A LUZ DA PAIXÃO Catherine Spencer Título original: Constantincs Pregnant Bride Cassandra Wilde engravidou de Benedict Constantino após uma tórrida noite de paixão. Casar foi à primeira opção de Benedict, para a surpresa de Cassie. Já na Itália, depois da cerimônia, Cassie co­meçou a ter esperanças de que o casamento por conveniência tinha alguma chance de se tornar uma história de amor. Mas Benedict es­tava interessado em prazeres mais ime­diatos... Digitalização: Rita Revisão: Ana Ribeiro PRÓLOGO — Esse assunto está morto e enterrado, não vou voltar atrás. Está tudo decidido — murmurou consigo mesma. O coração acelerou ao ouvir aquela voz sensual e inconfundível anunciar. — Está tudo decidido, mesmo, Cassandra. Lívida de susto viu Benedict Constantino entrar pela varanda. — Mas não do jeito que você planejou. Temos um bebê a caminho. Como vamos nos adaptar a essa mudança radical em nossas vidas? — Não vamos. Isso não é problema seu, Benedict. — rebateu ela. — Um filho não é um "problema" e se sou o pai, com certeza, ele é de interesse meu também. Esse filho é meu, Cassandra? — É seu. — Então, nosso casamento será o próximo passo. CAPÍTULO UM Cassandra Wilde saiu do elevador, empurrou a pesada porta de vidro e entrou na sede das Empresas Ariel. Imediatamente, foi to­mada pelos sons do ambiente, do discreto toque do telefone a con­versa de clientes, no saguão da recepção. Normalmente, pararia para identificar os rostos conhecidos e conferir se os novos clien­tes estavam sendo bem atendidos. Mas não hoje. Hoje não estava em seu estado normal. — Cassie! — chamou sua secretária, Megan, quando viu Cas­sandra entrar. — Temos visitas. Cassie acenou rapidamente e continuou andando até que se sentiu protegida em sua sala. Somente então deu um sorriso força­do e contido que logo se tornou um pranto mudo e desolador. Apoiada contra a porta olhava entre lágrimas tudo borrado ao redor. A luz do sol parecia um arco-íris. A mesa de mogno era um cubo cor de rubi iridescente e a moldura prateada do porta-retrato da falecida mãe brilhava como diamante. Uma das janelas estava entreaberta e lá fora, na pequena varan­da, um ramo de frésias exalava seu perfume delicado, misturado à brisa quente de março, invadindo toda a sala. Quatorze andares abaixo, o ruído dos carros confundia-se com o chiado rouco das gaivotas que voavam alto, no azul do céu sem fim. Era um lindo dia de primavera em São Francisco e o mais triste nos 27 anos de Cassie. Porém, ficar se lamentando não ia ajudar. Precisava se acalmar, enfrentar os problemas com a cabeça fria, refazer seus planos para o futuro — já que, de uma hora para outra, eles haviam mudado drasticamente. Era necessário pensar com clareza. No entanto, aquele homem não saía de seus pensamentos e ela mal podia esperar para vê-lo novamente. Sua imagem era tão níti­da que parecia que o tinha visto ontem, como se há apenas algu­mas horas ele tivesse lhe mostrado como foram insignificantes to­das as relações anteriores a ele. A história começara no verão passado. Ela e Patrícia Farrel, sua melhor amiga desde o primário e sócia nos negócios há quatro anos, viajavam a Napa Valley para uma reunião com Núncio Zanetti, cliente importante, proprietário de uma das vinícolas mais badaladas da Califórnia. Duas vezes por ano, ele presenteava seus empregados com um jantar no navio Ariel, que Cassie e Patrícia haviam comprado quando começaram o negócio. Núncio era um homem generoso que adorava gastar com extravagância. Também era exigente e esperava dos outros a mesma atenção aos detalhes que tinha ao organizar suas próprias festas. A realização desses eventos demandava meses de meticulosa organização, e cada cláusula do contrato deveria ser honrada. Além disso, sempre que Núncio requisitasse, deveria haver um tempo reservado para encontros pessoais. Naquele dia ensolarado, Cassie e Trish, como ela chamava sua amiga Patrícia, chegaram ao iate para os últimos arranjos, quando Núncio as apresentou ao seu amigo de infância Benedict Constantino. Ele morava em Nova York, onde administrava os negócios da família, no ramo de produtos cítricos. — Principalmente a bergamota, que cresce apenas numa pe­quena região ao sul da Itália, o que a torna uma mercadoria rara. Provavelmente, vocês estão familiarizadas com o odor que ela tem, porque é usada por várias grifes de perfumes finos. O que tal­vez não saibam é que a bergamota também é de grande valor para a indústria farmacêutica — explicou Benedict. Quando a conversa girou em torno de Nova York, ele sorriu para Cassie de uma maneira singular e disse: — Acho a energia da cidade estimulante, mas consigo ver vá­rias vantagens em dividir meu tempo entre lá e aqui, na Costa Oes­te. Acabo de descobrir que a Califórnia também possui atrativos surpreendentes. Completamente seduzidas pelo charme e pela sofisticação eu­ropéia de Benedict, Cassie e Trish foram facilmente convencidas a almoçar com os dois no magnífico jardim da vinícola, depois da reunião de negócios. Foram três horas prazerosas, com direito a escalope de ceviche e vinho tinto espumante, o mais aclamado da vinícola de Zanetti. Cassie constatou que o interesse daquele lindo estranho não era produto de sua imaginação quando o encontrou pela segunda vez. A batida enérgica na porta de sua sala interrompeu bruscamen­te sua viagem ao passado e Trish entrou. — Cassie? Vi quando chegou e achei que você não parecia... muito legal. Está tudo bem? Por alguns instantes, Cassie havia conseguido ocultar sua an­gústia, mas com a pergunta da amiga tudo veio à tona e as lágri­mas voltaram. — Cass, você está me assustando! A última vez em que a vi nesse estado foi no funeral de sua mãe e, antes disso, quando tí­nhamos seis anos e fomos ver o filme do Bambi. — Trish se apoiou no braço da cadeira, tirou o cabelo de Cassie do rosto e suplicou: — Fale comigo, o que for, vamos resolver juntas, como sempre fizemos. — Não dessa vez... Se minha vida está uma bagunça, a culpa é toda minha. — Não pode ser tão ruim assim. — E pior do que ruim. Não tem... desculpa. É uma vergonha. — Vergonha? Você tinha uma reunião hoje de manhã e estava ótima quando saiu daqui. O que aconteceu depois? Perdeu nossa conta mais preciosa? Cometeu um erro colossal de avaliação que vai nos levar à falência? — A empresa nunca esteve tão bem. Minha vida pessoal é que está desmoronando. — Cassie pegou um lenço de papel, assoou o nariz e decidiu ir direto ao ponto: — Minha reunião hoje de manhã não foi de negócios. Fui ao ginecologista. Estou grávida. — Grávida? Jura? — zombou Trish. — Você nunca encontra tempo para um relacionamento sério e sexo casual não é do seu feitio. Cassie não respondeu. Não poderia, pois a verdade já havia sido dita, Seu silêncio falou mais que mil palavras, e Trish era es­perta demais para não ter entendido a mensagem. — Que bonito, Cassandra, engravidar de uma única noite! — E isso não é o pior. Tem mais. Trish ainda falava, aturdida demais com o que acabara de des­cobrir para agüentar ouvir "mais". — Você tem certeza absoluta de que... está grávida? — Tenho. Você está de dez semanas, garantiu o ginecologista. Se se cui­dar e tiver sorte, terá mais uma meia pendurada na lareira no próximo Natal. — Mas... — Trish fez uma pausa, tentando tocar no assunto da forma mais delicada possível: — Quem é o pai? Cassie abriu a boca para responder, mas o medo fez com que sua garganta se fechasse. E se ela realmente tivesse as complica­ções que o médico advertiu que poderiam ocorrer? E se perdesse o bebê? — Cass? — Trish abraçou Cassie pelos ombros. — Você sabe quem ele é, não sabe? — Claro que sei! Posso ser uma idiota, mas não sou uma perdi­da na vida! — Querida, nunca quis dizer isso! Mas sim se você foi força­da... Se você não conhecesse o homem... se ele abusou de você... — Não fui estuprada, se é o que está pensando. Conhecia o cara e estava... mais do que a fim dele. — Então ele tem um nome? — A pergunta pairou no ar, espe­rando por uma resposta. — É... Benedict Constantino — sussurrou, com medo de que as paredes tivessem ouvidos. Trish não foi nem um pouco discreta. — Benedict Constantino? — Deu um grito estridente que es­pantou a gaivota pousada na grade da varanda. — Benedict Cons­tantino? — Por que não pega um alto-falante e conta para todo mundo? — Desculpe. Mas se me pedisse para adivinhar quem nesse mundo conseguiria levar você para a cama por uma noite, Cons­tantino seria o último da lista. Ele é tão careta e correto. Palavras equivocadas para descrever Benedict na última vez que Cassie o viu, pensou, sentindo um calor invadir seu corpo ao lembrar daquela noite. O amigo charmoso de seu cliente mostrou-se um amante ardente, transformando uma simples cama num pal­co de paixões abrasadoras. Trish a encarava como se Cassie fosse um ser do outro mundo. — Como aconteceu? — Adivinha! Ele pode ser rico, poderoso e lindo, mas, como todo homem, não consegue ver um rabo-de-saia sem perder a ca­beça. — Não perguntei sobre isso. Somos amigas há séculos, mas não significa que possa me meter nos detalhes íntimos de sua vida. Quero saber é como foi que se encontraram? Afinal, ele não mora logo ali na esquina. — Ele veio para a festa de fim de ano de Núncio. — Fim de ano... Ah, aquela noite! — É — disse Cassie desolada. — Foi puro fogo de palha então! Se um de nossos funcionários não tivesse faltado, provavelmente você teria passado a noite em casa, vendo televisão. Mas teve que cobrir o cara, acabou se en­contrando com Benedict novamente e... — E enquanto o resto dos convidados festejava o Ano-novo, eu e Benedict curtíamos nossa festinha particular, e uma lembrança desse dia nasce em seis meses e meio! — As lágrimas voltaram a cair. — Eu me sinto uma imbecil! — Você não é de se deixar abater sob pressão nem de ficar se lamentando. Sempre encarou os problemas de frente. — Desta vez é diferente. Não consigo! — Claro que consegue! Você não é a primeira mulher a ter de enfrentar uma gravidez indesejada, nem será a última. Se acha que não segura a barra, há duas outras opções: adoção e... aborto. — Como se eu fosse optar por alguma das duas! — Cassie pres­sionou carinhosamente o útero e se perguntou se ainda choraria muito até o dia do parto. — Então, por que essa crise emocional? É por causa de Bene­dict? Ele já sabe do filho? — Não tem nada a ver com Benedict! — mentiu. Nessas dez semanas, apesar de não conseguir tirá-lo da cabeça nem esquecer a noite de amor, Cassie se resignou com o fato de que Benedict, aparentemente, não teve tantos problemas quanto ela para esquecer o que tinha acontecido. — É... minha mãe. — Ai, querida! Sei o quanto sente falta de sua mãe e ainda mais. nesse momento, mas você não está sozinha, tem a mim e ao Ian. A gente não pode substituir Nancy, mas pode contar conosco para o que der e vier. — Não é por isso. É que... — Cassie quase se afogava nas pró­prias lágrimas. — É porque o bebê deve nascer... no dia 8 de outu­bro. — No dia do aniversário de sua mãe! — Sinto como se mamãe estivesse me dando de presente uma nova vida, já que a perdi. Não me olhe como se eu estivesse deli­rando! Uma grávida pode se dar ao luxo de ter devaneios. — Você tem estado sob muita tensão, ultimamente, os negó­cios esquentando com a chegada do verão e agora isso. Talvez fosse melhor tirar férias. Quem sabe se encontrar com Benedict em algum lugar e resolver a situação. Como acha que ele vai reagir? — Não vou contar. — Como não? Ele tem o direito de saber, Cassie! É filho dele também e dois pais é sempre melhor que apenas um. — Não senti muito por não ter pai. — Não é verdade. Você apenas aprendeu a reprimir essa falta. Não há razão para forçar a criança a também não ter pai. Não co­nheço Benedict, mas parece ser um homem digno. — Ele não parecia preocupado em agir corretamente quando transou comigo no reveillon. — Não quero ser óbvia, Cass, mas quando um não quer, dois não brigam. Você também não é nenhuma santa. — Não sou mesmo. Mas foi culpa dele. Ele estava... sedutor demais para que eu conseguisse dizer "não". — Posso entender. Ele é realmente um pedaço de mau cami­nho. Alto, bronzeado, lindo. Cass, você tem que contar. — Não vou contar nada, nem você. Quero que isso fique claro, Patrícia! O que acabei de contar não sai daqui. — Não vou pôr um anúncio no jornal, se é disso que tem medo, mas não preciso dizer que esse tipo de segredo não dá para escon­der por muito tempo. — Não vou sair muito em público. — Quando Benedict voltar para a festa de verão de Núncio, em junho, você vai estar de seis meses. Acha que vai dar para escon­der que leva um bebê na barriga? O que pretende fazer? — Vou entrar de férias e deixo você para cuidar de Núncio. — Sou responsável pela comida, não por marketing e relações públicas. — Então vou resolver tudo por telefone e e-mail. — Você está delirando! Núncio vai querer seu toque pessoal e a atenção que sempre recebeu. Não pode desapontar nosso cliente mais importante. Você sabe que nesse ponto o problema não é só seu. Tem que pensar também no futuro dessa criança... filhos não saem nada barato hoje em dia. — Por favor, Trish, você fala como se eu tivesse problemas fi­nanceiros! — Você não é milionária. Se quiser ser mãe solteira, acho bom fazer todas as vontades do signor Zanetti, porque vai ficar muito feliz com os cheques que ele assinar, quando tiver que arcar com seguro-saúde, escola e todos os mimos que decerto vai querer pro­porcionar a seu filho. — Começo a organizar os preparativos em maio, seis semanas antes da festa. A barriga ainda não vai estar grande e não corro o risco de esbarrar com Benedict. — Por quanto tempo acha que pode guardar esse segredo? — O suficiente para ninguém desconfiar de quando ou de quem fiquei grávida. — Você está sonhando! Se não estivesse tão atrasada para uma reunião ficaria aqui para convencê-la da loucura que está fazendo. — Esse assunto está morto e enterrado — Cassie disse enquan­to Trish saía da sala. — Não vou voltar atrás. Está decidido. Mal pronunciou estas palavras, Cassie sentiu que não estava sozinha. O coração acelerou quando ouviu a inconfundível voz sensual: — Está decidido mesmo, Cassandra. Lívida de susto viu Benedict Constantino entrar na sala pela porta entreaberta da varanda. — Mas não do jeito que planejou. — Obviamente, ele havia es­cutado a conversa dela com Trish. E não havia gostado nada, é cla­ro. No entanto, Cassie estava tão atônita que não percebeu o óbvio estampado na face de Benedict e respondeu, indiferente e arro­gante: — Não sei do que está falando, mas quero saber como conse­guiu entrar aqui. Você tem um minuto para explicar ou chamo a segurança. — Você não vai chamar ninguém. Ela havia conhecido aquele homem intimamente, tocado aque­le corpo másculo e viril em posição perfeita para acomodá-lo. Ele havia tocado as partes mais íntimas de Cassie e ela havia se entregue àquele homem de corpo e alma. Era impressionante o po­der que Benedict exercia sobre ela. Tinha medo de encará-lo, pois a paixão ardente que havia demonstrado na noite de amor ainda exalava dos poros dele. CAPÍTULO DOIS Cassie olhou rapidamente para o telefone, ao alcance da mão, em seguida para a porta fechada. Se quisesse, poderia escapar para o corredor antes de ele alcançá-la. Ou apertar o viva-voz e pedir socorro. — Não, Cassandra, não vai sair da sala nem chamar a seguran­ça. A não ser que queira discutir nosso problema em público. Ele foi até a mesa, pegou o telefone e o estendeu a Cassandra. — Se é o que quer, vá em frente, chame o prédio todo. Ou pre­fere que eu faça isso? — Desligue isso! — implorou, furiosa por se mostrar tão frágil e por achá-lo tão fascinante, mesmo quando a ameaçava. — Sem problemas, cara. Não quero causar ainda mais aborre­cimentos. — Ele recolocou o fone no lugar gentilmente, arrastou uma cadeira para se sentar e disse civilizadamente: — Então te­mos um bebê a caminho. Como vamos nos adaptar a essa mudan­ça radical em nossas vidas? — Não vamos. Isso não é problema seu, Benedict. — Um filho não é um “problema" e, se sou o pai, com certeza é de interesse meu também. — Seus olhos escuros observavam o rosto de Cassie, buscando uma expressão de dúvida, de dissimula­ção. — Esse filho é meu, Cassandra? Ela poderia ter mentido, mas Benedict já havia escutado sua conversa com Trish e nos dias de hoje era muito fácil fazer um exame de DNA, o que provaria a paternidade de Benedict. — É seu. — Então nosso casamento será o próximo passo. — Casar? — Ela engasgou. — Você só pode estar brincando! — Brincando de pedir sua mão? De jeito nenhum. — Então está louco. Casamento entre nós? Não há a menor condição! — Por acaso você tem um marido que esqueceu de mencionar antes? — Claro que não! — Pois então, também não tenho esposa. Não há nada que nos impeça de casar. — Benedict, foi apenas uma noite, e isso foi há quase três me­ses! Desde então você não deu sinal de vida. — Estava fora do país. — Bem, pois eu não. Estive aqui todo o tempo. O telefone funciona no mundo inteiro. O e-mail também, mas você optou por não utilizar nenhum dos dois, o que dá a entender que "fora do país" também quer dizer “não estar nem ai”. É por isso que acho essa sua vontade de casar absolutamente ridícula. — Ninguém está falando de vontade. É questão de obrigação. — Não quero um marido que me vê como obrigação. — Que tipo de marido você quer? — Um que me ame, que seja companheiro, apaixonado por mim. Não posso esperar isso de você. — Não? Já esqueceu da noite de Ano-novo? Esquecer? Teria rido da pergunta se não tivesse experimentado de repente um intenso dejà vu que a fez até corar. Se algo faltou naquela noite, com certeza não foi paixão. — Não esqueci, mas, como disse antes, foi apenas uma noite. — Mesmo assim, as lembranças dessa noite ainda mexem com você e prometo que isso pode ocorrer novamente. Sou homem, e como bem falou sua amiga, tenho a carne fraca. Apesar de não ser uma virgem, você continua sendo, em muitos aspectos, uma me­nina inocente sem muita noção do poder que o sexo exerce sobre as pessoas. — Ele pegou uma estatueta de mulher que decorava a mesa e passou o dedo pelas sobrancelhas até chegar ao pescoço da imagem. — Vai ser um prazer instruir você. Cassie sentiu o toque como se a estatueta nas mãos de Benedict fosse ela mesma; começou a transpirar e sentiu a calcinha umedecer-se. Constrangida, se contorceu na cadeira, disfarçadamente. Bene­dict sorriu. Ele sabia! — Não quero discutir isso com você agora, muito menos aqui. — Entendo. — Ele pôs a estatueta no lugar e se levantou da cadeira. — Vamos continuar hoje à noite. Posso pedir que sir­vam o jantar no meu quarto de hotel? Ou prefere que seja na sua casa? Em nenhum lugar, se ela pudesse escolher. Escreveu o endere­ço num pedaço de papel deu a ele e mostrou a porta de saída. — Na minha casa. — Pelo menos dessa vez ela estava no con­trole de situação. — Que horas? — Sete horas. Mas não espere nada sofisticado para o jantar, ando meio enjoada para comer. Em vez de encaminhar-se para a porta, ele foi na direção de Cassandra. Ela se levantou e estendeu a mão, para manter a distância. — Até mais tarde. Foi um gesto patético, já que Carrie carregava na barriga um filho dele e que Benedict havia acabado de pedi-la em casamento. Assim mesmo, achou mais seguro manter a formalidade. Infelizmente, ele tinha outros planos. Em vez de estender a mão, pegou a de Cassandra e beijou seu pulso. Ela ficou surpresa e afogueada, enquanto ele beijava lentamen­te a palma de sua mão. Então levantou levemente a cabeça e mur­murou: — Arrivederci, Cassandra. — E se retirou. Com o pôr-do-sol, a temperatura caiu. Cassie acendeu uns gra­vetos na lareira. Um pequeno vaso com rosas, velas e a porcelana da avó decoravam a mesa do jantar. Na cozinha, a carne de vitela assava no forno e a garrafa de vi­nho branco de Borgonha esfriava na geladeira. Será que tinha caprichado demais? Não teria sido melhor servir uma pizza e deixar a TV ligada no jornal em vez de ter posto o CD de Debussy? Por que não vestiu jeans e uma camiseta em vez do vestido de seda longo e dos brincos de pérolas? Confusa e ansiosa, estava a ponto de trocar de roupa quando o interibne tocou. Pela janela, viu Benedict parado em frente à porta do prédio. — Que cheiro delicioso — disse ao entrar no apartamento. — Achei que Patrícia fosse a cozinheira da dupla. — E é. Passei numa delicatessen no caminho de casa. Minha única contribuição foi à salada. Ele vestia um belíssimo paletó cinza-escuro feito sob medida e uma gravata de seda. Estava impecável e ela não conseguiu disfar­çar seu deslumbramento. Enfiou o nariz nas flores que ele trouxe para evitar encará-lo. — Nossa frésias! Como sabe que são minhas favoritas? — Talvez porque tenha um vaso na varanda de seu escritório. — Você notou? Obrigada, são lindas. — Prego. — Ele sorriu; outra característica de Benedict que Cassie achava desconcertantemente atraente. Indicando a sala de estar, ela disse: — Fique à vontade enquanto ajeito as flores em um vaso. — Ia trazer um vinho. — Ele a seguiu até a cozinha. — Mas pensei que você deve estar evitando bebidas alcoólicas. — Pensou certo, mas não quer dizer que você não possa tomar um drinque. Quer uísque, campari ou vinho? — Um vinho mais tarde, com a comida. Por agora, estou satis­feito em só olhar você. — Gostaria que você não falasse essas coisas. — Por que não? É um prazer olhar para você, o que é ótimo, já que vai ser minha mulher. A tendência é gente se ver bastante. — Não está nada decidido, Benedict. Ainda tem que me con­vencer de que existe alguma vantagem na sua proposta. — Claro que tem. — O sotaque italiano ficou ainda mais carre­gado. — No meu país, os homens se casam com as mães dos seus filhos. É simples. — Estamos nos Estados Unidos e resolvemos nossos proble­mas de forma diferente. — Não significa que seja a melhor forma ou a correta. Sua preocupação é que não está apaixonada por mim, mas, de onde vim, existem ingredientes mais importantes num casamento, como respeito e companheirismo, para criar um bom ambiente para os filhos. Se o amor acontecer, vai ser ótimo, mas está em segundo plano. — Em outras palavras, trata-se de um casamento por conve­niência. — Cassie fez cara de desprezo. — Devem ter muitas mu­lheres que não se incomodam em ser meras parideiras, proprieda­de dos homens, mas não é meu caso. — Podem até ser de conveniência, mas são casamentos dura­douros. Divórcio era algo impensável no tempo dos meus pais, Cassandra. A família vem em primeiro lugar, junto com a devoção e a admiração pelo parceiro. Mesmo nos dias de hoje, é raro que uma viúva da geração da minha mãe queira casar outra vez. — Esse é o seu ponto de vista. Talvez seja porque, depois de finalmente se ver livre de um homem de quem não podia se sepa­rar, a mulher não tenha nenhuma vontade de repetir a dose. Ele riu. — Tem medo de não conseguir se ver livre de mim, cara? — Nem um pouco. — Que bom, porque pretendo manter minha esposa bem perto de mim. — Espero que ela goste da companhia, seja ela quem for. Cassie apanhou o vaso de flores e levou para a sala, deixando Benedict para trás. — Mas aceite que eu não vou ser essa pessoa, Benedict. Não lenho intenção de me casar por respeito. — Você vai casar comigo, a única coisa que ainda não sei é quanto tempo vou levar para convencê-la. — Duas horas, Benedict. Pretendo estar na cama antes das nove. — Não se sente bem? — Fora o enjôo que sinto de vez em quando, estou ótima. Meu médico falou que está tudo bem. Na verdade, o médico disse que não queria assustá-la, mas o colo do útero estava mais fino do que o normal, nessa fase da ges­tação. Dependendo dos resultados dos exames, ela teria que tomar medidas preventivas para não perder o bebê. Quando suspeitou da gravidez, ainda não estava certa se queria ter o bebê. Mas com o risco de perder a criança, Cassandra ficou aterrorizada. Só então percebeu que já havia criado um forte vín­culo com o pequeno ser que crescia em sua barriga. ? Que tipo de medidas?, ela perguntou. ? Uma cirurgia, com anestesia local, que consiste em suturar a parede do útero e assim mantê-lo rígido e dilatado para o bebê se acomodar. Quando estiver com 36 semanas, retiramos os pontos para que o útero se desenvolva sozinho. ? Algum risco para o bebê? ? Há algum perigo, mas quanto mais cedo fizer, mais seguro para você e para o bebê. — Se está tudo às mil maravilhas — Benedict interrompeu os pensamentos dela — por que está tão apreensiva? O que está me escondendo, Cassandra? — Nada. Estava pensando em como deve estar a vitela que dei­xei no forno. Dessa vez ele não a seguiu, e quando Cassie voltou o viu exa­minando algumas pinturas na parede. — Você tem bom gosto, cara. — Herdei quase tudo. — E o resto? — Comprei. Um de meus hobbies é comprar antigüidades. — Tem bom gosto. — Obrigada. — O ambiente era amplo, mas parecia reduzido com a presença de Benedict. Ele estava perto o suficiente para que sua sombra tocasse Cassandra. Ficou incomodada com a proximidade. Era melhor que ele fos­se embora logo. — A vitela já está quase pronta. Vamos comer a entrada? Enquanto ela se servia da sopa de aspargos, ele enchia uma taça de vinho. — Muito obrigado pelo jantar. A comida do hotel não é ruim, mas não se compara com a comida caseira. Por alguns minutos, eles mantiveram uma conversa leve e ami­gável, como qualquer casal civilizado. Cassie conseguiu consumir a sopa e uma pequena porção da salada. A história foi bem diferente com o prato principal. A vitela, co­berta por champignons, cebolas e queijo derretido, era muito pe­sada e embrulhou o estômago de Cassie. — Não está comendo nada, Cassandra. Ela brincava com a comida no prato. — Perdi a fome. — Que eu saiba, as grávidas sentem enjôo pela manhã. — Meu corpo não tem hora para sentir enjôo. — Você comentou isso com seu médico? — Comentei. — E? — E nada. Dá para mudar de assunto? — Tudo bem, mas quero o nome do médico. — Porquê? — Seu estômago embrulhou de aflição. — Para me assegurar de que ele é competente. — Ele é um excelente médico. É obstetra, especialista em gra­videz. — Se você está dizendo. — Você não acredita em mim? — Acredito, mas acho que não me contou tudo o que devo sa­ber. Estou preocupado com você. Dessa vez não era apenas um aviso, seu estômago estava real­mente em apuros. — Bem, não se preocupe, porque estou em boas mãos. — Vou conversar com esse médico, você querendo ou não. — Isso não é problema seu. — Claro que é, Cassandra. Nem pense em dizer isso de novo. — Você já ouviu falar de confidencialidade entre médico e pa­ciente? Você não tem o direito de pedir-lhe informações sobre mim. — Não tenho o direito? Como pai da criança, tenho todo o di­reito do mundo, e vou lutar por ele. Ela sabia que ele era um homem rico, acostumado a negociar com magnatas poderosos e que possuía amigos influentes. Nunca poderia lutar de igual para igual com ele. A vitela caiu mal no estômago de Cassie. Ela levou o guardanapo até a boca e se levantou. — Com licença — murmurou, e saiu correndo. Quando voltou, a sala de jantar estava escura. Pensou que ele havia ido embora. Ficou frustrada por sentir uma mistura de alívio e culpa. Porém, ouviu passos na cozinha e percebeu que não havia sido abandonada. Um segundo depois, ele estava na sala. — Trouxe um chá com torradas. — Como sabia que era exatamente disso que eu estava preci­sando? — Tenho duas sobrinhas. Lembro bem de como minha irmã fi­cava péssima quando estava grávida e só melhorava com chá e torradas. Ela provou um pouco do chá, ciente de que ele a observava atentamente. — Por que a carinha triste, cara! Meu chá é tão ruim assim? Comovida com o gesto de Benedict, pressionou os lábios ten­tando manter a calma. Quando conseguiu falar, a voz saiu carrega­da, estava prestes a chorar. — O chá está ótimo. Não é isso, é que... — Sinto muito por tudo que está passando. Não que não esteja feliz, mas fomos muito descuidados. A culpa foi minha, Cassandra. Não tenho mais idade para me deixar levar por esses impul­sos. Imploro que me deixe reparar esse erro. — Ele pousou a mão no ombro dela, subiu pela nuca e começou a acariciá-la. Ela se arrepiou com o toque suave e sutilmente erótico. Como resistir, manter-se firme e não se deixar levar pelo poder de per­suasão de Benedict? — Está com medo de mim? — Estou. — Ela o olhava bem nos olhos. — Posso saber por quê? Não respondeu, pois não podia admitir que tinha medo da imensa atração que sentia por ele. — Por que cresceu sem pai, Cassandra? — Meus pais não eram casados quando nasci. Tinha 17 meses quando ele largou minha mãe por outra mulher. Nunca mais tive­mos notícias dele. — Isso não vai acontecer com a gente, prometo que vou honrar nosso casamento e tomar conta de você e do nosso filho. — Não preciso que tomem conta de mim. — No entanto, uma parte de Cassandra adorou a idéia. Seria uma delícia ter um homem para cuidar dela e da criança. — Se minha mãe conseguiu cuidar sozinha dela mesma e de mim, também posso. — Não vê que não precisa? É uma responsabilidade para duas partes. Não estou dizendo que não vou deixar você fazer parte da vida do bebê. Não seria justo para com você nem para com nosso filho. — Não foi isso que ouvi você dizer a Patrícia, hoje de manhã. — Mudei de idéia desde que você descobriu e se mostrou bem diferente do meu pai. Você não encara o nascimento de um filho como um estorvo. Ele agora massageava o pescoço de Cassie. — Muito menos o casamento com a mãe dele — sussurrou no ouvido de Cassie. Ela sentiu sua resistência baixar, estava quase cedendo as von­tades de Benedict. Porém, seus dispositivos de defesa foram ativa­dos a tempo de resistir à lábia do italiano. — Pare de me pressionar, Benedict. Já tive o bastante para um dia. — Vamos deixar esse assunto para depois, então. Obrigado pelo jantar maravilhoso. — Maravilhoso?! Não ofereci café nem sobremesa! Ele se levantou e vestiu o paletó. — Você me ofereceu um vislumbre do seu coração, da sua in­timidade. Essa foi a melhor sobremesa. — Quanto tempo vai ficar na cidade? — perguntou enquanto o acompanhava à porta. Ele a olhou de cima a baixo. Os olhos de Benedict eram cati­vantes e pareciam acariciar o rosto de Cassie. — O tempo necessário para conquistar sua confiança. — Ele a beijou no rosto. Os lábios de Benedict demoraram-se na face de Cassie e ela abriu a boca para reclamar. Esse foi seu erro: ele aproveitou e rapidamente, porém com delicadeza, beijou os lábios de Cassandra. O beijo foi pura brasa, uma delícia; acabou com a sensatez de Cassandra. A boca que se abriu para repreendê-lo agora estava anestesiada de prazer. — O tempo que for preciso, mi amore. — E tão rápido quanto a beijou, ele a deixou e desapareceu pela escada do edifício abaixo. Cassandra fechou a porta e foi cambaleando para a sala. Sentiu uma fome repentina e devorou as torradas. Tomou todo o chá e levou a bandeja para a cozinha. Ainda sentia fome. Ele havia limpado tudo. O que tinha sobrado do jantar, já esta­va na geladeira; a louça, arrumada na máquina de lavar. Difícil resistir a alguém tão atencioso, pensou, enquanto fervia água para cozinhar um ovo e colocava mais uma fatia de pão na torradeira. Talvez estivesse sendo injusta, talvez devesse aceitar a proposta de Benedict. A festa de fim de ano não poderia ser o iní­cio de algo maravilhoso? Queria ter a certeza que um casamento baseado em respeito e confiança era sinônimo de felicidade, como ele afirmou. Se hou­vesse chance de o amor surgir, então, não pensaria duas vezes, as­sumiria o risco. Gentil e atencioso, ele queria ser um pai presente na vida do filho, mostrou-se preocupado com o bem-estar dela. Ainda não havia encontrado defeitos nele. O mesmo não podia dizer de si mesma. Fatiou o ovo cozido e o colocou sobre a torrada. Pela primeira vez, em dias, a comida cheirava bem. Com a bandeja que Benedict havia utilizado foi até a varanda. Lá, encontrou sua agenda aberta, na mesa da varanda. Na página, o nome e o telefone do ginecologista, com a hora da consulta a que havia ido pela manhã. No chão, um cartão de visitas de Be­nedict. limão, durante o tempo que ele passou na cozinha, tinha apro­veitado para bisbilhotar sua agenda. O enjôo voltou e a fome de­sapareceu. Quanto tempo até ganhar minha confiança?, pensou furiosa, enquanto jogava o ovo e a torrada na lixeira. — É bom esperar sentado, senhor Benedict Constantino! CAPÍTULO TRÊS — Pelo menos ele tem bom gosto — falou Trish, enquanto chei­rava as rosas à sua frente. — Se não quiser na sua sala, levo para a minha agora mesmo. — Pode levar, aproveita e leva esse tal de Constantino tam­bém! — Acho que ele é capaz de qualquer coisa para ter você como esposa. — Que jeito estranho de tentar me conquistar! Achar que me­xendo nas minhas coisas vai conseguir alguma coisa comigo. — Cassie, por favor! Ele olhou na sua agenda, não roubou suas jóias! E pelo que me contou, você praticamente o forçou fazer isso. — Sabia que ia defendê-lo. — Não estou defendendo ninguém. Estou tentando fazer com que seja racional. É óbvio que ele se preocupa com você e com o bebê. Desde quando isso é crime? — Desde que passou a jogar sujo! Isso mostra que ele não tem caráter. E não foi só isso, Trish, você já esqueceu que ele se escon­deu na minha varanda e ficou ouvindo nossa conversa? — Se dependesse de você, ele nunca teria descoberto que tinha um filho. Benedict tem razões de sobra para achar que você está escondendo mais coisas. Além disso, com todos os defeitos que ele possa ter, ganhou uns pontos com essas flores. Até o vaso é divino. — Para mim é ostentação. — Cassie olhava o enorme vaso de cristal. — Seu problema é que você se deixa levar fácil demais pelas aparências. — Querida, sou chefde cuisine. Qualidade e boa apresentação para mim são tudo. Você pode até não reconhecer nunca, mas esse vaso é lindo, Cassie. — Vaso? Dava para tomar um banho aí dentro! ? Não por muito tempo. Em breve, você não vai entrar nem na banheira. — Não está ajudando, Patrícia! — Amiga, só quero que encare os fatos sem exagerar tudo. Be­nedict não tinha obrigação de pedi-la em casamento. Mas ele não hesitou em assumir o filho e em pedir sua mão. Homens assim estão em extinção e você seria uma boba se não considerasse a pro­posta dele. — Mas nós não estamos apaixonados! — Você estava entusiasmada o suficiente para engravidar. Agora vocês têm algo que deve ser prioridade na vida dos dois. Pelo menos seria para mim. — Eu sei — Cassie disse com pena da amiga. Trish e o marido, Lan estavam tentando ter um filho há três anos, sem sucesso. — Desculpe, Trish, não tinha que perturbar você com esses assuntos. — Para isso servem os amigos: estender o braço quando neces­sário e dar conselhos mesmo que não necessários. Quem além de mim para dizer as verdades que você não gosta de ouvir? Ninguém mais! Ela não tinha irmãos, tios ou tias, nem mesmo primos. Trish era muito mais que melhor amiga, era como uma irmã, e desde a morte da mãe de Cassie havia se tornado a pessoa mais importante em sua vida. Tinha outros amigos, mas nenhum tão leal e companheiro, que a conhecesse tão bem. — Acha mesmo que estou sendo muito dura com ele? — Acho. Se não sentisse nada por ele, ou se não conseguisse ficar perto dele. Mas, Cassie, basta observar como você fala dele! Pode até tentar odiá-lo, mas não consegue. Está muito atraída por ele e parece que ele também está por você. — Ele só está interessado no bebê. Sou só a incubadora do her­deiro dele. — Ah, dá um tempo! Se fosse verdade, o que ele estaria fazen­do aqui no seu escritório, ontem, quando ainda nem sabia que você estava grávida? Cassie deu de ombros. — Não sei nem quero saber. — Mais cedo ou mais tarde vai acabar sabendo, porque ele não vai desaparecer só porque você quer. Benedict tem feito todas as concessões e as flores são um recado do que está disposto a fazer. — São apenas flores para agradecer o jantar de ontem. — Se fosse só por isso, um vasinho seria suficiente. — Está insinuando que agora tenho que aceitar as exigências dele só porque comprou todo o estoque da floricultura? — Estou sugerindo que é você que deve dar o próximo passo, mostrar que está aberta para conversar, ceder também. Trish pegou o telefone. — E estou sugerindo que faça isso agora mesmo, porque aque­le italiano lindo pode até ser um cavalheiro, mas tem pavio curto, e se você continuar insistindo em provocar Benedict Constantino, vai acabar se arrependendo, Cassie. Cassandra estava com ânsia de vômito novamente! E aquele fio do telefone balançando de um lado para o outro na mão de Trish parecia uma cobra ameaçadora. — Nem sei onde ele está hospedado! — Você tem o número do celular. Está escrito no cartão que ele deixou cair na sua casa. — E se ele estiver numa reunião de negócios? Ele veio a traba­lho e para visitar o Núncio. — Deixa uma mensagem na secretária eletrônica. — Dizendo o quê? — Sei lá. Algo bem complexo como : “Oi, Benedict, é a Cassan­dra. Quando puder me liga". — Se fizer isso você me deixa em paz? — Prometo. — Trish passou o telefone para Cassandra. Ela discou o número esperando deixar uma mensagem na secretária. No entanto, ele atendeu no primeiro toque. Cassie ia desligar, mas Trish falou bem alto: — Fale alguma coisa, Cassie! — Cassandra? — O nome soou do outro lado da linha. — Oi... obrigada pelas rosas. São muito bonitas. Vermelhas são minhas preferidas. Não precisava. — Claro que precisava, Cassandra. E foi um prazer. Essa foi à única razão por que me ligou? — Hum...não. — Qual a outra? — Eu não... não posso... não gosto de fazer essas coisas por te­lefone. — Que idiota, aquilo soou péssimo! Indecente até! E do jeito que Trish olhou, deve ter achado a mesma coisa. Cassie respirou fundo. — O que quero dizer é que prefiro discutir o assunto pessoal­mente. Frente a frente. — Perfeito! Mas dessa vez você não vai cozinhar. Vou levá-la ao meu restaurante favorito. É silencioso e bem aconchegante. — Não! Jantar não. — Almoço então. — Está bem. — Hoje. — Tá. — Eccelente! Pego você às... — Não. Tem uma lanchonete aqui no primeiro andar do prédio. Vejo você lá, ao meio-dia. — Se você insiste — disse ele, como se Cassie tivesse sugerido um encontro no depósito de lixo. — Insisto. — Viu algum fantasma? — Trish riu depois que o telefonema terminou. Cassie pegou uma folha de papel e usou como leque para re­frescar-se. — Não sei o que esse homem tem que me deixa desse jeito. Será que estou fadada a me envolver com homens perigosos? — Ele não tem nada de perigoso, Cass! — Por trás daquela cara de bom moço tem uma pessoa ambi­ciosa e calculista. — Isso não é nenhuma surpresa. Como conseguiria ganhar a fortuna que acumulou? De qualquer forma, você nunca teria se deixado seduzir por um frouxo. Ou foi você que seduziu ele, sua safada? — Com certeza não fui eu! — Nenhum olhar convidativo na noite enluarada? Nenhum flerte no convés? Cassie abriu a boca para retrucar, mas fechou-a em seguida, to­mada de súbito pelas lembranças daquela noite... — Dança comigo, signorinal — Não posso, estou trabalhando. No entanto, lá estava ela nos braços dele, rostos colados, cor­pos se tocando e fluindo com a música, com a baía de São Francis­co e os fogos de artifício colorindo o céu. — Nunca pensei que fosse encontrá-la desacompanhada. — Eu nem vinha. Nosso relações-públicas pegou uma gripe. Impossível conseguir alguém em cima da hora para cobri-lo, ain­da mais em noite de Ano-novo. — Chato para você, sorte para mim. Os dedos dos dois se cruzaram e a outra mão de Benedict segu­rou com firmeza a cintura de Cassie. Uma corrente de calor e ex-citação a invadiu. — Fico feliz que esteja se divertindo, senhor Constantino, mas terá que me dar licença. Tenho que voltar ao trabalho. — Mas você está trabalhando e eu estou muito satisfeito. O calor aumentou e a cada palavra e gesto sugestivo de Bene­dict ela ficava mais consumida pelo desejo. Benedict sentiu que Cassandra já não tinha o controle de suas ações e a puxou para mais perto, não a ponto de chamar a atenção dos outros convidados, porém o suficiente para deixar claro quais eram suas intenções. Ela se deixou levar por aquele homem maravilhoso e, quando a música acabou, ainda teve dificuldade para se desvencilhar dos braços de Benedict. Cassie queimava por dentro, da cabeça aos pés, e suas partes intimas pulsavam como uma bomba-relógio. — Obrigada pela dança. — Grazie, Cassandra? Per favore, foi um prazer! Pena que du­rou tão pouco. Cassandra se afastou tão rápido quanto seus saltos permitiram, para o salão onde um assistente supervisionava os preparativos do bufê. Por uma hora ela se dedicou às obrigações. Não desconfiou das verdadeiras intenções do galã italiano quando, meia hora antes da meia-noite, um membro da tripulação foi avisá-la de que precisava ir com urgência a determinada suíte do navio. A porta estava destrancada, mas a suíte parecia vazia. O rapaz não só já havia ido embora, como também não tinha fechado a porta. Um pouco confusa, entrou na suíte e levou um susto. Pelo menos uma dúzia de velas acesas estavam espalhadas pela cabine. Na mesa, um balde de gelo de prata com uma garrafa de champanhe. Duas taças de cristal e uma única rosa vermelha completavam <> cenário. Ao lado da janela, com o terno desabotoado e as mãos nos bolsos, estava Benedict Constantino. Surpresa e constrangida, mas achando aquilo divertido, Cassie disse: — Espero que tenha uma boa explicação para isso. Achei que fosse uma emergência. — Mas é. Preciso urgentemente ficar a sós com você. — Muito lisonjeiro signor Constantino, mas não posso negli­genciar os demais convidados. Ele foi até ela e a pegou pelas mãos. — Escute! Por acaso está ouvindo o som da multidão sofrendo pela sua falta? — Não é caso. — Não, não é — ele murmurou rente à boca de Cassandra. — Mas esse com certeza sim. — Então beijou-a com vontade. Ela não resistiu. Quando os lábios se tocaram, Cassie já estava consumida pelo desejo. Ele podia fazer com ela o que quisesse. Benedict ainda tinha algum controle sobre si mesmo. — Esta não foi à razão por que a trouxe aqui. — Ah, é? Qual a razão, então? — Dar boas-vindas ao Ano-novo a sós com você. — Não vai ser possível! Estão me esperando no convés. — Que esperem mais 20 minutos, cara. — Cassie ficou com os joelhos bambos, absorta em pensamentos proibidos, enquanto ele abria o champanhe. — Pode não ser o tempo ideal, mas certamen­te será suficiente para brindarmos a chegada do Ano-novo. O champanhe borbulhava nas taças e era assim que Cassandra sentia o sangue nas veias. Benedict ofereceu uma das taças a ela. — Não deveria — ela protestou sem convicção. — Uma taça não vai fazer mal. Buona fortuna, Cassandra! Que esse novo ano lhe ofereça muitas alegrias e boas realizações. — Obrigada. — Ela não conseguia olhá-lo nos olhos. Tinha medo do que ele pudesse ler nos seus e, mais ainda, do que poderia encontrar nos olhos dele. — É assim que você comemora seu ré-veillon — Tento evitar festas como esta, mas confesso que hoje estou muito feliz por ter encontrado você, por poder beijar você. — E foi o que ele fez novamente. Ainda com mais intensidade, explo­rando a boca de Cassie com uma língua úmida e quente que a dei­xou completamente extasiada. Os toques ficaram mais ousados; ela já não conseguia mais pensar, a razão havia fugido há muito tempo. Não estava nem um pouco preocupada por saber tão pouco so­bre ele. Isso era um problema de uma parte do cérebro que não estava funcionando naquele momento. Ele estimulava em Cassandra um desejo sexual incontrolável, mesclado com ansiedade e agitação: sensações que ela já havia lido nos livros, mas nunca acreditara que realmente existiam. Quando ele desceu a mão pelo colo de Cassie, entre seus seios, ela soltou curtos gemidos de prazer. Estava à flor da pele, tomada pela loucura do momento. Ela pegou a mão de Benedict e a guiou pelas partes mais sensí­veis dos seios, oferecendo-se toda. Ele aceitou a oferta e a agarrou pela cintura, num movimento que deixou Cassandra imobilizada de tanto tesão. Ele era muito gostoso, quente, forte. Ele achou o zíper do vestido de Cassie e abriu o suficiente para que caísse no chão. Ela vestia uma roupa íntima de cetim que pe­dia para ser arrancada. Os seios de Cassie foram cobertos pelas mãos de Benedict e ele começou a explorá-los com a boca, como se quisesse roubar a alma dela. Ela quase gritou; o desejo corria pelas veias, arrepiando sua pele e a deixando completamente molhada. A sensação era quase dolorosa de tão intensa. Puro êxtase. Quando ele escorregou as mãos por baixo da calcinha de cetim, cia já não o desejava apenas, mas necessitava desesperadamente que ele a tocasse toda, que descobrisse o lugar escondido que pul­sava por ele. Cassie também queria tocá-lo e fazer com que ele tremesse e gemesse como ela. Sentindo a necessidade dela, ele pegou a mão de Cassie e a le­vou até seu sexo duro e ereto que marcava a calça. Benedict a aju­dou a abrir o zíper, mostrando-se sem qualquer pudor. Ela nunca havia visto um homem tão perfeito. Tocou-o como se estivesse saboreando um prato exótico e delicioso e fechou as mãos ao redor do sexo de Benedict, deleitando-se com sua rigidez e beleza. — Estou fazendo direito? — ela sussurrou. — Você gosta? Ele revirou os olhos, murmurou algo em italiano e, em segui­da, a deitou no carpete. Beijou as coxas nuas de Cassandra e sussurrou: — Sua pele, Cassandra, é perfeita. Você é perfeita. Então, tocou no local exato de Cassandra que clamava pela pre­sença dele. Ficou ali, brincando com a língua e com os dedos, dei­xando-a encharcada de prazer. Ela não agüentava mais, precisava que ele a penetrasse, e foi o que Benedict fez: os dois corpos fun­diram-se em um só, duas almas num só corpo. Por alguns minutos o mundo ao redor deixou de existir. Ele era o mundo de Cassie, seu universo. Abrigada nos braços de Bene­dict, poucos segundos antes de ele perder o controle do próprio corpo, Cassie sentiu-se como poeira estrelar caindo do céu. No convés, gritos e assobios ecoavam, buzinas de navios toca­vam na baía e fogos de artifício ocupavam o céu em cascatas co­loridas. Ela ainda estava absorta no êxtase da paixão e não perce­beu de imediato o significado daquilo tudo. Então, caiu em si e olhou para ele preocupada. — Perdemos a virada do Ano-novo! — Duvido que alguém tenha notado. Ela virou o rosto, constrangida. Ele percebeu e se levantou ra­pidamente da cama. Cassie fez o mesmo, sem pressa. Ele estava apenas um pouco despenteado, ao contrário dela, que parecia ter enfrentado um tufão. A calcinha estava nos joelhos, faltava um pé do sapato e o ves­tido estava todo amassado. — Cassandra... — Não! Não diga nada de que possa se arrepender. Vá embora e nos poupe do constrangimento de ter que fingir que o que acon­teceu foi mais do que um momento de fraqueza. — Isso não seria cavalheiresco da minha parte. — Cavalheiresco? Acho que é um pouco tarde para pensar em cavalheirismo, senhor Constantino. — E mais tarde ainda para tanta formalidade. Sabe muito bem que meu nome é Benedict. — É melhor você voltar logo para o convés, Benedict, antes que seu amigo Núncio venha aqui procurá-lo. Cassandra foi para o banheiro e trancou a porta. Quinze minutos depois, quando retornou, os únicos vestígios de Benedict eram as taças de cristal e a garrafa de champanhe pela metade. — Parece que está tendo dificuldades para responder, Cass. Você seduziu Benedict? — E se seduzi? — disse Cassie sem graça. — Mas não foi intencional e com certeza nunca pensei que fôssemos acabar na cama. Acho que ele também não, para ser sincera. — Óbvio que não, do contrário um dos dois teria pensado em usar camisinha, não é? E hoje não estariam vivendo esse dilema. — Você acha que posso aprender a amá-lo com o tempo? —= É possível. Então vai pensar na proposta? — Estou com medo. — Por quê? — Ele é autoritário, controlador, acha que mulher nasceu para servir ao homem. — Ninguém é perfeito, Cass. Além disso, não consigo ver você se submetendo às ordens de nenhum machão. — Não quero acabar me apaixonando por um cara que talvez nunca me ame. Não vou colocar a mim e a meu bebê na situação humilhante que minha mãe viveu, abandonada simplesmente por­que o marido cansou-se da rotina. — Não é justo supor que Benedict vai cometer os mesmos erros que seu pai. — Eu sei... E é por isso que aceitei me encontrar com ele outra vez, achar uma alternativa conveniente para os dois. — Então é bom se apressar. Já é quase meio-dia e você ainda tem que passar um blush e um batom. Você fica até charmosa com esse rostinho pálido dos enjôos, mas não tem nada a ver com seu estilo. CAPÍTULO QUATRO Sem perceber que ele a observava do outro lado do saguão, Cassie saiu do elevador e olhou seu reflexo no vidro. Insatisfeita com o que viu, ajeitou o cabelo e beliscou as bochechas para deixá-las mais rosadas. Como se algo fosse disfarçar as olheiras ou a palidez sob a maquiagem! — Ah, você já está aí! — A respiração era ofegante ao ser abor­dada por ele. — Tem muito tempo que está aqui? — Tempo suficiente para reparar que você precisa escolher melhor os lugares onde come. — Ele a pegou pelo braço e a levou até a saída. — Vamos comer no parque. — Não tem restaurante no parque — ela retrucou e o forçou a parar. — Tem uma delicatessen do lado. Compro algumas coisas e vamos fazer um piquenique. — Não tenho tempo para isso. Só posso ficar com você meia hora. — Meia hora não é suficiente. Arranje mais tempo. Ela soltou o braço da mão dele e o olhou de cara feia. — Também não tenho paciência com tiranos. — Não gosto de agir como tirano, mas quando é necessário, quando uma mulher não demonstra bom senso, como é seu caso, me vejo na obrigação de agir assim. — Ele a tomou pelo braço novamente e a levou até a delicatessen. — Bem, aqui estamos. O que vai querer, além da minha cabeça numa bandeja? — Nada. Não estou com fome. — Vou ter que escolher pelos dois, então. — Por que será que não estou surpresa? — Alguém precisa se preocupar com sua saúde. E quem mais indicado do que eu? Cassie suspirou e revirou os olhos. — Não tenho o dia todo e temos assuntos mais importantes que escolher entre pastrami no pão de centeio ou bife defumado no pão com passas para resolver. Só em mencionar comida Cassandra sentiu o estômago embru­lhar e correu para fora, procurando uma sombra onde sentar. Ele comprou frango frio em fatias e torradas, queijo branco, um cacho de uvas e duas garrafas de água mineral. — A gente pode comer aqui mesmo — disse Benedict, quando sentava ao lado de Cassandra. — Não, prefiro sentar no parque. O cheiro daqui... qualquer cheiro forte tem me deixado muito enjoada. — Prefere ir andando ou quer que eu chame um táxi? — Vamos andando. Conheço um atalho. Enquanto esperavam o sinal fechar, ele reparou que ela estava com uma aparência péssima e parecia bem mais frágil que dois meses atrás. Estava bem mais magra. Porém, continuava linda. Cassandra tinha um biotipo que permaneceria belo mesmo depois de velha. No entanto, havia perdido o brilho interior, o ar radiante que ele viu na irmã quando estava grávida. — Ainda está enjoada? — Não. E pare com essa preocupação exagerada! De me olhar como se eu fosse cair dura a qualquer momento. — Senta — ele disse espalhando o paletó na grama. Dessa vez ela não se opôs e fez o que ele mandou. Com cara de alívio, sentou sobre as pernas e aceitou a garrafa de água. — Estou preocupado, Cassandra. Você está muito pálida, ma­gra demais. O que seu médico falou sobre isso? — Vai me dizer que não foi a primeira coisa que perguntou quando foi lá hoje de manhã? — Como poderia? Você se recusou a me dar o nome dele. Ela ficou vermelha de raiva. — Não estou com saco para mentiras, Benedict! — Que mentiras? — Ele controlou a irritação que sentiu com a acusação. — Eu não minto! — Como pode fazer essa cara de ofendido quando sabemos que você arranjou um jeito de descobrir quem é meu médico? — Não tenho a menor idéia do que está falando e não gosto do tom como fala comigo. — Por favor! Pare de representar! Você é sofisticado demais e velho demais para bancar o inocente injustiçado. — Tenho 34 anos, Cassandra, e sou, sim, um homem vivido. Mas ainda não aprendi a ler pensamentos. Então vou repetir: não sei o que você acha que fiz. Dá-me uma pista antes que eu perca a paciência. — Você ficou bem à vontade na minha cozinha. — Sim, não queria que se cansasse lavando a louça. Não satis­fiz suas exigências de arrumação? — Mas claro! Prendado assim, vai fazer da esposa uma mulher muito realizada, se não se tornar um espião internacional antes. — Você não pode ser tão conservadora e ultrapassada a ponto de achar que só porque lavei a louça não sou homem suficiente. Do contrário, me enganei redondamente com você, achando que fosse uma mulher inteligente. — Não foi isso que quis dizer. Mas continuo achando que seria um ótimo espião. — E por quê? — Minha agenda lhe dá alguma pista? Você não mexeu nela? — E por acaso isso foi meu crime? — Você procurou uma informação que não lhe dizia respeito na minha agenda. — Tome cuidado com o que diz, porque essa criança que carre­ga na barriga é meu filho. Apesar de estar disposto a fazer concessões, não vou tolerar questionamentos sobre minha integridade e acusações sem fundamento. Não me provoque, mia bella gestan­te, pois não vai gostar das conseqüências. — Mas se você não estava procurando informações, ontem à noite, o que seu cartão estava fazendo no chão ao lado da mesa onde deixei minha agenda? — Pensei em ir embora, porque você estava demorando muito a voltar. Achei que tivesse ido dormir, por estar indisposta. Então, peguei um cartão para escrever uma mensagem. Foi aí que lem­brei que tinha esquecido a caneta no carro. Vi um lápis na mesa e ia pegar, quando ouvi você entrando na sala. Então fui à cozinha fazer as torradas e o chá. O cartão deve ter caído no chão. Descul­pe se achei que era mais importante dar atenção a você. Foi algo tão horrível assim? Ela fez uma cara tão arrependida que a raiva que ele sentia transformou-se em compaixão. — Horrível foi o papel de idiota que fiz por essa bobagem. Te­nho feito muito isso, ultimamente, desculpe-me. — Você está vivendo um momento muito peculiar. — Benedict desejava que ela não mexesse tanto com ele. Cassandra era uma mulher confiante e bem-sucedida, e muito charmosa. Não precisava de um homem para protegê-la. Assim mesmo, ele sentia necessidade de cuidar dela. Ou seria o bebê que ela carregava que o tocava tão profundamente? — Você também. Uma semana atrás nunca teria pensado em me pedir em casamento. — Uma semana atrás muitas coisas ocupavam minha cabeça, mas casar com certeza não era uma delas. — Viu? Casar é um erro. Nunca fomos amantes de verdade, nem mesmo amigos. — Somos adultos. Nosso filho não tem culpa dos nossos erros, ele merece o melhor. — Você fala como se isso fosse tão simples quanto um mais um ser igual a dois, mas não é. — Não é mesmo! Nesse caso, um mais um é igual a três, a não ser que você esteja esperando gêmeos. — Nem pensar! Isso não é brincadeira, Benedict! — Mas também não tem que ser uma tragédia. — Ele a levan­tou do chão e a tocou no queixo, fingindo não reparar nas linhas rebeldes dos lábios de Cassie, que continuavam tentadores e deli­ciosos. — Olha para mim, Cassandra. Sou tão repulsivo que não consegue gostar de mim um pouquinho? Sente asco ao pensar em mim beijando você, tocando-a? Cassie corou. — Não, senão nunca teria feito amor com você. — Então vamos aproveitar que existe uma química entre nós, cara. Podemos transformar isso em algo maior. — Não é tão simples! É necessário mais que bom sexo para um casamento sólido. — Você subestima meu poder de determinação. Quando me proponho a conseguir algo, nada é capaz de me parar até que eu atinja meu objetivo. — Aceitaria isso como um elogio se seu objetivo fosse me con­quistar. Se eu não estivesse grávida, você nunca casaria comigo. — Como pode ter certeza? — Vamos parar de fingir. — Muito bem, vamos ser bem sinceros. É assim que vejo tudo. Acho você muito interessante e linda, por dentro e por fora. Admi­ro seu caráter e senso de humor, a determinação e a doçura com que encara a vida. A gente tem uma química maravilhosa na cama. Ou seja, temos todos os ingredientes necessários para uma união feliz e duradoura, não acha? — Pode ser, mas... Ele envolveu as mãos de Cassie nas suas e a puxou para perto. — Acredito que o casamento seja algo sagrado, como a família. Ser marido e pai foi algo que realmente não previ para este mo­mento da minha vida, mas não estou frustrado e vou fazer com que você tenha orgulho de ser minha mulher e mãe do meu filho. — Ele deu um passo atrás para analisar a reação de Cassandra. — Pronto, acabei. Agora é sua vez. — Nem sei o que dizer depois de tudo isso. — Você pode dizer que não acredita em mim. — Mas acredito, esse é o problema. — Se acredita em mim, o que nos impede de sermos felizes? — Você parece muito seguro. — Porque estou convencido de que vai dar certo. — A gente nem se conhece direito. — Temos o resto da vida para nos conhecermos melhor. Um bom casamento não é estático. É um processo de amadurecimen­to, de crescimento. A tendência é ficar cada vez melhor. — Mas e a questão geográfica? Tenho meu negócio aqui na Ca­lifórnia e você mora em Nova York. — Nova York é mais conveniente para meus negócios porque é mais perto da Europa. Mas minhas prioridades mudaram. Além disso, norte, sul, leste, oeste, o lugar não tem importância. — Você se mudaria para cá? — Claro. Solidariedade é fundamental numa relação, princi­palmente com uma criança na história. — Ai, Benedict, fica difícil resistir aos seus argumentos. — Casa comigo? Ela ficou um pouco pensativa, suspirou e: — Ai, por que não? O que a gente tem a perder? — Não temos nada a perder, Cassandra, apenas a ganhar. Va­mos comer? — Boa idéia. — Ela se ajoelhou ao lado dele. — Quando va­mos casar? — Uma semana basta para arranjarmos o vestido de noiva e as flores e mandar os convites? Pela primeira vez desde que descobriu que estava grávida, ela caiu na gargalhada. — Só podia ser homem para fazer uma pergunta dessas! Essas coisas demoram meses para se preparar, Benedict. Mas no nosso caso não tem importância, porque não quero vestido de noiva, flo­res nem multidão de convidados. Uma cerimônia bem simples, com um juiz de paz e duas testemunhas é mais que suficiente. — Sem nenhum dos detalhes românticos que toda mulher so­nha ter no dia do casamento? — Dadas às circunstâncias, sim. — Então, que tal uma lua-de-mel na Itália, para compensar? — Também não faço questão de lua-de-mel. Benedict estava a ponto de dizer que se ela planejava trazer para o casamento aquela falta de entusiasmo, a união estaria fada­da ao fracasso. Mas controlou-se e disse gentilmente: — Mesmo assim, quero lhe dar uma lua-de-mel. Acho que umas férias vão lhe fazer bem. Além disso, devo voltar em breve à Calábria para resolver uns problemas de família. — Onde é isso? Desculpe minha ignorância, mas nunca estive na Itália. Se você me mostrar um mapa, posso apontar as cidades principais como Roma e Milão, mas Calábria... — É bem embaixo, no dedo do pé da bota, ao lado da Sicília. — Sicília não é onde mora a máfia? — Você tem visto muita televisão, Cassandra. Tenho uma casa de férias linda na Sicília e nunca tivemos ataques de mafiosos. — Adoraria conhecer, mas não acho que seja a melhor hora. Se você tem negócios a resolver, só vou atrapalhar. Por que a gente não espera para casar depois que você voltar da Itália? — E deixar você sozinha? Nem pensar! Garanto que consigo resolver tudo e ainda arranjar bastante tempo para minha mulher. — Não sei se posso viajar. Talvez meu médico desaprove a idéia. — Nesse caso, a gente conversa com ele. Posso adiar a viagem se for preciso. Ela continuou apreensiva. — Do que você tem medo? De avião? — ele perguntou zombeteiro. — Nem um pouco, mas estas últimas semanas têm me tirado tanta energia. — Um motivo a mais para fugir um pouco do estresse do traba­lho. A Calábria é divina, Cassandra, um verdadeiro paraíso. Você não vai precisar fazer nada além de relaxar e ser mimada pela mi­nha mãe e irmãs. — E seu pai? O que vai dizer de você misturar lua-de-mel com negócios? — Meu pai morreu há quatro anos. — E isso que me assusta. Sei muito pouco de você e nada sobre sua família. Só que produzem um tipo especial de fruta cítrica, chamada bergamota. Não é isso? — Isso mesmo. Viu? Você não está tão desinformada assim. — Estou, sim! Se colocasse uma bergamota na minha frente, não saberia o que é. — A laranja bergamota é bem singular. Você logo vai aprender a reconhecê-la. — Bergamota... — Ela se deitou na grama e repetiu a palavra, imitando o jeito como ele pronunciava a letra "r". — Do jeito que você fala soa tão sensual. — É uma fruta extraordinária. Ela se sustentou em um dos cotovelos para beber um gole de água e voltou a deitar, admirando os galhos das árvores acima. — Lembro de você dizendo, na primeira vez que nos vimos, que ela é usada para fazer perfumes caros e remédios. Também se come? — Não, mas você encontra bergamota concentrada em licores e chás. — Sua família está metida num negócio e tanto, não? — Dá para sobreviver. — Ele ficou observando Cassie. Ela es­tava linda naquela posição. — Não perguntei quanto você vale, Benedict, se é isso que está pensando. Até por que não me interessa. A empresa Ariel vai muito bem e posso perfeitamente sustentar meu filho sozinha. Se acha que aceitei casar por causa do seu dinheiro... — Isso nunca passou pela minha cabeça. Vamos casar porque queremos o melhor para nosso filho. — É bom que isso fique bem claro entre nós. — Absolutamente! Quer um pouco de queijo com as uvas? — Boa idéia. O ar fresco me abriu o apetite. — De repente, foi o conforto de saber que o futuro ficou mais estável. — Confesso que a idéia de fazer parte de uma família me é atraente. Eu me sinto sozinha desde que mamãe morreu. Fale mais das suas irmãs. Elas são mais velhas ou mais novas que você? — Bianca tem minha idade, somos gêmeos, é casada e tem dois filhos: Stefano, de sete anos, e Pia, de três. Meu cunhado, Enrico, é advogado e cuida da parte legal dos negócios da família em Mi­lão. Francesca tem 25 e ainda está solteira. Trabalha com nossa mãe, na Calábria, na parte administrativa. Temos cerca de 70 em­pregados lá e mais 30 em Milão. — Tem lugar para mim numa família tão ocupada como a sua? — Eles vão adorar receber você, cara. — Ele desejava que isso fosse verdade. — Toda mãe italiana quer que seu filho produza um bambino ou dois. — Nesse momento, um já está de bom tamanho. Nem dei à luz ainda e mal consigo dar conta dos compromissos de trabalho. Fa­lando em trabalho, tenho uma reunião em 20 minutos. — Vou andando com você até o escritório. — Que bom que me arrastou até aqui. Esse lugar traz muita paz. — Na casa da Sicília, o som do mar batendo nas pedras parece uma cantiga de ninar à noite. Você vai dormir à luz do luar e acor­dar com um sol deslumbrante, sentindo o perfume dos jasmins e das verbenas do campo. Cassie o abraçou e deixou que ele descansasse o queixo em sua cabeça. — Parece um sonho. Promete que é assim que vai ser nosso ca­samento? — Não, cara. Posso prometer que darei o melhor de mim para que seja. É inevitável que haja tempestades, mas também vamos ter dias de calmaria, com intervalos aquecidos pela paixão. — Que tipo de paixão? — Daquelas que os livros não conseguem descrever tão bem quanto a vida real. Ele então a beijou, como havia desejado desde o momento em que a vira saindo do elevador. O beijo foi longo e intenso; Cassie correspondeu à altura e Benedict sentiu o calor ao redor dos qua­dris. Ele queria tocá-la toda, acariciar a barriga onde outra vida florescia. Cassie sentiu a excitação de Benedict e continuou a provocá-lo, apertando-o contra si, e dizendo baixinho: — Ah, esse tipo de paixão. — Isso é apenas uma amostra do que está por vir. — Queria tanto que não tivesse um cliente esperando no escri­tório... — Que bom que tem, senão íamos acabar presos por atentado ao pudor. Os dois voltaram para a rua movimentada e barulhenta. — Acho que não adianta dizer que trabalha demais, não é? — ele disse ao se aproximarem de um camelô que vendia flores em frente ao prédio de Cassandra. Benedict não hesitou em comprar um ramo de violetas. — Não, mas prometo que vou pegar leve. — Ela sorriu para agradá-lo. — Violetas! Como sabia que adoro violetas? — Adivinhei. Elas são pequenas e delicadas, como você, bella. — Você diz umas coisas lindas às vezes. Desculpe ter tirado conclusões erradas sobre ontem à noite. — Já esqueci. Agora temos que focar no futuro. — Concordo. — Não queria deixá-lo. — Realmente tenho que ir. — A gente se fala mais tarde. Cassie hesitou, virou-se, mas voltou e o beijou no rosto. — Obrigada pelo almoço. — Então sussurrou no ouvido dele: — E por tudo mais. Ele permaneceu lá, absorto. Teria que enfrentar sérios proble­mas quando chegasse à Calábria. Estaria sendo justo com Cassan­dra levando-a com ele? Mas ela estava esperando um filho seu, não podia abandoná-la. Como apresentá-la à família num momen­to tão delicado? Levar uma noiva desconhecida para casa? CAPÍTULO CINCO O jantar já havia sido servido, o filme acabado e as luzes apaga­das. Cassandra reclinou a luxuosa poltrona de couro da primeira classe do 767 da Alitalia. A seu lado, seu marido deixou a revista para olhá-la. — Confortável? — Muito. — Acha que consegue descansar? Ela fez que sim com a cabeça e fechou os olhos. Mas não con­seguiria dormir. Relembrava os eventos dos últimos dias como um filme vivo, em cores vibrantes. — O que ele fez para você mudar de idéia? — Trish perguntou curiosíssima, quando Cassie voltou do almoço com Benedict di­zendo que ia se casar. — Usou argumentos doces e plausíveis. — Não foi o sorriso cativante ou olhar sedutor dele, com aque­les cílios longos e sexies — Também. Ele é realmente muito persuasivo, mas pelo me­nos parece sensato e sincero. E muito eficiente também. Sem dar tempo para que ela voltasse atrás, ele entrou em ação e, em menos de 72 horas, tudo no cartó­rio estava resolvido, a cerimônia agendada e o vôo para a Itália reservado. Até o ginecologista fora consultado e pedira uma ultra-sonografia. — Umas semanas para relaxar é tudo que ela precisa — acon­selhou o médico. — No entanto, a ultra-sonografia mostra que o útero ainda merece cuidados. Recomendo que evitem relações se­xuais. Sei que não é a notícia mais agradável às vésperas da lua-de-mel, mas a gravidez é de alto risco e não é bom brincar com fogo. Benedict lançou um olhar de reprovação para Cassandra. — O senhor poderia me explicar essa história, doutor? Mais tarde, durante o jantar, ela mencionou novamente a idéia de adiar a cerimônia até que pudessem aproveitar uma verdadeira lua-de-mel. — Absolutamente. Casamento é mais do que sexo, Cassandra. A segurança do bebê é nossa prioridade. A resignação com que ele aceitou as recomendações do médico e depois a maneira impessoal como passou a tratar Cassandra fi­zeram com que o presente de casamento que Trish deu — um conjunto de lingerie quase transparente e muito sensual — não fosse usado. Cassie pensava nisso, enquanto sentia o peso da aliança de ouro no dedo anular esquerdo. Não importava quantas vezes ela dissesse "Sim, eu aceito", aquelas palavras não significavam nada. — Nem sei o dia do aniversário dele! — Cassie resmungou para Trish. — Não sei seu nome todo nem o número que ele veste. Não sei se usa pijamas ou dorme pelado! — A data do aniversário e o nome completo dele estão na cer­tidão de casamento. O que veste, ou não, para dormir, você vai descobrir em breve. Pare de se prender a detalhes, Cass, ponha os pés no chão. Ian está chegando com o carro, a gente não quer dei­xar o noivo esperando, quer? — Não posso sair agora — protestou Cassandra, em pânico. — Acho que vou vomitar outra vez. — Vai ter que esperar até o final da cerimônia. Seu batom vai sair e a maquiagem vai borrar se vomitar agora. O enjôo persistia e não tinha nada a ver com a gravidez ou com a turbulência do avião, mas com a súbita e assustadora constata­ção de que ela havia mergulhado de cabeça numa relação com um completo estranho. Um estranho que havia conseguido tudo o que queria em me­nos de 24 horas e que agora descansava a seu lado. Logo, a respi­ração dele foi ficando mais e mais lenta e relaxada. Ele dormia. Até dormindo era elegante. Admirando as curvas dos lábios de Benedict, ela ficou com a garganta seca de desejo. Todas as partes do corpo de Benedict tinham o poder de deixá-la completamente enlouquecida de desejo. Enquanto o encarava, pensava como basear um casamento só­lido apenas na atração física. Foi quando, de súbito, ele abriu os olhos. — Então? Está satisfeita? — Achei que estivesse dormindo. — Esse seu exame intenso é capaz de levantar os mortos, Cassandra. Mas você não respondeu. Está satisfeita ou já se arrepen­deu de ter casado comigo? — Você é um homem muito bonito, muito charmoso e muito... franco. Qualquer mulher teria que estar louca para se arrepender de casar com você. — E neste exato momento, você está tendo sérias dúvidas com respeito a sua sanidade, não é? — Admito que no momento me sinto um pouco amargurada. — Gostaria de poder acabar com sua insegurança, mas só o tempo pode fazer isso. Posso garantir, porém, que sou exatamente do jeito que tenho me mostrado: um homem honrado, que respeita as tradições e os laços sagrados do matrimônio, e que não vai dei­xar faltar nada para você ou nosso filho. Além disso, me considero um homem de sorte por ter conseguido uma mulher tão linda e in­teligente para ser a mãe do meu filho. Ele tocou a manga da roupa que ela havia usado na cerimônia, um vestido de seda azul-turquesa e uma jaqueta da mesma cor, que ela e Trish haviam comprado no horário de almoço, numa loja próxima ao local de trabalho. Ela usou a mesma roupa para viajar, porque era confortável e elegante; queria estar bonita para se apresentar à família de Bene­dict Constantino. — Nós não tivemos um casamento sofisticado, mas você esta­va uma noiva linda. — Tomara que sua família pense o mesmo. Você nunca me dis­se como eles receberam a notícia. — Eles reagiram como previ. A resposta foi tão ambígua que ela não pôde deixar de fazer um comentário: — A resposta não me pareceu muito promissora. Ele deu um tapinha na mão de Cassandra como se ela fosse uma criança incapaz de compreender o mundo complexo dos adultos. — Eu me entendo com minha família. Você só precisa se preo­cupar com que nosso filho venha ao mundo forte e saudável. — Não me venha com essa, Benedict. Se quiser que nosso ca­samento dê certo, o mínimo que pode fazer é respeitar minhas preocupações assim como respeito as suas. — Muito bem, é claro que ficaram surpresos com a notícia. — Felizes por você? — Não perguntei. — Por quê? — Cassandra achou estranho. — A ligação estava horrível, falei rápido. Logo estaremos na Itália. De qualquer forma, a opinião da minha família não tem a menor importância. Benedict não titubeou na resposta, mas Cassandra pôde notar que ele estava escondendo alguma coisa. A forma como contraía a boca e se movia impacientemente na cadeira o denunciava. — Eles não aprovaram, não é? Não querem que você leve uma noiva para casa. — Que importância tem isso, Cassandra? É a minha vontade que importa e eles não têm outra escolha senão aceitar. Eu e você somos, como diriam os franceses, afait accompli, e ninguém pode fazer nada ou mudar isso. Desolada, Cassandra virou o rosto e olhou para fora da janela do avião, onde o céu era um mar de estrelas. Qualquer marido teria dito: "Eles vão adorar você, assim como eu a adoro." Porém, Be­nedict não estava apaixonado nem fingia estar. Ela sabia que a razão de estarem juntos era o filho. Então, por que se sentia tão feri­da, com a sensação de ter sido enganada? — A família vai estar toda em Milão? — ela perguntou tor­cendo para que a resposta fosse não. Nove horas de vôo, por mais confortáveis que fossem, deixavam qualquer um exausto, e pelo visto ela teria que se esforçar em dobro para causar boa impressão. — Não, só Bianca e Enrico vão estar lá. Não tem vôo direto de Nova York para minha cidade, e Milão fica mil quilômetros ao norte da Calábria. Não faz sentido minha mãe e Francesca irem até Milão se a gente vai estar na Calábria no dia seguinte. — Ele bocejou e fechou os olhos. — Durma um pouco, Cassandra. Os últimos dias foram extenuantes. Você deve estar quebrada. Quebrada, Benedict? Ela se virou de lado e se conteve para não ter mais um daqueles acessos de choro. Que tal desanimada, ofen­dida, magoada? Quem esses parentes seus pensam que são para me julgar antes de me conhecer? — Cassandra não fala nada de italiano? — perguntou Bianca. — Ciao, grazie e arrivedercci. O suficiente para ser simpática, mas não para uma conversa. — Você é louco de ter trazido Cassandra num momento desses. Tem noção de como mamãe vai recebê-la? — Não quero me preocupar hoje, Bianca. Amanhã penso no que fazer com mamãe. Você sabe que vou dobrá-la independente de como reaja ao meu casamento. — Acho difícil, do jeito como as coisas vão. — Ela deu o braço para ele carinhosamente. — Não quis preocupar você quando li­gou para avisar que ia casar, mas mamãe está cada vez mais per­turbada. A situação no campo está muito pior desde a última vez que esteve aqui. — Não pode ser. Só ficaram uns poucos empregados e paguei um bom dinheiro para eles continuarem trabalhando, com a pro­messa de um aumento quando voltasse. — Até onde sei, poucos continuaram leais a nós. A maioria foi embora. Os empregados de dentro da casa também estão insatis­feitos. Sérgio partiu no fim de semana passado e isso significa que a esposa e a filha também nos abandonaram. Há dois dias Guido também saiu. A única que ficou foi Speranza. Não gosto nem de pensar em como ela está sendo explorada. — Isso é inadmissível! Speranza tinha 70 anos e trabalhava para a família desde que Benedict nascera. Ela nunca abandonaria aquela família que ama­va como se fosse sua própria. Era obsceno que tivesse que traba­lhar por quatro pessoas bem mais jovens, além do seu serviço. — Claro que é! Como isso pôde acontecer tão rápido, Bene­dict? Um ano atrás tudo estava correndo bem, todos estavam satis­feitos. Agora, temos uma bomba nas mãos e não quero nem pensar quando chegar outubro, na época da colheita das bergamotas. Se' não resolvermos isso, teremos que cancelar os contratos mais va­liosos. Não só vamos perder dinheiro, mas, muito pior, vamos su­jar nossa reputação. — Isso não vai acontecer. Prometo que vou cuidar disso. — Na sua lua-de-mel? Acho que não combina com trabalho. — São férias a trabalho. Cassandra já entendeu. — Ela parece tão frágil e ansiosa, sua esposa, e triste também, li você também não está radiante de felicidade. Não deviam estar se curtindo? — Estamos cansados, só isso. A semana foi uma loucura, com os preparativos da viagem e o casamento. — Por que tudo tão de repente? Ele deu um suspiro longo e nervoso. — Ah, sim! Ela está grávida. — Dio! — A cara de Bianca era de desespero. — Benedict, como você deixou que... — Eu sei! Você esperava que eu fosse mais responsável. Mas as coisas são como são, só me resta reparar meu erro. — Você está apaixonado? — Sinto uma forte atração por ela. Do contrário, não estaria grávida do meu filho. — Mamãe está sabendo? — Não pretendo contar por enquanto. Confio em você, Bianca, porque sempre fomos muito unidos e sei que vai aceitar Cassandra sem julgá-la. — Claro! Ela é uma mulher doce e adorável. Posso entender perfeitamente que você se sinta atraído por ela, e a aceito como uma irmã. Mas Benedict... — Você está desapontada comigo. Caí do pedestal e me mos­trei tão humano quanto qualquer outro. — Não, não é isso! Você é meu irmão e não o julgo. O que me preocupa são os problemas no sul... não é só a mamãe. — Mais problemas? — Aparentemente, os empregados leais estão sendo ameaça­dos pelos desertores metidos com os Aspromonte. Nós dois sabemos o que isso significa. Estamos lidando com la'ndrangheta. Isso nunca teria acontecido se papai estivesse vivo. ? Ele jamais teria contratado esses bandidos. Benedict sentiu algo muito parecido a medo. La 'ndrangheta, a , máfia local, tinha como principal fonte de renda os resgates obti­dos com seqüestros de integrantes das famílias ricas. Foras-da-lei sem qualquer escrúpulo, viviam nas montanhas, segundo regras próprias. — A situação é crítica — ele disse enquanto pensava em Cassandra e na estupidez de ter insistido para que ela o acompanhasse á Itália. — É ingenuidade esperar que eles respeitem as leis e os princípios que seguimos. Se quiserem se vingar, as conseqüências 1 serão piores do que podemos imaginar. — Exatamente. Nós crescemos ouvindo as histórias de pessoas m que desapareceram do mapa, das brigas intermináveis dessas famílias. E nada mudou. Morro de medo por Francesca e nossa mãe. E Temo por você também. — Não tema. Sei me defender e Francesca e nossa mãe tam­bém. Mas Cassandra é outra história. Se achar muito arriscado ela ficar no palazzo, vou deixá-la com você. — Claro! Quando e por quanto tempo você quiser. — Obrigado. Sempre confiei em você. — Sempre confiamos um no outro, caro, e o fato de estarmos casados não muda nada. Somos e sempre seremos uma família. A noite caiu e as luzes da casa estavam acesas, menos no quarto de Cassandra. Será que ela estava dormindo? Ele esperava que sim. Tinha medo que não conseguisse disfarçar a cara de preocu­pação. Escondida atrás da cortina, Cassie olhava para o jardim. A lua nascia ao longe e o jardim estava deserto, a não ser pelos vultos do marido e da irmã passeando; tão à vontade e indiferentes que ela sentiu que se não existisse ninguém sentiria sua falta. Não que não tivesse sido bem recebida pela irmã do marido. Quando se conheceram, no aeroporto, Bianca Constantino Manzini deu um abraço carinhoso em Cassie, dois beijinhos nas boche­chas e disse, num sotaque charmoso: — Estou muito feliz de conhecê-la e de que meu irmão tenha finalmente encontrado com quem ser feliz. Bem-vinda a Milão e a nossa família. Enrico também foi muito simpático. Cassie teria ficado tran­qüila e contente não fosse a cara de preocupação de Benedict. As­sim que chegaram à residência dos Manzini, ele foi para o escritó­rio de Enrico e deixou Cassandra completamente desamparada. — Assuntos de família — disse Bianca dando uma desculpa ao ver que Cassie ficara desapontada por ser abandonada. — Nessa família, os negócios sempre vêm em primeiro lugar. Enquanto os pobres homens discutem sobre contratos e taxas de importação, venha conhecer as crianças, cara. Elas estão ansiosas para conhecer a nova tia. Como você está aqui por pouco tempo, deixei meu filho faltar à aula hoje. Numa sala grande e iluminada, um menino montava um avião e uma menina brincava de boneca. Os dois eram morenos e lindos como a mãe. — Oi — murmurou o menino timidamente, dando a mão para Cassandra. — Você ser bem-vinda à Itália. — Stefano vem decorando esta frase em inglês desde que Benedict ligou avisando que vocês viriam — disse Bianca, escon­dendo o riso. — Não foi exatamente assim que ele aprendeu, mas valeu a intenção. — Não tem a menor importância — respondeu Cassie, comple­tamente encantada com o sorriso do menino. — O inglês dele é , muito melhor que meu italiano. A menina Pia, também quis dar o ar da graça e desandou a falar em italiano: a única palavra que Cassie entendeu foi ciao. Mas entendeu o que a menina queria ao ser puxada pela mão até a casinha de bonecas. — Presente de Benedict — disse Bianca. — Ele é um tio muito atencioso; tenho certeza que vai ser um marido maravilhoso. Cassandra tinha suas dúvidas quanto a isso. Porém, a aparente devoção de Benedict para com os sobrinhos era um sinal de que ele poderia ser, pelo menos, um bom pai. De alguma forma, já sa­bia disso, porque ele não se cansava de dizer “O bebê vem em pri­meiro lugar". No andar de baixo, ela ouviu uma voz masculina e outra de mu­lher, muito alegre. Ambos falavam com muita energia num italia­no rápido e eloqüente. Cassie abriu a porta e pôde ouvir as palavras domani, bambini e Cassandra. Ela não entendeu nada e se prometeu que a primeira coisa que faria no dia seguinte seria comprar um dicionário de italiano e estudar durante o vôo para a Calábria. Aprenderia expressões como: muito prazer, como está?, sua casa é linda... Quem sabe conseguia conquistar a sogra. | E Benedict? Será que o esforço de tentar adaptar-se à cultura dele faria com que voltasse a tratá-la com o carinho e a atenção de antes? Parecia que desde que Cassie dissera o “sim" a atração física que ele sentia por ela havia desaparecido. No início, Cassie achou que logo que ele resolvesse os proble­mas no trabalho voltaria ao normal e que a forte atração retornaria, quando estivessem sozinhos. Mas nada disso aconteceu. Benedict andava cada vez mais au­sente. A lua já havia tomado seu lugar no céu e irradiava uma luz pá­lida e melancólica pelo quarto. Na sua suposta lua-de-mel, Cas­sandra encontrava-se completamente sozinha, empoleirada sobre uma pilha de travesseiros, na cama. Morrendo de saudades de casa e confusa demais para conseguir dormir, olhava distraída para o nada, em meio à penumbra do quarto. Havia perdido a noção de quanto tempo estava ali, completa­mente imóvel e infeliz. Em algum momento, notou que a casa ha­via ficado silenciosa. Minutos ou horas depois ela ouviu o ranger da porta se abrindo e Benedict entrou. Ele fechou a porta silenciosamente e foi até o closet. — Pode acender a luz se quiser. Apesar das suas ordens, não estou dormindo — Cassandra anunciou friamente. Benedict acendeu a luz e exclamou surpreendido: — Então, o que está fazendo aí sentada no escuro? — Adivinha! Esperando meu marido vir para a cama como qualquer noiva em lua-de-mel. Ou isso não é costume na Itália? CAPÍTULO SEIS Benedict tirou o paletó e o pendurou junto com a gravata no ar­mário. — Se soubesse que estava acordada... — O que teria feito? Ficado para me fazer companhia, em vez de ir passear com a irmã? — Como sabe que saímos? Estava observando a gente? — Vi você e me perguntei por que será que me mandou para cama em vez de me convidar. — Cassandra, você parecia tão exausta durante o jantar que achei melhor deixá-la descansando. — Estou grávida, Benedict, não estou morrendo. Sou bem grandinha para decidir quando dormir. — Tudo bem! — Ele deu de ombros, tirou as abotoaduras e do­brou a manga da camisa. — Me perdoe por me preocupar com sua saúde! Da próxima vez, faça como quiser. — É isso que pretendo. E, neste momento, quero descobrir por que você está mais interessado em bancar meu pai do que meu ma­rido. Há uma semana não podia ficar sem minha companhia. Ago­ra faz tanta questão de ficar longe de mim que me sinto como se tivesse uma doença contagiosa. Ele soltou uma gargalhada alta e exagerada como ela nunca ha­via escutado antes e disse: — Não me lembro de ter conhecido essa pessoa. Que doença é essa? — Deixe de gracinhas, Benedict! Não combina com você. Em vez de ficar rindo, por que não me dá uma resposta convincente? Ele fez um esforço patético para ficar sério, mas quando falou a voz saiu tremida pelo riso contido: — Estou tentando, mas ver você sobre essa montanha de tra­vesseiros, como uma rainha caprichosa repreendendo seu súdito... Cassie caiu em prantos. — Que bom que está se divertindo. — Cassandra! Se você queria passear comigo e Bianca era só falar. — Ele sentou-se ao lado dela. Ela fungou o nariz e sentiu raiva por estar fazendo aquele pape­lão e por ter tão pouco controle sobre suas emoções ultimamente. — Não falei porque achei que fosse atrapalhar. — Claro que não. Bianca estava me falando de como gostou de você. — Ele pegou no queixo dela. — Por acaso alguém aqui fez você se sentir mal recebida? — Não, Bianca e Enrico são uns amores. Mas não vamos nos enganar, Benedict. Apesar de eles estarem se esforçando para não deixar transparecer, sua irmã e seu cunhado estão chocados. Fran­camente, como eu, eles não sabem o que esperar desse casamento pela maneira indiferente como você me trata. — Você acha que a estou tratando com indiferença? — Talvez o problema seja comigo: sou uma estranha numa ter­ra estranha e estou longe das pessoas que realmente se importam comigo. — Eu me importo, Cassandra. — Só porque estou grávida. — Não é verdade. Se acha que a razão de estar evitando sua presença é porque não quero sua companhia, é muito ingênua, isso sim. — Então vem para a cama, não vamos deixar que aconteça o que aconteceu duas noites atrás. — Não sei se entendi bem. — Posso ser ingênua, Benedict, mas não sou louca. Fui para a cama sozinha na noite do meu casamento, acordei depois da meia-noite e ainda estava sozinha, e o mesmo aconteceu na manhã se­guinte. — Não queria incomodar. Quando vim para o quarto, você dor­mia tão profundamente que achei melhor dormir no sofá do escri­tório. — Não estou dormindo agora. — Mas devia. Seu médico não ia gostar de saber que você está desobedecendo às instruções dele. — Também não ia gostar de saber que estou estressada porque meu marido me ignora. Ele não era um homem inseguro, mas Cassandra viu o olhar atormentado de Benedict e sentiu medo pelo que isso podia signi­ficar. Será que agora que estava inchada, com os seios enormes e com um surto de enjôo interminável ele estava com aversão dela? Ou arrependido de ter casado com ela? Ele levantou os ombros e desapareceu no closet em silêncio. Em seguida, ela escutou a porta do banheiro se fechar e o barulho do chuveiro. Quando ele retornou, ela apagou a luz do criado-mudo. Estava tensa e ansiosa. Sem dizer uma palavra, ele se deitou e ficou imóvel. Apenas alguns centímetros separavam o corpo de Benedict do de Cassan­dra, mas parecia um abismo. Sem poder suportar a situação, ela apoiou a mão no peito nu de Benedict. O coração batia e ele respi­rava, porém parecia mais morto que vivo, imóvel ao toque de Cassie. — Benedict, eu me sinto muito sozinha. — Você não está sozinha, Cassandra. Eu estou aqui. — Então me abraça. Me deixa sentir seu calor. Ele deu um abraço cauteloso e fraternal em Cassie. Carente, ela procurou o corpo dele como refúgio e o beijou no pescoço. — Não! — ele murmurou com a voz abafada. — Por quê? Você não me quer? — Estou morrendo de desejo, mas não posso ter você. Não ago­ra, não ainda. Não vou fazer nada que possa colocar sua gravidez em risco. — Mas você pode me tocar, não pode? — Ela tocou novamente o peito de Benedict, agora brincando com os mamilos dele. — A gente pode fazer carícias, beijar. — Já dei um beijo de boa-noite. — Não do jeito que fazia antes, quando parecia que me deseja­va insaciavelmente. — Ela se debruçou sobre ele. — Assim, olha. — E o beijou, passando a língua, lentamente, pelos lábios dele. — Você está indo longe demais, Cassandra! Por que não se contenta em apenas dormir a meu lado? Ela passou as mãos pelo abdômen de Benedict, e foi descendo; com os dedos acariciou suas coxas. — Acho que você merece mais do que apenas ficar deitado ao lado da sua mulher sem que ela lhe dê prazer. — Cassandra, eu imploro... — Ele estava ofegante, vivo. Vivo por ela! — Não fale nada, Benedict... — E foi descendo suavemente até que sua boca estivesse ocupada, beijando e lambendo o sexo de Benedict. Ele era delicioso e ela queria tudo que ele pudesse oferecer. Fi­cou lá durante bom tempo, brincando, provando, provocando-o. Benedict a agarrou pelos cabelos e estremeceu de prazer, en­quanto xingava e a ameaçava. Ele resistiu o quanto pôde, mas acabou derrotado, num espas­mo violento e incontrolável que chegou a seu apogeu após gozar na boca de Cassandra. — Satisfeita? — Ele sorria ainda ofegante, recuperando-se da explosão que o acometeu. Ela levantou a cabeça e olhou para ele. — Estou muito satisfeita. E você? Benedict soltou um daqueles xingamentos em italiano, só que dessa vez soou como música, como uma canção de amor. — Vem aqui. Me escute. Não é justo que só eu tenha prazer. — Também tive prazer ao lhe dar prazer. Basta agradecer e pronto, aceitar que, às vezes, dar prazer ao seu homem é um prê­mio para uma mulher. — Scusate, cara. Grazie e buona notte! Cassie sentia-se preparada para conhecer a sogra. Durante o vôo de hora e meia de Milão à Calábria, conseguiu decorar buono giorno, signora Constantino e Lieto di conoscerla que, segundo o livro que comprou, significavam “bom dia", “senhora Constanti­no" e “é um aprazer conhecê-la". Estava confiante de que no momento certo conseguiria pronun­ciar as palavras fluentemente. Sentia-se tão bem que podia até estudar japonês se quisesse! Nos 40 quilômetros que separavam o aeroporto da casa de Benedict, havia uma paisagem encantadora. No entanto, as pequenas estradas de terra, cheias de curvas e buracos, pareciam verdadei­ras montanhas-russas. Benedict dirigia como se estivesse numa corrida de fórmula-1. Ela se agarrou no banco do carona, rezando para que chegassem vivos ao destino. Fizeram apenas uma parada para comprar água e conversaram pouco durante á viagem. Apesar do tratamento bem mais afetuo­so, ele parecia preocupado e Cassie pôde entender o porque ao chegar na casa. Ao contrário da residência clara e arejada de Bianca, o palazzo Constantino era um lugar de arquitetura gótica e pesada, paredes altas e janelas estreitas. O jardim de frente para o mar era vasto, porém malcuidado. A fachada parecia uma prisão medieval de tão medonha. Não havia ninguém para recebê-los e Benedict não parecia sur­preso. — Depois pego as malas — disse ele, enquanto a conduzia por um saguão de pedra. O sol não conseguia penetrar no interior frio do lugar. De re­pente, uma voz gutural ressoou no ambiente e uma mulher apareceu no alto da enorme escada, no centro da sala. Ela falava italia­no, mas o tom rude em suas palavras deixou Cassandra arrepiada. Benedict não teve a mesma reação. — Trouxe minha esposa para você conhecer, mãe. Ela não fala italiano e também não vamos falar quando ela estiver presente. Cassandra, esta é minha mãe, Elvira. Antes que Cassie pudesse se recompor e recitar seu discurso, Elvira Constantino se aproximou, olhou para ela dos pés à cabeça com desdém e se virou para o filho: — Então, miofiglio, esta é a mulher de que me falou ao tele­fone. Sem se mostrar intimidada ou desanimada com tal recepção, Cassie revidou o olhar de maneira insolente. — Esta é minha esposa, Cassandra. Gostaria que você fizesse com que ela se sentisse em casa, Elvira — disse Constantino. — Não posso fazer milagres. A Calábria é para calabreses, e todo mundo sabe que estrangeiros custam a se adaptar ao nosso estilo de vida. Mas... vou fazer o possível. — Elvira tocou sua face na da nora e Cassie pensou que até o toque de um defunto teria sido mais cálido. — Então, quer se trocar antes de tomarmos um refresco? — El­vira perguntou dando mais uma olhada desinteressada em Cassie. Cassie tinha demorado horas escolhendo a roupa para causar boa impressão na sogra, vestia uma roupa sóbria e alinhada, sapa­tos baixos de couro, tão elegantes quanto os de Elvira. Mas o olhar de repulsa que recebeu fez com que Cassandra se sentisse um lixo. Ela murmurou humilhada: — Obrigada, é muita gentileza sua. Ignorando-a com uma piscada lânguida, Elvira tocou uma cam­painha. — Já deixei tudo arrumado para que você e sua esposa fiquem no quarto azul do terceiro andar, Benedict. Tem mais espaço que seu quarto de solteiro. Speranza pode mostrar o caminho a ela. — Por favor, não se preocupe. Posso esperar Benedict para su­bir comigo. — Isso não vai ser possível. Temos que conversar assuntos de família que não lhe dizem respeito — disse Elvira de forma curta e grosseira. — Os problemas que comentei ao telefone semana passada, Benedict, se intensificaram. Vamos ter que tomar atitu­des enérgicas para evitar que o problema se torne uma bola de neve. — Bianca me adiantou o assunto. — Ele seguiu a mãe e Cassie logo viu que Benedict já havia esquecido que tinha esposa. Bianca bem que havia avisado que os negócios vinham em pri­meiro lugar para os homens da família. Porém, reconhecer a verdade das palavras de Bianca não aju­dou a diminuir a sensação de abandono que se apossou dela ao se ver sozinha naquele lugar frio e inóspito. O quarto azul era um lugar sombrio, entulhado de móveis, com piso de mármore, cortinas escuras e um cheiro de mofo que im­pregnava o ambiente. Era o último quarto no final de um longo corredor e Cassandra sentiu pena da pobre senhora que a guiava. Speranza era pequenina e parecia ainda mais velha devido às costas arqueadas e à artrite. No entanto, era impressionante a agi­lidade com que subia as escadas. Era muito terna e tinha um sorriso natural, enquanto apontava para il balcone, do lado de fora do quarto, terminando o tour no banheiro da suíte. — // bagno — declarou orgulhosa. — Moderno, si? — Si — Cassie concordou, apesar da banheira parecer ter sido fabricada séculos atrás. — Grazie. — Prego! — Muito simpática, a velhinha sorria radiante. Ba­teu no peito e disse: — Sono Speranza. — Você é Speranza? — Si, si! Come si chiama! — Cassie. — Cassii. Eccellente! — Ela afagou o braço de Cassie e voltou ao serviço. Cassandra abriu as cortinas e ficou apreciando o jardim. Para sua surpresa, avistou Benedict tirando as malas do carro, com El­vira ao lado. Gesticulando muito, Elvira falava energicamente. Benedict respondeu secamente e Elvira deu um passo atrás com as mãos na cabeça, como se sentisse muita dor. Elvira resmungou algo e se virou para o pátio. De repente, olhou na direção da janela do terceiro andar. Apesar da distância, o olhar colérico de Elvira fez Cassie recuar e sair da janela. Cas­sandra não era supersticiosa, mas sentiu um mau presságio tão for­te que se arrepiou toda. Ao perceber a reação de Cassandra, Elvira abriu um sorriso es­cancarado e venenoso. CAPÍTULO SETE O rosto era o mesmo, mas aquela estranha que o insultava não se parecia em nada com a mãe que Benedict conhecia e que há ape­nas um ano o havia tratado com tanto carinho. O sarcasmo e a malícia agora eram uma constante na persona­lidade de Elvira e azedavam tudo à sua volta, incluindo a relação dos dois. Ele até poderia atribuir a repentina mudança da mãe à dor pela morte do marido, não fosse pelo fato de que ela era viúva há qua­tro anos. O período de luto já era para ter passado. — Não vou tolerar mais sua atitude ridícula com Cassandra. Aceite de uma vez por todas que ela é minha mulher! — Ele pôs um fim na conversa, saindo do escritório para o saguão, e subiu as escadas carregando as malas. — Nunca! Você ia casar com Giovana. — Esse era um sonho seu, não meu. — Você não ama essa americana! Quando olha para ela não há sinal de paixão em seus olhos. Você é um Constantino e ela nunca vai conseguir satisfazer suas necessidades. Não? Ele teve que conter um sorriso ao se lembrar da noite an­terior. — Como pode gostar de uma mulher tão pálida e desinteres­sante? Ele quase contou sobre a gravidez, mas decidiu esperar um mo­mento mais oportuno. — Não responde porque sabe que estou certa — disse a mãe triunfante. — Você casou com uma aventureira que só vai lhe tra­zer infelicidade. Quando podia ter casado com uma mulher decen­te da Calábria que o adora e sabe que papel desempenhar como esposa. — As relações afetivas não têm que fazer sentido para darem certo — ele disse enquanto subia as escadas. — Apenas se confor­me com o fato de que eu e Cassandra estamos casados. Se não con­segue entender, pelo menos tenha a delicadeza de ser simpática enquanto estivermos aqui. Ou terei que levar minha esposa de vol­ta para os Estados Unidos imediatamente. E aí você e Francesca vão ter que se virar sozinhas e limpar a sujeira que fizeram sem mim. De súbito, ela o agarrou com força pelo braço. — Desde quando você se tornou essa pessoa cruel que fala des­sa forma tão fria? Você não era assim! O que ela fez com você? Sou sua mãe. Eu imploro, em nome de seu falecido pai, não nos abandone quando mais precisamos de você! Apesar dos últimos ataques irracionais da mãe, o pedido que fazia agora era bastante coerente. As operações na Calábria esta­vam por um fio e tudo por culpa da mãe e de sua má administra­ção, que permitiu que os empregados chegassem a ponto de se re­voltar e sabotar os negócios da família, algo impensável quando o pai era vivo. O orgulho agora estava em jogo e Elvira faria tudo para que a honra da família não fosse manchada. O nome Constantino era re­verenciado na Calábria há séculos; ela preferia arder no inferno a entrar para história como responsável pela queda da família. — Já avisei, Elvira, é só tratar minha mulher com respeito e fa­rei tudo que estiver a meu alcance para resolver a crise. — Mas, claro! Ela vai ser minha nora do coração. Prefiro pagar para ver, pensou Benedict, enquanto subia os de­graus da escada que o levara ao terceiro andar e finalmente à suíte onde se encontrava Cassandra. Segundo Bianca, a mudança de hu­mor da mãe estava cada vez mais imprevisível e mais aguda, o que tornava as reações de benevolência e submissão altamente suspeilas. Ele encontrou Cassandra dormindo, de lado, com uma das mãos sob a cabeça e as pernas dobradas como se estivesse com frio. Não havia se atrevido a responder ao toque de Cassandra na noite passada por medo do que pudesse acontecer. Nem olhar muito para ela ousava mais. No entanto, agora ele se dava ao luxo de examiná-la por inteiro, pois tinha certeza de que, dormindo, Cassandra não tinha o poder de provocá-lo a ponto de ele perder a cabeça. Ansiava pelo dia em que poderia fazer amor com ela no­vamente, quando o risco de perder o bebê já tivesse passado. Ela parecia uma criança, vulnerável e doce; a boca macia e ino­cente. Com cuidado, ele se debruçou para tirar um fio de cabelo do rosto de Cassie e sentiu a textura delicada de sua pele. Olhou para o corpo, para os seios de Cassandra, para as curvas encantadoras da cintura, para as pernas elegantes; corpo de mu­lher grávida, como uma fruta madura e suculenta. Ele nunca a tinha visto totalmente nua, nem na noite em que conceberam o filho, mas mesmo de roupa dava para ver o contor­no delicioso do corpo de Cassandra, como uma prévia do que ele estava perdendo. Benedict sentiu a garganta seca. Ele desejava Cassandra mais que nunca. Tanto que sentia dor de tão excitado que estava. Queria beijá-la, tocá-la, prová-la até que ela estivesse com os olhos transbordando de paixão e supli­casse, sem fôlego, que ele a penetrasse para apagar o incêndio que a consumia. Com ela Benedict era um homem insaciável, desde o primeiro momento em que a viu. Era isso que a fazia diferente de todas as mulheres que conhecia. E se ele não fosse tão pragmático, diria que fora obra do destino, e não de Núncio Zanetti, os dois terem se cruzado. Cassandra se espreguiçou e murmurou algo, esticou as pernas, em seguida se virou de bruços e acariciou a barriga, onde o filho dormia. Se fosse menina, seria linda como a mãe? E se fosse menino, será que seria alto como o pai? Eles teriam mais filhos, feitos com amor e paixão? Como se os pensamentos de Benedict tivessem penetrado em seus sonhos, Cassandra piscou e abriu os profundos olhos azuis, mexendo a cabeça de um lado para o outro e estudando o ambiente ao redor. Ao se deparar com o mundo real, franziu as sobrance­lhas, arrependida de ter deixado o mundo dos sonhos. — Há quanto tempo você está aí? Ele passou a mão pelo rosto de Cassie, com carinho. — Acabei de chegar, cara. — Por dentro se questionava se trazê-la para o palazzo tinha sido a coisa certa a fazer. Não bastasse ter que enfrentar uma gravidez de risco, ainda precisava aturar uma sogra que parecia estar perdendo a razão. Ela não merecia isso, pensou ele. Cassandra lambeu os lábios e olhou ao redor. A luz que pene­irava pela persiana das janelas já era fraca. — Que horas são? — Seis. — Tão tarde? Por que não me acordou? Não tinha que me en­contrar com você lá embaixo uma hora atrás? Aposto que sua mãe deve estar cansada de esperar. — De jeito nenhum. Minha mãe vai entender. — Ele lhe deu um beijo. — Sua mãe parece não querer entender nada, no que diz respeito a mim. Parece que ela escolheu me odiar antes mesmo de me conhecer. — Não é nada pessoal com você, ela só não esperava que eu me casasse com uma americana, só isso. — Não perca seu tempo tentando me convencer, Benedict, eu vi o jeito como ela me olhou quando fomos apresentadas. Se pu­desse, tinha aberto um buraco no chão e me jogado lá dentro. — Mas ela não tem esse poder, nem o de se meter na minha vida. Casei com você porque quis e mesmo que tenha sido algo inesperado e chocante para ela, com o tempo minha mãe vai se acostumar com a idéia. Você vai ver que ela não é tão má assim. — Ele então a puxou para fora da cama. — Por que você não lava o rosto antes da gente se encontrar com ela no salão? Aí vai ver que o que estou dizendo não é só para agradar você. — Vocês se arrumam para jantar aqui? — Geralmente, sim. — Então vou levar mais que alguns minutos para ficar pronta. Não vou descer parecendo uma jeca e dar mais uma razão para ela me menosprezar. Considerando as reações adversas de Elvira pelos motivos mais triviais, Benedict não retrucou. — Tome o tempo que precisar. Esta é sua segunda casa, Cas­sandra, e se minha mãe tem algum problema com isso, pode dei­xar que eu resolvo. — Já estou causando desavenças entre você e sua mãe, Bene­dict. Não quero criar mais problemas. — As desavenças começaram antes de você entrar na história, cara. Ultimamente, parece que eu e minha mãe não conseguimos nos entender. — Ele a empurrou gentilmente e sorriu. — Vai fazer o que tem que fazer. — As malas já estão aqui em cima? —"Si. Eu mesmo trouxe. Estão no outro quarto. — Se incomoda de pegar uma roupa que seja apropriada para a ocasião na minha mala, enquanto tomo um banho? — Sem problema. Uma das suas saias longas e uma blusa vão estar mais que apropriadas. — Obrigada, Benedict. — Porque estou ajudando minha esposa a desfazer a mala? — Por isso e por ser tão compreensivo. Vou tomar um banho rápido. — Não precisa ter pressa, cara — ele disse, com receio de que ela fizesse tudo correndo e acabasse escorregando e caindo ao en­trar ou sair da banheira. Ele desejou estar lá para ajudá-la e ensaboá-la dos pés à cabeça; tomar banho com ela, sentir o corpo relaxado de Cassandra sobre 0 dele e envolvê-la com os braços. Queria poder acariciar os seios de Cassie, sua barriga, seu um­bigo, tocá-la entre as pernas e só parar quando ela gemesse de prazer. — Benedict, tem alguma coisa errada? — Imagine, cara. Aproveite seu banho de banheira. A gente geralmente leva uma hora comendo o antepasto antes do prato principal, e como eu e mamãe demoramos mais do que tínhamos planejado discutindo sobre os negócios, nem vamos começar o jantar no horário certo. Vou deixar a roupa em cima da cama e volto em meia hora, está bem para você? — Voltar? Por quê? Aonde vai? — Tomar banho no meu quarto de solteiro, assim você tem mais privacidade. — Se continuar me mimando, vou achar que esse casamento foi o melhor negócio da minha vida. Antes que os hormônios o fizessem perder o controle, ele pro­curou ficar o mais afastado possível de Cassandra. — Guarde os elogios para outra ocasião e vá tomar seu banho, senão vamos nos atrasar para o jantar. Sem notar o desconforto de Benedict, Cassie deu um sorriso maroto e entrou no banheiro. Elvira Constantino estava usando um vestido preto impecável v uma cruz de ouro ao pescoço. Não estava sozinha quando Bene­dict apareceu no salão com Cassandra. A jovem que a acompanha­va se parecia tanto com Benedict e Bianca que Cassandra concluiu que era a irmã mais nova, Francesca. — Finalmente — exclamou Elvira dando mais um daqueles beijos frívolos na face de Cassandra. — Desculpe por fazer vocês esperarem. Acabei caindo no nono. — Não precisa se desculpar. Depois de horas de viagem só para nos conhecer, uma sesta é mais do que compreensível. — Era vi­sível o esforço de Elvira para pronunciar tais palavras. Benedict levou Cassandra até a irmã. — Quero que conheça a caçula da família, cara. Francesca, esta é minha esposa Cassandra, e quero que faça com que ela se sinta em casa. Francesca olhou nervosamente para a mãe como que pergun­tando o que dizer. Elvira respondeu: — Francesca está tão ocupada quanto você estará em breve, Benedict. Acho que sua mulher terá que se virar sozinha. — Neste caso, vou ter que deixar de lado algumas das minhas obrigações para dar atenção a minha esposa, porque não vou dei­xá-la abandonada. — O tom era amigável, mas ficou claro que fora uma repreensão à mãe. — Claro que não, meu filho. Todos nós vamos fazer de tudo para mantê-la entretida. — Não se preocupem comigo. Posso me virar sozinha — disse . Cassie, cansada de ser motivo de discussões entre Benedict e a mãe. — Já sabia desde o início que a lua-de-mel ia ser de negócios para Benedict e não espero que ninguém fique me pajeando. — Como Francesca ainda parecia incerta de como se comportar, Cassandra estendeu a mão, sorriu e pôs em prática o pouco de ita­liano que havia estudado. — Lieto di conoscerla, Francesca! Francesca sorriu, mas Elvira deu uma gargalhada maldosa. — Como você disse, Benedict, sua mulher realmente não sabe nada de italiano. Cassie não se intimidou e respondeu: — Mas estou disposta a aprender. Já é alguma coisa, não? — Si, claro. Já é alguma coisa. Francesca, mostra a nossa con­vidada a vista. Vou chamar Speranza e pedir que traga o antepasto e o vinho. — Muito prazer em conhecê-la — Francesca sussurrou. Em se­guida, levou Cassandra até a varanda, onde o panorama, do mar e do céu crepuscular com o sol se pondo no horizonte, era de tirar o fôlego. — Por favor, Cassandra, não leve a sério o que mamãe fala às vezes. As mães da Calábria são muito ciumentas de seus filhos e mamãe tinha outros planos para Benedict. Antes que Cassie tivesse tempo de perguntar que planos eram esses, a porta de entrada da casa se abriu e a resposta foi dada pela jovem que entrou, doce e simples. Elvira foi até ela e a abraçou com carinho. — Esta é Giovana — murmurou Francesca. — O outro plano de sua mãe? — Si. Sinto muito. — Ela está apaixonada por Benedict? — perguntou Cassie, en­quanto a garota cumprimentava Benedict com dois beijinhos no rosto. — Tenho a impressão de que toda mulher solteira da Calábria é um pouco apaixonada por Benedict, e algumas das casadas tam­bém, para ser sincera. Mas não se preocupe, porque Giovana nun­ca vai se meter entre você e meu irmão. Ela é muito boa. Era linda também, com um rosto angelical. Ao se aproximar de Cassie e de Francesca, ela deu um sorriso que parecia ser bastante sincero. — Você é a Cassandra do Benedict e eu sou Giovana. — O in­glês de Giovana era bem melhor que o de Elvira. — Bem-vinda a Calábria. — Ela se sentou à mesa, ao lado de Cassandra, e pergun­tou sobre a viagem de avião se gostou de Milão e o que achava da Itália até então. — Se quiser um tour pela Calábria, me liga, será um prazer lhe mostrar os lugares. Francesca tinha razão, a mulher não representava perigo para o casamento de Cassie e Benedict. O perigo era a própria mãe, que agora a olhava com desdém. Alguns minutos depois, Speranza entrou no salão empurrando um carrinho de madeira com uma garrafa de vinho, uma tigela com uma variedade de peixes defumados, azeitonas e legumes marinados e pequenas rodelas de salame. — Tudo especialidade da terra — explicou Francesca. — As azeitonas foram colhidas no jardim. Estavam uma delícia. No entanto, o cheiro do salame e das azeitonas recheadas com pimentão, banhadas no azeite, deixou Cassie subitamente nauseada. Elvira percebeu que Cassandra não havia tocado no salame e nas azeitonas e fez um comentário maldoso. — Não gostou da comida, Cassandra? — Não é isso. É que estou sem fome — respondeu Cassandra enxugando o suor que escorria da testa. Benedict notou o mal-estar de Cassandra e ofereceu-lhe um copo d'água com uma fatia de limão. — Toma, cara. Vai lhe fazer bem. — Dio mio! Você também não gosta do nosso vinho! — Elvira pôs mais lenha na fogueira. — Não é o seu vinho, mas qualquer vinho. — Ah, você tem problema com bebida alcoólica! — Elvira fa­lou, exultante; havia encontrado mais um defeito na mulher do filho. — Não sou alcoólatra, se é o que está insinuando. Apenas evito tomar álcool e achei que você entenderia. — Como poderia entender se mal a conheço? Até poucos dias nem sabia de sua existência. Como posso saber do que você gosta ou não? — Pare de pressionar Cassandra, mãe! Ela não quer vinho e pronto. Arranja outro assunto para falar! Cassandra teria ficado comovida com a resposta rápida e dura de Constantino em sua defesa não fosse pela forte suspeita de que ele havia, na verdade, escondido da mãe o fato de que Cassandra estava esperando um filho dele. Foi impressionante o impacto que as palavras de Benedict ti­veram em Elvira, que sentou na cadeira mais próxima, comple­tamente submissa. Elvira voltou a falar com uma candura cho­cante: — Espero que esteja satisfeita com as acomodações, querida. O terceiro andar é pouco usado, mas pensei que, estando em lua-de-mel, vocês teriam a privacidade de que precisam. — É... muita bondade sua — respondeu Cassie, surpresa com a inesperada delicadeza da sogra. — Mas claro. Você é mia nuora, como se fala em inglês? My daughter-by-lawl — Daughter-in-law — corrigiu Francesca. — Pois então — continuou Elvira. — É uma mudança radical vir para um país onde não se fala a língua, com costumes tão dife­rentes. Ainda por cima, com um fuso horário de nove horas de di­ferença da Califórnia. Posso ver que você está muito fatigada. Eu devia ter providenciado algo mais leve para você comer e marca­do o jantar para mais cedo. Cassie aproveitou a deixa para falar sobre a gravidez: — Não é só a viagem e o fuso horário, mas também por causa da... Mas Benedict a interrompeu. — Cassandra também teve uma semana cheia em São Fran­cisco que a deixou completamente exaurida. Ela tem um negócio muito bem-sucedido por lá, mas que também toma muito de seu tempo. Teve que deixar tudo em ordem para a sócia, enquanto estiver fora. Se mudar o rumo da conversa era sua intenção, Benedict havia atingido o objetivo, e durante todo o tempo em que estiveram es­perando pelo prato principal Cassandra foi bombardeada de per­guntas por Francesca e Giovana, que queriam saber tudo sobre a Califórnia e sobre a vida de Cassie. Já era tarde da noite quando o jantar foi servido. A sala de jantar linha móveis pesados e muito ornamentados e ricos tapetes aveludados nas paredes. A mesa, com lugar para 20 pessoas, esta­va arrumada com louça de prata e copos de cristal enormes e pe­sados. Cassie tomou seu lugar e pensou que só faltavam os trajes de época e um trovador tocando bandolim debaixo da sacada. A conversa estava bastante animada. No entanto, Elvira passou a maior parte do tempo indiferente ao que acontecia. Uma ou duas vezes encarou Cassie, sem demonstrar hostilidade ou ternura. Ela parecia não se lembrar daquela estranha ali sentada à sua mesa. Pouco antes de o cafezinho ser servido, Elvira se levantou, de re­pente, e sem dizer uma palavra retirou-se. Claramente irritado, Benedict perguntou: — Aonde vai, mãe? — Para a cama. Estou com dor de cabeça e preciso me deitar. Francesca comentou: — Ela tem reclamado com freqüência de dores de cabeça, há algum tempo. — Ela foi ver um médico? — Benedict perguntou. — Sugeri mais de uma vez, mas ela insiste que é o estresse, e é verdade que ela está sob muita tensão. As coisas aqui vão de mal a pior. — Bianca já me deixou a par, mas Cassandra não precisa ser incomodada com esses assuntos. — Não vejo por que não, se agora também sou parte da família — disse Cassie. — Você já tem problemas demais, cara. Já basta minha mãe descontando os problemas em você. — Mas talvez possa ajudar. — Não. — Benedict, você mesmo disse que sou uma mulher de negó­cios experiente. Pelo menos me dê uma razão para não aceitar mi­nha ajuda. — Você é minha mulher e como seu marido estou dizendo que não quero você envolvida nisso. Esta razão basta. Boquiaberta, Cassandra levou alguns instantes para se recupe­rar do choque: — Como é que é? — Você não está nos Estados Unidos, Cassandra. Aqui as mu­lheres sabem seu lugar. — Sabem seu lugar? — Ela olhava para ele sem acreditar em seus ouvidos. — Exatamente. E não é ao lado do marido quando o assunto é negócios. — Que pena você não ter me dito isso antes de a gente se ca­sar... que a idéia que tem de esposa é da típica subserviente, embuchada, lavando sua cueca no tanque. Posso garantir que nunca te­ria me casado com você. — Agora é tarde demais para isso, não acha? — Nunca é tarde demais! Pode acreditar, Benedict. Giovana sussurrou: — Vamos, Francesca, vamos tomar nosso café no salão. — Não precisa. Faço questão de sair e deixá-los à vontade. — Mas vocês estão em lua-de-mel! Benedict, por favor, diga alguma coisa. — Não importa, Francesca. Ele já foi franco o suficiente e já disse tudo o que tinha para dizer. Já tive o bastante da hospitalida­de dos Constantino para um dia só. Vocês fiquem à vontade e des­frutem da companhia do patriarca. O patrão é todo de vocês! CAPÍTULO OITO Ele apareceu na suíte 15 minutos depois. Ela já estava de camisola, sentada à penteadeira, e escovava os cabelos, furiosa. — Precisamos conversar — ele anunciou. — Sei que não gos­tou do jeito abrupto como me comportei lá embaixo e... — Abrupto? Que tal tirano, rude, detestável, autoritário, pa­tético? Ele parecia estar sofrendo. — Cassandra, você não foi à única a ter problemas hoje. Eu também estou a ponto de explodir e sem nenhuma paciência para outra mulher com crises temperamentais. Então, por favor, fique quieta até ouvir tudo o que tenho para dizer e depois, se ainda tiver vontade de me enfiar a mão na cara, tudo bem. — Este deve ser o único jeito que as mulheres daqui encontram , para se vingar dos maridos machistas, mas de onde venho escolhe-; mos formas mais civilizadas de revidar. — Não vejo a hora de conhecer esses métodos, mas enquanto isso me deixe explicar e esclarecer o que tinha começado a falar quando você saiu da sala de jantar. — Benedict, eu estava totalmente furiosa. Do contrário nunca teria feito aquele escândalo na frente de pessoas que acabei de co­nhecer. E, para variar, você se comporta como se minha presença o incomodasse. — Cassandra, já casamos e vamos continuar casados, pelo me­nos enquanto você estiver carregando meu filho. — E depois disso, pretende fazer o quê? Mandar-me para um convento? — Talvez até antes, se achar necessário. — Pelo menos assim você não ia ter que explicar para sua mãe que estou grávida, não é? Por que esconder isso, Benedict? Tem vergonha que ela descubra que você não é o filho perfeito que ela pensa que é? — Eu estou protegendo você, Cassandra. Primeiro, quero que ela se acostume com a idéia do casamento. Você é inteligente o bastante para perceber que ela não está nem um pouco satisfeita, e não vejo sentido em piorar ainda mais a situação, principalmente porque a única prejudicada vai ser você. — Por que só eu? Para fazer uma criança são necessárias duas pessoas, se é que você esqueceu. — Não me esqueci de nada nem quero continuar discutindo com você. Por favor, dá para ficar quieta e prestar atenção no que vou dizer? — Por favor digo eu! Pare de me tratar como uma gueixa! — Gueixa? Não sei o que significa. O que é gueixa? — Ele realmente não conhecia essa palavra. — Mulher submissa que só serve para servir a seu amo. — Interessante — ele respondeu pensativo. — Bom, voltando ao assunto, eu estava tentando explicar algo sério, mas você con­tinua fugindo pela tangente. Aqui não é São Francisco, Cassandra. Nem mesmo Roma ou Milão. É uma parte antiquada da Itália, que se prende a costumes de centenas de anos e que em muitos aspec­tos está há anos-luz do resto do país, principalmente nas atitudes e no modo de vestir. As mulheres da Calábria, em geral, preferem manter os papéis tradicionais de mãe de família. — Jura? Acho que esqueceram de dizer isso para sua mãe. — Minha mãe nunca havia se metido nos negócios até ficar viúva. Se tivesse outro irmão ou se Francesca fosse casada, o ma­rido dela tomaria o controle dos negócios. Como ela estava mais familiarizada com todo o processo local de produção e negociação que qualquer outra pessoa, acabou substituindo meu pai. Achei compreensível no início, porque os empregados sempre foram muito prestativos e leais. Tinha todas as razões para acreditar que tudo ia correr bem. — Mas sua mãe acabou trocando os braços pelas pernas... — Nos últimos meses, nosso produto mais valioso não cresceu como esperado. Para piorar, nossos pomares foram destruídos por vândalos, o que prejudicou a colheita do próximo ano. Não preci­so explicar quais as conseqüências disso. — Destruição de propriedade privada é realmente algo muito sério... é crime. Essas pessoas são perigosas e claro que qualquer um que queira tomar alguma atitude pode estar ameaçado. — Não estou preocupado comigo, mas com você. Por isso, não quero que se exponha. É mais seguro. A irritação de Cassandra diminuiu com o argumento de Benedict. — Quem são esses vândalos? — Acho que é retaliação de alguns empregados sem escrúpulos i que estão insatisfeitos. — O que vai fazer? j — Terei que mudar as regras, por aqui. Talvez a gente tenha que ficar mais tempo do que o planejado. — Não está pensando em tomar o lugar da sua mãe no coman­do, está? — Meu lugar não é aqui. Mas a produção é nossa principal fon­te de renda e, sem ela, vamos ter de procurar outra forma de sobre­viver. — Nossa não sabia que a situação era tão grave. Se o problema for dinheiro, talvez eu possa ajudar. — De jeito nenhum! Também não casei por causa de seu di­nheiro. — Mas você não tinha idéia do meu dote. Minha avó me deixou uma boa herança. — Isso não é problema seu e não vou deixá-la gastar um tostão. — A quem vai pedir socorro? À polícia? — Não. — Ele pegou a escova e começou a penteá-la. — Esta é uma cidade pequena, todo mundo está ligado por parentesco ou por casamento. Mesmo que nós identificássemos e denunciasse- I mos os envolvidos, só íamos ter problemas. Um homem atrás das grades não pode ajudar a sustentar a família e família, neste lado do mundo, é algo sagrado. — Vai deixar esses caras se safarem? Você está procurando mais problemas... — Os Constantino sempre se defenderam sem pedir ajuda a ninguém. Até recentemente, nossos empregados sabiam que po­diam contar conosco e que seriam tratados com respeito. Tenho que provar que essa tradição não foi abandonada. — E por que eles acreditariam em você? — Nasci e cresci aqui. Entendo essas pessoas e elas me enten­dem. No passado, havia muita confiança entre nós. Tenho que mostrar que não vou puni-los, mas sim restabelecer essa relação de cumplicidade. Quando conseguir isso, vou ter forças suficien­tes para enfrentar qualquer um que esteja destruindo a colheita. — Não gosto nada dessa história. Você está se arriscando. — Eles não são tão perigosos quanto minha esposa, quando está invocada. Benedict era autoritário e prepotente, às vezes, mas era seu ma­rido, pensou Cassie. Só de pensar que ele pudesse correr algum risco de vida a deixou com medo. — Você devia ter me dito isso antes. — Preferia nunca ter lhe contado. Nossa lua-de-mel já está sen­do muito prejudicada. Ela se inclinou e descansou o corpo sobre ele. — Os casais também compartilham seus problemas, Benedict. Por alguns minutos, ele massageou os ombros e o pescoço de Cassie. — É mais que isso, cara mia — disse com voz rouca, e ela no­tou que ele falava com desejo. — Eu sei — ela respondeu, e pegou a mão de Benedict, guiando-a para o meio de seus seios. A mão permaneceu lá, apertando-a com tanta sensualidade e anseio que Cassandra ficou molhada de imediato. Ela gemeu e abriu os olhos, fitando o espelho, pasma com sua aparência ofegante, rosto corado, olhos flamejantes. Sabia que seu coração não era o único que estava disparado. Ele puxou a camisola até a cintura de Cassie, encarando-a pelo espelho, extasiado por saber que a estava deixando louca de prazer. — Não pare Benedict! — ela implorou num suspiro desespe­rado. Ele beijou o pescoço de Cassandra e sussurrou palavras em ita­liano que ela não precisava entender para saber que era a língua do amor... da forma mais explícita. Ela pôde sentir o sexo rijo de Benedict tocando suas costas. Ele baixou a cabeça e os lábios buscaram os seios de Cassandra, lambendo-a do pescoço até o mamilo e chupando delicadamente o bico de um seio rijo de prazer. Ela sentiu cair uma gota de saliva da língua e uma lágrima do olho. Contorceu-se toda no banco da penteadeira. Sentiu como se arcos de calor contornassem sua alma. Cassandra tentou virar-se, mas ele a segurou forçando-a contra seu membro duro e ereto, abaixou ainda mais a camisola e espa­lhou as mãos pela barriga de Cassie. — Benedict... — Ela passou as mãos por trás das pernas dele e subiu até a bunda dura e masculina e lá ficou, acariciando-a. Ele gemeu dessa vez, soltou um som primitivo, ferino. E então passeou por entre as pernas de Cassie, que se abriu toda, dando passagem, incapaz de resistir à invasão quente das mãos de Benedict. Ele explorou as dobras sedosas e úmidas da carne de Cassie até encontrar seu centro, que pulsava de prazer. Foi necessário apenas um toque para que ela tivesse uma con­vulsão: prismas coloridos invadiram sua visão e seus sentidos. O corpo quente ficou tenso, mas depois relaxou completamente. Contorceu-se novamente. Outra vez e mais, até sentir que a tor­tura sublime a faria desmaiar. No entanto, a reação de Cassie deixou Benedict assustado. Ele levantou-se rapidamente e abraçou Cassie com força. — Estou bem, não se preocupe. —Não tinha o direito de fazer isso. — Tinha todo o direito do mundo, sou sua mulher. O que acon­teceu é perfeitamente normal. — Não. Você podia ter perdido o bebê. — Benedict, a gente vai ter um bebê muito saudável. — Você está sentindo alguma coisa? — Me sinto amada. — Nenhuma eólica ou enjôo? — Apenas uma satisfação dolorosa, mas acho que isso é permi­tido. — Não me casei com você por sexo, mas porque você está es­perando um filho meu, e se por culpa minha você perder esse bebê... — O quê? Você anularia o casamento no dia seguinte? — Nunca me perdoaria. — Bem, Benedict — Cassie vestiu a camisola —, sinto dizer que a natureza se encarrega do destino dos seres humanos. Só por­que a gente tem que tomar cuidado com nosso filho não significa que tenha que me tratar como se eu fosse de porcelana. — Não quero correr riscos, e enquanto o médico não disser que está tudo bem, não farei nada que a deixe assim. Era impressionante como ele conseguia metamorfosear sua paixão em frieza e pragmatismo. Deprimida, ela saiu da cadeira e foi ao banheiro. Estava disposta a dar tudo de si para ele e espera­va o mesmo. Porém, Benedict estava determinado a permitir que ela conhecesse apenas uma amostra dele mesmo, que, apesar de surpreendente e alucinante, não era suficiente. Enquanto escovava os dentes, se perguntava se não estaria pe­dindo demais, se seria sua generosidade de mulher que simples­mente não podia ser entendida ou correspondida pelos homens. Quando voltou para o quarto, Benedict já não estava lá. O úni­co consolo de ter sido abandonada foi saber que ele não conseguia resistir à forte atração que sentia por ela. No dia seguinte, eles estavam tomando café quando Cassie ex­pressou sua vontade de passear pelo vilarejo e comprar alguns itens para o enxoval do bebê. — Não — respondeu Benedict. — Como assim, não? — Ela olhava para ele indignada. — Absolutamente não. Eu proíbo. Aquele era o mesmo homem que com um simples toque havia levado Cassandra ao delírio, na noite passada? Que havia mostra­do um lado tão carinhoso que a fez se apaixonar perdidamente por ele? — Benedict, antes de qualquer coisa, não permito que me proí­ba de alguma coisa. Além disso, não tem nada para fazer nessa casa. — O centro fica longe demais para você ir caminhando e, mes­mo que não ficasse, duvido que encontre o que está procurando. — Posso pegar seu carro e ir até a cidade mais próxima. — Não. — Você está com medo que arranhe seu carro? Que receba uma multa por excesso de velocidade? — Não — ele falou indiferente, como se não tivesse ouvido uma palavra do que Cassandra dizia. — Droga, Benedict! — Ela bateu com a mão na mesa. — É só isso que você sabe falar? Não conhece outra palavra? — Assim que tiver um tempo livre, eu a levo para fazer com­pras, Cassandra, se é isso que quer. — Sou perfeitamente capaz de me localizar com a ajuda de um mapa e tenho carteira internacional de motorista. Qual é sua real objeção? — Não quero você andando por aí sozinha. — Porquê? — Achei que tivesse sido bastante claro, ontem à noite. — Posso muito bem passar por uma turista. Não está escrito na minha testa que sou a mulher de Benedict Constantino. — Ainda não estamos na temporada turística e você é branca e loura demais para passar despercebida. — Mas... — Mas nada! Estou preocupado com sua segurança, Cassan­dra. Não quero você sendo alvo de... nenhum ataque. — Ataque? Você tem medo de que me seqüestrem? — Ela con­trolou o riso, pois ele não estava brincando. — Tem medo que eu seja seqüestrada? — É exatamente do que tenho medo. — Quer dizer que sou prisioneira neste lugar? — Vá passear nos jardins, curtir a praia particular. — Ele aca­bou de tomar o café e se levantou da cadeira. — Tenho que ir. Por favor, Cassandra, não saia do palazzo. Já me preocupo demais com você. — Foi por se preocupar comigo que me deixou dormir sozinha ontem à noite? — Sabe muito bem por que não dormi com você ontem à noite. Na verdade, ele parecia não ter pregado os olhos a noite toda; tinha olheiras e o rosto cansado. Cassie sentiu-se envergonhada por tê-lo irritado com caprichos. Ele já tinha preocupações de­mais. — Sim, eu sei, mas gostaria que você pelo menos dormisse na mesma cama que eu, Benedict. Nós não podemos fazer amor, mas pelo menos podemos passar a noite juntos, já que quase não nos vemos durante o dia. — Dormir a seu lado sabendo que não posso fazer amor com você exige de mim um esforço sobre-humano, mas vou tentar. Agora entenda que não quero bancar o marido tirano só para hu­milhá-la. — Eu entendo e sei que você tem razão de estar preocupado. Ele a beijou na boca. — Promete que vai ficar aqui até eu ter um tempo para sair com você? Além de tudo que lhe falei, você viu como as estradas daqui são horríveis? — É verdade! Meu estômago quase saía pela boca todas as ve­zes que você acelerava e quase tive um treco no coração quando viramos aquela curva e demos de cara com um burro no meio do caminho. — Mais uma razão para você não dirigir sozinha. Acredite em mim, Cassandra, só quero o melhor para você. — Confio em você. Pode confiar em mim também. Prometo que não vou sair. — Obrigado. — Por um instante ela achou que Benedict ia bei­já-la, pois ele segurou seu rosto, mas no último momento ele se afastou. — Nos vemos à noite. — Você não vem almoçar? — Quero adiantar o trabalho para ter o fim de semana livre com você. Quero levá-la para minha casa de veraneio na Sicília. A viagem nunca aconteceu e a estada que estava prevista para apenas 15 dias acabou se estendendo por quatro semanas. Pelos breves comentários de Benedict, ainda havia muito trabalho pela frente até que os pomares estivessem plenamente recuperados. Para evitar mais problemas, Cassie desistiu de perguntar quando voltariam para os Estados Unidos. Para aliviar o tédio e arranjar algo para Cassie se ocupar, Bene­dict pediu a Bianca que comprasse acessórios de costura e tricô. Cassandra trabalhava às escondidas, para que ninguém descon­fiasse da gravidez, mas a atividade a ajudou a sentir-se útil. Foi terapêutico para Cassie, pois depois que começou a tricotar já quase não via Benedict e começou a pensar que ele a estava evi­tando propositadamente. Quando estavam juntos, ele parecia tão ausente que, mesmo dormindo na mesma cama, ela continuava sentindo-se sozinha. Não faltava nada que fosse material e ele sempre dava um beijo nela antes de dormir e pela manhã. Mas nenhum carinho mais ín­timo ou corpo quente envolvendo-a durante a noite. Sabia que não podiam fazer amor, mas não entendia por que não podia receber os carinhos do marido. Ele estava mais estranho e distante agora do que na noite em que fizeram amor pela primei­ra vez. Se raramente via o marido nos últimos dias, o mesmo não podia dizer da sogra. Era só Cassandra sair da suíte para Elvira surgir das sombras, silenciosa e carrancuda. Para escapar da atmosfera opressora da casa, ela passava a maior parte do dia na praia. Era seu paraíso, o único lugar onde realmente encontrava paz e a sensação de liberdade. Longe da casa, debaixo de uma barraca, trabalhando no enxoval do neném, pegava sol e nadava no límpido mar azul. No entanto, quando maio chegou, a temperatura subiu muito e para evitar o calor Cassandra passou a ficar mais tempo no palazzo, refugiando-se no andar de cima. Mas começou a sentir falta de sua casa e dos amigos. Ocasionalmente, ela falava com Trish por telefone, mas o úni­co aparelho da casa ficava bem no corredor de entrada. Era quase impossível ter uma conversa em particular, com Elvira sempre xeretando por perto. — Está se divertindo? — perguntou Trish. — Mais alguns dias aqui — Cassie sussurrava olhando ao redor para ver se ninguém estava ouvindo — e vou estar andando de quatro e uivando para a lua. — Problemas com a sogra? — Essa mulher é uma víbora. A maior parte do tempo está soltando o seu veneno, às vezes até parece que está drogada. — E as irmãs? — Ah! Francesca é uma gracinha e Bianca também. Se não fos­se por elas, eu e Elvira já estaríamos numa guerra sangrenta. Mas as duas estão ocupadas com os negócios da família, assim como Benedict. — Agüenta firme, amiga! Logo tudo vai estar em paz. E não se preocupe com as coisas aqui. Estão todos morrendo de saudades, mas estamos suportando bem e os negócios estão indo de vento em popa. É, de vento em popa, sem ela! Então, quando achava que as coi­sas não podiam piorar, Benedict veio com a notícia: — Vou ter que deixá-la por uns dias, Cassandra. Preciso resol­ver umas questões fora da Calábria. Ela estremeceu, pois notou de imediato pela expressão sombria de Benedict que as "questões" era encontrar-se com os mafiosos. Cassandra começou a chorar descontroladamente. — Não agüento mais isso! Já suportei o bastante, Benedict! Você casou comigo e me trouxe até aqui para o bem do bebê e porque acreditava que a família estava em primeiro lugar. Aqui estou, escondendo minha gravidez para não arranjar confusão. E agora tenho que me preocupar com a vida do meu marido, porque é orgulhoso demais para procurar a polícia? — Tem que ser assim — ele respondeu tentando abraçá-la. Cassie o rejeitou com raiva e limpou as lágrimas. — Não vou ficar aqui esperando que tragam você morto e ficar viúva sem nem mesmo saber como é ser uma esposa de verdade. Ele sentou no canto da cama e pôs a cabeça de Cassandra no colo. Ela não resistiu dessa vez e se deitou. — Não desiste da gente agora. Depois que esse último assunto estiver resolvido, vou levar você para casa. Você vai estar de volta à sua terra antes de o bebê nascer, prometo. — Promete que vai estar lá também? — Claro, é meu filho também. Se ele ao menos tivesse dito "Porque eu te amo", ela teria ce­dido a tudo que ele pedisse. Mas de que servia desejar o impossí­vel quando era óbvio que o amor não estava em questão? — Me deixe em paz, Benedict. — Não, já faz tempo demais que não tenho você em meus bra­ços, que não a beijo... Bastou um beijo para que ela se derretesse toda. Sabia que iria odiar os dois por ter sido a boba apaixonada de sempre. No entan­to, só pensava em satisfazer sua fome de amor. Precisava que ele a envolvesse nos braços como se ela fosse a criatura mais preciosa do mundo; que suplicasse com a boca pelos beijos dela: era só o que importava no momento. Amanhã ela se odiaria por isso e a ele por tê-la abandonado. Mas só amanhã. CAPÍTULO NOVE Benedict partiu na manhã seguinte e por três dias e três noites ela foi consumida pelo medo de que algo acontecesse com ele. Na tar­de do quarto dia, Cassandra não agüentava mais a solidão: desceu para a cozinha com seu dicionário debaixo do braço, em busca de Speranza. A cozinha era equipada com muitos aparelhos elétricos e uten­sílios modernos, mas parecia ter séculos. Cabeças de alho e pi­mentas secas decoravam as paredes, o forno era à lenha e as pane­las de ferro ficavam penduradas por ganchos em cima do fogão. Cassie achava aquele o lugar mais alegre da casa. Speranza estava sovando uma massa na enorme mesa, no centro da cozinha, e limpou as mãos no avental quando viu a vi­sitante. — Lm disturbo? — perguntou Cassie. — No! — A senhora simpática abriu um sorriso de boas-vindas e com gestos efusivos fez com que Cassandra se sentasse numa cadeira de balanço ao lado do fogão. — Avanti, e si accomodi, per favore! Cassie abriu o dicionário em busca de palavras que explicas­sem sua presença ali, mas não encontrou nenhuma. — Non parlo italiano. O rosto enrugado de Speranza estava radiante e curioso. Fazendo mímica, Cassie continuou: — Vim ver a senhora, porque estava me sentindo muito sozi­nha lá em cima... sola. — Sola. Si! — Achei que podíamos tomar um caffe. — Non caffe! — Ela foi até a geladeira e apanhou uma jarra de leite. — Latte, per bambino. — E encheu um copo para Cassandra. Surpresa, Cassie pôs a mão na barriga. — Benedict contou sobre o bambino! Speranza fez que não com a cabeça. — Você adivinhou? Ah, não sabe como é bom poder falar so­bre isso abertamente. Ninguém sabe, além de você. Benedict não quer contar, talvez porque esteja envergonhado. — Ela voltou a olhar o dicionário. — Benedict é imbarazzato. Speranza pegou o dicionário e com sotaque carregado, mas sem nenhum erro, falou: — Não, signora. Benedict está orgulhoso. — Não sei, Speranza. Ele só casou por causa do bambino. Dessa vez Speranza não entendeu uma palavra, pois respondeu sorrindo: — Si. Signor Benedict é molto virile! — Não sei se ele está comigo porque engravidei ou se realmen­te gosta de mim independente do bebê. Ela sabia que estava entregando seu coração para alguém que não tinha a menor idéia do que acontecia, mas foi realmente um alívio poder desabafar. Speranza ficou pensativa, depois pegou na mão de Cassandra e inspecionou a palma. Finalmente, mostrou o muque fino e enrugado e anunciou: — É um figlio. Bebe latte, signora, per bambino. Para bebê me­nino ser forte como papa. Cassie morreu de rir do muque que Speranza fez. — Ai, Speranza, como é maravilhoso rir novamente. No entanto, a alegria durou pouco. Uma voz cortante ecoou na cozinha: — O que é tão engraçado, Cassandra? Acha engraçado tirar mi­nha empregada de suas obrigações? Elvira estava parada na entrada da cozinha, lívida de raiva. Há quanto tempo estava ali? Teria ouvido sobre o bebê? Spe­ranza seria punida? — Não é culpa de Speranza. Vim sem ser convidada, para to­mar um café — falou Cassandra em defesa de Speranza, levantando-se tão rapidamente que sentiu uma fisgada na barriga. Speranza respondeu algo em italiano, deu uma banana com o braço para Elvira, gesto universalmente conhecido, e voltou ao serviço sem pressa. Elvira ignorou Speranza e olhou para o copo de leite que Cassie tentava esvaziar na pia, disfarçadamente. — O que é isso? Também não suporta nosso café? Ela não tinha ouvido sobre o bebê! Cassie respirou aliviada. No entanto, o alívio transformou-se em desespero quando Elvira fez a mesma pergunta a Speranza. Sem hesitar, a senhora respondeu e entre as palavras que pronunciou uma delas foi bambino. O silêncio era ensurdecedor. Cassandra ficou petrificada de medo, mas conseguiu falar: — Agora sabe o segredo que eu e Benedict tentávamos escon­der da senhora, apesar de eu nunca entender o porquê. — Cassie foi andando em direção à saída, sabendo que teria que passar pela sogra. — Sciatonna! — Elvira vociferou e não saiu do caminho quan­do Cassie se aproximou da porta. — Vadia! Cassie empurrou a sogra para subir a escada e Elvira a seguiu. Exasperada, Cassandra gritou: — Me deixe em paz! Não tenho mais nada para dizer à senhora. — Acha que pode prender meu filho com essa criança que diz que é dele? — Ele não está comigo contra a vontade, Elvira! — Ela tentou subir as escadas, mas Elvira ficou na frente e não a deixou passar. — Ele quer se ver livre de você! Por qual outra razão passaria tanto tempo longe de casa? Ele que ficar longe de sua carência ir­ritante. — Nunca tentei impedir que ele fosse trabalhar. — Não? — Elvira fez um gesto melodramático. — Oh, Bene­dict queria tanto passar uma tarde com você no Museo Naziona-le... Benedict, sua irmã disse que tem umas ruínas bizantinas divi­nas na região. Quando vai me levar lá? Mostra-me a escola onde estudou. E assim por diante, dia após dia! — Alguma vez passou pela sua cabeça que me interesso pelo lugar onde meu marido nasceu e que quero conhecê-lo melhor? — Mentira! Você só pensa em si mesma, garota mimada. Mas Benedict não precisa de uma criança como esposa. Ele precisa de uma mulher. — Alguém como Giovana, suponho. — Não alguém como, mas simplesmente ela! — Giovana não quer nada com Benedict. Ao contrário de você, ela respeita nosso casamento. — Ela entende Benedict e o conhece de uma maneira que você nunca vai conseguir. Ela completa meu filho. Você o afugenta. Confusa, Cassie respondeu vacilante: — Essa nunca foi minha intenção. Só quero... — Você quer tudo, todo o tempo que ele tem! Quer ele todo para você, mas Benedict não lhe pertence e nunca vai pertencer! — Cale a boca! Se Benedict soubesse das barbaridades que você está falando... Elvira chegou mais perto de Cassie. — Sim? — Agarrou os ombros de Cassie e deu um forte em­purrão. — O que, americana? Cassie perdeu o equilíbrio, pisou em falso e, de repente, estava completamente sem chão. Em câmera lenta, ela sentiu seu corpo cair para trás pelo ar. Ou­viu um grito e pensou que só poderia ser o seu, já que Elvira tinha u boca fechada observando a cena indiferente. O corrimão de már­more lacerou os dedos de Cassie quando ela se segurou para não cair, uma das pernas ficou presa entre dois balaústres e ela distendeu a virilha; estava prestes a rolar mais um degrau. Por sorte, escorregou o suficiente para alcançar outro balaústre e se agarrar a ele. Tremendo, sussurrou apavorada: — Meu Deus, Elvira, você poderia ter me matado! Elvira continuava apática. Por alguns segundos, Cassie pensou que ela pretendia terminar o serviço. Ela não o fez. Apenas olhou para frente, desceu as escadas passando por Cassie como se passasse por um inseto insignifican­te e desapareceu. Cassie permaneceu onde estava, agarrada ao balaústre, tremen­do dos pés à cabeça, apavorada com o que poderia ter acontecido ao bebê. Morrendo de medo que Elvira voltasse, soltou a perna presa. Apesar da dor nas costelas e na virilha, estava bem. Mas e o bebê? E se o tombo tivesse causado um problema no cérebro do feto? Na espinha dorsal? — Benedict! — ela murmurou entre lágrimas, sentindo-se so­zinha e amedrontada. — Por que não está aqui quando preciso tanto? Teria que se virar sozinha e fazer o que fosse preciso para se assegurar de que o bebê estava bem. E sair de uma vez por todas daquele palazzo infernal. Partiu seu coração ter que abandonar Benedict. No entanto, o bebê estava em primeiro lugar, para ambos. Tinha que sair daquela casa amaldiçoada e buscar atendimento médico. Tomaria o primeiro vôo para os Estados Unidos. Subiu as escadas e foi até a suíte, pegou sua bolsa com o passa­porte e a carteira. Em seguida, abriu o armário de Benedict, rezan­do para encontrar o que precisava para levar seu plano a cabo. Sujo e cansado, Benedict passou pelo arco que marcava o que antes haviam sido os estábulos da família Constantino e que agora era uma enorme garagem para os veículos da fazenda e os carros da família. Ele estacionou o caminhão no lugar de sempre e ao bater a porta o som foi de um canhão devido ao silêncio que imperava. O silêncio não o incomodou no início; Bianca e Francesca de­viam estar trabalhando, e Cassandra na praia, aproveitando o sol da tarde. No entanto havia algo que não estava certo, algo com a garagem... Deu de ombros e se dirigiu para a casa. Se fosse algo importan­te, teria percebido. Tinha ficado fora alguns dias, no território dos Ia 'ndrangheta, tentando fazer um trato com Ângelo Menghi, o líder da gangue. Darius, o irmão mais novo de Ângelo, fora o homem que Elvira contratara quando os empregados que trabalhavam para a família há 20 anos decidiram que estavam fartos da má administração da nova patroa. Dissimulado e incompetente, Darius ajudou a arruinar a frágil estabilidade que restava entre a família Constantino e os emprega­dos. Quando Elvira o despediu, as retaliações e os vandalismos não tardaram a acontecer. Odiava ter que negociar com esse tipo de gente. Porém, sem escolha, foi até os bandidos em busca de uma trégua. Depois do sucesso da missão, tudo o que queria era tomar um bom e longo banho, uma garrafa de vinho e passar o resto da tarde com Cassandra. Sentiu muita falta de Cassie. Não tanto durante o dia, quando teve que negociar para conseguir um acordo de paz. Porém, du­rante a noite, sob o céu estrelado, sentindo o ar frio da montanha no saco de dormir, lembrara-se da pele suave, do corpo quente, da boca deliciosa de Cassie. Estava impaciente para vê-la outra vez; envolvê-la, sentir o filho mexer dentro da barriga da mulher que escolhera. Depois do banho, voltou à suíte azul, mas ela estava vazia. Be­nedict começou a desconfiar do silêncio absoluto que imperava na casa. Ele não era supersticioso, nem poderia ser, pois não teria êxito nos negócios se não fosse bastante pragmático e pé no chão. No entanto, naquele instante, teve um mau pressentimento. Foi de cômodo em cômodo, chamando por Cassandra e escu­tando apenas o eco de sua voz. Foi quando encontrou Elvira. Ela estava sentada numa cadeira e parecia completamente des­ligada. — Mãe? Está me ouvindo? Ela não respondeu e permaneceu tão imóvel que por alguns se­gundos terríveis ele achou que Elvira estivesse morta. — Estou ficando velha, Benedict, não sirvo mais para nada. — Você só tem 59 anos! — Mas aqui dentro, minha cabeça às vezes não funciona direi­to. Esqueço de coisas... que não deveria esquecer. — Você está doente, mãe? — Não, mas Cassandra sim... Acho que está machucada. Ela caiu da escada. Acho que eu a empurrei. Ele sentiu um golpe no coração e quase lhe faltou ar para pro­nunciar as palavras: — Pelo amor de Deus! Por quê? — Não consigo me lembrar. Tentando não perder o controle, ele perguntou calmamente: — Onde ela está agora, mãe? Elvira continuou calada. Benedict explodiu num acesso de fúria e agarrou a mãe pelos ombros. — Me responde, Elvira! Cadê minha mulher? — Procurei Cassandra por toda parte, não a vi. Ela não está aqui. Ao ouvir as palavras da mãe, ele caiu em si. O lugar onde ficava estacionado o Lamborghini estava vazio quando chegou! Ele começou a suar frio. Cassandra, machucada e perturbada, dirigindo naquelas estradas sinuosas e traiçoeiras, cheias de penhascos! Poderia estar ferida em algum despenhadeiro ou até... morta! — Onde está Francesca? Será que levou Cassandra até a cidade para ver um médico? Antes que Elvira respondesse, ouviu-se a voz de Francesca gri­lar alegremente: — Olá! Alguém em casa? Um minuto depois ela entrou no salão e, vendo a cara de aflição de Benedict, murmurou: — O que aconteceu desta vez? — Elvira disse que jogou Cassandra pela escada. Você tem al­guma idéia do que aconteceu? Francesca estava boquiaberta. Benedict sentiu seu coração des­pedaçar. Praticamente, havia obrigado Cassie a ir para a Itália, de­pois deixou-a abandonada. Sua atitude talvez tivesse custado à vida de Cassandra. — Benedict, espere, aonde vai? — perguntou Francesca. — Procurar minha mulher! E rezar para que ela e o bebê este­jam vivos. — Bebê? Cassandra está grávida e você não me contou? — Não tenho tempo para ficar me justificando! Preciso encon­trar Cassandra. — E o que vai fazer? Sair por aí como um louco? Espere e pen­se, Cassandra pode estar aqui, descansando em algum lugar da casa. — Não está. Já procurei por todos os lugares e meu carro não está na garagem. Francesca empalideceu. — Vamos ligar para a polícia. Não vai ser difícil encontrar um amborghini Diablo vermelho. Se ela ainda estiver na Calábria logo será localizada. — E se ela já não estiver na região? — Vamos ligar para a clínica do Vieri. E pare de pensar no pior, Benedict! Se ela tivesse sofrido algum acidente já saberiamos. Precisamos alertar as autoridades e esperar que a encontrem. Mas se ela voltar para cá, é melhor que você esteja aqui. O que Francesca disse fazia sentido e era melhor não perder nem um minuto mais, pois já começava a escurecer e seria mais difícil fazer as buscas, caso o pior tivesse acontecido. Se não en­contrasse Cassandra até o amanhecer, não seria capaz de olhar a luz do dia novamente. Cassandra chegou ao centro da Calábria à tardinha e acabava de deixar o hospital. Respirou aliviada. O bebê estava ótimo. Após uma série de exames, ouviu do obstetra: — Seu bebê está muito bem, assim como a signora. O tombo a deixou com pequenos hematomas, mas sua gravidez não corre pe­rigo. — E meu útero? — Está perfeito. Você e seu marido podem ficar tranqüilos. Ele vai gostar de ouvir isso. — Vai sim. Porém Benedict estava longe e ela não tinha nenhuma intenção de voltar ao palazzo para esperar por ele. Cassie descobriu que o próximo vôo para São Francisco saía no dia seguinte à tarde. Estava feliz, pois pela primeira vez em sema­nas viu-se livre da atmosfera pesada e sombria da casa dos Constantino. O som do tráfego e das pessoas na rua fez com que perce­besse o quanto sentia falta da agitação urbana. A região da Calábria sofreu um grande terremoto no início do século XX que destruiu a maior parte da bela arquitetura da época pré-romana. As novas construções não tornavam o lugar atrativo. Ainda assim, Cassie sentia a energia da cidade, que era muito viva. Encontrou um hotel bem simples e charmoso, numa rua tran­qüila. O quarto e o banheiro eram limpos e dava para ver um pe­queno e simpático jardim da janela. Cassandra saiu para passear e no caminho encontrou uma pe­quena loja de roupas para grávidas. Feliz em saber que o bebê es­tava bem e de poder mostrar sua gravidez, comprou um vestido de seda laranja e um conjuntinho de algodão azul. Ao retornar para o hotel, já era noite e havia lamparinas de que­rosene acesas no jardim. Há séculos não se sentia tão relaxada. Tomou um banho de banheira demorado e depois vestiu seu novo conjunto azul. Atraída pelos aromas tentadores que vinham da co­zinha desceu para jantar. Esfomeada, devorou as azeitonas e o pão recém-saído do forno. Deleitou-se com o ravióli recheado com berinjela e, de sobreme­sa saboreou o queijo e as frutas da região. Viu a lua nascer ao som de um violino, ao fundo. Um casal apaixonado sentado à mesa ao lado namorava, de mãos dadas. Fal­tava apenas Benedict; ela estava morrendo de saudades. Às três da manhã Cassie acordou sentindo como se uma borbo­leta estivesse batendo asas dentro de sua barriga. A sensação vol­tou um minuto depois. Seu bebê havia mexido pela primeira vez! Desejou ardentemente que Benedict estivesse lá para sentir o filho mexendo. Ela sentou na cama e ligou para Trish. Às seis da manhã, o telefone tocou e Benedict respirou com o coração aliviado. A polícia a havia encontrado. Ela estava regis­trada no Hotel Calábria; o carro estava estacionado em frente. Em menos de 15 minutos eleja estava na estrada e chegou ao centro antes que o tráfego da manhã começasse. No hotel, o recepcionista confirmou que Cassandra ainda esta­va hospedada ali. Benedict ficou no lobby esperando. Cassandra só apareceu às 9h30 da manhã, com o pequeno di­cionário a tiracolo, descansada e lindamente grávida. Serena e feliz Cassie deixava transparecer que o bebê estava bem. Sem perceber que era observada, foi direto ao jardim, segui­da por Benedict. Ela se sentou ao lado de uma pequena fonte, pôs os óculos escuros e abriu o cardápio. Benedict sentou-se em uma mesa atrás de Cassandra e, inclinando-se, disse: — Parece que a signorina conhece bem o hotel. O que reco­menda para o café-da-manhã? Cassandra deixou escapar um grito curto e abafado ao reconhe­cê-lo, mas se controlou e entrou no jogo: — Signora. Sou uma mulher casada. — E eu sou um marido em apuros. Minha esposa me deixou e estou desesperado atrás dela. — Por que ela deixou você? — Infelizmente, tratei-a com descaso e a coloquei em perigo. Se alguma coisa acontecer a ela, nunca mais poderei viver em paz. — Ela sabe dos seus sentimentos? — Não sei. Nunca lhe disse, porque não havia me dado conta até ontem à noite, quando vi que a tinha perdido. — As mulheres precisam saber o que seus homens sentem, signor. — Será tarde demais para convencê-la? Ela não respondeu e Benedict sentiu o coração congelar de medo. Ela estava certa: as ações nem sempre falavam mais que as palavras, e desta vez suas ações não haviam sido suficiente. — Ela vai voltar para mim, você acha? Ou decidiu que é me­lhor seguir a vida sem mim? Os segundos que se passaram até que ela respondesse foram uma eternidade. Ele já estava perdendo as esperanças quando sen­tiu os dedos de Cassie passarem por seu rosto. — Acho que ela prefere ficar com seu marido — Cassie res­pondeu. CAPÍTULO DEZ — Não queria ter deixado você, Benedict. Mas não tive escolha. Não o culpo pelo que aconteceu ontem, não é responsável pelas atitudes de sua mãe. Sem largar a mão de Cassandra, ele levantou da cadeira e sen­tou mais perto dela. — Mas sou responsável por você e por nosso filho. — Você não pode estar sempre presente e evitar o perigo. Caso não tenha percebido, também sei cuidar de mim mesma. — Mais do que imaginei, pela forma como desapareceu sem deixar rastros. Como conseguiu chegar à cidade? — Foi um horror. Principalmente depois que cheguei aqui. O congestionamento foi um pesadelo. O mais difícil mesmo foi en­contrar a chave do carro. Sabia que você costumava guardá-la nas suas coisas, mas tinha medo de que a tivesse levado com você para as montanhas. Eu nunca teria conseguido escapar sem seu carro. — Ela o olhou sorrindo. — Mas se é o Lamborghini que o preocu­pa, não há um arranhão nele. — Não estou nem aí para o carro, Cassandra! Iguais a ele têm milhares, mas você... você é insubstituível, e nunca mais quero pensar na hipótese de perdê-la. — Já disse, Benedict, o que aconteceu não foi culpa sua. — Foi, indiretamente. Eu devia saber que deixar você morando sob o mesmo teto com minha mãe era um erro. Você tentou me alertar. Eu podia tê-la deixado com Bianca, seria bem mais segu­ro. Ela teria cuidado muito bem de você e do bebê. — Eu não teria ido. Queria ficar com você. Mas agora as coisas foram longe demais. Ah estou tão feliz de você ter vindo me pro­curar. Tenho ótimas notícias. Ele olhou meio incrédulo e quase esboçou um sorriso. — Como pode ter algo ótimo para me contar em meio a essa tragédia? — Passei aqui no hospital ontem e fiz uns exames para saber se estava tudo bem com o bebê. Ele apertou a mão de Cassie e a beijou. — E? — Vi e ouvi o coraçãozinho do nosso filho batendo e ontem à noite ele mexeu. — Ela pegou na bolsa as fotos da ultra-sonografia e deu a ele. — Aqui estão as fotos do seu menino, Benedict. — E um menino? — Suas mãos tremiam quando pegou as fotos e Cassandra quase chorou ao ver o rosto maravilhado do pai de seu filho. — Ele é perfeito? — Perfeito! — Fomos abençoados, cara mia\ — E não contei tudo. O problema com meu útero... Bem, afi­nal, já não é mais um problema. O médico disse que estou melhor que nunca. — Confia nele? — Ele é especialista. Acredito que saiba o que fala. — Quer dizer que tenho uma esposa e um bebê saudáveis? — Exatamente. — Só queria que fosse suficiente para fazer de mim um homem plenamente feliz. — O rosto de Benedict perdeu o brilho e ficou taciturno. —Não é? — Depois do que minha mãe fez? — Pela primeira vez Cassan­dra viu o orgulho sempre presente no olhar de Benedict desapare­cer. — Nem sei o que dizer, Cassandra. Estou perdido. Perguntei a ela porque fez isso, mas ela respondeu de forma irracional. Tem alguma idéia do que a possuiu? — Ter descoberto sobre o bebê daquele jeito a deixou descon­certada. Mesmo assim, o que me choca é que ela sabia que estava pondo a vida do neto em perigo. Sei que é sua mãe, Benedict, mas o que ela fez não tem perdão. — Nunca pensei que fosse dizer isso um dia, mas ela não é a mãe que sempre conheci. Ela é um monstro. Antes pensava que estava doente, mas agora começo a suspeitar que é uma louca cri­minosa. Ele falou com raiva e Cassie pôde ver que sofria. Ela se sentia, em parte, culpada. Ao mesmo tempo, Benedict precisava saber que nada voltaria a ser como antes. — Gostaria de discordar de você, mas não posso. Não posso mais voltar ao palazzo e não quero sua mãe perto de mim ou do bebê nunca mais. — Eu entendo. Não vou pedir que volte, mas imploro que não vá embora para os Estados Unidos ainda. Por favor, Cassandra, vem comigo para La Posada, minha casa na Sicília, só nós dois. Vamos recomeçar tudo, do jeito que dois recém-casados mere­cem, com uma lua-de-mel de verdade. — Não tenho nem roupa. — Ela riu. — Saí com tanta pressa que deixei tudo no palazzo. — Assim que acabarmos de comer vamos fazer umas compras. — Mas, e seu trabalho? Não pode abandonar tudo depois de tanto sacrifício. — Você e o bebê são tudo o que importa, agora. Claro que me preocupo com minhas irmãs, mesmo com minha mãe, mas já es­tou farto de ter que nos deixar em segundo plano. A partir de ago­ra, nosso casamento vem em primeiro lugar. Ele estava emocionado. Uma atmosfera de paixão acumulada, contida; apontava para um futuro subitamente ensolarado, um fi­nal feliz pelo qual Cassandra há tempos ansiava. Mesmo que não tivesse dito o "Eu te amo, Cassandra", as pa­lavras de Benedict estiveram muito próximas disso e eram mais que suficientes para ela, depois do tumulto e do trauma das últi­mas 24 horas. Ele a levou para fazer compras em lugares que ela nunca teria encontrado se estivesse sozinha e gastou uma quantia exorbitante: um guarda-roupa completo de lingerie de seda, sapatos, perfumes, vestidos para grávidas tão lindos que ela teve vontade de estar grá­vida para sempre, só para continuar usando as roupas. Eles comeram frutos do mar e conversaram sobre a viagem de Benedict e do sucesso do empreendimento de ele ter conseguido pôr os negócios da família em ordem. — Convenci um velho empregado a voltar e dei a ele o controle das decisões na Calábria. Ele é muito respeitado na aldeia e não vai ter nenhum problema em contratar novos camponeses. Muitos já voltaram e estão trabalhando nos pomares. A viagem até La Posada foi feita de barco e quando chegaram ao refúgio na Sicília Cassie se apaixonou pelo lugar de imediato. Ao contrário do palazzo, pesado e sombrio, a casa de Benedict estava localizada num declive que dava na costa, paredes de estuque brancas e telhado azul com uma bela piscina de água azul-turquesa. Benedict a levou para conhecer a casa. O jardim era repleto de arbustos floridos e de pequenas fontes com córregos que formavam reservatórios onde peixinhos colori­dos nadavam. As janelas e portas eram amplas, permitindo que a brisa arejas-se a casa com o perfume dos jasmineiros, abundantes na entrada da casa. Os quartos, espaçosos e ventilados, recebiam o reflexo do sol sobre o mar. O piso era de mármore polido como seda e os sofás, de um cou­ro tão macio que pareciam de algodão. A enorme suíte principal tinha um terraço particular com mesa e cadeiras e, curiosamente, havia dois banheiros gigantescos, liga­dos aos respectivos closets. — Se está pensando quantas mulheres eu trouxe aqui, saiba que você é a primeira e a última. Comprei a casa há três anos por causa da localização e da vista. Era de um casal que se mudou para Roma para ficar mais perto dos netos. Envergonhada por ele ter lido seus pensamentos com tanta precisão, ela respondeu: — Você não precisa me dar explicações. — Não quero mais nenhum mal-entendido entre nós. Você é minha mulher, a única que terei dentro desta casa. O sol se pôs e Cassie tomou um delicioso banho de banheira e se vestiu demoradamente. O olhar de Benedict dizia que logo, muito em breve, nada mais os separaria. Nem as paredes do ba­nheiro, nem as roupas que vestiam e nunca mais a presença taci­turna e reprovadora da mãe dele. Só de pensar na sogra, Cassie sentiu calafrios. À noite, eles jantaram à luz de velas no terraço, admirando o mar, ao som das ondas batendo na areia da praia e com a lua no horizonte. De dentro da casa vinha o som de uma música românti­ca dos anos 40, que falava de amores perdidos novamente encon­trados, dois corações que batiam como se fossem apenas um. Car­mine, o chefde cuisine, serviu vitela a parmeggiana e rollentini, com uma salada bem leve de entrada e zabaglione frio de sobre­mesa. Durante esse tempo, cada palavra, cada olhar, cada toque gera­va correntes de calor e muita expectativa entre Cassie e Benedict. Cassie sentou ao lado do marido enquanto tomava uma taça de champanhe, que haviam aberto para comemorar. Ela pressentia que o granfinale estava próximo. A união tão esperada depois de quase quatro meses e meio de casados. A luz das velas iluminava o rosto e os olhos escuros e misteriosos de Benedict. Semanas de trabalho pesado no campo deixaram seu corpo forte e bem defini­do ainda mais modelado, beirando a perfeição. A pele sensual­mente morena estava mais bronzeada. Parecia um deus romano e Cassie desejou que pudesse congelar aquele momento tão único e espetacular e guardá-lo como talismã para afugentar todo e qualquer tipo de desventura que pudesse ameaçar seu casamento no futuro. Porque, por mais decidida que estivesse de manter total distância da sogra, Cassie sabia que enquanto Elvira vivesse seu poder de destruição permaneceria, como uma nuvem negra no horizonte. — Em que está pensando, cara? — Em como consegue deixar um lugar como este. É divino aqui. — É meu refúgio favorito. O apartamento em Manhattan é con­fortável e os de Paris, Londres e Hong Kong também são bons. Mas aqui é o lugar que escolhi para esfriar a cabeça e relaxar. Cassie ficou atordoada devido à naturalidade com que ele men­cionou os inúmeros imóveis, como se fosse corriqueiro ter pro­priedades espalhadas pelo mundo. — Quantas casas você tem, exatamente? — Quatro. Meu trabalho exige que eu viaje o tempo todo, e não gosto de hotéis. — E barcos? — Dois: a lancha que nos trouxe até aqui e um veleiro que dei­xo no Caribe. — Benedict, desculpe a pergunta idiota, mas você é muito rico? — Acho que sim. Mas que importância tem isso? — Fiz um papel ridículo quando lhe ofereci dinheiro para aju­dar a cobrir o prejuízo. Você deve ter rido de mim. Achei que quando falou de ter que encontrar um outro meio para sobreviver estivesse se referindo a problemas financeiros. — Não ri de você, Cassandra, e fiquei comovido com sua gene­rosidade. — Nossa! Como nos conhecemos pouco! Benedict deu um beijo na testa de Cassie e a puxou para mais perto. — Mas temos o resto da vida para nos conhecermos melhor. — É verdade. — Acho que devíamos começar esse processo de conhecimen­to o quanto antes. Esperei muito tempo, pelo bem do bebê, mas você sabe que não sou um homem paciente. A voz rouca de Benedict deixou Cassandra arrepiada. — Então — sugeriu ela — é melhor me levar para a cama agora mesmo, antes que a gente dê um show erótico para os empregados. Ele não esperou nem um minuto. Levantou Cassandra e cruzou o terraço com ela nos braços para dentro da casa, até a suíte. — Adoro uma mulher que fala abertamente o que pensa. Gosto de você, minha Cassandra. Gosto demais de você. CAPÍTULO ONZE Ele planejou cada detalhe daquela noite com tanto esmero que es­tava seguro de que tudo aconteceria exatamente como pensara: iria finalmente amansar o coração e o corpo e desfrutar sem pressa cada segundo com Cassandra. Não foi o que aconteceu. Ele estava ansioso e ela deliciosa e lânguida demais. Mal chegaram à suíte, o desejo acumulado pre­valeceu. Ela sussurrava o nome de Benedict, seu hálito quente queimando a pele dele. As curvas sensuais que a gravidez criara, as carícias de Cassie... eram tentações demais para um homem só. Encurralado pela vontade, ele estava a ponto de explodir. Ele beijou Cassie nos lábios de um jeito erótico e agressivo. Ela o recebeu com boca ávida pela língua atrevida de Benedict e ge­meu suavemente. Nem chegaram até a cama. O cheiro e o gosto de Cassie o levaram à loucura e ele a deitou no chão mesmo, sem parar de beijá-la, bem devagar para que não deixasse de tocar um centímetro sequer do corpo dela, e ela de provocar o dele. Quase cego pelo desejo, ele desabotoou o vestido de Cassandra e o arrancou de uma vez. Desceu a cabeça pelo pes­coço de Cassie e com a boca tocou os seios que estavam cobertos pela fina seda do sutiã. Ela tremeu de prazer quando ele a mordeu de leve no bico do seio e com a língua acariciou-o ao redor. E tremeu ainda mais quando Benedict arrancou sua calcinha, já completamente úmida. Benedict então mergulhou o dedo com delicadeza no sexo mo­lhado e quente de Cassie. Ela se contorceu, completamente exta­siada, e Benedict quase gozou. Querendo prolongar o prazer, ele tentou manter um pouco de distância, mas ela aprisionou a mão de Benedict entre as pernas com força, abriu o zíper da calça dele e sem hesitar acolheu com a mão o sexo rijo e excitado dele. Em segundos, arrancaram as roupas que ainda cobriam seus corpos. A cama estava a apenas cinco passos, mas parecia estar a quilô­metros. Impossível chegar até o colchão antes da explosão de gozo e volúpia. Com as mãos encaixadas nas nádegas de Cassie, ele a levantou e, empurrando-a contra a parede, a suspendeu. Ela o envolveu com as pernas pela cintura e apoiou o ventre onde o fruto dos dois descansava contra a barriga de Benedict. — Tem certeza de que é seguro? — ele perguntou receoso, po­rém sabendo já que era tarde demais, que a paixão já possuíra seu corpo. — Absoluta — ela sussurrou. Ele provocou o sexo de Cassie com o seu, cutucando, brincan­do com os lábios internos de Cassie, que pulsavam desesperados pelo toque profundo e ardente dele. Então, finalmente, ele estava dentro dela, num movimento har­mônico de puro êxtase. Ela o pegou pelos cabelos e chorou quan­do o clímax que havia tentado adiar o mais possível a invadiu sem piedade. Esgotado e trêmulo, parecia que sua alma havia sido roubada. Ainda sob o efeito do orgasmo que acabara de ter, Benedict pro­nunciou as palavras que nunca antes tinha dito a uma mulher: — Cassandra, eu amo você! — O que foi que você disse? — Cassie arregalou os olhos. — Eu a amo, você é minha vida, nunca mais a deixarei em se­gundo plano. Ela voltou a chorar, dessa vez de felicidade. Os belos olhos azuis marejados. — Ai, Benedict! Esperei tanto para escutar estas palavras, mas tinha tanto medo que você nunca fosse sentir o mesmo. — Não tenha medo, mi amóre, o pior já passou. Daqui por diante só vão acontecer coisas boas para nós. Por cinco dias e quatro noites ele se dedicou a dar prazer a Cassie. Os dias maravilhosos que passaram fizeram com que ela es­quecesse da longa espera da lua-de-mel e dos momentos terríveis no palazzo. Eles faziam amor o tempo todo, com muito carinho e paixão, com direito a risadas, gemidos de prazer e sussurros ao ouvido. De dia, se amavam na piscina, com o sol pintando a parede branca da casa com seus raios; à noite, à beira-mar, na praia, com as estrelas partilhando a cena. Uma manhã ela acordou antes de Benedict e ficou contemplan­do seu homem, que dormia relaxado e sensual, com os cabelos pretos desarrumados sobre a testa. Ela não resistiu e deu um beijo suave no ombro de Benedict. Quando levantou a cabeça, ele estava com os olhos bem aber­tos, com um sorriso preguiçoso nos lábios. — Vem aqui, minha gueixa. — Sim, meu mestre. — Buon giorno, mi amore. Ele mostrou a Sicília para ela, levou-a a Palermo, às tratorias só conhecidas pelos nativos; apresentou a comida tradicional siciliana como o choco — um molusco semelhante à lula, com dez tentáculos —, o gelato italiano. Mostrou os palácios, as igrejas bi­zantinas, góticas e românicas. Um dia, quando estavam no campo, viram um ritual de casa­mento. A família e os amigos da noiva a escoltavam numa procis­são que vinha da casa dos pais dela a caminho da igreja da aldeia, onde o noivo esperava com a mãe e outras testemunhas. Benedict explicou para Cassie o fenômeno do mammismo, muito comum em algumas regiões da Itália, mas especialmente na Sicília, onde os homens mantinham vínculos fortíssimos com a mãe e a lealdade era sempre a mammina e depois à esposa. — Mas não é o seu caso. Você nunca pôs sua mãe em primeiro lugar — disse Cassie, agora segura do amor de Benedict. — Não, nunca. — Ele deu um forte abraço em Cassie. — Nasci na Itália, mas em muitos aspectos tenho pontos de vista norte-americanos. O sonho se desfez no sexto dia, com um telefonema de Francesca. Ela estava tão fora de si que, apesar de Benedict ter atendido o telefone, Cassie pôde escutar a voz estressada da cunhada do outro lado da linha. Ao pôr o fone no gancho, a expressão no rosto de Benedict era de temor. Não foi nenhuma surpresa para Cassie sa­ber que a razão era Elvira e mais uma de suas crises nervosas. — Você vai ter que voltar lá, não é? — Ela não conseguiu dis­farçar o desânimo. — Si! Mas dessa vez eu prometo, Cassandra, que vou pôr um fim nessa história absurda. Elvira nunca mais vai interferirem na nossa vida. — Não sei como você vai fazer para acabar com isso. Elvira não recebe ordens de ninguém. — Encontrarei uma saída. — Ele tocou o rosto de Cassie com as mãos e olhou-a com ternura. — De um jeito ou de outro, pro­meto que esse drama vai acabar. Se for necessário, vou interditar Elvira. Ela está dando vários sinais de que está perdendo a razão. — Benedict, entendo seu dilema, mas não vou com você para lá. Até reconheço que Francesca não pode segurar essa barra sozi­nha, mas me recuso a expor a mim e a meu filho ao perigo. — Nem pediria isso a você. Vou deixá-la com Bianca, em Milão. — Não há qualquer previsão de quando você vai se ver livre disso. Já fiquei ausente dos negócios durante muito tempo, muitas semanas além do planejado. Se não posso ficar com você, e pelo visto mais uma vez não poderei, prefiro ir para casa. Ele a apertou entre os braços e murmurou: — Não posso suportar a idéia de ter você tão longe de mim! — Também não acho que seja a solução ideal, mas também não é justo com Trish deixá-la trabalhando sozinha. O negócio é meu também. Gosto muito de Bianca e da família dela, mas minha vida é nos Estados Unidos, não aqui. Ele a largou, foi até a janela do quarto e ficou olhando para o lado de fora. Seu corpo estava rijo, os ombros tensos. Então se vi­rou e perdeu a compostura. — Você é minha mulher, Cassandra! Seu lugar é ao meu lado! Isso não devia estar acontecendo com a gente. Não agora, quando finalmente estávamos conseguindo dar uma segunda chance ao nosso casamento. Será que não dá para chegarmos a um consenso que nos permita ficar juntos? O desespero de Benedict partiu o coração de Cassie, mas não o suficiente para fazer com que ela voltasse atrás em sua decisão. — Desculpe, Benedict, mas me recuso a me submeter aos abu­sos de sua mãe novamente. Ela passou dos limites quando me em­purrou da escada. Não há a menor possibilidade de eu perdoar o que ela fez. — Por que não fazemos assim: amanhã, ponho você num vôo para Milão. Você fica com Bianca até o próximo fim de semana, quando já vou ter conseguido resolver tudo. Estou pedindo apenas três dias, cara. Pode fazer isso por mim? — E se não conseguir resolver tudo até lá? Por quanto tempo mais vou ter que deixar meus interesses em segundo plano? — Três dias e nada mais. — Ele pegou o telefone, discou um número, teve uma conversa rápida com a pessoa e desligou. — Tem um vôo que sai de Milão para São Francisco às três da tarde de sexta-feira. Eu me encontro com você no aeroporto e sábado você já vai estar em casa. Ele pegou a mão de Cassie e pressionou-a contra o peito. — Prometo, Cassandra, que nada vai me impedir de estar a seu lado naquele avião. No sábado à noite, vamos jantar a beira do cais de São Francisco. Na segunda, vou procurar uma locação para o novo escritório e você vai estar entre seus amigos, pessoas que a amam tanto quanto eu. Não vou deixar que minha mãe jogue lama em nosso casamento pela segunda vez. Ela sentiu o tom de convicção na voz rouca e sexy do marido e em seus olhos negros e profundos. Ela o amava muito e queria acreditar nas palavras do marido, por isso aceitou fazer a vontade dele. — Três dias então. Mas se você me decepcionar... — Isso não vai acontecer. Eles deixaram a Sicília na manhã seguinte e na terça à tardinha Cassie estava novamente em Milão. Bianca e Enrico a receberam de braços abertos e Cassie teve a atenção e o carinho familiar que não recebia desde que perdera a mãe. — Vamos fazer com que esses dias sejam verdadeiros feriados para você — disseram. — Antes que você perceba, sexta-feira já terá chegado, assim como Benedict. Pode confiar, ele é um ho­mem de palavra. Benedict ligou naquela mesma noite para saber se Cassandra chegara bem e contar sobre os progressos que já tinha feito. Havia providenciado que Elvira fosse internada no hospital da Calábria no dia seguinte, para avaliação psiquiátrica e um exame médico completo. A boa notícia era que Pasquale Renaldo, grande amor de Francesca desde a época da escola, a havia pedido em casamento. Ele era um bom homem. Sua família também negociava com a berga-mota e Pasquale estava no ramo desde que saíra da faculdade; era perfeitamente capaz de assumir o comando dos negócios da famí­lia Constantino na Calábria. — Eu a amo, Cassandra, vejo você sexta-feira. Na quarta-feira ele ligou para dar mais notícias. Chegaria em Milão às 10h30 da manhã de sexta; com tempo de sobra para to­marem o avião para São Francisco. Benedict ia encontrar o medico de Elvira no dia seguinte e tomar as medidas necessárias para que a mãe recebesse o tratamento adequado. Antes de desligar, ele disse: — Amo você, cara mia. Mais dois dias e estaremos juntos para sempre. Na quinta, ele não ligou, e Cassie tentou aceitar a justificativa de Bianca de que passar o controle da empresa para as mãos de Pasquale era um processo complicado, particularmente depois de tantos problemas criados por Elvira na administração. No entanto, as horas custavam a passar e, apesar de Cassie se esforçar para manter o otimismo, calafrios e más premonições dominavam-na. Só iria acreditar que o pesadelo havia acabado depois que Benedict estivesse ao seu lado e os dois bem longe dali. Por fim, sexta-feira. Ansiosa, Cassie chegou ao aeroporto Mal-pensa a tempo de ver o avião oriundo da Calábria pousar. Um grande número de pessoas saía do avião, mas nem sinal de Benedict. — Com certeza, não notamos quando ele saiu. — Bianca abra­çou Cassie, tentando animá-la. — Não se esqueça de que ele com­binou nos encontrar no setor de embarque internacional, não aqui. Ele está em trânsito e já deve estar lá, esperando por você. Não estava. Nem ninguém respondeu no palazzo quando Bian­ca ligou pelo celular para saber notícias sobre o irmão. — Na verdade, isso é um bom sinal... — Bianca insistia em manter o otimismo, incapaz de admitir o óbvio. — Francesca pro­vavelmente está ajudando Pasquale a familiarizar-se com a nova rotina e Benedict já está aqui. Quem sabe não está no free shop comprando algo? Se não for isso, então ele perdeu o avião. De qualquer forma, ele pode pegar o próximo vôo, ainda restam quatro horas até vocês partirem. Vai dar tempo, Cassandra, de verdade! — Por que não consigo acreditar em você? — Cassie disse an­gustiada. — Sei que ele não vai decepcionar você. Acredite em mim, Cassandra. Ela acreditou em Benedict mais uma vez. Casou com ele, cru­zou um oceano por confiar nele. Contra sua vontade, permaneceu na casa da mãe louca do marido mesmo quando seus instintos di­ziam que devia ir embora. Entregara seu futuro, sua vida e a de seu bebê a ele. Acima de tudo, acreditou que ele manteria a promessa que ha­via feito. Ele não cumpriu. Quando a última chamada do vôo 7602 com destino a Nova York foi anunciada, Cassandra já sabia o que fazer. — Ir para a América sem ele? — Bianca perguntou chocada. — Ele é seu marido, Cassandra! Você tem que estar aqui quando ele chegar. Ele vai esperar que você esteja aqui. Entenda que na Itália as esposas esperam por seus maridos. — Não sou italiana! Sou americana, e a partir de agora só farei o que for melhor para mim! — Tenho certeza de que ele terá uma boa desculpa pelo atraso. — Ele sempre tem uma boa desculpa. Benedict não consegue separar sua vida pessoal dos problemas da família. Sempre que al­guma coisa sai errada, ele se sente na obrigação de resolvê-la pes­soalmente. — Cassie pegou a mala de mão. — Se ele não chegar aqui nos próximos cinco minutos, esse casamento termina aqui, se é que existiu algum dia. Ele não apareceu. O Boeing 767-300 já havia decolado e o as­sento ao lado de Cassandra permaneceu vazio. Benedict chegou no portão de embarque internacional a tempo de ver o avião que levava sua esposa no ar. Ofegante, frustrado, exausto, ele agarrou os cabelos e pronunciou palavrões em voz baixa. — Isso não vai ajudar. — Ele se virou e viu a irmã, bastante abatida. O pouco de esperança que restava em Benedict de que Cassan­dra não houvesse partido morreu ao ver Bianca. — Então ela foi embora. Bianca, geralmente calma, estava irritada e bateu no braço do irmão. — Como pôde fazer isso com ela? Ele então relatou a história toda para a irmã. Primeiro, ela pareceu não compreender nada; depois, deu um grito. — Nossa mãe com um tumor no cérebro? — Bianca mal con­seguia falar.— Então por isso vivia com dores de cabeça e estava se comportando de maneira estranha? — Parece que sim. Por sorte, o tumor era benigno, mas a remo­ção foi bastante delicada. Ela teve que ser levada para Roma e on­tem à noite uma equipe de neurocirurgiões operou-a. — Está me dizendo que ela passou por uma cirurgia ontem à noite e só agora estou sabendo? Benedict, por quê? Você não tinha o direito de esconder isso de mim. Elvira também é minha mãe! — Depois que deram o diagnóstico, foi tudo muito rápido. Se tivesse esperado mais um dia para ouvir uma segunda opinião, tal­vez tivesse sido tarde demais. — Custava dar um telefonema para me avisar? — Bianca, você não chegaria a Roma a tempo. Não havia sen­tido em deixá-la preocupada, sem dormir, sabendo que não po­dia fazer nada para ajudar. Era melhor esperar que a operação acabasse. — E Cassandra? Não merecia uma explicação? — Ia contar tudo quando estivéssemos no avião. — Ela estava com muita raiva e magoada. Não sei como vai conseguir que o perdoe. — Mas eu sei. — Olhou no relógio e viu que uma hora já havia se passado desde que chegara a Milão. Não tinha tempo a perder se queria que o plano arquitetado durante a viagem até lá funcio­nasse. — Como único filho homem, era meu dever garantir que nossa mãe receberia o tratamento adequado. Já fiz minha parte, Bianca. Agora deixo essa responsabilidade com você e Francesca. Elvira está passando por um momento crucial e precisa da ajuda da família, mas agora tenho minha família para cuidar, uma espo­sa e um filho que precisam de mim. — Claro, eu entendo. — Ela beijou-o na face. — Quando che­gar me ligue para contar as boas novidades, e não se preocupe com mais nada a partir de agora. Francesca e eu vamos cuidar de tudo. Ele a viu partir, arrependido de ter deixado tanta responsabili­dade nas costas de Francesca, quando ela mesma já tinha uma fa­mília com que se preocupar. Cheirava a hospital e a remédio. Precisava de um banho, fazer a barba, trocar de roupa e principalmente dormir. Mas tudo isso teria que esperar. Com os olhos pesados de fadiga, ele deu um longo suspiro e pegou o celular. — É Benedict Constantino. Tenho que estar em São Francisco ainda esta noite. Em quanto tempo pode me levar lá? Teria que esperar duas horas até que o jatinho particular estivesse autorizado a decolar. Tempo suficiente para despachar a bagagem e usufruir os privilégios da área vip do aeroporto. Tempo suficiente para ligar para a amiga de Cassie, Patrícia, e pedir ajuda. CAPÍTULO DOZE Depois da interminável e extenuante viagem, Cassie tentou enca­rar de forma pragmática sua situação e decidir o que faria agora que estava de volta. O cansaço, porém, parecia ter-lhe roubado a razão, não conseguia dormir, sentia-se incapaz de pensar com cla­reza. Cassie se sentia num buraco negro, isolada do resto do mundo. Desejou não ter que sair nunca mais daquele lugar tranqüilo que parecia outro planeta, a não ser nos momentos em que Benedict invadia seus pensamentos, sem avisar, quando então a dor e o sen­timento de perda a consumiam. Sentia-se traída, desgostosa. Por um curto tempo, ele a amou, mas não o suficiente. Nunca o suficiente. Sua mente, voltando a raciocinar, reconhe­ceu que a única saída era pôr um fim nessa história. Ela precisava parar de se submeter a tanto sofrimento. Era destrutivo demais, exaustivo, humilhante. O avião pousou em São Francisco depois das 7h da noite, quase uma hora depois do previsto devido ao congestionamento aéreo no aeroporto de Nova York. Não havia ninguém esperando por ela, pois não avisara ninguém que estava voltando. Cassie estava frágil demais para tolerar a compaixão dos amigos. Odiava o sen­timento de pena. Tudo o que queria era ir para casa e sentir o acon­chego do lar, entre as coisas que tanto gostava, como a porcelana da avó, suas pinturas, os tapetes. Coisas não causavam dor a nin­guém, ao contrário das pessoas. Tomou um táxi no aeroporto. Ao chegar na entrada de seu pré­dio ficou um momento parada em frente à porta para se acostumar com a idéia de que estava finalmente em casa. Agora sim ela po­deria recobrar o controle de sua vida. Deixou a mala no lobby e subiu até o apartamento. A casa esta­va fechada há quase quatro meses, mas foi só abrir a porta para sentir o perfume de flores. Ela sempre fora suscetível a evocar lembranças pelo cheiro. O perfume do Chanel n° 5 lembrava sua mãe, o bom aroma do fumo cubano a levava de volta à infância, quando passava o Natal com Trish e seu pai, que sempre acendia um charuto depois do jantar. Invadida pelo cheiro de frésias, a lembrança de Benedict volta­va com força como se ele estivesse em carne e osso na sua frente. Confusa, andou até a sala e viu que estava repleta de flores. Frésias de vários tons de amarelo e roxo, em vasos espalhados pe­los quatro cantos da sala. Somente então percebeu que uma música dos anos 40 estava tocando e falava de um amor perdido e depois reencontrado, de dois corações que batiam como se fossem um só. As janelas esta­vam abertas, deixando a brisa quente da tarde entrar. Cassie vagou pelos outros cômodos da casa e encontrou mais frésias no quarto e uma camisola sensual e provocante em cima da cama; velas queimavam no banheiro. Completamente dominada pela adrenalina, sem saber se por conta da expectativa ou do desespero, foi até a varanda. Lá encon­trou a mesa lindamente decorada e Benedict. — Bem-vinda, mi adorata. — Como assim? — ela exclamou, segurando-se na porta com medo de que fosse desmaiar de susto. — Você não pode estar aqui! Para provar que Cassie estava errada, ele foi até ela e a tomou nos braços. — Estou aqui, porque aqui é meu lugar. A seu lado, minha bella mulher. De agora em diante para sempre. — Não — protestou, tentando se desvencilhar, pois a tentação de perdoá-lo era forte demais e ela sabia que não devia ceder mais uma vez aos encantos de Benedict. — Você não foi se encontrar comigo em Milão. Não cumpriu sua promessa. — Não — ele admitiu, soltando-a apenas para que pudesse olhá-la nos olhos. — Não cumpri minha promessa e nunca me per­doarei por isso. Mas se me deixar explicar o que aconteceu, talvez você possa me perdoar mais uma vez. — Não acho que seja capaz de perdoá-lo. — Mesmo assim, deixou que ele a envolvesse ao se sentarem no banco da varanda. — Pelo menos escute antes de me julgar e tomar uma decisão precipitada. Ela não podia negar isso a ele. A verdade é que estava morren­do de curiosidade para saber o que havia acontecido. — Quando você chegou? Como conseguiu chegar antes de mim? Como entrou aqui? Você não tem a chave! — Mas Trish tem e ela é uma verdadeira romântica. Agradeça a ela pelo cenário e a mim por tê-la procurado quando precisei. Do contrário, você teria me encontrado na escada do prédio. — Por que, Benedict? Por que me fazer passar por tanto des­gosto? — Não tive escolha. Ele então contou toda a história. — Podia ter me ligado. — E dizer o quê? Que estava priorizando minha mãe em detri­mento de minha esposa, mais uma vez, depois de ter prometido que nunca mais faria isso? Preferi explicar tudo pessoalmente. In­felizmente, cheguei tarde demais em Milão, mas fiz de tudo para chegar na hora, cara. Perdi você por alguns minutos e nunca vou me perdoar por isso. Cassandra percebeu que ela não havia sido a única a sofrer. Na verdade, ele pagou muito mais caro. Seu rosto estampava sofri­mento e exaustão. — E então? — Ele a olhava candidamente, disposto a aceitar qualquer decisão dela. Toda a raiva e dor que sentia se dissolveram. Desarmada, ela o empurrou com carinho e acariciou os cabelos de Benedict. — Você fez o que tinha de fazer, meu amor. Você não é o único que se sente culpado. Como sua mulher, eu devia permanecer lá, a seu lado, num momento tão difícil. Espero do fundo do coração que Elvira fique boa logo. — Também espero que sim. Quero que conheça minha mãe como ela é de verdade, não como se comportou nos últimos me­ses. Mas o que importa mesmo é que agora nós estamos juntos ou­tra vez. Não posso suportar a idéia de perdê-la. Você é mais do que minha esposa. Você é minha vida. — Sua voz estava embar­gada pela emoção. Trish havia deixado um prato delicioso de caranguejos, com sa­lada e morangos de sobremesa. Mas a comida teria que esperar para depois, quando a lua estivesse plena no céu e a temperatura mais amena para comer na varanda. Antes, havia coisas bem mais importantes para serem tratadas e o lugar para isso era o quarto. — Eu a amo, Cassandra — Benedict falou, depois que fizeram amor, de forma intensa, mas sem pressa, para desfrutar cada se­gundo, para recuperar o tempo perdido. — Eu o amo, Benedict — ela afirmou, levantando o rosto para beijá-lo. Novembro, quatro meses depois. Da estrada já dava para ver que a propriedade dos Constantino estava muito bem cuidada e que a ordem havia sido restaurada. Os pomares estavam repletos de frutas e as cestas penduradas nas ár­vores aos poucos se enchiam de bergamotas colhidas à mão pelos empregados. À porta do palazzo, uma Elvira bem diferente os esperava. Ain­da a mesma sofisticação e elegância, a mesma casa formalmente decorada, porém a voz de Elvira tinha um tom mais suave e o sor­riso era caloroso, apesar de ansioso, ao dar as boas-vindas. — Trouxe seu neto — Cassie disse, enquanto colocava Michael Vincenzo nos braços da sogra. — Já era hora de a senhora conhecer o mais novo membro da família. — Grazie — ela respondeu com os olhos cheios d'água. — Grazie tante, Cassandra. Eu nem sei se mereço tudo isso. Disse­ram que tratei você muito mal, cara. Espero que me dê a chance de consertar o que fiz e fazer com que se sinta parte da família, como merece. Cassie abraçou o filho e a sogra com um carinho que seis meses antes pensara que jamais pudesse expressar. — Mas é claro! Todos nós merecemos somente coisas boas da­qui por diante, Elvira. Estou muito feliz em vê-la tão bem. — E eu — Elvira disse com alguma dificuldade, pois estava muito emocionada — sou muito grata a você. Olho para meu filho e percebo que você é uma esposa adorável que o faz muito feliz e olho para seu filho e vejo que você é uma mãe maravilhosa tam­bém. Mas agora vamos entrar. O resto da família está esperando ansiosamente para conhecer o bambino e há dias que Speranza está arrumando a casa para sua visita. Embalando com cuidado o bebê, Elvira entrou pelo corredor cavernoso do palazzo até chegarão salão. Curiosamente, a triste­za do lugar parecia menos opressora e a frieza das paredes de pedra menos perceptível. Talvez a razão fossem os braços de Benedict, que carinhosa­mente envolviam a cintura de Cassie, e a segurança reconfortante de que ele estaria sempre a seu lado, ela precisando ou não. Ou talvez fosse por uma razão ainda mais simples; uma razão irracio­nal e plena chamada amor. FIM