suas exigências a eles e ao atual governo. Deste modo, é possível dar mais vigor, nos próximos meses, à luta permanente que sustentamos por um governo nacionalista e democrático, através de modificações da política e composição do atual governo. A campanha eleitoral para a sucessão presidencial cria condições particularmente favoráveis ao êxito dessa luta, visto que o governo e as forças políticas que o apoiam podem ser agora mais sensíveis à pressão das massas trabalhadoras e populares, aos reclamos da opinião nacionalista e democrática. Ademais, a mudança de rumos do governo é imprescindível para ampliar e consolidar a coligação eleitoral em torno da candidatura apoiada pelas forças nacionalistas e pelos partidos políticos situacionistas. Uma vez que o programa de "reformas de base" do PTB obteve a concordância oficial da direção do PSD, já pode contar com ampla maioria para ser aprovado no parlamento, sendo indispensável, porém, a pressão das massas para que essas reformas, no mais breve prazo, sejam consagradas em lei. 2 - Explicar ao povo como se agrupam as forças políticas para a sucessão, revelar o sentido e as características de cada candidatura. Para isto é necessário esclarecer, com base em fatos e argumentos, o caráter entreguista e reacionário da candidatura Jânio Quadros, mostrar as forças reacionárias que a apoiam e a política em que se inspira, alertar o povo para que não se deixe ludibriar pelas artimanhas demagógicas e pseudomoralizantes desse candidato, fazendo esforços a fim de ganhar para as posições nacionalistas todos aqueles que equivocadamente ainda seguem ao ex-governador de São Paulo. Em relação à candidatura do Marechal Teixeira Lott, devem os comunistas mostrar ao povo as características patrióticas e democráticas das forças que lançaram essa candidatura. Ao mesmo tempo, é indispensável criticar firmemente as posições conciliadoras de Lott, exigir sua definição em torno de problemas básicos para o povo, apresentar reivindicações ao candidato e aos partidos que o sustentam. Consideramos que, em torno da candidatura do Marechal Teixeira Lott, é possível reforçar agora o movimento nacionalista. Os comunistas e outras forças populares não são, assim, indiferentes à necessidade de consolidação dessa candidatura, que pode vir a ser por eles apoiada. Com este fim, é necessário lutar energicamente contra a influência de elementos reacionários e entreguistas na coligação que sustenta a candidatura em apreço. No que se refere ao sr. Ademar de Barros, é preciso fazer sentir à base popular do PSP e aos seus dirigentes a inviabilidade de sua candidatura e a necessidade de unir todas as forças contrárias à candidatura entreguista e reacionária de Jânio Quadros. 3 - A perspectiva que se abre com a campanha eleitoral e com o agravamento das condições de vida do povo é de intensificação das lutas pelas reivindicações populares, pela emancipação nacional e pela democracia. Nestas condições, cabe aos comunistas levar à prática sua orientação política, com redobrado vigor, fortalecer e ampliar as fileiras do movimento comunista e concentrar sua atuação junto às massas em torno das seguintes questões: - Melhoria da situação aflitiva dos trabalhadores e do povo, por meio do aumento dos salários e vencimentos, de medidas práticas contra a carestia da vida, e aprovação da lei orgânica da previdência social. - Política externa independente e de paz. Estabelecimento de relações diplomáticas e comerciais com a União Soviética e demais países socialistas. Solidariedade à revolução cubana. - Política econômica e financeira que favoreça o desenvolvimento independente do país. Repúdio às imposições do Fundo Monetário Internacional e limitação das remessas do capital estrangeiro. Desenvolvimento e industrialização do Nordeste com ajuda financeira e planificada do governo federal. - Reforma agrária que eleve o nível de vida das massas trabalhadoras do campo e estimule o aumento da produção agropecuária. - Salvaguarda das liberdades democráticas, aprovação da lei que regulamenta o direito de greve e revoga o Decreto-lei 9.070. Legalidade do Partido Comunista e revogação do artigo 58 da Lei Eleitoral. A campanha sucessória já iniciada, cria condições favoráveis ao desenvolvimento da luta que trava o povo brasileiro pela constituição de um governo nacionalista e democrático, através de mudanças na política e na composição do atual governo, e pela vitória em outubro de 1960, dos candidatos que expressem os anseios de emancipação e progresso da nação. (Luís Carlos Prestes, Os Comunistas e a Sucessão Presidencial. Novos Rumos, 04 a 10-09-1959).